— Heroico…? Eu, um herói?
— Um herói.
Zich bateu e tentou enfiar os dedos nos ouvidos várias vezes.
— Um herói?
— Sim, herói. Você ouviu direito. Um herói como Glen Zenard. Não estou falando de uma forma indireta, e não tem nenhum significado escondido por trás. Quis dizer exatamente o que falei.
— Eu…? — Apontou um dedo para si. Não havia nada da sua compostura habitual, e até parecia um pouco burro.
— É difícil para mim acreditar nisso também. Não sei como você se tornou um ou como viveu, mas definitivamente havia um futuro em que você era um herói. E o nome que você usou foi Zich Brave.
— Entendi. — Ele bateu palmas — Nunca vou usar esse sobrenome.
— Faça o que quiser.
— Eu usei a Estellade durante esse tempo? — perguntou, se recostando na cadeira.
— Talvez. Acho que sim.
Com força, ele segurou a nova espada na mão. Mesmo que gostasse dela, agora tinha uma apreciação ainda maior.
— Esta é a minha última pergunta. Se lembra de quando nos conhecemos?
O tom dele soou como se estivesse mencionando uma memória sentimental entre ex-amantes. No entanto, estava longe disso.
— Sim. Tivemos uma grande luta.
— Porque você era muito suspeita.
— Você deveria considerar a minha posição. Eu estava frente a frente com o cara que poderia se tornar um futuro Lorde Demônio.
— Mas eu não era.
— Não importava como olhasse, você não era o Steelwall e com certeza não o Brave. O que eu deveria pensar quando restasse só o Zich Moore?
— Bem, vamos apenas dizer que ambos nos entendemos mal em nossas respectivas posições.
Esta não era a parte sobre a qual estava curioso. Não havia necessidade de se emocionarem com lutas passadas.
— Se lembra de como olhou para mim naquela luta?
— Quer dizer quando olhei para você como olharia para um futuro Lorde Demônio?
— Não, quero dizer quando você olhou para mim antes de fugir.
Por fim, ela se lembrou do que ele estava falando e soltou um gemido.
— Pensando bem, olhei para você um pouco diferente na hora.
— Foi a primeira vez que vi os olhos de alguém refletirem tanto animosidade quanto sentimentalismo. Embora eu entenda completamente a animosidade, por que o sentimentalismo?
— Não sei. Me senti sentimental, não me lembro exatamente por quê.
— Está relacionado às suas memórias nebulosas de novo?
— Deve ser. Mas sinto que algo estava diferente. E acredito que a animosidade não foi para Moore. Sei lá.
— Isso também é um mistério. — Entortou o braço no apoio e olhou para o teto — Tudo bem, eu basicamente perguntei tudo o que queria perguntar. Obrigado por responder.
— Às suas ordens.
Após isso, conversaram um pouco. Já que se aproximaram muito mais nos últimos dias, puderam dialogar com facilidade. E em meio a esse diálogo, ele mudou o olhar para a porta.
— Entre.
Era uma situação familiar. Da mesma forma, Lyla também prestou atenção.
— Por favor, com licença. — Hans abriu com cuidado a porta e entrou com Snoc.
— Por que estão aqui?
— Queríamos ajudar as pessoas na reconstrução da cidade. Mas, antes, queríamos a sua permissão, senhor.
Desde que salvaram Violuwin, estiveram sendo tratados bem ao extremo. Até o alojamento em que estavam hospedados agora foi preparado para eles. Por isso, Hans e Snoc, gratos, queriam ajudar na reconstrução.
— Também vou com vocês dois. — Lyla se levantou com Zich.
— Eu também deveria fazer uma benção ou duas antes de deixar Violuwin.
— Eu… não consigo me acostumar com você falando de bondade.
— É meu trabalho. — Encolheu os ombros.
— Ah, senhorita Lyla — Hans chegou mais perto — … Como tudo estava tão agitado, não pude devolver isso a você.
Era o anel que ela deu a ele nas ruínas.
— Obrigada.
— Você também o tinha quando começou a recobrar as memórias?
— Aham.
Hans e Snoc não prestaram atenção à conversa, pois sabiam que não os envolvia e não deveriam se intrometer. Quando Zich estava prestes a sair, seu olhar pousou na Estellade, que Hans estava segurando. Visto que não encontrou uma bainha adequada, enrolou um pano nela.
“Talvez…”
Zich olhou para o dedo que costumava ter a Chave que Distorce o Destino.
— Hans.
— Sim, senhor.
— Me dê a Estellade.
— Sim?
— O que está acontecendo? É estranho que você queira segurá-la.
— Talvez eu tenha conseguido usá-la por causa da Chave que Distorce o Destino que costumava estar na minha mão. Quero ter certeza de que esse é o motivo.
— A Chave que Distorce o Destino…
Era o objeto que costumava estar no dedo dele antes de se integrar à espada-galho, que possuía uma conexão estreita com a Estellade.
“Até que faz sentido” pensou Lyla.
— Aqui, senhor. — Hans tirou o pano.
