Circle of Inevitability – Capítulos 111 ao 120 - Anime Center BR

Circle of Inevitability – Capítulos 111 ao 120

Capítulo 111 – Mensageiro

Combo 37/50


Agarrando a lâmpada de carboneto, Lumian subiu os degraus de pedra.

Logo, a luz apareceu à frente, acompanhada por uma cacofonia de ruídos. Emergindo do subterrâneo silencioso, era como se o mundo inteiro tivesse ganhado vida.

Lumian acelerou o passo, girando a válvula da lâmpada de carboneto com a mão direita, impedindo que as gotas de água pingassem na pilha de carboneto abaixo. À medida que o gás acetileno se extinguiu, as chamas na boca de metal desapareceram gradualmente.

Só então, ele teve um vislumbre da cena lá fora.

Prédios altos e baixos pareciam ter solidificado no momento do colapso, inclinados ou prestes a desabar, mas permanecendo teimosamente em pé.

Os pedestres usavam roupas velhas ou esfarrapadas, e discussões e xingamentos enchiam o ar, o barulho nunca diminuía.

Na saída subterrânea, Lumian avistou um prédio de cinco andares chamado Auberge du Coq Doré.

Os dois andares superiores do edifício acastanhado pareciam acréscimos posteriores, contrastando com as paredes e pilares da era Roselle, arcos, grandes janelas e padrões nos andares inferiores. Parecia tão simplista que poderia ter sido transplantado de Cordu.

Carregando a mala e a luminária de metal duro, Lumian navegou entre crianças em busca de cascas de laranja e adultos brigando até chegar à entrada do Auberge du Coq Doré.

Ele olhou para o chão do hotel, cheio de catarro amarelo, papel picado, ketchup derramado e manchas de álcool. Ocasionalmente, uma horda de percevejos se reunia no teto e nas paredes.

Se suas mãos estivessem livres, Lumian teria aplaudido a cena.

O Antigo Bar de Cordu era muito mais limpo que isso!

Ele encontrou uma rota sem sujeira e dirigiu-se à recepção em ritmo moderado.

Uma mulher rechonchuda de meia-idade estava sentada ali, com o vestido branco-acinzentado manchado de óleo e o cabelo castanho preso em um coque simples.

Ela olhou para Lumian com seus olhos azuis, não se incomodando com o desdém e a resistência em seu rosto.

— Esta é a melhor e mais barata pousada da Rue Anarchie, na área do mercado. Mas o proprietário é um avarento que não suporta contratar faxineiras. Ele só contrata freelancers1 para limpá-lo uma vez por semana.

— Ele economiza no seu salário também? — Lumian perguntou, fingindo ingenuidade.

Isso irritou a mulher.

— Você quer um quarto ou não?

— Sim. — Lumian rapidamente esclareceu sua intenção, parecendo assustado. — Gostaria de saber o preço.

A mulher se acalmou.

— Depende do quarto. Os dois andares superiores custam 3 verl d’or por semana e os dois últimos custam 5 verl d’or. Se isso for demais, você pode bater de porta em porta e perguntar quem está disposto a dividir a cama ou alugar espaço por 1 a 1,5 verl d’or por semana.

— Dê-me um quarto nos dois andares inferiores. — Lumian concluiu que seria mais fácil escapar, fosse pulando de uma janela ou subindo as escadas.

A mulher gorda o avaliou.

— Pague 15 verl d’or adiantado durante todo o mês e é seu.

— Por que o desconto? — Lumian fingiu a ignorância de um caipira novo na cidade.

A mulher zombou.

— Muitas pessoas não têm escolha a não ser mudar-se ou deixar Trier depois de uma semana ou duas. Este lugar é ao mesmo tempo o céu e o inferno.

Lumian tirou três notas azuis claras de 5 verl d’or e as entregou.

A moeda era toda em denominações de 5 verl d’or, apresentando o busto do primeiro presidente da República Intis, Levanx, junto com agricultores e pastores trabalhadores na frente, e a cordilheira Hornacis no verso.

Ao receber o mês inteiro de aluguel, a expressão da mulher gordinha relaxou visivelmente. Ela pegou duas chaves de latão amarradas e as jogou para Lumian.

— Quarto 207 no segundo andar. Há uma pequena lanchonete no térreo e um bar no porão. Você encontrará enxofre na gaveta da mesa da sala para ajudar a afastar esses malditos insetos. Meu nome é Fels. Se precisar de alguma coisa, venha até mim.

— Obrigado, Madame Fels. — Lumian pegou as chaves, pegou a mala e a luminária de carboneto e subiu para o segundo andar.

Ao subir, notou jornais e papel rosa barato colados nas paredes, embora alguns já tivessem sido descascados, expondo as rachaduras que deveriam esconder e uma abundância de percevejos.

O segundo andar continha oito quartos e dois banheiros. Cada quarto era apertado, com uma cama à direita. Uma mesa aninhada entre a beira da cama e a parede ficava abaixo da janela, uma cadeira frágil posicionada na frente dela.

Não havia outros móveis, mas fileiras de percevejos rastejavam pelo teto.

Tendo se acostumado com a limpeza de Aurore, Lumian largou a mala e a luminária de carboneto, abriu a gaveta e tirou um pouco de enxofre. Acendeu-o com um fósforo e, à medida que o cheiro pungente encheu o quarto, os percevejos fugiram.

Em segundos, Lumian detectou o cheiro sulfúrico vindo do quarto ao lado.

Quase simultaneamente, alguns percevejos voltaram em busca de refúgio.

