Histórias Bônus
Cena #1
— Senpai! Ei, Senpai!
Ao ouvir a voz chamando por ele, Haruhiro levantou o rosto lentamente.
Num canto do pátio da escola, havia alguns bancos, e Haruhiro sempre saía da sala assim que o intervalo começava para garantir um deles para si. Com um olhar rápido para o aluno que o chamara—um garoto absurdamente alto para alguém que estava um ano abaixo dele—Haruhiro respondeu de forma indiferente e voltou a abaixar a cabeça.
— Oh…
— O que você tá fazendo? — O aluno mais jovem sentou-se ao lado de Haruhiro.
— Jogando. E outras coisas. — Haruhiro mexia em seu celular.
— Hum. — O garoto mais jovem olhou para as mãos de Haruhiro. — É divertido fazer isso?
— Mais ou menos — respondeu Haruhiro, empurrando o garoto com o ombro. — Tá muito perto, cara, e meio que no caminho.
— Oh, foi mal. — O garoto se desculpou e recuou um pouco.
Haruhiro continuou jogando por mais algum tempo, mas depois desligou o jogo.
— Você queria alguma coisa? — perguntou ao garoto.
— Não, só achei que te encontraria aqui se viesse. — O garoto deu uma risadinha.
— Você veio pra me ver, então?
— Bem, é. Tipo, não que tenha um motivo real pra isso. Só pensei: “Ei, talvez você esteja aqui” e meio que vim.
— Ah, é? — Haruhiro respondeu, considerando se deveria voltar a jogar, mas não estava no clima. Pensando bem, decidiu perguntar: — Você tem um nome meio estranho, né?
— Com certeza. — O garoto mais jovem assentiu. — Se escreve KU-ZA-KU. — Ele desenhou os kanji 久座工 no ar com o dedo. — Esse sobrenome é bem raro, pelo que ouvi. Acho que nunca conheci ninguém com ele que não fosse da minha família.
— Heeeey, Parupirooo! — Uma voz veio de cima.
Quando olharam para cima, Ranta estava pendurado na janela do segundo andar, com um sorriso zombeteiro. Haruhiro desviou o olhar sem dizer uma palavra.
— O quê, vai me ignorar? Tá se achando, Parupiron! — gritou Ranta.
— Ugh, ele é tão barulhento… — Haruhiro murmurou, mas parecia que a audição aguçada de Ranta tinha captado aquilo.
— Quem você tá chamando de barulhento?! Hein?! — berrou Ranta.
Haruhiro tentou ignorá-lo, mas bolas de papel amassado e caixas de doces vazias começaram a chover lá de cima. Não o acertaram, então ele não ligou, mas…
— Ai! — O garoto mais novo soltou um grito.
Olhando para o lado, parecia que uma pantufa tinha acertado a cabeça do garoto. Ele chutou o calçado caído.
— Seu idiota! Que tipo de pessoa joga uma pantufa, sério?! — gritou ele para Ranta.
— Foi mal, foi mal — Ranta se desculpou, mas ainda assim exibia aquele sorriso idiota. Ele claramente não estava nem um pouco arrependido.
— Desce aqui, Ranta-kun.
— Nem ferrando.
— Tá com medo?
— Não tô coooom medo. Por que eu teria medo de você?
— Droga, desse jeito você me irrita!
— Então fique irritado. Nyan nyan nyan nyan nyan nyan.
— Nyan nyan nyan nyan nyan nyan? Você é uma criança?! Quem faz isso, sério?!
— Eu faço!
— Só ignora ele — disse Haruhiro, pegando a pantufa de Ranta e jogando-a o mais longe que pôde.
— Ahh! Haruhiro, seu…! O que você tá fazendo?! — Ranta protestou, inclinando-se ainda mais para fora da janela, quase caindo. — Ahh! Droga! Eu vou… — Ranta gritou desesperado antes que Monzo o puxasse por trás.
— Oh! Moguzo-san — disse o garoto mais novo. — Você não precisava salvar esse idiota. Seria melhor se ele caísse.