Zich soltou um grande suspiro, como se estivesse realizando um ritual importante.
“Ele a odeia tanto assim?”
Nenhum dos três não conseguiam entender o ódio pela Estellade. No entanto, Zich não se importava com os pensamentos deles. Então, ele a agarrou e colocou pôs pressão na mão.
— Você pode segurar…
— Senhor…
— Senhor, funcionou…
Koo.
Ele olhou para ela com uma expressão inexplicável no rosto e a jogou no chão.
— Como esperado, esta coisa está quebrada. Não tem como eu poder segurá-la. Tenho certeza de que qualquer um pode.
— Pare de dizer coisas ridículas — disse Lyla
— É uma espada sagrada. Olhe, pelo menos eu não serei capaz de…
Todos ficaram quietos quando ela foi capaz de levantá-la.
— Eu estou bem. Eu tenho Nowem.
Koo.
No silêncio, as palavras de Snoc soaram tristemente entre eles.
Apesar de terem prolongado a estadia na cidade para ajudar na reconstrução, não podiam mais ficar após a maioria da destruição ser limpa e novos edifícios estarem prontos.
— É tão lamentável saber que estão indo embora tão cedo.
O prefeito da cidade saiu para se despedir deles. Detalhe importante: ele tinha um bigode elegantíssimo.
Zich e os seus companheiros eram heróis que haviam impedido o colapso da de Violuwin. Além disso, ninguém esqueceu da força massiva de Zich, o que bastou para fazer o prefeito se rebaixar a eles.
— Já recebemos muito com a nossa estadia. Por outro lado, sinto muito por não podermos ajudar um pouco mais na reconstrução.
— Não, não sinta! Fomos nós que recebemos mais do que o suficiente!
Zich ignorou o olhar perplexo de Lyla por trás dele e não apagou o sorriso do rosto. Assim, deixaram a cidade.
Ao contrário de Zich e os seus companheiros, os habitantes precisavam se preocupar com os seus sustentos. Mesmo que fosse uma sorte que ela não tivesse desmoronado, o futuro de Violuwin como um local turístico era muito preocupante.
Quem diabos viria para ver a destruição e estradas desmoronadas? Ademais, vários lugares atraentes também foram devastados, e o prefeito não tinha certeza se poderiam mesmo ser reconstruídos. Necessitavam de um novo jeito de atrair turistas.
— Tem que ser físico? Por que não tentamos vender histórias? — sugeriu um civil ao prefeito.
— Histórias?
— Sim. Mesmo que um pesadelo terrível tenha chegado aqui, heróis salvaram a todos.
O prefeito e todos na reunião prestaram atenção às palavras.
— Uma cidade capturada por monstros e um misterioso grupo maligno. Os destinos das pessoas eram tão frágeis quanto uma vela no vento. Quatro heróis apareceram de repente no tempo da perdição das pessoas, salvando a todos. Não se parece com a história de um romance?
— Explique o seu plano em detalhes.
— Vamos primeiro organizar a história. Nem precisamos exagerar, só dizer o que ouvimos e experimentamos seria tocante o suficiente. Se tentarmos, até as nossas verdades podem ser descartadas como mentiras. Então, depois de confeccionarmos, a espalhamos ao nosso entorno.
— E então?
— Marcamos as áreas onde lutaram e montamos monumentos para anotar o que fizeram. Colocar estátuas na cidade também seria uma boa ideia.
— O quê mais?
— Vamos deixar uns detritos para mostrar o que aconteceu e apoiar ainda mais as realizações dos heróis.
O prefeito caiu em pensamentos profundos, concordando que era um bom método para aumentar o turismo.
— O que os vocês acham?
— Não vai ficar tudo bem?
— Por mais que seja um pouco desconfortável usarmos a história dolorosa da cidade de meio para o turismo, acredito que é um bom plano.
— Temos que fazer o que pudermos para ajudar. É uma boa ideia pelo menos tentar isso.
— Sim.
Os outros também apoiaram o plano. Da mesma maneira, o prefeito estava inclinado para colocá-lo em prática.
— Como espalharemos os seus feitos, provavelmente podemos compensar parte da nossa dívida com eles. Têm outras ideias que queiram compartilhar?
— Por que não criamos um apelido para cada um dos heróis de acordo com suas características? Ajudará as pessoas a se lembrarem melhor deles.
— Como?
— Bem, por que não adicionamos um modificador na frente do “herói”? Para coisas assim, é mais fácil de lembrar se você simplificar. Por exemplo… — A pessoa ponderou por um tempo — Podemos dar a Snoc o título de “Herói da Terra”, uma vez que ele controla a terra. Para a Lyla, hábil em magia, podemos dar-lhe o título de “Heroína Mágica”. Os dois restantes…
Já que Hans usa uma espada brilhante, vamos chamá-lo de “Herói do Sol”. Zich mostrou uma esmagadora de força, então por que não o chamamos de “Herói da Força”?
— Não é ruim. — O prefeito assentiu — Acho que não temos mais que continuar esta reunião. Vamos executar o plano de imediato para atrair mais turistas.