Ele rapidamente entendeu a situação: ele havia espantado seus percevejos para o quarto adjacente e o inquilino usou enxofre para afugentá-los e devolvê-los.

Divertido, Lumian se abaixou, abriu a mala e tirou caneta e papel.

Em meio ao forte cheiro de enxofre, ele sentou-se à mesa de madeira e começou a escrever.

“Honorável Madame Mágica,”

“Cheguei em Trier conforme combinado. Por favor, informe sobre meus próximos passos, em qual organização ingressar e como contatá-la…”

“Os dois psicólogos estarão disponíveis em breve? Quando posso receber tratamento?”

“Você tem alguma nova pista sobre Guillaume Bénet e Madame Pualis?”

Depois de escrever a carta, Lumian pegou uma vela laranja no quarto da irmã.

Iluminando-o com sua espiritualidade, o aroma de frutas cítricas e lavanda envolveu o ar.

Instintivamente, ele fechou os olhos, sua expressão se acalmou.

Depois de ficar em silêncio por um ou dois minutos, Lumian usou a adaga ritual de prata para santificar a vela e criar uma parede de espiritualidade. Ele então pingou óleo essencial na chama.

Com os preparativos concluídos, colocou a carta da Mágica no altar, um meio para convocar um mensageiro e identificar o encantamento.

Lumian recuou, observando o fogo laranja enevoado, e murmurou no antigo Hermes: — Eu!

Um vento invisível girou dentro da parede espiritual, escurecendo a sala.

Mudando para Hermes, ele continuou: — Eu invoco em meu nome: O espírito que vagueia pelo infundado, uma criatura do mundo inferior que é amigável aos humanos, um mensageiro que pertence exclusivamente à Mágica.

Enquanto o vento uivava, a chama da vela ficou azul-escura, lançando uma atmosfera sinistra e fria.

Lumian se concentrou na vela, aguardando o mensageiro da Madame Mágica.

Após alguns segundos de silêncio, a carta no altar flutuou no ar. Surpreso, Lumian olhou para cima e encontrou uma boneca do tamanho do antebraço de um homem empoleirada no topo da janela.

Com longos cabelos loiros, olhos azuis claros, pele branca e um lindo vestido dourado claro, a boneca tinha características surpreendentemente realistas, mas bizarras.

No segundo seguinte, a carta pousou na mão lisa e brilhante da boneca, sem qualquer textura de pele.

— Você é a mensageira da Madame Mágica? — Lumian perguntou.

boneca baixou lentamente a cabeça, a figura de Lumian refletida em seus olhos azuis claros e desfocados.

Sua voz, etérea e raivosa, respondeu: — Escolha um ambiente mais limpo da próxima vez!

Com isso, a boneca desapareceu junto com a carta.

Lumian ficou atordoado por um momento antes de murmurar: — Aurore não disse que apenas o altar precisava estar limpo e arrumado?

Ao olhar ao redor, ele notou vários cadáveres de percevejos no chão.

A sala agora estava livre de insetos.

“Isso é melhor que enxofre…” Lumian coçou o queixo e encerrou o ritual de invocação.

Lumian costumava limpar o quarto antes de se agachar ao lado da mala para pegar seus produtos de higiene pessoal.

Os cadernos de bruxaria de cor escura de Aurore estavam intactos no fundo.

Durante sua viagem a Trier, Lumian já os havia estudado sem encontrar nada suspeito. Aurore não era de registrar seus pensamentos pessoais ou minúcias diárias; seu caderno de bruxaria era puramente dedicado ao conhecimento místico, cheio de encantamentos, símbolos e princípios para a seleção de ingredientes.

Provavelmente devido à tendência de Aurore em manter notas detalhadas, a maioria dos feitiços incluía informações sobre quando e onde foram obtidos, seu custo ou os itens trocados por eles.

Lumian percebeu que a Sociedade de Pesquisa de Babuínos de Cabelos Encaracolados provavelmente tinha vários grupos de interesse. Aurore frequentemente participava de reuniões da ‘Academia’, onde muitos feitiços eram trocados entre os membros. Ela também participou de intercâmbios com outros grupos, ocasionalmente adquirindo conhecimentos místicos e feitiços de eventos como o Dia da Mentira.

Não encontrando nada de errado nos cadernos, Lumian resolveu continuar sua investigação após consultar os psicólogos e localizar Padre e Madame Pualis.

Ele sabia que sua irmã não teria mencionado o caderno sem razão naquele momento crítico. Deve ter havido uma mensagem importante que ela desejava transmitir.

Olhando para os cadernos de capa escura, Lumian decidiu estudar os conhecimentos registrados de sua irmã na ordem inversa, começando naquela noite.

Embora usar feitiços em combate fosse quase impossível para um Caçador, entendê-los poderia ajudá-lo a identificar quaisquer problemas com o conhecimento místico correspondente ou detectar anormalidades.

Com seus pertences arrumados, o estômago de Lumian roncou de fome.

Ele se levantou e olhou para a janela. A luz fraca do crepúsculo permitiu-lhe ver vagamente seu reflexo no vidro.

Seu cabelo, agora tingido de loiro e crescido, mal disfarçava suas feições. Vestido com camisa branca, colete preto e terno escuro, sua expressão fria e indiferente o fazia parecer anos mais velho. Até Guillaume Bénet o acharia apenas vagamente familiar.

Lumian deu um tapinha no rosto dele, forçando um sorriso, antes de abrir a porta e sair.

