Seishun Buta Yarou – Capítulo 1 – Vol 06 - Anime Center BR

Seishun Buta Yarou – Capítulo 1 – Vol 06

Capítulo 1

Este era o maior perigo que Sakuta Azusagawa já enfrentou.

Era o primeiro dia de dezembro, resta apenas um mês no ano. Numa noite de segunda, já depois das 10 horas.

A sala de estar, que normalmente era um lugar para descançar e relaxar, estava neste momento enfrentando um nível de tensão sem precedentes. Faíscas explodiam pelo ar.

Eles só pegaram o kotatsu ontem. O aquecedor que ficava embaixo da mesa estava ligado, e as pernas de todos estavam dentro do cobertor, mas ele não sentia nenhum calor. Ele considerou se deitar e entrar totalmente dentro, mas não era uma opção viável no momento. Até mesmo tirar as suas pernas parecia arriscado. Ninguém tinha pedido, mas Sakuta estava de joelhos, com postura bem ereta, nenhum traço de seu habitual jeito relaxado era visível.

É preciso apenas uma olhada rápida na sala para entender o porquê.

Havia duas garotas sentadas no kotatsu com o Sakuta.

A direita dele tínhamos uma atriz, um ano acima na sua escola, seu nome é Mai Sakurajima, ela foi uma estrela mirim, cujo nome era conhecido ao redor do Japão, nos últimos dias, ela tem ocupado papeis relevantes na TV, shows, comerciais, até filmes – Mas para o Sakuta, ela era também a sua namorada. Ela tinha belos traços que deixavam uma forte impressão. Cabelos longos, pretos que só acrescentavam a sua beleza. Ela retorna diretamente do set de filmagem, então sua maquiagem estava impecável, e ela parecia ainda mais deslumbrante que de costume. Se as circunstancias fossem menos extraordinárias, ele adoraria ficar sentado observando. Ele acredita ser capaz de ficar por duas ou três horas sem se entediar.

Mas não era um bom momento para isso.

A esquerda dele tinha outra garota, que alegremente descascava uma tangerina como se não tivesse nenhuma preocupação no mundo. Seu nome é Shouko Makinohara. Ela não era nada além do primeiro amor do Sakuta e parecia ser uma estudante universitária. Apesar da crise que ocorria, ela estava simplesmente pegando algumas tangerinas sem permissão e murmurando “Nossa, está azedo”. Ela por acaso tem nervos de aço? Ela estava no apartamento onde Sakuta e sua irmã viviam, mas julgando por como ela estava relaxada, seria fácil confundir e achar que a casa é dela.

Tanto Sakuta quanto Mai estavam olhando para ela com expectativas. Não estava claro se Shouko percebeu isso ou não, mas ela colocou o ultimo pedaço de tangerina na boca e disse “Deixe-me colocar a chaleira no fogo ” e então começou a se levantar.

“Eu…” começou Sakuta.

“Deixa que eu faço. ” Disse Mai firmemente. Ela estava de pé antes que algum dos dois pudesse reclamar.

“Não, eu deveria – ” tentou Sakuta.

“Sakuta, senta aí e tente achar um bom motivo” ela ordenou.

Ele não ousou replicar.

“Tá bom, desculpa. ”

Ele recuou. Ela já estava furiosa, e seria uma péssima ideia arriscar confronta-la ainda mais.

Mai se moveu elegantemente para a cozinha. Com uma graça relaxada que você esperaria de uma garota acostumada a estar na casa do namorado, ela abriu as portas dos armários e tirou a chaleira, as xicaras, a caixa com os chás. Ela deixou a água fervendo na chaleira e preparou uma bandeja para carregar tudo.

Se estivessem apenas os dois, Sakuta poderia apreciar completamente esta maravilhosa visão de sua namorada se sentindo em casa na sua cozinha. Mas pela primeira vez, ele sentiu que era impossível saborear o momento.

Enquanto colocava as folhas de chá no bule, ela olhou de relance para o lado da pia, Sakuta não podia ver de onde sentava, mas ela provavelmente estava olhando para o escorredor. Os pratos que ela e Shouko usaram antes estavam secando lá.

Droga. Um arrepio percorreu sua espinha. Todos os músculos de seu corpo ficaram tensos, e sua testa começou a soar frio.

Mai colocou a tampa na caixa e lentamente levantou seu olhar. Ela analisou a sala com uma falsa indiferença. Seus olhos brilharam com algo no fundo da sala, e ele achou que ela tinha visto um brilho que indicava desprezo. Será que lá tinha algo incriminador?

Sakuta se virou para ver e instantaneamente viu a maldita evidencia circunstancial. Era visível através da porta de vidro que seguia para a sacada. As roupas lavadas estavam alinhadas lá fora. A camiseta de Sakuta e suas cuecas estavam bem ao lado das roupas da Shouko. Pelo menos as roupas intimas dela estavam secando em outra sala, mas ver nossas roupas secando juntas com certeza era algo que abria espaço para perguntas incômodas.

Isto gritava “Recém-casados”.

Claro, seu relacionamento com a Shouko era nada daquilo. Shouko pode ter sido seu primeiro amor, mas Mai era sua namorada, e sua vida era dedicada a ela. Mas esta vista duvidosa causava uma suspeita que era poderosa o suficiente para superar tudo que ele dissesse em sua defesa.

Deixa-la continuar examinando a sala apenas cavaria ainda mais a sua cova. Ele instintivamente começou a falar “então, é, Mai …”

“O quê ?”

Ela foi grossa. Nem olhou para ele.

“A filmagem acabou mais cedo?”

Mai tinha ido para Kanazawa para filmar no local 10 dias atrás. Quando ligou para ele ontem disse que ainda faltavam 3 dias. Teria sido esta uma estratégia para pega-lo em flagrante?

“Ainda não terminamos. ”

Ela ainda não estava olhando para ele.

“Tá tudo bem você estar aqui? ”

“Encontrei um tempo livre na minha agenda até amanhã de tarde, então voltei para te ver. Mas mesmo assim você não parece feliz em me ver.”

“N-não, é claro que estou super feliz.”

Ele tentou fazer parecer natural e despreocupado, mas só conseguir fazer parecer falso.

“Pois não parece.”

Os olhos dele estavam de volta as evidencias de coabitação.

“Isso não é verdade, ” disse ele, esperando ganhar algum tempo. Ele tinha que achar algo convincente para se defender. Mas antes das palavras saírem, Mai retornou ao kotatsu, carregando o conjunto de chá.

Ela colocou as mãos na saia para mantê-la no local e sentou-se de uma forma graciosa, com as pernas pressionadas uma contra a outra de forma ordenada, com facilidade, ela adicionou chá em cada xícara. Ela encheu cada uma um terço, então na segunda adição encheu até a metade, na terceira e última encheu até 80% e disse “aqui esta, ” antes de colocar uma em frente a Shouko.

“Obrigada,” disse Shouko, aceitando de forma educada.

“E o seu, Sakuta.”

“Obrigado.”

Ele temia não receber, porem o medo provou-se infundado.

“Pegue alguns desse também.”

Mai pegou um pacote de Manju de uma sacola e estava abrindo, os salgadinhos estavam decorados de coelhinhos e eram fofos.

“Parece um desperdício comer eles, ” Shouko disse enquanto pegava um. “Oh, eles são bons!” Ela sorriu.

Sakuta pegou um, mas a tensão no ar era tão grande que aquilo se transformou em cinzas na sua boca.

Ele tomou alguns goles do chá, não querendo deixa-lo esfriar após Mai ter tido o trabalho.

Soltando um longo suspiro, ele lentamente colocou sua xicara no kotatsu.

“Vamos então começar com o mais importante,” disse Mai, como se tivesse esperando pela oportunidade.

Tinha muita suspeita no seu olhar, que se direcionava para o outro lado da mesa, para a Shouko.

Não precisa nem explicar a razão. A própria existência da Shouko era suspeita. Tanto Mai quanto Sakuta conheciam outra Shouko Makinohara, diferente daquela sentada na frente deles. Eles tinham conhecido outra Shouko neste verão. Ela era uma jovem garota, no seu sexto ano do fundamental. Eles a acharam perto de um gatinho abandonado, sem saber o que fazer.

Ela acabaria adotando o gato e dando-lhe o nome de Hayate.

As duas Shoukos eram muito parecidas que era estranho assumir que elas não eram a mesma pessoa – mas tinha uma diferença significativa de idade. Uma era uma criança do fundamental 2 e a outra era muito mais velha e com certeza com idade para estudar numa faculdade.

Isto colocou uma grande pergunta, uma que estava no canto da mente de Sakuta desde que eles encontraram a Shouko mais jovem naquele verão. Se eles fossem falar sobre qualquer coisa, teriam que começar esclarecendo isso. Mai estava certa. Isso era importante. A coisa mais importante.

“E o que poderia ser?” Shouko perguntou, com as mãos ao redor da caneca de chá.

“Há quanto tempo vocês dois estão dormindo juntos?” (usaram o termo Shacking up que significa morar juntos tendo relações sexuais sem serem casados de acordo com o dicionário de Cambridge)

“Não estamos!”

A pergunta de Mai o surpreendeu, e ele emitiu um grito de negação antes que pudesse se conter.

“Tudo bem, ‘morando juntos’.”

“Não é uma questão de semântica. Além disso, essa é realmente a pergunta ‘mais’ importante?”

Ele tinha tanta certeza de que ela perguntaria sobre o que estava acontecendo com a própria Shouko.

“Nada poderia ser mais importante.”

“Bem, eu, por exemplo, pensei que havia algo mais urgente…”

Sakuta e Mai claramente tinham prioridades diferentes.

“E então? Há quanto tempo?”

Ela não estava abandonando essa linha de questionamento. Havia um poder silencioso em sua voz. Não tinha vacilado nem um pouco, apesar dos melhores esforços de Sakuta.

Seus olhos vacilaram.

“Uh… talvez ontem?”

Confundi-la parecia ser o melhor. Se ele tomasse manobras evasivas por enquanto, talvez ganhasse tempo suficiente para pensar em uma resposta decente. Pelo menos, esse era o plano.

“Isso não é verdade, Sakuta. Estou aqui desde quinta-feira.”

Quão rápido suas pequenas esperanças foram destruídas.

Quinta, sexta, sábado, domingo, segunda… Shouko estava contando nos dedos.

“Então estamos morando juntos há cinco dias agora.”

“Por favor, pare de usar essa expressão…”

Era uma distinção importante. Talvez ninguém mais se importasse, mas isso importava para ele.

“Chamar de ‘cinco dias morando juntos’ seria melhor?”

“Podemos parar com a brincadeira?” Mai perguntou. Nem um traço de sorriso. Seu olhar era poderoso o suficiente para parar qualquer um no caminho.

“Mas a repetição é a chave para a comédia,” Shouko disse, sorrindo como se não tivesse notado.

Sakuta não ousava olhar para Mai.

“Quero dizer… quinta-feira acabou acontecendo dessa forma. Não foi até sexta-feira que você realmente pediu para ficar aqui.”

O que ele estava dizendo? Reduzir a estadia em um único dia não iria ajudá-lo nesse ponto. Ele sabia que era inútil. Simplesmente não conseguia parar de se agarrar a esperanças frágeis.

“Quinta-feira… foi o dia em que Kaede recuperou suas memórias?”

“Hã? Ah… sim.”

