Hai to Gensou no Grimgar – Capítulo 09 – Vol 04 - Anime Center BR

Hai to Gensou no Grimgar – Capítulo 09 – Vol 04

Capítulo 9 – A Vinda dos Anjos

Às vezes, as pessoas dizem que se sentem “fora de seu elemento.”

Era exatamente assim que Shihoru se sentia agora.

Perto da Rua Jardim das Flores, havia um restaurante chamado Maraika. Não havia uma placa na frente, mas o lugar era administrado por Maraika-san, então era assim que as pessoas o chamavam.

Os clientes do Maraika eram, em cerca de nove décimos, ou, na verdade, na maioria das vezes, 100% mulheres. Não era que os homens não fossem bem-vindos, mas o fato de a clientela ser majoritariamente feminina tornava o local menos acessível para os homens. Por outro lado, isso tornava mais fácil para as mulheres entrarem, criando um ambiente relaxante para elas. Não havia muitos lugares assim, ou melhor, Shihoru não conhecia nenhum outro, e a comida era boa, então, quando iam comer fora apenas entre as meninas, o Maraika era sempre a primeira opção.

Não precisava nem dizer que as mulheres que comiam fora com frequência—em sua maioria, soldados voluntárias ou aquelas que trabalhavam no setor de serviços—costumavam comer no Maraika, por isso, o lugar estava sempre cheio.

Hoje, elas evitaram os horários mais movimentados, chegando um pouco mais cedo, então havia lugares vagos. Mesmo assim, Shihoru e Yume foram forçadas a se acomodar no canto de uma mesa grande, sentando-se uma ao lado da outra. A comida que pediram foi servida, e, quando estavam pela metade do prato, o restaurante já estava lotado.

— E então, como cê tá indo, Shihoru? Tá aprendendo? — Yume perguntou.

— …Sim — Shihoru respondeu hesitante. — Levei quatro dias pra aprender um feitiço… Vai ser realmente difícil se acostumar… Eu acho. Até agora, só usei a magia Darsh…

— Magia Darsh, né — Yume disse.

— Na magia, existe o que chamamos de maestria, sabe… — Shihoru começou a explicar.

— Hmm? Mostarda? —

— …Ah, não. Maestria. —

— Ohhh — Yume disse. — Maestria, né. Maestria, certo. O que é isso?

— Para um mago, seu poder mágico é extraído dos elementais — Shihoru explicou. — Eles são uma espécie de criatura mágica, só pra você saber, e existem quatro tipos… — Shihoru contou nos dedos. — Arve, Kanon, Falz e Darsh.

— Amp, e Marrom, e Fax, e Dash? Uhum — disse Yume. — Isso é difícil de lembrar.

— …De qualquer forma, existem quatro tipos de elementais. O conhecimento sobre cada um deles… as técnicas para controlá-los corretamente… e a experiência que você ganha ao fazer isso, tudo isso compõe o que chamamos de maestria. Cada tipo de elemental tem suas peculiaridades. Existem algumas semelhanças, mas outras coisas são completamente diferentes…

— Então, existem quatro maestrias, ou algo assim? — perguntou Yume.

— Isso mesmo — disse Shihoru. — Por exemplo, a maestria de Arve e Darsh são diferentes. Eu usei Darsh por muito tempo, então tenho maestria acumulada. Mas essa maestria não se aplica a outras magias, então é como começar do zero…

— Ohhh — disse Yume. — Parece difícil. Yume é uma caçadora, então as opções pra ela são limitadas. Tem o arco, o facão, e depois, o quê, habilidades de caça? Isso é tudo. Huh? Uau, são três coisas inteiras. Mas Yume, ela não tem habilidades de caça, sabe.

— …Criar um cão-lobo entra como uma habilidade de caça? — perguntou Shihoru.

— Sim. Mas, sabe, Yume tá pensando que talvez ela tenha que desistir disso. Yume tem o dinheiro, mas se ela quer criar um, tem que ser desde filhote. Ela quer cuidar direito, sabe? É possível deixar com outra pessoa, mas Yume realmente não quer ter que fazer isso.

— Na situação atual, pode ser difícil dar a atenção necessária a um filhote… — Shihoru concordou.

— É, Yume tava pensando nisso também. Mesmo que Yume conseguisse criá-lo, ela sentiria pena do pobrezinho.

