Capítulo 20 – “Alfândega”
Lumian inconscientemente prendeu a respiração e recuou um pouco.
Naroka não veio na sua direção. Lentamente, ela entrou na pequena floresta e desapareceu na noite profunda.
Lumian estava um pouco preocupado. “Ela não parece bem… Aconteceu alguma coisa?”
Recentemente, houve cada vez mais anormalidades na aldeia.
Ele olhou para fora por um tempo e a noite voltou ao silêncio. Somente o balanço das folhas provava a existência do vento.
— O que você está olhando? — A voz de Aurore veio de repente atrás dele.
Lumian se virou e ficou encantado ao ver a irmã, que vestia um pijama de duas peças.
— Você também notou algo errado?
— Não, — respondeu Aurore, seu cabelo loiro ligeiramente bagunçado e fofo por ter acabado de acordar.
Depois acrescentou com raiva: — Não vejo nada de errado. Tudo que sei é que tem um cara que está acordado no meio da noite, olhando pela janela.
— No máximo, em uma hora amanhecerá. Como pode ser considerado meio da noite… — Lumian murmurou por hábito. Então ele perguntou: — Você não veio por causa da coruja? Você não viu Naroka lá fora?
— Naroka? — Aurore revelou uma rara expressão vazia.
Lumian contou tudo desde o momento em que acordou e percebeu que havia uma sombra negra do lado de fora da janela até o comportamento estranho de Naroka entrando na floresta.
Quanto à característica especial que descobriu enquanto meditava em seu sonho, ele planejou consultar a mulher misteriosa primeiro, antes de considerar como contar a Aurore ou esconder isso por um tempo para evitar que sua irmã o impedisse de obter superpoderes.
Aurore franziu suas lindas sobrancelhas loiras.
— Algo pode já ter acontecido com Naroka…
— Vá ver como eles estão ao amanhecer.
Lumian perguntou inconscientemente: — O que poderia ter acontecido?
— Como eu poderia saber? Eu não a vi; não há como fazer um julgamento preciso, — retrucou Aurore.
— Você realmente não a viu? — Lumian pensou que sua irmã o estava monitorando o tempo todo.
Aurore zombou. — Você acha que pode ver o que quiser? Se você ver algo que não deveria, terá que considerar em qual cemitério me enterrar. Não vou olhar para fora sem motivo. Vou apenas monitorar sua condição. Eu só vou acordar se algo estiver errado.
Lumian ficou atordoado por um momento e não pôde deixar de piscar. “A Grande Irmã está correndo um risco enorme para cuidar de mim…
Aurore acrescentou seriamente: — É por isso que estou lhe dizendo, não olhe para o que você não deveria ver e não dê ouvidos ao que não deveria ouvir. Buscar um poder extraordinário é uma coisa muito perigosa.
— Entendi. — Lumian assentiu solenemente.
Ao mesmo tempo, ele pensou consigo mesmo: “É precisamente porque é perigoso que não posso deixar você fazer isso sozinha.”
…
Após o café da manhã, Lumian seguiu as instruções da irmã e foi direto para a casa de Naroka.
Ao se aproximar, ele viu muitos aldeões parados do lado de fora da porta, incluindo seus amigos, o pai de Ava, Guillaume Lizier, o pai de Reimund, Pierre Greg, e o irmão mais novo do padre, Pons Bénet.
— O que aconteceu? — Lumian circulou cuidadosamente Pons Bénet e os poucos encrenqueiros que o cercavam e foi para o lado de Reimund.
Reimund respondeu com tristeza. — Naroka faleceu.
— Ah? — Lumian estava preparado para que algo acontecesse com Naroka, mas não esperava que ela estivesse morta.
Reimund continuou divagando. — Antes do amanhecer, o padre veio dar-lhe a última cerimônia. Ela ainda estava bem e cheia de energia há dois dias quando perguntamos a ela sobre a lenda do Bruxo. Por que ela faleceria repentinamente?…
“Antes do amanhecer?” Lumian ficou alarmado.
Ele percebeu que foi justamente nesse momento que viu Naroka. O momento exato da unção do padre não fez muita diferença.
A mente de Lumian fervilhava de pensamentos. “Então, o que eu vi era na verdade o fantasma de Naroka? Isso aconteceu depois que a coruja voou. Ela pode realmente tirar a alma de um humano? Sim, Naroka foi uma das testemunhas do incidente do Bruxo que aconteceu naquela época… Se eu não tivesse ouvido a Grande Irmã e saído à noite, poderia ter sido comigo que o padre faria a última cerimônia. Heh, ele provavelmente cuspiria em mim…”
Reimund não conversou com ele. Ele ficou do lado de fora da casa de dois andares e lamentou silenciosamente Naroka.
Depois que Lumian controlou seus pensamentos, viu Leah, Ryan e Valentine se aproximando.
— Aconteceu alguma coisa aqui? — Leah perguntou antes que Lumian pudesse cumprimentá-la.
Eles viram muitas pessoas reunidas na estrada.
Lumian suspirou e disse: — Meus repolhos, uma velhinha honrada faleceu.
— Então por que vocês estão todos do lado de fora? — Leah perguntou sem oferecer condolências, não totalmente convencida pela explicação de Lumian.
Ela ainda estava usando as mesmas roupas de antes.
Lumian fez um gesto óbvio de avaliação, o que deixou Leah em pânico.
— O que está errado? — Ryan perguntou.
Lumian sorriu. — Vocês definitivamente não são moradores de Dariège.
— Somos de Bigorre, — Ryan respondeu francamente.
Bigorre era a capital da província de Riston, na República Intis, enquanto Dariège era uma cidade na fronteira sul da província de Riston. Cobria uma grande área, incluindo a aldeia de Cordu.