Kaede era a irmã mais nova de Sakuta. Alguns problemas com valentões há dois anos haviam causado um transtorno dissociativo, e ela perdeu todas as memórias da vida que havia vivido. Era como se ela tivesse se trancado dentro de uma casca para se proteger do tormento. Para distinguir a nova Kaede da original, eles escreveram seu nome em hiragana em vez de kanji. E a Kaede em hiragana tinha vivido aqui com Sakuta.

Mas na última quinta-feira, ela voltou ao normal. O transtorno dissociativo desapareceu, e as memórias e a personalidade da antiga Kaede retornaram, substituindo completamente a nova Kaede.

“Entendo…”, disse Mai suavemente. Havia emoção em sua resposta, um toque de algo importante, mas Sakuta não conseguia identificar. Ela poderia estar pensando na Kaede que haviam perdido, mas a maneira como ela olhava para suas mãos sugeria que provavelmente havia mais nisso. Ele simplesmente não conseguia dizer o quê.

“Hum, por favor, não culpe o Sakuta por tudo isso,” pediu Shouko quando nada vinha de Mai. “Não é culpa dele. Eu sou a que não tinha para onde ir e pedi para ficar aqui.”

“Então você vai ficar comigo de agora em diante,” disse Mai, olhando para cima. Mas apenas seus olhos se moveram. Sua expressão não mudou nada.

“Não se preocupe—não estamos fazendo nada impróprio.”

“Não há garantia de que não farão,” Mai respondeu, como se estivesse discutindo um negócio.

“Sakuta nunca seria tentado a fazer nada comigo enquanto seu relacionamento com você o mantiver satisfeito.”

Não importava o que Mai fizesse, o tom de Shouko nunca mudava. Ela claramente sabia exatamente o que estava acontecendo, mas tudo o que dizia ignorava completamente a situação delicada. Sakuta até tinha a sensação de que ela estava aproveitando isso. E ele não achava que era imaginação sua. Shouko estava obviamente provocando Mai, agindo deliberadamente como uma destruidora de lares sem remorsos. Ele não tinha ideia do que isso fazia de bom para alguém…

Mas definitivamente estava causando estragos em seu estômago.

“Eu estou satisfazendo ele,” disse Mai, não exatamente em volume total. Seus olhos estavam fixos nas tangerinas no centro do kotatsu.

“Ela está, Sakuta?” Shouko perguntou, virando-se para ele no pior momento possível. Especificamente porque era o pior momento. A Shouko que ele conhecera tinha sido uma grande provocadora assim. Desta vez, poderia acabar sendo pior do que uma “provocação”.

E como se estivesse decidida a dar a última martelada no caixão dele, Shouko alcançou por baixo do kotatsu e colocou a mão na coxa de Sakuta.

“E então?” ela perguntou, esfregando a perna dele.

“Aaaahhh!” ele gritou quando um arrepio correu pela sua espinha.

Mai franziu a testa para ele. Mas então seus olhos se estreitaram e ela também alcançou por baixo do kotatsu.

“Eeek!”

Ela havia beliscado sua coxa.

“Você está satisfeito, certo?” Mai resmungou.

“Sim, claro!”

“Então minha permanência aqui não é motivo de preocupação e não representa problema algum.”

Shouko sorriu como se tivesse acabado de vencer essa conversa. Tudo tinha sido uma armadilha, preparando exatamente essa resposta de cada um deles.

“Bem…”, Mai começou, mas parecia não ter uma continuação. Ela encontrou o olhar de Shouko e o manteve, mas estava claramente perdida. Sakuta tinha certeza de que nunca havia visto Mai tão derrotada. Ela geralmente estava no controle, mantendo todos sob seu domínio.

“Algumas coisas simplesmente não são aceitáveis,” Mai conseguiu finalmente dizer. Não era comum ela simplesmente abandonar a lógica assim. Evidentemente, ela estava lutando para manter sua compostura habitual ao lidar com Shouko.

“Mas morar juntos não deveria ser um problema.”

“Definitivamente não é.”

“Mesmo que algo acontecesse, isso não seria um problema.”

O sorriso de Shouko ficou ainda mais travesso.

“Com base em quê?”

“Eu estou apaixonada pelo Sakuta.”

“Pffff!”

Sakuta tinha acabado de tomar um gole de chá. Foi para todo lado. Ele tossiu bastante.

“Olhe a bagunça que você fez.” Shouko resmungou, limpando o kotatsu com um lenço. Ela deu alguns tapinhas nas costas dele.

O olhar de Mai era como adagas. Silencioso e frio. Isso não era simples irritação ou raiva, então ele não conseguia entender. Tudo o que sabia era que ela levando muito a sério, e isso estava o esmagando. Talvez fosse assim que Mai ficava quando está realmente brava. O pensamento era aterrorizante.

“O-ok, tempo!”

Ele não aguentava mais e se ejetou do kotatsu. Foi direto para o telefone. Antes que alguém pudesse dizer uma palavra, levantou o fone e discou.

Esse era o número de celular de uma de suas poucas amigas, Rio Futaba. Ele sabia os onze dígitos de cor. Ela atendeu no terceiro toque.

“O que?”

Grossa. Típico da Rio. Isso foi um alívio.

“Por favor, me ajude,” ele implorou em português.

“Quem poderia ser?”

“Azusagawa.”

“Eu já sabia disso.”

“Então por que perguntou?”

“Então? O que foi?”

“Shouko voltou.”

“Você está tendo um caso?”

Não parecia que ela estava brincando.

“Ela está na minha casa agora.”

“Então só preciso enviar um e-mail com esse fato para Sakurajima.”

“Mai também está aqui.”

No momento em que ela entendeu a situação, a linha ficou muda. Ela tinha desligado na cara dele.

Ele pressionou rediscagem.

“O quê?” ela perguntou, como se essa fosse a última conversa da qual ela quisesse participar.

“Por que você desligou?!”

“Minha capacidade de me importar acabou.”

“Que expressão incrível.”

“Estou expressando um profundo desejo de não me envolver na sua crise em andamento.”

“Eu imaginei.”

Sakuta teria ficado tentado a desligar se um amigo ligasse para ele sobre isso também. Ele provavelmente teria feito exatamente isso.

“Mas eu preciso de ajuda.”

“Absolutamente não.”

“É assim que se comporta uma amiga?”

“Se você pensasse em mim como amiga, não me incomodaria com seu drama.”

“Estou indo te buscar agora. Por favor, seja a mediadora.”

“Não precisa.”

“Não, está tarde. Deixe-me te levar.”

“Eu quis dizer que não quero ir.”

“Estou implorando aqui.”

“Arg…”

Houve um suspiro bem longo. Sem dúvida, foi deliberadamente prolongado para o benefício dele.

“Certo. Minha mãe está prestes a dirigir ao aeroporto. Vou pedir para ela me deixar na sua casa.”

“Sério, você é uma salvadora.”

“Para deixar claro, só estou ajudando com a Síndrome da Adolescência da Shouko. Não vou me meter na sua infidelidade de jeito nenhum.”

“…Vou fazer o que puder nesse aspecto.”

“Até mais.”

Ele esperou até que ela desligasse antes de colocar o fone no gancho. Soltando um suspiro de alívio, ele se virou de volta para o kotatsu mais gelado do mundo.

Rio chegou vinte minutos depois, deu uma olhada na sala de estar e disse: “Posso ir embora?”

Ela claramente falava sério.

Sakuta colocou as mãos nas costas dela e gentilmente a guiou até o kotatsu. Esta era a primeira vez que Rio encontrava a Shouko mais velha.

“Ela realmente parece a mesma, só que crescida.”

“Agradeço por ter vindo até aqui,” Shouko disse, inclinando a cabeça.

“Agora que Futaba está aqui, você pode, por favor, se explicar, Shouko?”

Quem era ela? Qual era a sua conexão com a Makinohara mais jovem? Ele estava se perguntando isso desde o verão e finalmente teria uma resposta.

“Hora de acertar as contas, né?” Shouko disse, sentando-se. “A simples verdade é…”

Ela parou e olhou seriamente para Sakuta, depois para Mai e depois para Rio.

“Às vezes eu fico maior,” ela disse. Completamente séria.

“……”

“……”

“……”

Os três não disseram nada. Apenas a olharam. Ninguém parecia especialmente surpreso ou perturbado com sua chocante declaração. Era como se todos já suspeitassem disso.

“Às vezes eu fico maior,” Shouko disse novamente, como se esperasse mais reação.

“……”

Ainda sem resposta.

“Vocês estão mesmo me ouvindo?”

“Claro,” Sakuta disse.

“Vocês estão entendendo?”

“Estamos.” Rio assentiu.

“A Síndrome da Adolescência assume muitas formas,” Mai murmurou.

“Se vocês não estão nem estão um pouco surpresos, perdi muito tempo prolongando isso,” Shouko reclamou.

“Alguma ideia do por que isso acontece?” Sakuta perguntou, seguindo em frente.

“Isso é realmente anticlimático.” Ela parecia desanimada.

Ele não ia deixá-la escapar dessa. Tinha que extrair toda a verdade dela hoje.

“A culpa é sua por fazer um grande alarde por nada,” ele disse.

“Acho que ficar maior às vezes é um grande alarde!”

“Isso está relacionado à sua condição?” ele perguntou, ignorando os protestos dela. Se baixasse a guarda por um segundo, acabariam em uma digressão interminável.

“Provavelmente,” Shouko admitiu. Ela olhou para Mai e Rio. Ambas entenderam o que ela quis dizer e assentiram. Elas haviam sido informadas sobre isso.

Shouko tinha uma grave condição cardíaca. Os médicos haviam explicado que, sem um transplante, era improvável que ela sobrevivesse ao ensino fundamental. Isso era muito para qualquer garota da idade dela lidar. Não havia como ela não se preocupar com isso. Parecia provável que cada dia que passasse fosse apenas mais um lembrete de que o tempo estava se esgotando, deixando-a gritar silenciosamente cada vez que o sol nascia. E se isso não podia desencadear um caso de Síndrome da Adolescência, o que poderia?

Uma doença com risco de vida era um gatilho muito plausível.

“Para mim, sempre foi um sonho.”

Ela pegou uma tangerina, mas em vez de descascá-la, começou a rolá-la nas mãos.

“Crescer, quero dizer.” Ela fez uma pausa, então continuou. “Quando os médicos disseram que minhas chances de me formar no ensino fundamental não eram grandes… bem, desde que o significado disso afundou em mim, eu quis ser uma estudante do ensino médio. Uma estudante universitária. Uma adulta.”

Ela apertou a tangerina com força, como se fosse algo precioso.

“A pequena eu sabe que nunca poderá ser nenhuma dessas coisas, mas ela sonha com isso. E acho que é isso que você vê aqui.”

Ninguém disse nada por um tempo. Todos estavam ruminando sobre o que as palavras dela significavam.

Sakuta foi o primeiro a quebrar o silêncio.

“Posso perguntar uma coisa?”

“Sim. Vá em frente.”

“Tudo isso faz muito sentido, mas…”

Ele hesitou, olhando para ela.

“Sim?”

“Sinto que você e ela são muito diferentes.”

“Somos?”

“Você é muito mais descarada.”

A Shouko mais jovem era modesta, sincera e geralmente uma garota muito legal. Definitivamente não tinha coragem de manipular Mai.

“Eu sou a descarada? Sakuta, você tem três garotas compartilhando um kotatsu com você.”