  1. nao vou traduzir pq tenho certeza que alguem que lê ldm nao é pau no cu o suficiente para naao saber oq significa[↩]

Capítulo 112 – Charlie

Combo 38/50


Na adega mal iluminada do Auberge du Coq Doré, um bar aconchegante tinha espaço suficiente para 20 a 30 clientes.

No momento em que Lumian entrou, viu um homem pular em uma pequena mesa redonda, com cerveja na mão, e se dirigir ao punhado de clientes ao seu redor:

— Senhoras e senhores, prestem atenção! Eu experimentei algo inacreditável há dois dias!

Pela pouca luz das lâmpadas de vapor na parede, Lumian percebeu que o homem era bastante jovem, com cerca de 22 ou 23 anos. Ele tinha cabelo curto e castanho claro e rosto bem barbeado, que estava vermelho, provavelmente por causa do álcool.

Vestindo uma camisa de linho, calça preta e sapatilhas de couro, o homem tinha pouco mais de 1,7 metro de altura. No entanto, seus membros excepcionalmente curtos fizeram com que ele parecesse ter cerca de 1,6 metros.

Balançando os braços atarracados e arrastando as palavras, ele continuou: — Quão incrível foi? Vou lhe dizer, mudou toda a minha perspectiva sobre a fé. Como um crente no Deus do Vapor e da Maquinaria, agora estou pronto para me converter ao Eterno Sol Ardente!

— Escute, isso não é surpreendente?

— Você pode imaginar como eu estava faminto depois de cinco dias? Perdi meu emprego e fui demitido por aquele gerente imprestável. Não consegui encontrar trabalho mesmo depois de esgotar minhas economias.

— Durante cinco dias passei fome, mal conseguindo sair da cama. Estava à beira da morte. Sabe como é isso? Oh, que Deus te abençoe e nunca deixe você descobrir.

— Naquele momento, não suportava a ideia de morrer assim. Vim para Trier para fazer fortuna e tinha que fazer alguma coisa. Foi quando notei o retrato de Santa Viève na parede.

— Sim, com muito esforço, consegui me levantar, ajoelhar-me diante dela e orar por sua ajuda. Eu ainda acreditava no Deus do Vapor e da Maquinaria, mas o que um homem faminto não faria? Orar não poderia doer, certo?

— Cinco minutos depois de terminar de orar, um velho amigo apareceu e viu meu estado terrível. Ele próprio não tinha muita coisa, mas me lembrou que eu havia alugado uma lamparina de querosene para usar à noite. O depósito foi de 35 coppets…

— Deus, eu tinha esquecido completamente. Com a ajuda do meu amigo, devolvi a lamparina e usei o dinheiro para comprar pão e meio litro de bebida barata. O pão estava frio e úmido, como se tivesse sido mergulhado em massa. O álcool estava um pouco estranho e fraco, mas foi a refeição mais deliciosa que já comi. Senhoras e senhores, renasci!

— Hoje encontrei um novo emprego e amanhã, durante o intervalo, acenderei uma vela na Catedral da Santa Viève mais próxima!

Santa Viève era um anjo mulher mencionado na Bíblia da Igreja do Eterno Sol Ardente. Ela era um dos anjos da guarda da cidade em Trier. Os outros dois eram figuras proeminentes da Igreja do Deus do Vapor e da Maquinaria.

Lumian observou os olhos azuis do jovem brilhando de entusiasmo enquanto ele caminhava lentamente em direção ao bar.

O barman, que polia um copo com um pano, olhou para o orador na mesa redonda e riu.

— Charlie nunca conseguia ficar quieto. Sempre falando.

Com trinta e poucos anos, o barman ostentava uma barba fina e castanha escura circulando a boca, e seu cabelo da mesma cor estava preso em um rabo de cavalo artisticamente casual.

Lumian sentou-se no bar e perguntou com um sorriso: — Ele está falando a verdade?

— Quem sabe? — O barman encolheu os ombros. — Você deve ter ouvido o provérbio: é melhor confiar em uma cobra do que em um Reemiano. Charlie é de Reem.

As províncias de Reem e Riston vieram do sul. Seus sotaques eram semelhantes, mas eram províncias montanhosas mais parecidas com Lenburg.

Lumian refletiu em voz alta: — Não acho que esse seja o provérbio completo. Sinto que há mais do que isso.

Os olhos azuis do barman brilharam de diversão quando ele respondeu: — Você está certo. Esse provérbio é mais longo do que você imagina.

— Confie em um Loenese em vez de em um Reemiano. Confie em uma cobra em vez de em um Reemiano, mas nunca confie nos ilhéus.

As ilhas referiam-se ao arquipélago do Mar da Névoa, a oeste de Intis. Esta era uma das colônias ultramarinas da República. Os ilhéus frequentemente desempenhavam papéis de bandidos e vigaristas em Trier.

Sem esperar que Lumian perguntasse mais, o barman lançou um olhar zombeteiro para Charlie, ainda falando monotonamente, e sussurrou: — Se ele realmente passou por isso, certamente não sabe que o retrato de Santa Viève não está em seu quarto.

— Então de quem é? — Lumian perguntou divertido.

O barman lutou para reprimir o riso.

— Charlie está hospedado no quarto 504. O inquilino anterior frequentava a Rue de la Muraille do Quartier de la Princesse Rouge. A imagem no quarto era de uma das prostitutas mais famosas de Trier há alguns anos, Susanna Matisse.

— Pense só. Charlie acredita que está orando a um anjo pedindo ajuda, mas na verdade está orando a uma prostituta. Ele até se sente sortudo por ter escapado da fome e conseguido um novo emprego. Que irônico!

— De fato, — Lumian concordou.