Lumian assentiu. — Não é de admirar que você não conheça os costumes da região de Dariège.
Inicialmente, ele pensou que esses três estrangeiros eram funcionários de Dariège, mas descobriu-se que eram da capital da província, Bigorre.
Lumian atualizou silenciosamente seu julgamento sobre Leah e companhia. “Parece que o status deles é muito maior do que eu esperava…”
Leah perguntou com interesse: — Que tipo de costumes? Você pode nos contar?
Lumian planejava estabelecer um bom relacionamento com eles, então sorriu e disse: — Vocês são meus repolhos.
— Como você sabe, cada um tem seu horóscopo correspondente. E na região de Dariège, também acreditamos que cada família tem seu próprio horóscopo que determina a quantidade de providência que recebe. A morte e o funeral da família, principalmente do chefe da casa, serão com base na providência.
— Para não afetar o horóscopo e manter a providência, colocaremos a falecida no centro da família antes do enterro, que é a cozinha. Depois, cortaremos alguns cabelos e unhas e os manteremos em casa para sempre, sem permitir que sejam descobertos por nenhum hóspede.
— Nesse momento, se uma pessoa que vai ao funeral entrar em casa, isso afetará o horóscopo correspondente e tirará uma parte de sua providência. Portanto, comparecemos ao funeral de luto lá fora. No máximo, olharemos pela porta e esperaremos no cemitério ao lado da catedral.
— Entendo, — Ryan assentiu em compreensão. — Todas as catedrais em todas as regiões têm ossos sagrados armazenados. ‘O sábio está para sempre onde está uma parte de seu corpo.’
Ele se virou para a casa de Naroka, tirou a cartola, colocou-a contra o peito e começou a lamentar.
Leah e Valentine também expressaram suas condolências.
Quando terminaram, Lumian disse-lhes: — Vou até a porta dar uma olhada nela. Vejo vocês mais tarde, meus repolhos”
— Tudo bem, — Ryan respondeu com um aceno gentil.
Lumian baixou a voz e acrescentou: — Vou ajudá-lo a encontrar aquele livre bleu.
Antes que Leah e os outros pudessem responder, ele deu um passo para o lado e sorriu.
— Por que vocês usam as mesmas roupas todos os dias?
— Não podemos nos importar muito com as aparências quando estamos em um país estrangeiro por longos períodos, — Ryan explicou simplesmente, enquanto Leah inconscientemente tocava o sino prateado pendurado em seu véu.
Depois de se despedir de Valentine e dos outros, Lumian caminhou até a porta de Naroka.
Ele teve que ficar na fila por um tempo antes de finalmente chegar a sua vez.
Lumian parou na porta e olhou para a cozinha à frente.
O cadáver de Naroka ainda não havia sido colocado no caixão. Estava deitado tranquilamente numa cama simples feita de alguns bancos.
Suas unhas estavam aparadas e seu cabelo branco e fino estava muito mais arrumado do que antes.
Seu rosto estava pálido e suas rugas aprofundaram as linhas de seu rosto. Lumian não se atreveu a olhar para ela por muito tempo.
“Comparado com quando a vi antes do amanhecer, seu rosto está ainda mais branco,” Lumian pensou consigo mesmo enquanto fazia uma leve reverência antes de sair pela porta.
No caminho para o cemitério com Reimund, Lumian de repente deu um tapa na cabeça.
— Sacrebleu,1 esqueci de informar Aurore.
— O que você está esperando? — Reimund perguntou, entendendo a importância de manter Aurore informada.
Aurore não gostava de ficar fora a maior parte do tempo. Ela realmente não era mantida informada se não fosse por seu irmão.
Lumian viu uma oportunidade e disse: — Coincidentemente, este lugar não fica longe da sua casa. Empreste-me seu livre bleu por dois dias. Algumas páginas minhas foram roídas por ratos, então preciso copiá-las.
— Ok, — Reimund concordou.
De qualquer forma, ainda faltava algum tempo para o enterro.
…
Lumian voltou para casa e escondeu o livre bleu antes de informar Aurore sobre o falecimento de Naroka.
Ela não pôde deixar de suspirar.
— Como esperado, algo aconteceu. Gostaria de saber se foi causado por aquela coruja…
— Eu também suspeito, — concordou Lumian, repetindo sua irmã.
Aurore acenou lentamente e disse: — Você não deve sair de casa depois de escurecer. Você tem que encontrar uma maneira de avisar as pessoas que estavam procurando a lenda do Bruxo com você.
Lumian já havia assustado Reimund com a morte de Naroka, tendo acabado de perguntar sobre a lenda do Bruxo há dois dias, e o instruiu a não sair à noite por enquanto. — Tudo bem, — ele respondeu.
— Naroka é uma boa pessoa. Vou trocar de roupa e ir ao funeral dela, — disse Aurore, caminhando em direção às escadas. — Você quer vir comigo ou quer ler alguns livros e fazer um teste antes de ir?
“Por que eu faria testes em um momento como este?” Lumian não conseguia entender bem a linha de pensamento da irmã.
Considerando que precisava comparar os livres bleu, disse a Aurore: — Vou fazer um teste antes de ir.
— Muito bom. — Aurore ficou bastante satisfeita.
Depois que Aurore saiu, a expressão de Lumian escureceu.
Ele subiu ao segundo andar e entrou no escritório. Ele pegou o livre bleu que pegara emprestado de Reimund e comparou-o com o que tinha em casa, onde parte das palavras havia sido cortada.
O tempo passou lentamente enquanto Lumian juntava as palavras correspondentes, uma por uma, e as escrevia em um pedaço de papel.
Ele fez ajustes de acordo com a extensão das duas frases, e logo o conteúdo de um possível pedido de ajuda apareceu diante dele: “Precisamos de ajuda o mais rápido possível.”