“Exatamente…”

“Bem, culpe a outra eu, então. Eu sou apenas o ideal que ela gostaria de se tornar no futuro.”

Rio interveio. “Então podemos assumir que a pequena Shouko não sabe sobre você?”

Ela parecia convencida de que já tinha a resposta para isso e estava apenas confirmando. Como se fosse importante confirmar esse fato. Sakuta tinha uma boa ideia de por que ela havia feito essa pergunta.

Sakuta conheceu a Shouko mais velha há dois anos. Mas quando conheceu a mais jovem este ano, ela não tinha nenhuma lembrança dele. Ela agiu como se estivesse encontrando um estranho.

Se ela soubesse que ficava maior às vezes, isso teria ficado claro. Ela não parecia ser o tipo de garota que poderia esconder algo assim.

“Como você lidava com a mudança antes?”

“Eu não lidava.”

“Hã?”

“Quando percebia, já estava de volta ao normal.”

“Sua família não percebeu? Isso durou dias, certo?”

Não importa onde ela se escondesse, se sua filha doente desaparecesse sem aviso, a maioria dos pais chamaria a polícia para ajudar. E desta vez ela estava ficando com Sakuta por cinco dias inteiros. Parecia provável que a polícia estaria procurando por ela agora.

“Ah, isso não é uma preocupação”, disse Shouko firmemente.

“Com base em quê?”

“Quando eu disse que fico maior às vezes, não foi bem assim. Enquanto estou aqui sendo grande, a minha versão pequena ainda existe.”

“Eu ouvi falar de um caso semelhante”, disse Sakuta, olhando para Rio do outro lado da mesa. Uma pessoa se transformando em duas. Ele havia encontrado exatamente essa situação antes. Era o fenômeno da Síndrome da Adolescência que havia afetado Rio. Mas nesse caso, ambas tinham a mesma idade.

“Nunca conheci a minha versão pequena, mas também me preocupei com isso, então fui até minha casa esta tarde. E minha mãe estava saindo, então a segui… e ela foi direto para o hospital onde estão me tratando. Acho que minha outra versão está lá agora. O que provavelmente explica por que ela não atendeu quando você ligou.”

“Entendo…”

Sakuta tentou ligar para a Shouko mais jovem várias vezes sem sucesso. E ela não retornou a ligação. Se ela estava hospitalizada, isso explicaria a situação.

“Então acho que temos uma resposta plausível.”

“Sim.”

Se essa Shouko era um sonho que a Shouko mais jovem tinha do futuro, talvez conversar com a Shouko mais nova os ajudasse a entender por que isso estava acontecendo.

“Eu preciso checar a Kaede de qualquer forma, então vou passar para vê-la amanhã.”

O hospital que cuidava de Shouko era o mesmo onde Kaede estava internada. Rio se levantou silenciosamente.

“Banheiro?”

“Não. Estou indo para casa.”

“Por quê?”

“A conversa acabou, e não sou mais necessária aqui.”

“Fique aqui.”

“Azusagawa.”

“O quê?”

“Você é um lixo.”

“Você vai simplesmente me abandonar nessa confusão?! Quão insensível você pode ser?!”

Essa abordagem não levou a lugar nenhum.

“Futaba, desculpe. Mas eu também gostaria que você ficasse.”

O apoio de Mai foi inesperado. Ela não tinha dito uma palavra durante toda a conversa com Shouko, e parecia que fazia muito tempo desde que ele tinha ouvido a voz dela.

“Vou passar a noite aqui, então, por favor, fique conosco.”

“……”

Rio não esperava isso de Mai, também. Ela parecia genuinamente surpresa. Menos pelo pedido em si do que pelo fato de haver um pedido.

“Bem, se você insiste…”

Ela se acomodou novamente no kotatsu.

“Então você ouve se a Mai pedir.”

“Você sempre pede demais.”

“Não consigo viver sem a ajuda das pessoas ao meu redor. Tenho certeza de que isso acontecerá novamente.”

Enquanto ele falava, Mai se levantou. “Vou passar em casa, tomar um banho e trocar de roupa”, ela explicou antes que ele pudesse perguntar.

“Vou te acompanhar.”

“Não precisa. Não é tão longe.”

Isso era verdade. O condomínio de Mai ficava no prédio do outro lado da rua.

“Shouko, Futaba, desculpe, mas vou deixá-las sozinhas um pouco.”

“Entendido.”

Na porta, Mai disse, “Sério, você não precisa.”

“Me deixa falar com você.”

“……”

Mai não disse mais nada. Apenas saiu pela porta. Ele decidiu que a falta de uma recusa significava que ela havia concedido a ele uma audiência. Rapidamente calçou os sapatos e a alcançou enquanto ela esperava o elevador. Eles ficaram lado a lado observando as luzes do andar piscarem. Ele esperava que demorasse um pouco.

“Então, Mai,” ele começou.

“Sakuta,” ela o interrompeu. Sua voz ressoou.

“O quê?”

“Desculpa.”

Isso foi inesperado.

“Hã?” ele disse, confuso. Ele é que deveria estar pedindo desculpas. Ouvir um “Desculpa” dela apenas deixou sua mente em branco. Ele não conseguia pensar em um único motivo pelo qual ela teria dito isso.

“Todo o incidente com a Kaede deve ter sido tão difícil, e eu não pude estar aqui para você.”

“……”

Ela estava olhando para as luzes do elevador. Parecia triste, como se estivesse prestes a chorar. Sakuta se inclinou em sua direção e tentou abraçá-la.

Mas ela deu um passo para trás, evitando claramente seu abraço. Foi constrangedor.

“Não posso,” ela disse. “Não por um tempo.”

Ela nem sequer olhou para ele. Uma rejeição inconfundível.

Antes que ele pudesse pensar em qualquer resposta, houve um ding e as portas do elevador se abriram.

“Isso é o suficiente,” ela disse enquanto entrava sozinha no elevador.

Antes que as portas se fechassem, ele conseguiu dizer, “Desculpa, Mai.”

Isso era tudo o que ele podia fazer.

“Eu não comecei a namorar você porque queria ouvir suas desculpas,” ela respondeu.

Então as portas se fecharam e ela se foi.

Uma conversa curta, mas parecia que cada palavra havia sido uma flecha em seu peito. Ela estava certa. Eles não estavam namorando para ouvir um ao outro pedir desculpas.

Ele não podia discordar disso de forma alguma.

 

2

No dia seguinte, após a escola, Sakuta estava no trem a caminho de casa. Um trem com destino a Fujisawa que ele havia embarcado na Estação de Shichirigahama.

“O mar é tão vasto…”

O sol de inverno era mais suave para os olhos, dando ao oceano um brilho suave. O céu tinha um tom azul claro. O horizonte dividia um do outro, destacando o contraste.

Essa era uma linha local de via única que corria ao longo da Baía de Sagami, de Fujisawa a Kamakura, mas lhe permitia ver essa vista gloriosa diariamente.

No caminho de volta da escola, frequentemente havia turistas a bordo. Ultimamente, mais deles eram do exterior. No momento, havia um cara loiro e bonito exclamando “Incrível!” e tirando um monte de fotos.

“O mar realmente é vasto…”, ele murmurou novamente.

Ele estava tendo dificuldade em demonstrar muito entusiasmo, vista incrível ou não.

“Pare de tentar escapar da realidade audivelmente”, resmungou Rio. Eles estavam de cada lado do mesmo conjunto de portas, mas ela mantinha os olhos fixos no livro em suas mãos desde que embarcaram no trem.

“Você deveria ser legal com amigos inconsoláveis.”

“Isso é eu sendo legal. Eu dispensei minhas obrigações no clube para visitar este hospital com você.”

Ela certamente poderia ter enganado ele. E ela não levantou os olhos do livro uma única vez.

“Além disso, você é o que aparentemente tem tido um caso. O principal suspeito não deveria ser o que fica todo deprimido.”

“Você poderia não me chutar quando estou para baixo?”

Os golpes dela eram precisos demais. Doíam mais do que ele gostaria. Ele não podia discutir com nada do que ela disse. Mas ele não era capaz de suportar estoicamente toda essa confusão, também. A rejeição de Mai o atingiu fortemente, e ele não estava preparado para aceitar isso de forma passiva.

Ele já havia magoado Mai antes, mas nada como isso. Todo o resto estava no nível de “sentimentos feridos”.

“Espero que você possa ver que meu humor atual é uma expressão sincera do meu arrependimento.”

“Em vez de buscar minha aprovação, você deveria ter acordado a tempo e garantido que viu Sakurajima partir.”

Mais uma vez, ela acertou onde doía.

“Ela já tinha saído quando eu acordei! O que foi definitivamente ruim.”

Naquela manhã, quando ele finalmente saiu da cama, Sakuta descobriu que Mai já tinha partido para sua filmagem em Kanazawa. Ela deixou um bilhete na mesa, apenas um simples “Saindo.”

Não importava o quão cedo ela estivesse saindo, Mai normalmente o teria tirado da cama ela mesma. Ela teria dito de maneira travessa que estava fazendo um favor a ele, achando que ele gostaria de dar um beijo de despedida.

O bilhete de despedida que ele recebeu em vez disso não poderia estar mais distante de tais travessuras encantadoras. Ele sentiu um arrepio descer pela espinha. Não apenas uma noite de sono não havia melhorado a situação, como claramente tinha piorado.

“E o fato de que Shouko gentilmente te acordou é completamente indefensável. Dado esses fatos, não estou inclinada a te confortar.”

“…Eu estava muito chateado com Mai para conseguir dormir.”

Ele tinha a intenção de se despedir. Mas intenções vazias não servem para ninguém.

Sakuta tinha quase certeza de que já era quase amanhecer quando finalmente caiu em um sono agitado. Mai deve ter acordado logo depois e partido para Kanazawa.

“Guarde as desculpas para Sakurajima.”

“……”

Rio estava certa mais uma vez. Ela sempre estava. Ele não podia argumentar, então em vez disso, inspecionou o interior do trem. Havia um anúncio pendurado nas proximidades, convidando todos a visitarem o aquário perto de Enoshima. Também anunciava um show de águas-vivas iluminadas. Parecia um evento para atrair a multidão do Natal.

“Ter Shouko dormindo lá poderia ter sido perdoável, dadas as circunstâncias. Especialmente logo após o que aconteceu com Kaede. Acho que Sakurajima entende isso.”

“Não quero usar Kaede como desculpa.”

A irmã de Sakuta desenvolveu um transtorno dissociativo após um grave episódio de bullying há dois anos. Isso resultou na perda de suas memórias e, com elas, sua personalidade. Sakuta passou dois anos vivendo com a nova Kaede—uma pessoa completamente diferente.

Mas na semana passada, os sintomas do transtorno dissociativo desapareceram, e a antiga Kaede voltou por completo. Mas isso significava que as memórias e a personalidade da nova Kaede tinham desaparecido. Junto com os dois anos que passaram juntos. Sakuta sabia que o tempo que compartilharam nunca voltaria. Nunca deveria voltar. As coisas haviam acontecido dessa forma porque a doença mental dela havia sido curada. E isso foi o resultado de muito trabalho árduo por parte da nova Kaede.

Mas, mesmo que ele reconhecesse que isso era uma coisa boa, isso não o ajudava a lidar com a perda, e não significava que ele pudesse simplesmente aceitar tudo automaticamente.

O sofrimento que isso causou era inevitável. E essa dor reabriu as feridas em seu peito, feridas infligidas pela Síndrome da Adolescência. Ele ainda podia sentir o sangue em suas mãos. Seu peito doía, seu coração sofria e a tristeza ameaçava dominá-lo.