— Não é fácil cuidar de um animal…

— Isso mesmo — Yume disse. — Requer… determinação, talvez? Então, de qualquer forma, se você treinar um cão-lobo bem, ele nunca vai trair seu dono. Ele vai defender seu dono até a morte.

— …Eu gostaria de ter alguém assim — disse Shihoru.

— Hoh? Shihoru, cê preferiria ter uma pessoa de estimação do que um cachorro de estimação?

— Hã…? Ah, não, eu não quis dizer isso… —

Shihoru usou seu garfo para empurrar o que restava de comida no prato. Yume era meio lenta quando se tratava dessas coisas, ou simplesmente não se interessava, então, às vezes, ela não entendia bem o que Shihoru estava dizendo.

Quando olhava para Yume, Shihoru às vezes se preocupava que ela mesma fosse anormal. Ela não conseguia evitar dividir as pessoas do outro gênero em dois grupos: aqueles por quem poderia se apaixonar e aqueles por quem não poderia. Shihoru sentia um certo desgosto por essa parte de si mesma. Ela desejava poder ser mais ignorante em relação a isso, como Yume.

Quando eu decido que gosto de um garoto, isso só me traz sofrimento, pensou tristemente. É melhor nunca me apaixonar. 

— Ei, vocês duas — alguém disse.

Shihoru não esperava que alguém as chamasse, então ficou muito surpresa. Ela se virou para olhar em direção à voz. Ela conhecia—não, essa palavra era um pouco forte demais—ela reconhecia o rosto da pessoa que falava, ou melhor, o modo como estava vestida. Era uma mulher musculosa, com um estola de penas brancas enrolada no pescoço e o cabelo amarrado com uma bandana que, naturalmente, também estava decorada com penas brancas.

— Meu nome é Kikuno, mas acho que vocês não sabem disso — disse a mulher. — Nunca fomos apresentadas antes. Mesmo assim, eu sei sobre vocês duas. Lutamos juntas em Deadhead, certo?

— Ahh! — Yume apontou para Kikuno. — Você é uma daquelas Anjas Astutas, né?

— …É Wild Angels — corrigiu Kikuno. — E não aponte para as pessoas. Isso é rude.

— Eita. D-Desculpa. Yume vai ser mais cuidadosa com isso de agora em diante.

— Faça isso — disse Kikuno. — Eu sou bem tolerante, mas muita gente é mais temperamental. Bem, não que isso importe. Kajiko! — Kikuno se virou e começou a acenar. Ela estava tentando chamar alguém? Não, não era apenas alguém.

— Whoa-ho! — Yume soltou um grito estranho.

O corpo inteiro de Shihoru travou, e ela só conseguia encarar a mulher alta que caminhava em sua direção com passos largos.

— Com licença, vocês poderiam nos ceder seus lugares? — Kikuno perguntou, afastando três das clientes que estavam sentadas em frente a Shihoru e Yume.

Kikuno e a bela e assustadora mulher se sentaram nos lugares agora vagos.

A beleza assustadora. De fato, Kajiko era assustadora. Assustadoramente bela e simplesmente assustadora. Apenas estar sentada em frente a ela era intimidante. Honestamente, Shihoru queria fugir. Mas ela não podia. Se saísse correndo, sentia que seria cortada. Até mesmo Yume, sempre tão despreocupada, estava quieta como um rato.

— Eu diria “quanto tempo,” mas na verdade não faz tanto assim — quando Kajiko sorriu, Shihoru sentiu como se uma lâmina fria estivesse pressionada contra seu coração. — Eu sou Kajiko, líder das Wild Angels. Vocês são Shihoru e Yume, certo?

Shihoru assentiu em silêncio e mecanicamente, como uma marionete.

— …Huh? — Yume inclinou a cabeça para o lado. — Como você sabe os nomes de Yume e Shihoru?

— Eu pesquiso qualquer garota que chame minha atenção. — Kajiko disse algo muito assustador com naturalidade. — Aquele guerreiro de vocês, ele tinha coragem, para um homem. Meus pêsames pela perda.