Foi uma cena além de sua imaginação mais selvagem. A realidade às vezes era mais estranha que a ficção.

Ele então acrescentou: — Contanto que funcione.

O barman não prosseguiu no assunto e perguntou: — O que posso oferecer para você?

— Um copo de absinto de erva-doce. — Lumian bateu no balcão do bar com o dedo, sinalizando que estava imerso em pensamentos. — Que tipo de comida você tem aqui?

— Que tal caldo DuVar? Três licks por concha, — sugeriu o barman.

Três licks equivaliam a 15 coppets — 0,15 verl d’or.

Lumian pareceu intrigado.

— O que é caldo DuVar?

O barman explicou casualmente: — O dono de um restaurante, DuVar, inventou isso. Ele cozinhou carne, chucrute e nabos juntos para criar um caldo saudável. Por fim, adicionou queijo e migalhas de pão. Apenas uma porção pode encher seu estômago, e tem gosto muito bom. Como resultado, DuVar agora é rico e se mudou para o Quartier de la Maison d’Opéra.

Lumian estava atualmente no Le Marché du Quartier du Gentleman, também conhecido como bairro comercial, situado na margem sul do rio Srenzo, lar de inúmeras favelas. O Quartier de la Maison d’Opéra ficava na margem norte do rio Srenzo, perto da Avenida du Boulevard, uma das áreas centrais da República.

As muralhas da cidade de Trier abrangiam um total de 20 bairros.

— Parece bom. — Lumian assentiu com um sorriso. — Eu quero um.

Embora pudesse restaurar seu estado físico às 6 da manhã e não se preocupar com a fome, comer era uma das poucas coisas que o fazia se sentir vivo.

O barman assentiu e perguntou: — Pequena mamãe ou cambalhota?

— O quê? — Lumian não escondeu sua confusão.

Imperturbável, o barman explicou calmamente: — Essa é uma gíria comum em bares, cafés e cervejarias de Trier. Pequena mamãe significa uma pequena dose de absinto de erva-doce. Cambalhota é uma dose dupla. Tomate-vermelho tem suco de romã adicionado e, com hortelã, é chamado Papagaio. Há muitos mais assim. Amigo, você ainda tem muito que aprender em Trier.

— Pequena mamãe, então. — Lumian percebeu o desdém sutil do barman pelos estrangeiros, mas não se importou.

— Sete licks, — anunciou o barman enquanto abria uma pequena taça.

Era mais caro do que o absinto do Antigo Bar de Cordu, mas era típico em lugares sujeitos a impostos municipais.

Logo, um copo de absinto verde claro, brilhando hipnoticamente, apareceu diante de Lumian.

Ele pegou e tomou um gole. O leve e persistente amargor do sabor refrescante se espalhou e penetrou em seu cérebro.

Enquanto Lumian esperava a garçonete trazer o caldo de DuVar, ele notou potes de vidro, mangueiras, válvulas, engrenagens e outros itens empilhados ao lado do balcão do bar.

— O que é isso? — Ele olhou curiosamente para o barman.

Enquanto o barman limpava um copo, respondeu casualmente: — Deixado por um inquilino anterior. Ele acredita no Deus do Vapor e da Maquinaria. Ele sempre acha que tem talento para mecânica e acumulou muitos itens semelhantes.

— Onde ele está agora? — Lumian perguntou, brincando mesmo sabendo que a resposta não seria agradável.

O barman parou por alguns segundos antes de responder: — Ele foi para a fábrica e dizem que se distraiu enquanto trabalhava e foi puxado para dentro do maquinário. Metade dele foi esmagado.

Lumian não se intrometeu mais. Ele se virou para examinar as peças semi-montadas e mergulhou em pensamentos profundos.

Alguns segundos depois, saiu do banco do bar e se agachou ao lado do balcão, mexendo na pilha.

O barman olhou para ele, mas não interferiu. Ele só avisou Lumian quando o caldo de DuVar chegou da cozinha.

Depois de se ocupar um pouco, Lumian voltou ao banco do bar e provou o caldo farto com uma colher.

O rico aroma da carne, o sabor do queijo, o picante chucrute e a doçura do nabo fundiram-se para criar um sabor inesquecível. As migalhas de pão embebidas em suco eram a joia do prato.

Lumian não esperava que uma sopa que custasse três licks incluísse vários pedaços de carne. Poderia realmente encher o estômago de um adulto.

Assim que o prato ficou vazio, Lumian tirou um lenço e enxugou a boca. Ele se agachou ao lado das peças semi-montadas e retomou seu trabalho.

Dez minutos depois, colocou uma máquina no balcão do bar.

Acima da máquina havia uma jarra de vidro e abaixo dela havia componentes complexos conectados a duas mangueiras de borracha.

Lumian então pediu um copo de água limpa e despejou o absinto de erva-doce restante, tingindo o líquido incolor de um verde claro.

Por fim, inseriu uma das mangueiras de borracha no copo.

O elegante barman, com o cabelo preso em um rabo de cavalo, observou atentamente e perguntou, intrigado: — O que é isso?

— Invenção minha, — declarou Lumian, traçando um Emblema Sagrado triangular em seu peito. — Também acredito no Deus do Vapor e da Maquinaria, com algumas conquistas impressionantes no campo da mecânica.

Ele então estendeu a mão esquerda com luva preta e gesticulou em direção à máquina.

— Esta é uma máquina inovadora. Seus efeitos estão além dos seus sonhos mais loucos!

— O que é que isso pode fazer? — Charlie, suspeito de ter rezado para uma prostituta, aproximou-se do balcão do bar com uma garrafa de cerveja e uma expressão curiosa.