Se Shouko não estivesse lá para ajudá-lo, quem sabe o que poderia ter acontecido. Talvez ele ainda não estivesse pronto para reconhecer o retorno da antiga Kaede. Talvez as cicatrizes em seu peito ainda estivessem latejando. O vazio profundo que se abriu dentro dele era simplesmente vasto.

Mas, mesmo assim, Sakuta não achava que seria certo usar isso como desculpa. Ele não podia, e não queria.

“Só faça as pazes com ela.”

“Como?”

“E faça rápido para parar de me pedir conselhos sobre isso.”

“Acredite, eu adoraria nada mais do que isso.”

Mas como ele poderia fazer as coisas voltarem ao que eram antes? Ele não fazia ideia.

Ele olhou para Rio em busca de ajuda, mas ela manteve os olhos firmemente no livro.

“Isso é realmente bom?”

“Muito.”

Ela levantou para que ele pudesse ler a capa. Chamava-se Desvendando a Teoria das Supercordas. Ele não conseguia dizer se o autor achava que estava sendo inteligente ou se o título era apenas uma feliz coincidência, mas de qualquer forma, parecia uma piada de pai.

“A teoria das supercordas é uma metáfora para como Mai vai me manipular pelo resto da minha vida?”

“No seu caso, a teoria do parasita é mais aplicável.”

Como se isso fosse uma teoria real.”

“Se você não conseguir um emprego, ela realmente vai te deixar.”

“Eu pretendo conseguir!”

“Por outro lado, ela pode te largar antes de chegar a esse ponto.”

“Não fique ziquando, droga.”

“……”

“Por que você ficou quieta agora?!”

“Você realmente precisa que eu explique por que ela vai te deixar?”

“…Não, eu estou bem ciente.”

“Então não vou soletrar.”

Com essa declaração carregada, Rio finalmente levantou os olhos do livro e olhou diretamente nos olhos dele. Esperando que ele perguntasse.

“Ok, o que?” ele perguntou. Parecia que havia algo que ele não estava entendendo.

“Azusagawa, acho que você está entendendo algo errado.”

“Hã?”

“……”

Rio não disse mais nada. O trem havia chegado à Estação Fujisawa, o final da linha. Ela fechou o livro com um estalo e saiu do vagão. Sakuta a seguiu apressadamente. Esta não era uma conversa que eles poderiam continuar depois de se juntarem à multidão que saía pelos portões da estação.

Mas ela lhe deu uma dica.

“Você não entende as mulheres.”

“Uh… bem, eu sou um homem, então…”

Ele pensou muito sobre o que isso poderia significar no caminho para o hospital, mas no final não chegou mais perto de descobrir o que estava faltando.

Mai estava brava porque ele havia deixado Shouko ficar com ele sem consultá-la. A causa era clara, a situação simples. O que poderia ser mal compreendido nisso?

“Eu estou sem um pingo de noção.”

Mas uma vez que chegaram ao hospital, ele não teve tempo para ponderar mais sobre isso. Teria que ser seu dever de casa.

Ele e Rio estavam lá para ver Shouko.

A primeira coisa que fizeram foi obter o número do quarto dela na recepção.

Havia regulamentos de segurança e privacidade, então a equipe estava limitada no que poderia compartilhar, mas como este era o mesmo hospital que cuidava de Kaede, tudo o que ele teve que fazer foi dizer que conheciam Shouko, e eles alegremente informaram.

“Quarto 301,” ele disse, voltando para Rio.

“Então ela está aqui mesmo.”

Ele verificou o mapa do andar.

“Sim.”

A Shouko grande estava certa.

Eles pegaram o elevador até o terceiro andar. O corredor tinha aquele silêncio especial reservado para andares com pacientes internados. O tempo parecia fluir muito mais lentamente do que nos andares de pacientes ambulatoriais.

O quarto 301 estava no final do corredor.

Havia uma placa com o nome do lado de fora, e nela estava escrito SHOUKO MAKINOHARA em uma bela caligrafia.

Ele bateu duas vezes.

“Entre.”

Esta era com certeza a voz de Shouko. A pequena.

“Certo,” disse Sakuta, e ele deslizou a porta aberta. Estava quase silencioso. Eles tinham chegado a um quarto privativo com vista para o sul e muita luz do sol.

Shouko estava sentada na cama no centro.

Mas ela estava ocupada se trocando. A parte de baixo do pijama estava pela metade, e ela estava mexendo as pernas para puxar o tecido para cima. Suas coxas claramente raramente viam o sol e eram tão pálidas que eram quase ofuscantes. Quando ela levantou os quadris, ele vislumbrou uma calcinha branca.

“Você chegou cedo hoje, mãe… Espere, o quê?”

Shouko congelou, piscando para ele.

“Sakuta?” ela disse.

“Esse é o meu nome.”

Shouko respirou fundo.

Sakuta e Rio rapidamente se viraram e voltaram para fora, fechando a porta atrás deles.

“Aiiiiieeeeeeee!”

Um segundo depois, o grito de Shouko sacudiu o quarto.

Ele sentiu um olhar de reprovação de um lado. Rio estava olhando para ele como se ele fosse algum tipo de predador.

“Eu bati na porta e obtive permissão para entrar!”

Ele era inocente aqui.

“Se você algum dia me visse nua, seria um trauma para a vida toda.”

“Ela estava com a parte de cima do pijama!”

“E embaixo?”

“Ela ainda estava puxando.”

“Qual a cor da calcinha dela?”

“Se eu responder essa pergunta, estarei me abrindo para um mundo de abusos.”

“O fato de você ter uma resposta, apesar do curto tempo disponível, só prova que você é o maior dos patifes. Verdadeiramente, um terror entre os homens.”

Ele não foi poupado mesmo sem oferecer uma resposta.

“E-eu estou pronta agora,” disse Shouko. A porta abriu uma fresta, e ela espiou para fora. Seu pijama estava totalmente colocado agora. Ela acenou para Sakuta e Rio entrarem e então disse, com o rosto vermelho, “D-desculpe, isso foi… constrangedor.”

Ela se sentou de volta na cama, e Sakuta e Rio se sentaram ao lado, usando o banquinho e uma cadeira dobrável próxima.

“Bem, desculpe por aparecer assim de repente. ”

“N-não, tenho certeza de que é você quem quer gritar. Sinto muito mesmo. M-mas o que te traz aqui hoje?”

Ela olhou diretamente nos olhos de Sakuta, aparentemente tensa. Como se estivesse escondendo algo.

“Bem, eu liguei para ver se você queria que eu trouxesse o Hayate de novo, mas não consegui falar com você… então imaginei que você pudesse estar aqui.”

“A-ah, desculpe. Meu telefone está em casa.”

Enquanto falava, ela discretamente pegou o telefone da mesa de cabeceira e tentou escondê-lo atrás de si.

Sakuta lançou um olhar para Rio. Rio assentiu. Contato visual bem-sucedido. Rio tirou o telefone da bolsa e começou a tocar na tela.

Um momento depois, um toque de telefone ecoou alto no quarto.

“Ai! Ai!”

Shouko puxou o telefone do esconderijo e rapidamente tocou a tela, silenciando-o.

“Um… ok, desculpe, isso foi uma mentira.”

“Você achou que, se atendesse minha ligação, eu perceberia que você estava no hospital e me preocuparia.”

“S-sim…”

“Se você não me deixar fazer pelo menos isso, vou me sentir tão impotente que isso vai me esmagar.”

Ele fez soar como uma piada, mas ele quis dizer cada palavra. Sakuta não podia fazer nada para ajudar na recuperação dela, então ele pelo menos queria poder se preocupar com ela.

“D-desculpe.”

“Eu nunca vou te perdoar.”

“Você não vai?!”

Vendo Shouko perdida, Rio ofereceu um conselho.

“Não há nada que Azusagawa ame mais do que receber exigências egoístas. Ele prefere isso a um pedido de desculpas.”

“Muito bem dito, Futaba.”

“S-sério? Um, mas…”

“O que você quiser,” disse Sakuta.

“E-então, eu gostaria que você me visitasse novamente. Quando tiver tempo, é claro,” ela disse, como se isso fosse pedir demais.

“De jeito nenhum.”

“Você disse ‘qualquer coisa’!”

“Isso dá muito trabalho. Eu vou simplesmente vir todos os dias.”

“Oi?” Shouko piscou para ele.

“Não consigo me incomodar em descobrir com que frequência é muito ou pouco.”

“Oh… obrigada!”

“Ah, certo. Às vezes tenho um turno de trabalho logo depois da escola, então talvez não consiga vir nesses dias.”

Pelo canto do olho, ele percebeu alguém olhando para ele. Rio. Quando ele olhou na direção dela, a expressão dela era ainda mais seca do que o normal.

“O que foi com esse olhar?”

“Você está simplesmente flertando abertamente com ela, e isso é deplorável.”

“Ele está flertando comigo?! Eu estava me perguntando por que meu coração estava batendo rápido!”

“Eu não estou flertando com você.”

“Oh. Que pena.”

A própria existência da Shouko mais velha estava causando ondas de choque na vida dele, então ele realmente não precisava que a Shouko mais nova se juntasse à guerra.

“Um, Sakuta.”

“Mm.”

“Falando em pedidos egoístas, Tem algo que queria conversar com você.”

“Continue.”

Quando ele assentiu, Shouko alcançou a mesa ao lado. Ela pegou um pedaço de papel dobrado que estava em cima de uma pilha de livros escolares.

“É sobre isso,” disse ela, segurando o papel para que ambos pudessem ver.

No topo, estava escrito Horário Futuro em uma fonte bem formal. O campo do nome dizia Turma 4-1: Shouko Makinohara em uma caligrafia bonita.

“Isto é…?”

“Algo que fizemos na aula na quarta série.”

“Acho que fizemos algo semelhante.”

Havia uma lista de anos, e você preenchia cada um por conta própria. A escola fazia isso para encorajar as crianças a pensarem sobre seus futuros… ou pelo menos, esse provavelmente era o objetivo do exercício.

Sakuta não se lembrava do que tinha escrito. Provavelmente não tinha dado muita importância. Ele provavelmente escreveu algo sobre ir para uma escola secundária local, se formar, entrar em uma escola de ensino médio local, e então, de repente, conseguir uma vaga na melhor faculdade do Japão. Depois de completar o ensino superior, ele se tornaria primeiro-ministro e ficaria super-rico. Na escola primária, ele não sabia muito sobre faculdade, e primeiro-ministro foi a primeira coisa que veio à sua mente que soava importante. E ele pensava que ser rico era uma coisa boa, então por que não?

Mesmo que Sakuta não tivesse escrito isso ele mesmo, um ou dois outros garotos da classe teriam.

Ele preencheu feliz a lista de anos, sem nenhuma relutância, sem preocupações. Tinha sido como um jogo para ele.

Mas o Exercicio à sua frente não era nada tão trivial. Estava principalmente em branco. A lista de anos ia até Shouko completar oitenta anos, mas ela só tinha preenchido o primeiro quinto. Parava no final do ensino médio. Não havia nada depois disso. Um espaço em branco que enviava uma mensagem ominosa.

Ele não precisava perguntar se a doença dela era a razão para isso. Shouko tinha nascido com sua condição e passou toda sua vida dolorosamente ciente de que os médicos tinham dado a ela poucas chances de sobreviver até o ensino fundamental.