Shihoru mordeu o lábio. Por quê? Era estranho. Embora ela não tivesse ficado tão triste como seus camaradas, e nem sequer pudesse chorar por ele, agora, ao ouvir Kajiko elogiando Moguzo, seu coração foi repentinamente inundado de emoções. Felicidade, orgulho e solidão.

Finalmente, ela percebeu que havia perdido um camarada maravilhoso e insubstituível.

— …Moguzo era realmente forte, não era? — Yume murmurou, olhando para baixo.

— Eu achava que sim — Kajiko disse, olhando para o horizonte por um momento. — Vocês ainda são inexperientes. Praticamente novatas. Vocês têm muito espaço para crescer. Se aquele guerreiro tivesse tido a chance de continuar crescendo, ele poderia ter feito seu nome. No mínimo, tenho certeza de que ele teria crescido o suficiente para estar lado a lado com aquele exibido que se juntou ao mesmo tempo que vocês.

— …Com o Renji-kun… — Shihoru rangeu os dentes. Kajiko provavelmente não era de bajular os outros. Ela podia perceber isso. Aquela era a avaliação honesta de alguém que liderava um grande clã como as Wild Angels. Shihoru podia confiar nisso.

Moguzo tinha sido forte. Ele poderia ter ficado mais forte. Muito mais forte.

— Bem, isso acontece o tempo todo — Kajiko disse, dando de ombros. — Não é incomum que alguém com talento emergente morra antes de florescer. Na verdade, quanto mais talento uma pessoa tem, mais provável é que morra cedo. Aqueles que são fracos e tímidos não tentam suportar o peso das coisas em uma luta. É assim que eles sobrevivem. Eu era assim também.

Kikuno olhou para ela e revirou os olhos.

— …Não, você não era, Kajiko.

— Não mesmo — Kajiko disse. — Vocês meninas têm uma opinião muito alta de mim. É verdade que eu não sou comum. Não sou párea para Soma ou Kemuri, mas duvido que perderia para o ‘Red Devil’ Ducky, ‘One-on-One’ Max ou Shinohara. Mas não foi sempre assim. Eu era bem patética quando comecei como soldado voluntária. Só que, graças à minha aparência, nunca faltavam homens idiotas que tentavam me proteger. Eu os usei para sobreviver. Honestamente, isso me dá náuseas. Mas os fatos são os fatos. Eu usei aqueles homens estúpidos, vulgares e desprezíveis como degraus para ficar mais forte, pouco a pouco. Claro, não vou negar que tinha um talento bruto. Devia ter. Mas todos têm isso. Em alguma coisa. O importante é não morrer. Você precisa viver, não importa o que aconteça, se alimentar de qualquer coisa que puder, e construir suas próprias habilidades. Shihoru. Yume.

— …S-Sim? — Shihoru gaguejou.

— Miau? — Yume perguntou.

— Vocês perderam aquele guerreiro — Kajiko disse. — Ele deve ter sido o pilar central da party de vocês. Mesmo com uma estimativa moderada, a party de vocês perdeu pelo menos metade da força. Vocês não podem sobreviver assim.

Shihoru tentou engolir, mas sua boca estava seca, sem uma gota de saliva para engolir. Quando ela se virou para olhar para Yume ao seu lado, os olhos de Yume estavam bem abertos e seus lábios estavam cerrados.

— Vocês duas têm muito potencial — Kajiko disse, suavizando um pouco a expressão. — Zoran Zesh foi um inimigo poderoso. Os orcs são uma raça poderosa, mas, para ser franca, não há muitos orcs que chegam a ser tão fortes. Diria que as únicas pessoas que poderiam ter enfrentado ele um-a-um seriam Soma e Kemuri. Olhando para o histórico de vocês antes disso, não seria surpreendente se todos tivessem morrido. E, no entanto, vocês ainda estão aqui. Isso é impressionante. No entanto, infelizmente, a party de vocês acabou. Vocês não podem lutar sem aquele guerreiro. Não vai demorar até que outro de vocês morra. Quando um de vocês morrer, será a vez do segundo, depois o terceiro. É geralmente assim que as coisas acontecem. Se aquele guerreiro tivesse sobrevivido, a party de vocês teria sido uma para ficar de olho, com certeza. Considerando a outra party famosa que se juntou ao mesmo tempo que vocês, as pessoas poderiam ter começado a falar de vocês como uma geração dourada. Mas essa possibilidade se foi agora. Se vocês se apegarem a essa party para sempre, Shihoru, Yume, a única coisa que espera por vocês é uma morte miserável.