Lumian explicou, ao mesmo tempo solene e animado: — É chamado de Instrumento do Idiota. Ele testa a estupidez e a inteligência de uma pessoa.

— Realmente? — Charlie e o barman pareciam céticos.

Lumian detalhou sua ideia: — É fácil de usar. Sopre no tubo até que o líquido do copo suba para a jarra de vidro e forme bolhas.

— Ao observar essas bolhas, podemos determinar o índice de estupidez ou inteligência correspondente.

Intrigado, Charlie disse depois de observar Lumian: — Fascinante. Exatamente como eu esperaria de um crente no Deus do Vapor e da Maquinaria.

Ele pegou a mangueira de borracha exposta e soprou nela.

O líquido verde claro no copo fluiu pelas engrenagens, válvulas e outros componentes interconectados, subindo para a jarra de vidro acima e formando uma pequena bolha.

— O que isso diz? — Charlie perguntou, ansioso pelo resultado.

A boca de Lumian se curvou em um sorriso malicioso.

— Meu amigo, os princípios desta máquina são bastante simples. Quando você acredita em mim o suficiente para realmente soprar nessa mangueira, é quando você prova que é um ‘idiota muito idiota’.

A expressão de Charlie congelou, seus olhos ardendo de raiva.

O barman ao lado dele riu.

— Excelente! — ele exclamou, genuinamente impressionado.

Lumian sorriu para Charlie, esperando pela explosão.

Depois de alguns segundos tensos, Charlie engoliu a raiva e virou-se para os clientes que estavam ouvindo sua história.

— Senhoras e senhores, eis o que descobri: uma máquina inovadora! Ela pode testar seu índice de inteligência!

Capítulo 113 – Inquilinos

Combo 39/50


— Você é uma pessoa tão interessante!

O bêbado Charlie passou o braço em volta do ombro de Lumian enquanto eles saíam cambaleando do bar barulhento.

Lá dentro, quase 20 pessoas cantavam, jogavam e gritavam, liberando emoções reprimidas.

Em momentos como este, eles não pareciam indigentes com salários escassos, mas sim reis e rainhas.

— Achei que você interpretaria Billy B com eles. — Lumian passou o braço nas costas de Charlie e sorriu enquanto se dirigiam para a escada que levava ao andar de cima.

Billy B era um jogo de azar popular em Trier, algo que Lumian descobrira recentemente.

Ao contrário do Fighting Evil, favorito de Trierences, Billy B só precisava de um pedaço de papel. Dependendo do número de jogadores, o distribuidor desenhou uma grade de quadrados, variando de 9 a 64. A cada quadrado foi atribuído um número, permitindo aos participantes fazerem suas apostas.

O distribuidor então determinava um número da sorte por sorteio, lançamento de moedas ou de dados. O vencedor levava o pote inteiro.

Se ninguém ganhasse, o dinheiro ia para o distribuidor.

Os clientes do bar subterrâneo Auberge du Coq Dors eram moradores locais ou pessoas pobres das proximidades. Suas carteiras eram escassas, então apostavam principalmente em álcool em vez de dinheiro. Por exemplo, um jogo de Billy B só pode recompensar o vencedor com um copo de bebida comprado com o dinheiro arrecadado de todos.

Charlie soltou um longo arroto.

— Não recebi meu salário desta semana. Não posso ser muito indulgente!

Ele se virou para Lumian, com entusiasmo na voz: — Você sabia? Agora sou aprendiz de atendente no Hotel du Cygne Blanc, aquele na Rue Neuve, no Quartier des Thermes.

— O que isso significa? Isso significa que posso usar camisa branca, colete vermelho e terno preto. Farei um laço elegante e ganharei 65 verl d’or por mês! Quando me tornar atendente pleno, ouvi dizer que na alta temporada posso ganhar 7 verl d’or por dia só com gorjetas!

— Quando ficar rico, abrirei meu próprio motel… não, um hotel. Quando chegar a hora, contratarei você como capataz assistente. Aquele idiota anda por aí de fraque, criticando, e ganha 150 verl d’or por mês!

“Os atendentes aprendizes ganham um pouco mais que os trabalhadores braçais…” Lumian cheirava a álcool, mas seus olhos permaneciam claros. Ele assentiu quase imperceptivelmente.

Ele se lembrava de ter lido um jornal em seu escritório no início do ano, gabando-se de que os trabalhadores de Trier ganhavam cerca de 700 verl d’or anualmente.

Na época, Lumian não tinha um conceito claro sobre. Não sabia se era muito ou pouco. Como vagabundo, ele só se preocupava com a quantidade de comida que conseguia conseguir todos os dias e se pessoas gentis poderiam lhe oferecer alguns licks. O rendimento dos aldeões de Cordu consistia principalmente em bens, por isso ele compreendia os preços específicos e o valor de várias notas, mas faltava-lhe uma compreensão mais ampla.

Claro, isso também acontecia porque a renda de Aurore era muito alta, então ele dificilmente se preocupava com as finanças da família.

Pelo que Lumian sabia, a fama de Aurore lhe trouxe uma renda significativa através da venda de livros e contratos. Os royalties do ano passado se aproximaram de 130 mil verl d’or.

No entanto, Aurore gastava tanto quanto ganhava. Feitiços, materiais e conhecimento arcano foram responsáveis ​​pela maior parte de suas despesas. Ela também poderia estar apoiando membros em dificuldades da Sociedade de Pesquisa de Babuínos de Cabelos Encaracolados ou doando para instituições de caridade administradas pelo governo ou pela igreja.