“……”

E por essa razão, Sakuta não tinha certeza do que deveria dizer.

Enquanto todos os seus colegas de classe estavam preenchendo alegremente seus planos, o que estava passando pela cabeça de Shouko? Só de imaginar isso o fazia se sentir mal. Ele não suportava o pensamento.

“Havia muitas coisas que eu queria escrever,” disse Shouko. “Sobre ser adulta e o que eu faria então. Eu queria mostrar aos meus pais como eu seria se crescesse como todo mundo.”

“Mm.”

“Mas eu não podia fazer isso na aula. Se eu escrevesse meu futuro, os adultos ao meu redor ficariam chateados.”

“……”

“Eu comecei a perceber isso na primeira série. ‘Oh’, eu pensei, ‘eu não posso dizer coisas assim.'”

“Por exemplo?”

“Quando eu disse, ‘Quero ser florista quando crescer’, minha professora colocou as mãos sobre a boca e ficou toda emocionada. Foi realmente desconfortável.”

Aquela professora não tinha a intenção de magoá-la. Ela claramente era muito gentil. Mas, porque sabia sobre a condição cardíaca, não conseguiu esconder as emoções que as palavras de Shouko provocaram.

“Eu pensei, ‘Se eu preencher toda essa folha, a professora vai ficar chateada de novo.’ Então eu fiquei travada. A professora me disse para levar o tempo que precisasse e terminar em casa.”

“E você guardou isso?”

Se o dever de casa estava ali, significava que ela nunca tinha entregue.

“Estava na gaveta da minha escrivaninha. Eu planejava escrever o resto algum dia.”

Talvez ela esperasse que chegaria um momento em que escrever sobre seu futuro não seria um grande problema.

“Eu tirava isso de vez em quando, olhava… e não escrevia nada. Me formei sem nunca terminar.”

Se ela ainda estava guardando isso, então devia ter se arrependido de não completar. Talvez uma parte dela soubesse que preencher esse formulário seria um marco importante para ela. Talvez ambos fossem verdade. Sakuta podia tentar imaginar seus sentimentos, mas sem uma doença como a dela, não havia como ele realmente saber o que ela estava passando. A própria Shouko provavelmente não sabia a resposta.

“Eu nem conseguia escrever sobre me formar no ensino fundamental. Mas…”

Ela parecia confusa. Olhou para a página. Sakuta e Rio tinham a mesma expressão em seus rostos. O que ela dizia e o que estava na página não combinavam.

Formar-me no ensino fundamental.

Entrar em uma escola de ensino médio com vista para o mar! (Minegahara High é minha primeira escolha!)

Conhecer o garoto com quem estou destinada a ficar.

 Formar-me com saúde!

“Isso é o que eu queria perguntar.”

“Huh.”

“Eu não escrevi isso.”

“……”

A conversa não estava indo na direção que ele esperava.

“Você não…?”

“Não. Tenho certeza que não fui eu.”

Então quem fez isso? Isso estava ficando assustador.

Mas ele tinha uma ideia de quem poderia ter feito isso. A outra Shouko. A maior.

Rio parecia estar pensando em linhas semelhantes. Ele teria que perguntar a ela sobre isso mais tarde. Pelo que ela disse até agora, a pequena Shouko não parecia saber sobre a maior. Eles teriam que pensar muito sobre se deveriam contar a ela. A pequena Shouko já tinha bastante para lidar com sua doença, e não precisava da Síndrome da Adolescência em cima disso.

“Hum, Makinohara.”

“Sim?”

“É isso que você queria escrever na época?”

Ele apontou para os planos do ensino médio que ela afirmou não ter escrito.

“Não exatamente.”

“Então?”

“É mais como o que eu quero escrever agora.”

“Entendi. Se você fosse continuar, o que escreveria em seguida?”

“Hum. Isso seria…”

“Pode ser o que precisamos para resolver esse mistério. Não se preocupe, Futaba e eu não ficaremos chateados.”

Ele olhou de lado. Rio parecia levemente irritada por falarem por ela, mas não parecia inclinada a corrigir a afirmação. Ela teria dito algo se fosse diferente.

“Bem, se você insiste. Primeiro, eu gostaria de ir para a faculdade.”

Shouko falou suavemente, como se ponderasse seus próprios sentimentos sobre o assunto.

“E eu acho que seria ótimo se eu pudesse encontrar um bom namorado.”

Ela desviou o olhar, ligeiramente envergonhada.

“E quando ficarmos mais próximos, poderíamos morar juntos.”

“Mesmo como estudantes?”

“Sim. E se isso levar ao casamento, melhor ainda.”

“…Um plano de vida bem agressivo.”

“Minha mãe e meu pai se casaram na faculdade. Então eu sempre pensei que era assim que todo mundo fazia.”

Ela sorriu de forma constrangida, como se tivesse percebido desde então que isso era bastante incomum.

Ele pensou que ambos pareciam jovens, mas tinham se envolvido tão cedo? Talvez Shouko fosse a razão pela qual eles tinham se comprometido.

Enquanto pensava nisso, houve uma batida na porta.

“Ah, sim?”

A porta se abriu, e uma enfermeira entrou. A mãe de Shouko estava com ela. Ela acenou com a cabeça para eles. Ele já havia conhecido os pais de Shouko quando vieram buscar o gato, Hayate, então eles sabiam quem ele era.

“Shouko, é hora do seu exame.”

“Ok. Hum, Sakuta…”

“Eu volto de novo. Conversaremos mais então.”

“Ótimo! Vou estar esperando.”

Shouko os despediu com um sorriso, e Sakuta e Rio saíram do quarto dela. Eles caminharam juntos até os elevadores.

“O que você acha?”

Ele estava perguntando sobre as entradas extras no Plano de vida.

“A resposta mais óbvia é que Shouko escreveu isso e esqueceu.”

“Uma teoria racional.”

“É a caligrafia dela e não parecia adicionada depois.”

A ideia certamente tinha passado pela sua cabeça. Aqueles caracteres a lápis pareciam exatamente os mesmos, tanto na tonalidade quanto na intensidade das linhas. Se ela tivesse escrito em um dia diferente, o lápis teria sido apontado de maneira diferente, e pequenas diferenças seriam aparentes.

“A explicação menos racional é que a Shouko mais velha fez isso.”

“Mas se isso for verdade… para quê?”

“Uma pegadinha?” Rio deu de ombros. Não parecia que ela mesma acreditava nessa explicação.

“Não dá para simplesmente rir disso. Parece algo que ela faria.”

Mas tudo o que isso conseguiria seria semear o caos. A pequena Shouko estava bem confusa. Quem iria se esforçar para se chatear? O que isso conseguiria?

“Mas aprendemos algumas coisas.”

“Sim.”

“Se tivermos que definir a existência da Shouko mais velha, poderíamos dizer que ela apareceu para viver o futuro que a pequena Shouko não podia escrever em seu Plano de vida.”

“Ou ela está vivendo o futuro que a pequena Shouko talvez nunca consiga.”

“O que combina com o que a Shouko mais velha disse desde o início.”

——-“A pequena eu sabe que nunca poderá ser nada disso, mas ela sonha com isso. E acho que é isso que você vê aqui.”

Aquelas palavras realmente ficaram com ele. Um poderoso, desesperado e cru surto de emoção. Você poderia até chamar de “um desejo”. Os sentimentos por trás disso tinham um forte impacto em seu coração.

O elevador chegou. Eles entraram e desceram até o térreo em silêncio.

Voltaram pelo mesmo corredor por onde tinham vindo.

Sakuta passou o tempo todo pensando na condição de Shouko. Ele achava que entendia o quanto era difícil. Sentia que tinha compreendido. Mas ouvir diretamente dos lábios dela como Shouko se sentia definitivamente o fez perceber a realidade e deixou sua cabeça girando.

Ela era uma criança tão boa, tentando seguir sua vida de forma positiva, e ele queria ajudar. Mas Sakuta não tinha como curar a condição dela. Essa dura verdade estava corroendo-o por dentro.

Não havia nada que ele pudesse fazer.

Mas ele queria fazer algo.

Ele sabia que acabaria não fazendo nada, e ser forçado a viver com esses sentimentos e esse conhecimento era extremamente frustrante.

“Azusagawa, acho que você deve tratá-la como sempre tratou.”

“Eu sei.”

Era importante se preocupar. Mas fazer isso demais só faria Shouko ficar excessivamente consciente do efeito que estava tendo nas pessoas ao seu redor, e isso só aumentaria seus problemas.

Então ele tinha que agir como se nada tivesse mudado.

“A única outra coisa que você pode fazer é isso,” disse Rio, parando na recepção. Ela pegou um folheto verde no balcão. Um pedaço de papel, dobrado em três, com as palavras Cartão de Registro de Doação de Órgãos escritas no topo.

Rio pegou dois e entregou um a ele.

“……”

Sakuta balançou a cabeça. Os olhos de Rio brilharam por um segundo, mas depois ela entendeu.

“Ah. Você já tem um,” ela disse, assentindo.

“Peguei há dois meses.”

Logo depois de descobrir sobre a condição de Shouko. Ele tinha visto o folheto na loja de conveniência local e pegou. Já estava preenchido e em sua carteira.

Rio colocou um de volta e guardou o outro em sua bolsa.

Naturalmente, só isso não salvaria Shouko. Certamente não faria o doador que ela precisava aparecer magicamente. Não tinha nenhuma relevância real para a situação pessoal dela, mas se você esperava pela salvação de uma pessoa, tornar-se um doador parecia simplesmente a coisa certa a fazer.

“E agora, Azusagawa?”

“O que quer dizer?”

“Você vai se casar com Shouko?”

“……”

“Tenho certeza de que você sabe que as leis deste país não permitem isso até você completar dezoito anos.”

“Ok, isso é um salto muito grande.”

“Foi você quem perguntou quais eram os planos da pequena Shouko após o ensino médio. Você fez isso para resolver a situação com a mais velha, certo? Os planos adicionais do ensino médio incluíam encontrar o garoto com quem ela está destinada a ficar. Esse é você, e isso já aconteceu há dois anos, quando você conheceu Shouko vestida com o uniforme da Minegahara.”

Rio recitou seus pontos rápido demais para que ele pudesse interrompê-la. E tudo o que ela disse estava alinhado com suas próprias conclusões.

“Certamente é uma possibilidade distinta.”

“E já que ela alcançou esse objetivo, a Shouko do ensino médio desapareceu. Ou mais precisamente, os sintomas da Síndrome da Adolescência dela diminuíram.”

“Então agora chegamos ao segundo ato, com uma versão universitária.”

“Se o propósito dela é alcançar os objetivos que a pequena Shouko não pôde escrever no seu Plano de vida, o casamento é inevitável.”

“Uh, Futaba…”

Será que não havia outra solução?

“Como sua amiga, eu irei à cerimônia. Não se preocupe.”

“Sim, uh… obrigado, eu acho.”

Ele decidiu que não estava disposto a discutir o ponto.

Rio e Sakuta se separaram nas portas da frente. Ele ainda precisava ver Kaede.

No caminho de volta, parou em uma máquina de venda automática para comprar algo para beber. Ele tinha muita coisa em mente, e todo aquele pensamento o deixou com sede.

Seu dedo pairou sobre o botão de café quente, e então ele viu uma bebida esportiva ao lado. A mesma que Mai fazia comerciais. Seu dedo se moveu para ela instantaneamente.