— O que você tá dizendo? — Ranta esbravejou, afastando o braço de Monzo com raiva. — Pra começar, quem disse que um novato como você pode chamar o Monzo-san de Moguzo, hein, idiota?!
— Ops, foi mal. — O garoto deu de ombros, coçando a cabeça. — Não foi minha intenção…
— Tá tudo bem — disse Monzo, com um sorriso. — Todo mundo me chama de Moguzo, então não me importo.
— Gwahahaha! — Ranta ria como um idiota enquanto girava um dos braços em círculos. — Você é muito mole, Moguzo. Se continuar assim, as pessoas vão se aproveitar de você.
— Tipo você… — Haruhiro murmurou enquanto se sentava novamente no banco. Ao olhar ao redor, viu Manato observando-os de uma janela próxima. Seus olhares se encontraram. Manato acenou. Haruhiro retribuiu o aceno.
—E então o sonho terminou.
Quando acordou, ele mal se lembrava do sonho. Apenas fragmentos permaneceram com Haruhiro. Mesmo assim, segurou-os firmemente. Não queria deixá-los escapar. Mesmo sabendo que logo os esqueceria também, queria mantê-los por agora.
Cena #2: No Pátio Durante o Intervalo do Almoço
— O que você está fazendo, Haruhiro? — Manato perguntou, olhando para o que ele segurava.
— Huh? Ohh, apenas jogando… — respondeu Haruhiro enquanto tocava a tela do smartphone.
Manato olhou para a tela de Haruhiro. Fez um som pensativo, mas não disse nada.
Haruhiro continuou tocando, tocando e tocando.
Manato, de repente, se perguntou: Esse jogo é divertido?
— Parece divertido — disse Manato com um sorriso. Ao dizer isso, sentiu que estava certo.
— É, até que é.
— Talvez eu devesse experimentar alguns jogos também.
— Tem de tudo. Acho que seria um bom passatempo.
— Sério? Não jogo muito, então não entendo muito disso. Alguma recomendação?
— O que estou jogando agora é bem legal, acho. Uh, o nome é…
— Ah, espera. Esqueci meu celular. Não trouxe hoje.
— Sério? É um saco quando isso acontece, não é?
— Dá pra se virar sem ele, de certa forma.
— Ah, é? É assim?
Manato olhou para baixo e viu que a tela de Haruhiro tinha ficado preta. Parecia estar configurada para entrar no modo de espera após um tempo sem uso.
— Não vai continuar jogando? — Manato perguntou.
Haruhiro pensou por um momento e respondeu: — Nah, tô de boa, acho. — E colocou o celular no bolso.
Esse banco no pátio da escola, que ficava na sombra durante o intervalo do almoço, era o lugar especial de Haruhiro. Naturalmente, se alguém chegasse antes dele, não poderia sentar lá. Por isso, Haruhiro ia ao pátio o mais cedo possível para garantir seu lugar.
Manato olhou para o céu.
— O tempo está bom — disse ele.
— Tá mesmo — concordou Haruhiro.
— Esse lugar é bem agradável — acrescentou Manato com um leve riso.
— É.
— É bem confortável.
— E fresco no verão também.
— Não fica frio no inverno?
— Fica sim. Preciso me agasalhar bastante.
— Mesmo assim você faz questão de vir aqui?
— É, sei lá. É um hábito. Tipo uma mania minha.
— Isso é bem a sua cara, Haruhiro.
— Sério?
— Você é bem peculiar com certas coisas.
— Deve ser minha personalidade — disse Haruhiro. — Eu sou bem tranquilo, mas talvez fique preso a coisas que nem importam tanto assim.
— Engraçado isso. — Manato sorriu, como sempre.
Eu sou um cara bem sem graça, Haruhiro pensou, mas não disse em voz alta. Tinha certeza de que era uma pessoa monótona, mas Manato podia pensar o contrário se quisesse.
— Ei, Manato — chamou Haruhiro.
— Hm?
— Você é… — Haruhiro hesitou, coçando a cabeça. — Desculpa, deixa pra lá.
— O quê? — Manato deu um leve empurrão no ombro de Haruhiro. — Tudo bem se não quiser dizer.