No entanto, o que intrigou Lumian foi a ausência de um comprovante de depósito em casa quando ele deixou Cordu.

Ele sabia muito bem que Aurore era uma poupadora. Gastar muito só foi possível porque ela guardou muito dinheiro no Banco Suchit e em outras instituições.

Por um momento, Lumian suspeitou que os companheiros de Guillaume Bénet o tivessem arrebatado enquanto ele e a irmã eram usados ​​como sacrifícios ou recipientes.

Enquanto Lumian e Charlie seguiam para o segundo andar, com os braços pendurados nos ombros um do outro, um grito raivoso cortou o ar.

— Seu desgraçado!

Bang! Uma porta bateu, abafando o lamento e deixando apenas ecos no corredor.

Uma pessoa com um fraque preto engomado aproximou-se da escada vinda do outro lado do corredor.

Ele era um homem jovem, mais ou menos da idade de Charlie. Seu cabelo amarelo-acastanhado estava penteado em uma divisão 30-70, e seus olhos castanhos escuros eram desprovidos de expressão. Seus lábios finos estavam pressionados firmemente.

Muito bonito, segurava uma cartola preta na mão, parecendo mais pertencer a uma festa da alta sociedade do que ao Auberge du Coq Doré.

Seguindo os gritos do homem estava uma voz de mulher, pesada de dor e desespero.

Enquanto Charlie observava o homem desaparecer escada abaixo, seu rosto corado se contorceu.

— Que bastardo!

— Você o conhece? — Lumian ainda estava bastante preocupado com seus vizinhos. Afinal, ele poderia ficar aqui por um tempo. Quanto mais soubesse sobre o que estava ao seu redor, mais seguro estaria.

Charlie zombou: — Esse é Laurent, filho da Sra. Lakazan do quarto 201.

— Sra. Lakazan trabalha como escrava, consertando meias e fazendo todo tipo de artesanato 16 horas por dia apenas para sustentar aquele bastardo. Ele sempre se veste bem e gasta o dinheiro dela em cafés chiques, alegando que está se misturando à alta sociedade em busca de oportunidades de sucesso!

— Heh, ele se acha muito talentoso

Antes que Charlie pudesse terminar, outra discussão acalorada irrompeu entre um homem e uma mulher próxima.

Eles lançaram insultos um ao outro.

— No terceiro andar há um casal complicado. Eles ficam assim todos os dias quando estão quase falidos. — Charlie estalou a língua e sorriu. — Meu amigo, você vai ter que se acostumar. Este é o bairro comercial, Rue Anarchie, o Auberge du Coq Doré. Temos os seriamente doentes, os falidos, os vigaristas, os estrangeiros que nunca saem da pousada e só bebem lá embaixo, as meninas de rua falidas, os lunáticos que acordam em frenesi, os pedreiros desempregados, os veteranos, os velhos miseráveis ​​e os criminosos procurados…

— Todos deveriam agradecer ao Monsieur Ive por ser tão tolerante. Contanto que eles não deixem de pagar o aluguel, ele é bastante indulgente.

— Monsieur Ive… O estalajadeiro? O avarento que Madame Fels mencionou? — Lumian perguntou.

Charlie sorriu e respondeu: — É ele, um sujeito gentil, mas mesquinho. Ele até fornece enxofre grátis para todos!

— Croaa,1 não vejo Monsieur Ive há alguns dias. Estou realmente preocupado que ele tente salvar alguns coppets visitando alguma mulher qualquer na Rue Anarchie e pegue alguma doença desagradável em vez de patrocinar a Rue de la Muraille ou o Quartier de la Princesse Rouge

Enquanto ele falava, Charlie acenou com a mão.

— Ciel, croaa. Vou para a cama. Tenho que sair amanhã às seis da manhã e chegar ao hotel às sete.

— Croaa, se você não conseguir encontrar um emprego, me avise. Vou apresentá-lo a um faz-tudo em nosso hotel. Você pode ganhar 50 verl d’or por mês. Fique por aqui o tempo suficiente e você poderá ganhar 75. Além disso, há comida de graça. Recebemos até um litro de vinho todas as noites!

— Tudo bem. — Lumian sorriu ao observar Charlie subir as escadas.

Ao mesmo tempo, murmurou para si mesmo: ‘A simples provocação não ajuda muito na digestão da poção…’

Ele montou o Instrumento Idiota no bar para irritar todo mundo. O resultado foi um sucesso, mas não melhorou a digestão da poção.

Durante sua viagem de Dariège a Trier, Lumian frequentemente provocava outras pessoas. Às vezes sentia a poção sendo digerida, mas na maioria das vezes não ganhava nada.

Se não conseguisse encontrar uma maneira melhor de atuar, suspeitava que levaria pelo menos um ano para digerir completamente a poção Provocador.

Voltando para o quarto 207, Lumian ouviu um ataque de tosse vindo do andar de cima. Ele ouviu uma mulher repreendendo seu amante, chamando-o de preguiçoso lixo. Houve tiros, seguidos pelo som de um grupo perseguindo alguém do lado de fora.

Assim era a vida no Auberge du Coq Doré e na Rue Anarchie.

Charlie dissera que nem mesmo um policial ousaria andar ali sozinho à noite. Ele precisava de um parceiro para reforçar sua coragem.

Tirando a chave de latão, Lumian abriu a porta e voltou para seu quarto.

Os percevejos pareciam ter percebido alguma coisa e ficaram longe.

Lumian cheirou o enxofre e ergueu os olhos. Uma carta estava silenciosamente sobre a mesa de madeira ao lado da janela.