Ele tomou metade da garrafa de uma vez, então colocou a tampa de volta. Era demais para beber de uma só vez. Quando ele se levantou do banco para ir para o quarto de Kaede, ouviu a voz dela.

“Oh, Sakuta.”

Aquela definitivamente era a voz de sua irmã. Tanto a nova quanto a antiga Kaede soavam iguais, mas apenas uma delas ainda existia.

Ele se virou e a encontrou vindo em sua direção, chinelos batendo. Havia uma enfermeira com ela.

“Se você está no hospital, por que está por aí em vez de vir me ver?” ela perguntou, enchendo as bochechas.

“Você não apareceu no horário de costume, então Kaede ficou perguntando ‘Ele já chegou?’ repetidamente,” a enfermeira compartilhou.

“Eu—eu não fiz isso! Eu estava apenas me perguntando em voz alta por que você estava demorando tanto.”

“E então ela veio te procurar.”

“Para sua informação, Sakuta, caminhar é importante para minha reabilitação. Eles vão me deixar sair amanhã.”

“Você deve ter se sentido tão sozinha sem o seu irmãozão.”

“E-eu não fiquei!”

Ouvindo a enfermeira provocar Kaede, Sakuta lembrou-se de outra coisa importante.

Como ela tinha dito, Kaede voltaria para casa amanhã. De volta ao apartamento onde eles moravam. Onde Shouko estava hospedada…

Ele estava esperando resolver essa situação na noite anterior, mas o retorno abrupto de Mai tornou tudo mais complicado.

O que Kaede pensaria se encontrasse uma garota mais velha hospedada com seu irmão? Especialmente considerando que Shouko não era sua namorada.

“Você está ouvindo?”

“Eh, claro que estou.”

“Você claramente não estava.”

“Estarei aqui no horário de sempre amanhã, então certifique-se de estar pronta para ir.”

“Já estou me preparando. Estava arrumando as coisas mais cedo.”

Ela parecia animada para sair daqui.

Sakuta chegou a uma conclusão importante.

Vou deixar o amanhã para amanhã.

Ele tinha certeza de que seu eu do futuro lidaria com isso.

Por enquanto, ele decidiu deixar como estava.

Ele já tinha muita coisa em mente e adicionar mais alguma coisa poderia levá-lo ao limite.

***

Ele conversou com Kaede até as seis, quando as horas de visita acabaram. Depois, ele caminhou de volta para a estação de Fujisawa. Ele tinha se esquecido de entregar seu formulário de disponibilidade de turnos no restaurante onde trabalhava.

Normalmente, mesmo que esquecesse, o gerente ligaria para ele, e ele resolveria isso na hora. Mas com Shouko ficando com ele, muitos problemas poderiam acontecer se a ligação viesse enquanto ele estivesse fora. Melhor evitar essas coisas antes que acontecessem.

Mas o desvio significava que ele chegaria em casa mais tarde do que o usual. E toda a caminhada deixou seu estômago roncando. Tinha chances da Shouko ter o jantar esperando. Ela insistia que isso era uma troca justa por deixá-la ficar com ele e o tinha proibido de entrar na cozinha. Mas esse pensamento só o lembrou de como Mai tinha ficado zangada.

“Olha, ela insistiu, tudo bem?”

Ele sentia vontade de oferecer a desculpa mesmo sabendo que não adiantaria nada.

Ele ficou preso em um semáforo vermelho. Enquanto esperava, olhou para o céu noturno de dezembro, observando as nuvens finas passarem por cima.

Faltava menos de um mês para o fim do ano. Ele não conseguia decidir se tinha sido um ano longo ou curto. Muitas coisas tinham acontecido, com certeza. Conhecer Mai. Namorar com ela. Vários casos de Síndrome da Adolescência. Alguns deles até se tornaram boas lembranças agora.

Talvez no próximo ano ele olhasse para a confusão que a aparição de Shouko causou da mesma forma.

Mas ele tinha alguns obstáculos difíceis para superar primeiro. No mínimo, ele precisava encontrar uma solução melhor do que a que a investigação de hoje sugeriu.

“Uma que não envolva um casamento…”

No meio do pensamento, o semáforo ficou verde. Ele deu um passo à frente, e uma dor aguda atravessou seu traseiro. Alguém o chutou.

Um pouco atrasado, ele se virou, segurando o bumbum e resmungando, “Ai?”

Havia uma colegial parada atrás dele, usando o uniforme de uma escola para garotas sofisticada. Uma roupa muito formal que contrastava terrivelmente com seu cabelo loiro brilhante, todo empilhado de um lado. Sua maquiagem chamativa nos olhos não combinava com o visual discreto da saia que ia até os joelhos.

Ela estava olhando feio para ele, com os lábios franzidos, parecendo muito irritada.

Quando ela não disse nada, Sakuta disse, “Desculpe, deixei minha carteira em casa.”

“Hã?”

“Isso é uma tentativa de assalto?”

“Claro que não!”

Ela tentou chutá-lo novamente, então ele evitou o ataque.

“Espera— aaahhh! Não desvie!”

A garota perdeu o equilíbrio e aparentemente culpou ele por isso.

Ele conhecia essa garota. O nome dela era Nodoka Toyohama.

Ela era meia-irmã de Mai e atualmente morava com ela.

“Sem aulas de Idol hoje?”

Nodoka fazia parte do grupo de Idols Sweet Bullet e geralmente ia direto da escola para aulas de canto ou dança. Era incomum para ela chegar em casa tão cedo.

“Nenhuma da sua conta.”

“Justo.”

Ele realmente não se importava, então apenas continuou andando. Nunca seria bom deixar o semáforo ficar vermelho antes de atravessar.

“Ei, espere!” Nodoka disse, correndo atrás dele. “Hoje tivemos apenas uma reunião rápida.”

Ela decidiu se explicar mesmo assim. E como eles moravam do outro lado da rua um do outro, estavam indo na mesma direção.

“……”

“……”

Eles caminharam em silêncio por um tempo.

O som de seus passos ecoava e permanecia enquanto cruzavam rua após rua.

“Diga alguma coisa!”

“Hã?”

“Além disso, você anda rápido demais.”

Nodoka agarrou seu braço, puxando-o para trás.

“Só para você saber, estou com pressa para chegar em casa. Estou com o estômago vazio e a mente cheia e ocupada.”

“Você não deveria estar pensando em nada além da minha irmã.”

“Ela é o que está na minha mente.”

“Mentiroso.”

“Estou falando sério.”

“Então que dia é hoje?” Nodoka perguntou, parando na entrada do parque.

“Hã?”

A pergunta repentina e estranhamente oportuna o pegou de surpresa.

“Diga.” O tom de Nodoka era sombrio, como se estivesse proibindo-o de fazer uma piada.

“Dois de dezembro. Terça-feira.”

“O aniversário da minha irmã,” Nodoka disse antes mesmo que ele terminasse.

“……”

O que ela tinha acabado de dizer? Aniversário? De quem…?

“Oh, droga.”

Sua voz saiu como um sussurro. Sua mente acompanhou sua voz um momento depois. Uma onda de pânico o invadiu, e seus pés ficaram instáveis.

“Você está ferrado,” Nodoka disse, balançando a cabeça. “É por isso que ela voltou ontem à noite!”

“Ela não disse nada!”

“Não é exatamente difícil descobrir o aniversário de Mai Sakurajima.”

Nodoka tirou o telefone do bolso, deslizou o dedo pela tela e mostrou a Sakuta o site que encontrou.

Era o site oficial da agência de Mai. Aberto na página de perfil de Mai Sakurajima. Que exibia claramente Data de Nascimento: 2 de dezembro.

“Ela deveria ter me contado…”

Mas já era um pouco tarde para isso agora.

“Como ela poderia? Você está ocupado com Kaede. Ela obviamente não queria sobrecarregá-lo com isso também!”

Mas isso significava que Sakuta deveria ter descoberto por conta própria. Pelo menos, era o que Nodoka pensava. Mas ele não descobriu, então ela estava zangada com ele. Furiosa.

“Ela estava preocupada com você e Kaede o tempo todo que esteve fora. Ela me ligava todas as noites e só falava sobre você.”

“……”

“Mas você parecia estar indo bem estranhamente, e acontece que é porque outra mulher estava cuidando de você? Vá para o inferno!”

A raiva de Nodoka era bastante justificável.

Ele estava bastante irritado consigo mesmo. Isso era patético. Frustrante. Ele queria voltar no tempo. Mas isso era impossível. Ele teria que fazer o que pudesse.

“Toyohama.”

“Vá se danar.”

“Deixe-me pegar seu telefone primeiro.”

“De jeito nenhum.”

“Ainda é dois de dezembro.”

“……”

“Por favor.”

“…Tudo bem. Pelo menos deseje um feliz aniversário para ela.”

Nodoka estendeu o telefone em sua direção. Ela estava furiosa com ele, mas aparentemente decidiu que Mai precisava disso.

Ele discou, e o telefone atendeu no terceiro toque.

“Azusagawa falando!” disse a voz alegre de uma mulher. Era Shouko. Naturalmente — Sakuta tinha ligado para o próprio número.

“Eu te disse para não atender o telefone, lembra?”

Se ela atendesse inadvertidamente uma ligação de seu pai, isso poderia causar todo tipo de dor de cabeça. Ele nunca ouviria o fim disso. E se seu pai decidisse que precisava fazer uma visita pessoalmente, seria ainda pior. Isso tinha que ser evitado a todo custo.

“Você é um pouco meticuloso com essas coisas, Sakuta.”

“Não, eu não sou!”

“Espere — Sakuta?” Nodoka percebeu que ele não estava falando com Mai.

“Só um segundo,” ele disse, interrompendo-a.

Ela ficou quieta e olhou para ele com desagrado.

“Então, o que aconteceu?”

“Aconteceu algo e eu não vou voltar para casa esta noite. Vá em frente e jante sem mim. Certifique-se de trancar as janelas antes de dormir.”

“Entendi. Só me compre algo em Kanazawa!”

“……”

“Eu adivinhei errado?”

“Não, mas… como?”

Shouko ignorou essa pergunta.

“Divirta-se!” ela disse e imediatamente desligou.

“Tanto faz. Obrigado pelo telefone,” ele disse, devolvendo-o a Nodoka.

“Você está falando sério?”

“O quê?”

“Você vai para Kanazawa? Agora? Sabe que não é no distrito de Kanazawa em Yokohama?”

“Prefeitura de Ishikawa, certo? Eu posso chegar lá se pegar o Shinkansen. São só sete horas.”

“Sete e quarenta e cinco, você quer dizer.”

“Se já são quase oito, vai ficar apertado.”

“Espere, eu vou verificar.”

Nodoka rapidamente começou a mexer na tela do celular. Poucos momentos depois…

“Ah, você está certo—você consegue. Pegue a Linha Utsunomiya em Fujisawa e desça em Omiya. Pegue o Shinkansen (trem bala) de lá e você chegará às onze e trinta e cinco.”

“Quando o primeiro trem chega em Fujisawa?”

“Sete e cinquenta e cinco. Você tem dez minutos.”

Se ele voltasse agora, poderia chegar a tempo.

“Estou indo, então.”

“Me ligue quando chegar lá. Vou ver se consigo descobrir onde ela está.”

“Eu não sei seu número.”

“Me dá sua mão, idiota.”

Resmungando, ela enfiou a mão na bolsa e procurou. Então, puxou uma caneta.