Os dois ficaram em silêncio por um tempo. Era uma situação meio constrangedora.
— Talvez seja meio raro… — murmurou Haruhiro.
— O que é raro?
— Uh, não sei… Ter um amigo como você? Pra mim, isso talvez seja meio incomum, acho.
— É mesmo?
— Não que eu tenha muitos amigos, pra começo de conversa.
— Não importa se você tem muitos ou poucos, né?
— Talvez.
— É o que eu acho.
Eu também acho isso, Haruhiro disse para si mesmo em silêncio. O vento era agradável, e o intervalo do almoço logo terminaria.
Cena #3: Na Sala de Aula
— Hmmm… — Ranta estava encarando seu smartphone e resmungando, enquanto Monzo perguntava: — O que foi?
Ranta o ignorou.
— Hmmm… — continuou resmungando. — Hmmm… Hmmmmmm… Hmmmmmmmmmmmmmmmmmmm…
Ele lançou um olhar para o lado. Monzo estava olhando para frente.
— Ei! — Ranta levantou-se e deu um leve tapa na cabeça de Monzo. — Moguzo! Escuta! Normalmente, você deveria perguntar o que foi!
Monzo segurou o lugar onde havia sido atingido.
— E-Eu perguntei, sabe? Mas você não respondeu…
— Se estiver interessado, pergunte duas ou três vezes! Pergunte, cara!
— Eu não tô tão interessado assim.
— O quê?! Você disse alguma coisa?!
— Não, é que… Desculpa. Você estava pensando, então não quis interromper.
— Ei, ei, ei, ei!
— …O q-quê?
— Moguzo! — Ranta jogou o braço ao redor do ombro de Monzo com força. — Nós somos amigos! Não precisa ficar se preocupando! Mesmo se eu estivesse pensando, não tem como eu te dar uma bronca por falar comigo, certo?!
— Hã? Mas você dá bronca às vezes…
— Tá, certo, às vezes!
— Então você dá, né…
— Eu sou humano! Quando dou bronca, dou bronca! Quando não dou, não dou! É assim que os humanos são! Porque somos humanos, certo?!
— …Humanos, certo.
— Nós somos humanos, não somos? Moguzo, não me diga que você não é humano?! O que você é, então?! Um lagarto-de-gola?! Não consigo te imaginar sendo um, mas mesmo assim!
— Eu não sou um lagarto-de-gola…
— O quê? Não é?! Diga essas coisas mais cedo! Você me assustou por um momento!
— …Então, o que você estava fazendo no celular?
— Hm? Ahhh, isso? Ramen.
Os olhos de Monzo se arregalaram.
— Rameeeeen?!
— S-Sim… P-Por que ficou tão empolgado de repente?
— Quando ouço “ramen”, como não ficar?! Quero dizer, é ramen! Ramen!
— Você disse isso duas vezes porque era importante…?
— Claro! Quero dizer, é ramen, né?! Então, do que se trata esse ramen?!
— Nah, eu tô com vontade de comer ramen desde manhã, então tava pensando em ir comer depois da escola. Por isso estava procurando lugares de ramen no celular…
— Se é só isso, deixa comigo! — Monzo tirou o braço de Ranta de cima dele e puxou um caderno da mochila. — Aqui! Shio?! Shoyu?! Ou miso?! Você também gosta de caldos de frutos do mar, certo?! E como você ama carne, vai querer algo com um chashu especial! Isso significa…
Ele folheava e folheava o caderno. Cada página estava repleta de informações. Parecia ser um compilado sobre restaurantes de ramen. Monzo abriu em uma página específica e mostrou para Ranta.
— Este é o restaurante de ramen que eu recomendo agora! Uchinachu Haiden-ken! O nome soa meio okinawano, mas isso não importa! Esse lugar é delicioso! O caldo de asari é incrível! A nori em cima é crua, mas é isso que a torna especial! E o chashu deles também é excelente!