Ele deu alguns passos à frente e pegou o pedaço de papel dobrado.

“A resposta da Madame Mágica? Lumian refletiu, desdobrando a carta e lendo-a sob o luar carmesim que entrava pela janela.

“Estou feliz que você chegou em Trier sem problemas. Isso mostra que você dominou a técnica básica de escapar da captura e obteve experiência navegando no ponto fraco da sociedade.”

“Às 15h30 deste domingo, um psicólogo atenderá você no estande D da Cafeteria de Mason, localizado no Quartier du Jardin Botanique.”

“Nos próximos dias, sua missão será se aventurar perto das catacumbas no Quartier de l’Observatoire e localizar um homem chamado Osta Trul. Ele muitas vezes se disfarça de feiticeiro para enganar turistas e moradores locais.”

“Por qualquer meio necessário, conquiste a confiança de Osta Trul e revele seus poderes quando chegar a hora certa.”

O Quartier du Jardin Botanique e o Quartier de l’Observatoire ficavam a oeste do Le Marché du Quartier du Gentleman, adjacentes um ao outro. O primeiro ficava mais ao sul, enquanto o segundo ficava mais perto ao norte, junto ao rio Srenzo.

Lumian leu a resposta da Madame Mágica repetidas vezes, memorizando os locais, horários e nomes relevantes. Então riscou um fósforo e queimou a carta.

Feito tudo isso, dirigiu-se ao banheiro mais próximo para se refrescar. Depois, pegou a Mercúrio Caído, embrulhou-se em um pano preto, tirou o casaco e deitou-se na cama.

O teto infestado de percevejos encontrou seu olhar, e os sons fracos de tosse, choro e discussão encheram a sala.

Pouco depois, o casal complicado anunciou a reconciliação através de um exercício apaixonado e vigoroso, acompanhado de gemidos desinibidos.

Lá fora, na rua, algumas vozes grosseiras cantavam canções vulgares, pontuadas por tiros, seguidas de xingamentos, choque de postes e som de armas afiadas perfurando carne.

Comparadas a Cordu, as noites aqui estavam longe de ser tranquilas.

  1. desculpa, mas era pra ser a onomatopeia de arroto[↩]

Capítulo 114 – Experiência de Vida

Combo 40/50


Ao amanhecer do início de maio, o céu permanecia envolto em escuridão. A lua vermelha poente e as estrelas espalhadas lançavam um brilho fraco, diminuindo a escuridão apenas o suficiente para revelar silhuetas próximas.

Lumian acordou cedo e se refrescou. Vestiu o traje formal do dia anterior e uma cartola de abas largas. Fez o possível para sorrir para seu reflexo na janela de vidro que servia de espelho.

Enquanto descia as escadas, passos apressados ​​ecoaram lá de cima.

Logo, Charlie apareceu.

Ele ainda vestia uma camisa de linho, calças pretas e sapatos de couro sem alças. Sua pele corada havia ficado um pouco mais pálida e seus pequenos olhos azuis traíam uma fadiga inconfundível.

— Bom dia, Ciel, — Charlie cumprimentou Lumian com entusiasmo.

Ele parecia bastante apressado.

— Você não deveria ter saído há muito tempo? — Lumian perguntou, sorrindo.

Ele só acordou para se refrescar quando ouviu o relógio da catedral badalar seis horas. Charlie deveria ter partido até então.

Charlie abaixou a cabeça, ajustando as roupas enquanto murmurava: — Bebi demais ontem à noite e tive um sonho maravilhoso. Eu não queria acordar.

Enquanto conversavam, a dupla chegou ao andar térreo. Eles atravessaram o corredor sombrio e mal iluminado em direção à porta que refletia a luz das estrelas.

Um casal de idosos, grisalhos e ligeiramente curvados, abriu a porta. Na casa dos sessenta anos, ambos eram baixos, o homem mal tinha 1,65 metro de altura e a mulher ainda mais baixa. Suas jaquetas escuras e vestidos de tecido amarelado estavam esfarrapados e manchados de óleo.

— Quem são eles? — Lumian esperava que Madame Fels ou o avarento proprietário do motel, Monsieur Ive, fossem os encarregados de abrir a porta pela manhã.

Charlie não diminuiu o ritmo, explicando casualmente: — Monsieur Ruhr e Madame Michel, eles são os vigaristas que mencionei ontem. Eles enganam os turistas para que comprem coisas.

— Eles acordam cedo todos os dias e a Madame Fels os manda abrir a porta da pousada. Em troca, ela fecha os olhos para a bagunça e o fedor que eles criam em seu quarto.

— Você acredita nisso? Eles não trocaram de roupa desde que me mudei. Já se passaram sete meses. Sete meses!

“Não admira que seja tão imundo…” Lumian conseguia se lembrar de seus próprios dias sujos como um vagabundo, mas a propensão de Aurore para a limpeza ainda o fazia franzir a testa.

Charlie saiu rapidamente do Auberge du Coq Doré,1 perguntando intrigado: — Ciel, por que você acordou tão cedo também?

Ao saírem para a rua, uma cena movimentada se desenrolou diante deles.

Inúmeros trabalhadores, escriturários e operários corriam em suas roupas cinza, azul, preta e marrom, parando ocasionalmente para comprar comida de vendedores ambulantes.

Algumas mulheres carregando cestos de madeira moviam-se com mais calma. Elas vagaram entre vários vendedores, comparando preços e qualidade.

Os vendedores ambulantes se alinhavam em ambos os lados da Rue Anarchie, ocupando metade da rua e deixando espaço apenas para a passagem de uma carruagem.