“Vamos lá!”

Quando ele hesitou, ela pegou a mão dele e começou a escrever. Isso fazia cócegas, e ele soltou um som estranho.

“Sério, morra,” ela disse, como se tivesse avistado algum lixo na rua.

Mas ela continuou escrevendo. Onze dígitos. O número de telefone dela.

“Isso é uma caneta permanente!”

Ele esfregou, mas não estava saindo.

“Assim, não vai sair antes de você chegar lá.”

“Se eu aparecer com seu número na minha mão, Mai vai ficar furiosa.”

“Você merece.”

“Certo, bem. Obrigado.”

“Vai logo, seu idiota!”

“Foi você quem me parou!” ele gritou por cima do ombro, já correndo em direção à estação. Ele começou a correr para garantir que não perdesse o trem. Logo ficou sem fôlego. Nuvens brancas se formavam a cada vez que ele exalava.

Ele podia deixar amanhã para amanhã.

Mas não hoje.

Hoje ele tinha que resolver as coisas por conta própria.

Então ele correu o mais rápido que pôde.

Depois de conseguir pegar o trem da Linha Utsunomiya das 19:55, ele viajou por uma hora e vinte minutos e desceu em Omiya. Lá, comprou um bilhete para o Shinkansen Hokuriku. Era todo com assentos designados, então, uma vez a bordo, ele só precisava encontrar seu assento e esperar até chegar a Kanazawa.

Estava escuro demais lá fora para admirar a paisagem passando. Ele não tinha com quem conversar e não havia trazido nada para passar o tempo, então estava literalmente sentado ali sem fazer nada. Desesperado para chegar o mais rápido possível, mas sem distrações para preencher o tempo, ele achou difícil se acalmar. Eles estavam viajando a 160 milhas por hora, mas ele queria ir ainda mais rápido.

Mas, independentemente do que ele queria, o Hokuriku Shinkansen Kagayaki 519 seguiu calmamente sua rota. Ele parou na Estação Nagano, na Província de Nagano, e na Estação Toyama, na Província de Toyama, antes de finalmente chegar à Estação Kanazawa, na Província de Ishikawa, exatamente conforme o programado, às 23:35.

Sakuta estava de pé antes mesmo do trem parar, esperando junto às portas. Ele já estava na plataforma no segundo em que elas se abriram.

Ele se dirigiu para o portão, procurando um telefone público na estação. Avistando um verde familiar na base das escadas rolantes, Sakuta avançou. Ele discou os números em sua palma. Devia ter suado, mas a magia do Sharpie garantiu que os números não estivessem nem borrados. Provavelmente ficariam lá a semana inteira.

O telefone foi atendido no segundo em que começou a tocar.

“Sakuta?” A voz de Nodoka.

Ela claramente estava esperando sua ligação. Atendeu rápido demais.

“Onde está a Mai?”

“Onde você está?”

“Ainda dentro dos portões do Shinkansen.”

“Perfeito. Recebi uma mensagem há dez minutos dizendo que ela está perto da rotatória na entrada leste da estação. Ela me enviou uma foto de um bolo que a equipe de filmagem trouxe, então acho que ela vai ficar por lá um pouco.”

“Entrada leste, entendido. E obrigado.”

“Você não tem muito tempo! Vá!”

Ela desligou.

Sakuta desligou e saiu correndo, seguindo as placas para a entrada leste.

Depois de passar pelos portões, ele começou a procurar pela rotatória mencionada.

Ele passou por um teto em forma de cúpula, todo de vidro e armações de metal, e finalmente chegou ao lado de fora. Um vento frio soprou em seu rosto.

E havia algo branco no ar. Muito disso.

“Você está brincando…,” ele ofegou.

Estava nevando de verdade.

Havia uma instalação artística do tipo torii fora da estação, e o topo dela já estava coberto por uma camada de branco. Tudo estava iluminado e parecia mágico. Ele girou e percebeu que toda a estação estava belamente emoldurada pela neve que caía.

“Kanazawa é incrível,” ele disse, realmente impressionado.

Mas ele não podia se dar ao luxo de perder tempo ali. Não tinha vindo até aqui para admirar as paisagens.

A rotatória de ônibus estava logo fora da estação, mas era bastante grande. Não seria fácil encontrar alguém ali.

Mas ele viu algumas luzes fortes agrupadas de um lado. Em suportes. E viu um microfone gigante em uma haste, como uma vara de pescar. Com certeza lá ocorria uma filmagem.

Havia cordas isolando a área e uma multidão reunida do lado de fora para assistir à filmagem. Locais e turistas, provavelmente em igual número.

Quando Sakuta se aproximou, uma rodada de aplausos começou. As grandes estrelas estavam saindo. Muitas pessoas gritavam “Bom trabalho” e “Obrigado.” Um homem mais velho se curvou para a equipe e para a multidão de fãs e entrou em um micro-ônibus. As portas se fecharam, e ele foi embora.

Um instante depois, a multidão rugiu—quase um grito. Uma atriz realmente deslumbrante havia surgido de trás da equipe—Mai.

Ela se virou para a equipe, dizendo educadamente: “Bom trabalho hoje, pessoal. Estou ansiosa para o último dia de filmagem amanhã.”

Então uma mulher que Sakuta reconheceu como sua empresária levou Mai a uma minivan branca, quase correndo. Ela se virou uma vez antes de embarcar, fazendo uma reverência para a multidão de fãs.

Sakuta estava naquela multidão também, mas não podia exatamente chamar por ela agora. Um movimento descuidado de sua parte poderia causar problemas para ela.

A porta deslizante se fechou, e a van foi embora. A equipe observou enquanto ela ia, e com um olhar de soslaio, Sakuta foi atrás dela.

Mas só havia até onde um humano podia perseguir um veículo em movimento. Quando ele virou a primeira esquina, a van já estava fora de vista.

“Haaah…haaah…”

Ofegando pesadamente, ele olhou para a direita e para a esquerda, em vão. Entre seu estado emocional e toda a corrida, ele estava suando bastante. Ele considerou apostar e correr para o próximo cruzamento, esperando que eles estivessem presos no sinal. Mas ele não conhecia bem o lugar, era noite e estava nevando, então encontrar um carro que ele já havia perdido de vista uma vez seria um milagre. E Sakuta sabia que a vida real não funcionava como um programa de TV.

Sua única opção era ligar para Nodoka novamente e ver se ela poderia descobrir onde Mai estava hospedada. Mas quando ele chegasse lá, já seria definitivamente 3 de dezembro… e não haveria nada que ele pudesse fazer sobre isso.

“Espero que ela seja gentil e ria disso como um acidente inevitável…,” ele murmurou. Seu riso soou oco.

“Isso não é nem remotamente engraçado,” disse uma voz atrás dele.

Sakuta conhecia aquela voz. Em um instante, sua decepção se transformou em surpresa e apreensão.

Ele se virou, encarando incrédulo. Ela saiu de trás de um prédio. Envolta em roupas quentes como uma corredora antes de uma maratona. Estava escuro, e seu capuz estava levantado, então ele não conseguia ver seu rosto.

“Por que você veio aqui, Sakuta?”

Ela deu mais um passo à frente, e as luzes da rua finalmente iluminaram o rosto da garota que ele estava perseguindo.

“Mai…” Ele estava genuinamente surpreso. Por que ela estava ali?

“Por aqui,” ela disse. Ela olhou rapidamente ao redor, depois agarrou sua mão e o puxou para o beco.

Estacionada no outro extremo da rua estava uma minivan branca. A mesma que ele estava perseguindo.

A porta traseira estava aberta e Sakuta foi apressadamente empurrado para dentro.

“Lá para o fundo.”

“Certo.”

Ele se acomodou no banco. Mai entrou atrás dele e fechou a porta deslizante.

O carro saiu. A gerente de Mai estava dirigindo. Ryouko Hanawa, se ele se lembrava corretamente. Mai uma vez contou a ele sobre seu antigo apelido, Holstein.

Mai tirou o capuz, revelando seu visual pós-filmagem. Ela estava olhando diretamente para a frente, e a maquiagem destacou todos os seus traços, tornando-a ainda mais bonita do que o habitual. Aquela não era a Mai dele – era a celebridade Mai Sakurajima. A pessoa glamourosa do outro lado da tela da TV. E essa aura tornava difícil falar com ela como ele normalmente fazia.

Não parecia que ela estava planejando dizer algo. Ela estava olhando para os carros que passavam, parecendo levemente irritada.

“……”

“……”

Havia uma tensão estranha no ar. Uma energia elétrica avisando-o para não falar.

Mas Sakuta estava em uma corrida contra o tempo e não podia perder a coragem ali. O relógio digital no carro mostrava 11:56.

“Mai, quando você me notou?”

Ela não tinha nem olhado em sua direção ao sair do set. Ele estava escondido na multidão. Ele achava difícil acreditar que ela o tinha visto tão rápido.

“O uniforme se destaca.”

Ele estava usando um uniforme de Minegahara. Ver isso aqui em Kanazawa provavelmente seria bastante notável. Mas naquela multidão, seria difícil ver muito das roupas dele. E Mai não tinha como saber que ele estaria em Kanazawa.

“Nodoka estava sendo particularmente falante, então achei que havia uma chance de ela ter te colocado nisso.”

“Ela disse que ia discretamente descobrir sua localização.”

O plano todo era surpreendê-la e comemorar seu aniversário. Mas Mai não estava surpresa, nem parecia feliz em vê-lo.

“Chegar aqui não deve ter sido barato.”

“Bem, você não está exatamente errada.”

“Você tem dinheiro para a passagem de volta?”

“Talvez se eu não pegar o Shinkansen…”

Isso era uma mentira. Ele tinha gasto todo o dinheiro que ganhara como garçom e, mesmo assim, mal tinha o suficiente para chegar até lá. A única maneira de voltar para casa envolvia mexer no dinheiro que seu pai enviava para ele e Kaede todo mês, e isso deveria cobrir as despesas de vida. Eles teriam que ser muito frugais com o orçamento de comida por um tempo…

Ele suspirou.

“Quanto você precisa?”

Mai claramente sabia que ele estava mentindo. Ela alcançou o assento à sua frente e tirou a carteira de sua bolsa.

“…Ah, bem…”

Ele tinha escolhido vir até aqui, e não parecia certo pegar emprestado o dinheiro da passagem dela.

“De Fujisawa a Kanazawa são quinze mil ienes, acredito,” Ryouko mencionou casualmente do banco do motorista.

“Então aqui,” Mai disse, entregando-lhe duas notas de dez mil ienes.

“Eu prometo que vou te pagar de volta.”

Ele sentiu que nunca tinha parecido mais desesperado. Estava sendo um total aproveitador. Isso estava no mesmo nível de teoria de parasita.

“Você tem onde ficar?” Mai deu outro golpe.

“Eu ia matar tempo em algum lugar até de manhã.”

“Nessa neve?”

“……”

O tom dela deixava claro que ela não toleraria argumentos ou comentários superficiais, então ele simplesmente calou a boca. Ela com certeza estava tratando ele como uma criança.

“Ryouko, desculpe, mas podemos encontrar um quarto vazio no hotel da equipe para ele?”

“Vou parar o carro e ligar.”

“…Obrigado,” Sakuta disse. Parecia ser a melhor opção. Tentar recusar a oferta só pioraria as coisas.

“Então?” Mai suspirou, olhando para ele. “Não tem mais nada a dizer em sua defesa?”