— …Você está dizendo… que deveríamos desistir… então? — Shihoru perguntou, com a voz trêmula, à qual Kajiko respondeu imediatamente, — Sim — com um aceno de cabeça.

— Juntem-se às Wild Angels — Kajiko continuou. — Não vou insistir para que decidam agora, mas estão convidadas. Tenho uma party que poderia aceitar uma maga e uma caçadora já amanhã.

— Somos um clã só de mulheres — Kikuno acrescentou com um sorriso estranhamente amigável. — Nenhum homem é permitido. Ninguém vai usá-las. Nós nos unimos para nos aprimorar, para sobreviver e para aproveitar a vida. Os homens são proibidos, mas nunca tivemos problemas por não tê-los por perto. Na verdade, sabe de uma coisa? Estamos melhor sem nenhum homem estúpido por perto. Não importa o quanto tentem manter as aparências, no fim das contas, todos são iguais. Eles só nos veem como uma saída para sua luxúria suja.

— Kikuno, você está ficando um pouco empolgada demais — disse Kajiko.

— Ah, desculpa, Kajiko. Me deixei levar…

— É verdade que os homens são proibidos, mas isso é apenas para se juntar ao clã — Kajiko disse. — O que vocês fazem no seu tempo livre não é problema meu. No entanto, se alguém magoar uma das minhas camaradas, eu nunca vou perdoar. Eles podem correr e se esconder, mas eu os encontrarei e farei com que paguem. Seria preciso ser muito idiota para não perceber isso, então ninguém tenta algo com uma de nossas garotas sem seriedade. Se houver um homem que ainda esteja disposto a se aproximar de você, pode ter certeza de que ele é sério. Eu não vou espancar um homem assim até a morte, então não precisam se preocupar.

— Não sei não… — Kikuno disse.

— Se tem algo a dizer, Kikuno, olhe nos meus olhos e diga — Kajiko disse bruscamente.

— N-Não importa.

Morte, pensou Shihoru. Uma morte miserável. Do jeito que as coisas estão, nós vamos morrer.

Shihoru olhou para baixo e fechou os olhos.

Manato-kun. Moguzo-kun. 

Ela se lembrou das expressões em seus rostos quando morreram. Será que Shihoru e os outros acabariam assim…? Não, não necessariamente. Kajiko estava as convidando para se juntarem às Wild Angels. Ela estaria exagerando a situação para convencê-las? Tinha que ser isso.

Mas, o fato era que a força da party havia sido reduzida pela metade. Mesmo que Shihoru aprendesse novas magias e Yume adquirisse novas habilidades, elas não conseguiriam preencher o vazio deixado por Moguzo. Sem Moguzo, elas conseguiriam passar por batalhas difíceis como a da Fortaleza de Observação Deadhead?

Shihoru sempre ficava na retaguarda do grupo, observando-os. Ela poderia responder a essa pergunta com certeza. Não conseguiriam. Quando ela imaginava não ver mais as costas largas de Moguzo à sua frente, a cena parecia tão desesperadamente vazia.

Como maga, ela não vestia nada que pudesse ser chamado de armadura, então se sentia nua em um campo de batalha sem Moguzo. Sentia-se incerta, assustada, e queria fugir. Todos sabiam que a situação era desesperadora, e estavam tentando desesperadamente fazer algo a respeito. Estavam tentando caminhar por um caminho espinhoso.

Se se juntassem às Wild Angels, Shihoru e Yume não precisariam mais trilhar esse caminho.

Shihoru abriu os olhos, olhando para ver a expressão de Yume.

Yume provavelmente recusaria ali mesmo. “Desculpe, foi gentil da sua parte nos convidar,” ela diria. Quando o fizesse, Shihoru provavelmente chegaria à mesma conclusão. Era o que ela pensava. No entanto, Yume…

Yume franziu a testa e empurrou os lábios para fora como um polvo.

Ela estava pensando. Não parecia saber o que fazer. Até Yume estava sem saber o que fazer.

— Hum… — Shihoru abaixou a cabeça. Ela nem sabia para quem estava tentando se desculpar. — …Nos dê um tempo para pensar.

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