— O-Olha só…
— Quer um caldo mais encorpado?! Se for o caso, então, hã, aqui! Ramen House Kanzen Jizai! É super rico, e as porções são generosas. É super substancioso, e você vai ficar super satisfeito! Mas é meio pesado, então é mais voltado pra um público específico, mas, olha, se quiser algo mais leve de comer…
A aula estava prestes a começar, mas Monzo não dava sinais de que ia parar.
Cena #4: O Pequeno
Já fazia uma semana desde que ela ganhara seu primeiro smartphone.
Ele estava em cima da mesa.
Ela estendeu a mão.
Recolheu-a.
Desviou o olhar. Olhou para fora da sala de aula. O céu era azul, com nuvens parecidas com algodão-doce brilhando nele.
Baixou os olhos de volta para a mesa. Aproximou-se de pegar o telefone. Resistiu.
— Ei, ei! — uma voz chamou por ela. O rosto de Yume apareceu do lado da mesa.
— O-o quê? — perguntou Marii.
Yume arregalou os olhos e inclinou a cabeça para o lado.
— Marii-chan, o que você tá fazendo?
— …Nada, na verdade.
— Mesmo?
— Não fiz… nada de mais.
— Hmm. Tá bom. Mas, sabe, você tava olhando pra lá e pra cá entre o telefone e a janela um bocado, né?
— Eu estava olhando.
— Tava mesmo, huh. Esse telefone, ele tá quebrado?
— Ele não está quebrado. Se alguma coisa, ele é muito agitado… — Marii abaixou a cabeça. — É… Cheio de energia, o pequeno… Cheio de energia? Falar assim é estranho?
— O telefone?
Quando Marii confirmou com um aceno, Yume inflou uma das bochechas.
— Talvez não seja normal dizer que um telefone é cheio de energia? Se você diz isso, parece que é um bichinho, né? Não, como se fosse uma criatura viva.
— Você tem razão. Mas o pequeno… Não consigo tirá-lo da cabeça.
— Hmm.
— Por algum motivo, não consigo parar de olhar pra ele. Mesmo quando não tenho tempo, isso acontece.
— Ohhh.
— Olho tanto. Ainda não sei usar ele direito, mas acabo tirando fotos, checando notícias, pesquisando coisas, e é só isso.
— Então você tá usando ele bem, né.
— …Você acha? Estou conseguindo usar bem?
— Sim, com certeza. Yume só consegue usar o telefone pra… telefonar. Olha, o telefone da Yume era da mãe dela, é daqueles que dobram.
— Um flip phone?
— Ohhh! Yume aprendeu errado, né? Então é um telefone flipando!
Flip, não flipando, mas tanto faz, pensou Marii.
— Eu também não tinha um smartphone antes, mas compraram um pra mim — ela disse. — Eu queria aprender a usar e, enquanto testava várias coisas, parece que acabei me viciando nele.
— Ah, é? Fungh…
— Yume…
— Nyoo?
— Você não devia morder a mesa.
— Unoo.
Yume aparentemente tinha começado, distraída, a morder a borda da mesa. Imediatamente afastou a boca dela.
— Miau! Yume babou tudo aqui. Mesmo não sendo a mesa dela. Desculpa, Marii. Yume vai limpar agora.
— …Não deveria limpar com a manga.
— Tá tudo bem! Essa roupa é da Yume.
Marii tirou um pacote de lenços do bolso e entregou para Yume.
— Use isso.
— Nyoh! Obrigada.
Enquanto assistia Yume limpar a mesa com os lenços, o smartphone no canto do olho chamou sua atenção. Marii estendeu a mão, incapaz de resistir, e tocou o telefone. Apertou o botão. A tela de bloqueio apareceu. Sem hesitar, apertou o botão novamente, apagando a tela.
Ela trouxe de volta a tela de bloqueio. Quando inseriu sua senha, a tela inicial surgiu. Imediatamente desligou o telefone.
— Nyeehee! — Yume soltou uma risada estranha. — Marii-chan, você gosta mesmo desse telefone!
— …Será?
Marii segurou o smartphone com as duas mãos.
Yume talvez tivesse razão, pensou. Preciso ter cuidado com o pequeno, pra ele não quebrar.