Os olhos dela se voltaram para o relógio. 11:59.

“Feliz aniversário, Mai.”

Assim que ele terminou, o visor digital mudou. Meia-noite. Era oficialmente 3 de dezembro.

“Você disse isso muuuito tarde, idiota,” Mai disse, finalmente sorrindo. Seus olhos fixos nele.

Enquanto a van se afastava da estação e do centro da cidade, ela lentamente subia uma colina, parando cinco minutos depois.

Ryouko puxou o freio de mão, tirou o cinto de segurança e disse, “Chegamos.”

“Obrigada, Ryouko.”

“Vocês têm quinze minutos para o encontro. Se mais fotos de vocês dois acabarem nos tabloides, nunca mais terei coragem de encarar o presidente.”

“Não se preocupe. Ninguém vai ligar para uma segunda vez.”

“Ah, Mai!”

“Nós seremos cuidadosos.” Mai respondeu obedientemente, como uma criança pequena.

“E faça esse namorado te animar direito,” Ryouko disse. Desta vez a vantagem claramente era dela. “Você está depressiva desde que voltou, e a equipe e o diretor estão todos preocupados.”

“R-Ryouko!”

Não era comum ver Mai tão nervosa.

“Não diga coisas assim!” ela disse. A maneira como seus lábios se projetavam era muito infantil. Ou talvez apenas… a sua verdadeira idade? Antes que percebesse, Sakuta estava sorrindo.

“Por que está sorrindo? Vamos lá.”

Mai abriu a porta e saiu. O ar frio o atingiu, e ele estremeceu.

“Mas Mai, está seriamente frio lá fora.”

“Você pode usar isso.”

Mai tirou o casaco de pena e o entregou a ele. Ela estava usando seu casaco habitual por baixo, que parecia bem quente.

Mai saiu, então ele vestiu o casaco emprestado e a seguiu. Ele percebeu que o casaco tinha o logotipo do título do filme. Devem ter mandado fazer para essa filmagem.

Ele deu alguns passos rápidos pela neve, alcançando Mai. A vista à sua frente de repente se abriu.

“……”

Sakuta ficou boquiaberto. Eles podiam ver toda Kanazawa dali.

“Ryouko me mostrou isso no primeiro dia de filmagem. Bonito, não é?”

“Sua gerente conhece bem a área?”

“O namorado com quem ela quase se casou é daqui.”

“Isso… soa constrangedor.”

Ela deve ter vindo aqui para conhecer os pais dele. Isso não acontecia a menos que você tivesse certeza. Ele não sabia o que tinha dado errado, mas parecia melhor não perguntar.

“Isso me lembra, Mai.”

“O quê?”

“Você estava se sentindo depressiva?”

“Enquanto você parecia totalmente bem.”

Um contra-ataque devastador.

“Eu estava um desastre.”

Sem desviar com piadas ou mentiras, ele compartilhou como ainda não tinha superado o que aconteceu com a nova Kaede.

“…Devo ser grata a Shouko. Ela te salvou duas vezes.”

A primeira vez foi há dois anos, quando ele ainda estava no ensino fundamental. Ele conheceu Shouko do ensino médio na praia de Shichirigahama, e ela realmente o salvou. A segunda vez foi na semana passada. Quando a tristeza de perder uma Kaede o dominou, ela apareceu para repreendê-lo.

“Eu não pude estar lá para você,” Mai disse, achatando as emoções na voz. Um traço de tristeza apareceu em seu rosto.

“Bem…”

Ele começou a dar desculpas para ela, mas… decidiu não fazê-lo.

Há dois anos, Sakuta e Mai não estavam juntos. Eles não eram um casal. Eles nem sequer se conheciam ainda.

Não havia necessidade de ela se sentir mal por isso desta vez também. Ela estava interpretando um papel principal em um filme que estava sendo filmado aqui em Kanazawa.

“E eu sei que você precisava da ajuda de alguém.”

Mas aparentemente a maneira como as coisas haviam acontecido não parecia bem para ela.

“É só… doeu não ter sido eu.”

Ela falou como se estivesse falando sobre outra pessoa. Talvez estivesse. Há momentos em que você tem sentimentos que te surpreendem tanto que parecem nem ser seus. Mai pode manter uma fachada madura, mas isso não a tornava imune a emoções inesperadas.

“Você estar aqui é tudo o que preciso para ser feliz,” ele disse.

“Isso é o mesmo que eu não fazer nada.”

“Acho que isso é ainda mais impressionante. Gostaria de poder ser assim para você.”

Ele lhe deu um olhar esperançoso. Mas ela deliberadamente evitou encontrar seus olhos. Ele desistiu e continuou falando.

“Ontem… quer dizer, acho que anteontem agora. Fiquei muito feliz por você ter voltado.”

“Mesmo que aparentemente eu tenha chegado em um momento muito inconveniente.”

“Estou sem palavras.”

Ele fez uma careta. Definitivamente, ele tinha entrado em pânico na época.

“Recebendo consolo de sua antiga paixão? Quem você pensa que é?”

“Sim, Shouko nunca foi assim. Você é a única—”

“Eu não acredito nisso nem por um segundo.”

Mai não ia nem deixá-lo terminar de protestar.

“Ahh.”

“Mais importante, está congelando aqui.”

Agora ela estava mudando de assunto. Ela olhou para o casaco de pena como se quisesse ele de volta.

“Entendi perfeitamente,” ele disse, abrindo o casaco para tirá-lo. Mas antes que pudesse, Mai escorregou para dentro, pressionando as costas contra ele.

“Feche o casaco! Está congelando.”

O desejo dela era uma ordem.

“Eu pensei que você disse que não poderíamos fazer isso por um tempo.” Aquela rejeição o tinha atingido com força. Só de lembrar disso, seu coração se partia.

“Está frio, então podemos.”

“Viva o inverno.”

“E você não precisa continuar inventando desculpas.”

“Eu ainda gostaria que você as ouvisse.”

“Quero dizer que você veio me ver, então está tudo perdoado.”

Essa declaração foi em uma voz muito mais baixa. Parecia que ela estava com raiva dele e envergonhada, mas estava tentando não demonstrar. Por trás, ele não podia ver seu rosto. Mas sentir ela tão próxima era tudo o que ele precisava.

“……”

“……”

“Sakuta.”

“O quê?”

“Feche os olhos.”

“Por quê?”

“Apenas faça isso.”

Havia uma nota de urgência, como se a vergonha estivesse alcançando-a. Pensando que era melhor fazer o que ela disse, ele fechou os olhos.

Mai se virou de lado e colocou a mão na bochecha dele. Ele podia ouvir a respiração dela. Sentir seu calor. Cheirar… algo, talvez o shampoo ou a maquiagem dela. Um aroma tentador que alcançava seu nariz apesar da neve.

“Sakuta…,” ela disse docemente. Tentadoramente.

Ela prendeu a respiração.

Ele podia sentir ela se esticando.

E, justo quando seu peso se inclinou contra ele…

“Ai!”

…ela torceu sua bochecha, com força.

Seus olhos se abriram instantaneamente.

“Isso doeu, Mai!”

Ele olhou para ela em busca de misericórdia, mas ela não soltou.

“Também, por quê?”

Isso parecia o prelúdio de um momento realmente agradável. Ele realmente acreditou que um beijo ou algo igualmente agradável estava por vir. Essa foi uma virada cruel.

“Estou irritada com o quanto fiquei aliviada ao te ver.”

Ela parecia incrivelmente chateada com esse fato.

“E eu ainda não te puni por me trair.”

“Eu não traí!”

Quem foi que disse que ele não precisava inventar desculpas?

“Oh, mas eu acho que se você ficou aliviado, então está tudo— Ai!”

Quando ele tentou mudar de assunto, ela torceu sua outra bochecha.

“Sakuta, onde está meu presente?”

“Seu o quê?”

“Meu presente de aniversário.”

“Eu não sou suficiente?”

Ele tinha esvaziado sua carteira para chegar ali. A conta onde ele guardava o dinheiro do trabalho estava com apenas algumas centenas de ienes.

“Não.”

“Vou fazer algo melhor para o Natal, então me deixe escapar dessa vez.”

“Eu não sei quais são meus planos de trabalho então.”

“Eu quero comer bolo com você.”

“Você deveria realmente passar o Natal com a Kaede este ano.”

“Passar o Natal com minha irmã?”

“Se você fizer isso, eu também te darei um presente.”

Ela olhou para ele por entre os cílios. Estranhamente, isso não era assustador. Talvez porque, mesmo na luz fraca, ele podia ver que as bochechas dela estavam vermelhas.

“Estamos juntos há seis meses agora… e hoje… bem, eu quero retribuir o favor.”

A voz dela estava tão suave que quase se perdeu no vento.

“Mai, isso é algo sexy?”

“…Casais geralmente fazem essas coisas.”

“Eu sei disso.”

“Então não vá suspirando por outras mulheres.”

Mai geralmente era tão majestosa, mas entre a vergonha e o frio, ela parecia menor. Como uma coisa frágil aninhada em seus braços. Era adorável, e ele não ia se segurar por muito tempo. Deixou o impulso dominá-lo e apertou os braços, puxando-a mais para perto.

“Ei! Sakuta! Ainda não!”

“É culpa sua por ser tão fofa.”

Ela levou ele ao limite.

“E-ei! Onde suas mãos estão indo?”

“Ai!”

Completamente vermelha, o salto dela acertou seu pé.

“Au!”

Ele ficou pulando em um pé só, segurando o membro ferido contra o peito.

Mai se afastou e arrumou o cabelo desalinhado.

“Ah, a Ryouko acabou de me mandar uma mensagem,” ela disse enquanto se afastava dele. “Ela encontrou um quarto para você.”

“…Obrigado,” ele disse, quase sem conseguir falar pela dor. Parou de pular e se encolheu.

“Você é tão dramático,” ela disse.

“Dessa vez realmente doeu,” ele disse, olhando para as botas dela com lágrimas nos olhos. Aquelas coisas eram armas mortais.

“Bem, você não deveria ter me tocado ali.”

Ele ainda podia sentir a maciez na palma da mão. Não importava o quão frio ele ficasse, ele nunca esqueceria isso.

“Pare de fantasiar sobre isso.”

“Você é uma adulta, Mai. Nada que eu imagine te afetaria.”

“Você está sendo nojento.”

“Aww.”

“Ah, e eu vou ficar na sua casa até resolvermos essa questão da Shouko.”

“Então, se eu nunca resolver isso, você nunca vai embora?”

Eles ainda não tinham encontrado um plano concreto para essa Síndrome da Adolescência. Bem, eles tinham uma ideia, mas não era realista.

“Claro, mas nunca estaremos sozinhos juntos. Isso não é um problema para você?”

Ela deu um sorriso irônico. Aquele era seu velho sorriso. Ela se virou para voltar ao carro, leve como uma pluma. Só de vê-la assim fazia Sakuta se sentir bem.

Kaede voltaria para casa amanhã. Shouko estaria lá. E quando as filmagens terminassem, Mai também chegaria, e seria puro caos desenfreado. Só de pensar nisso ele já ficava com uma úlcera. Mas ele só precisava relaxar e aproveitar. A vida não era algo que se podia controlar.

“Vou deixar o amanhã para o amanhã,” Sakuta murmurou. Mas, enquanto ele subia na van, Mai disse, “Já é hoje.”

Forçando-o de volta à realidade.

 

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