Eles gritaram alto, disputando a atenção dos clientes.

— Whiskey Azedo, Whisky de Maçã Azedo. Dois licks por litro!

— Peixes de água doce do viveiro de peixes de Bondi!

— Bacalhau e arenque frescos, venha dar uma olhada!

— Pão de cebola, um lick, só um lick!

— Carne salgada, deliciosa carne salgada!

— Sabonetes e perucas importados de Loen!

— Compre para as crianças uma garrafa de refrigerante refrescante!

— Molho picante, pasta de soja, cebolinha, água de aipo!

Absorvendo os sons e a energia da Rue Anarchie, Lumian virou-se para Charlie e sorriu.

— Acabei de chegar em Trier e não consegui dormir. Pensei em dar uma volta e ver se conseguia encontrar um emprego adequado.

Como Caçador, era fundamental para ele se familiarizar com a área que frequentava e compreender os seus meandros.

Seria tarde demais para se adaptar se algo acontecesse.

Charlie assentiu com conhecimento de causa.

Ele disse com entusiasmo: — Você poderia tentar a sorte na Rue des Blusas Blanches2. Fica entre Le Marché du Gentleman3 e a estação de locomotivas a vapor.

— Muitos gerentes de motéis, hotéis e restaurantes gostam de conversar na cafeteria de lá. Eles aproveitam a oportunidade para contratar lavadoras de louça, limpadores de chão, faxineiras e atendentes aprendizes.

— Se você tem dinheiro, lembre-se de comprar uma bebida para os garçons da cafeteria. Eles apresentarão você à pessoa certa e lhe darão a chance de um emprego melhor.

Sem esperar pela resposta de Lumian, Charlie compartilhou sua sabedoria.

— Você deve prestar atenção à sua aparência. Faça o que eu faço.

Enquanto falava, ele ergueu as mãos e deu um tapa no rosto, imitando um tapa de verdade, mas com menos força.

Logo, a tez pálida de Charlie recuperou seu rosado.

— Olhe, olhe. — Ele apontou para si mesmo presunçosamente e disse: — Não pareço mais enérgico? Esses gerentes não querem contratar alguém que pareça particularmente indigente e doentio. Eles acham que isso trará problemas. Eles não estão dispostos a lhe dar um emprego decente ou reduzirão seu salário. Se você fizer isso antes de entrar na cafeteria como eu, vai fazer você parecer alguém que tem onde dormir e tomar café da manhã. Mas ir muito cedo não funcionará, pois esta ‘cor-de-rosa’ desaparecerá gradualmente.

Essa técnica inteligente de procura de emprego era nova para Lumian, um ex-vagabundo. Ele achou isso fascinante.

Ele sorriu e assentiu.

— Ainda tenho dinheiro para alugar uma casa e encher a barriga. Não preciso fazer isso agora, mas quem sabe se precisarei disso no futuro?

Ele deliberadamente não escondeu o fato de que ainda tinha uma boa quantidade de verl d’or.

E se uma alma generosa estivesse disposta a doar outra quantia?

Charlie expressou sua compreensão e tirou 5 coppets em moedas de cobre para comprar pão de cebola de um vendedor próximo.

Lumian sentiu uma pontada de familiaridade.

Durante sua passagem pelas ruas, se conseguisse dinheiro, sua primeira escolha era o pão de cebola.

Era barato e o aroma da cebola permanecia, criando a ilusão de ter acabado de fazer uma refeição satisfatória.

Lumian também comprou pão de cebola para o café da manhã. Ao lado de Charlie, eles navegaram pelos numerosos vendedores e saíram da Rue Anarchie.

— Adoro as manhãs aqui! — Charlie olhou para trás e suspirou com seu zelo característico. — Aqueles gangsters que merecem apodrecer no inferno não podem acordar tão cedo. Eles não podem destruir esta vitalidade cativante.

Ele então acenou para Lumian.

— Tenho que pegar o metrô. Caso contrário, chegarei atrasado hoje. Esse maldito capataz certamente reduzirá meu salário!

Depois de se despedir de Charlie, Lumian vagou pela Rue Anarchie, explorando a área como um turista curioso.

Le Marché du Quartier du Gentleman estava situado na margem sul do rio Srenzo, no canto sudeste de Trier, oficialmente conhecido como Quartier 134. Trier ostentava vários bairros nomeados por números, cada um com seus próprios nomes históricos e característicos. Até mesmo as autoridades às vezes usavam esses nomes coloquiais.

O bairro ganhou o nome de Le Marché du Gentleman. A proximidade com o rio Srenzo permitiu a instalação de uma estação de locomotivas a vapor, que atendia aos viajantes do sul de Intis.

Cercada pelo mercado e pela estação de locomotivas a vapor, muitas de suas ruas eram notoriamente perigosas e repletas de habitantes empobrecidos. Era uma das favelas de Trier.

Ao norte do distrito comercial, na margem sul do rio Srenzo, ficava o Quartier 5, o Quartier de la Cathédrale Commémorative5 ou Quartier Universitaire6Trier Commun College7Trier Higher Mining College8 e Intis Academy of Fine Arts9 estavam todos localizados aqui.

A nordeste da cidade, na margem norte do rio Srenzo, ficava o Quartier 12, conhecido como Noel Quartier10. Abrigava a Casa dos Veteranos, o Hospital dos Soldados Feridos e várias grandes instalações médicas.

A noroeste do distrito comercial ficava o Quartier 6 — Quartier de l’Observatoire — onde Lumian planejava visitar mais tarde. Continha a entrada principal das catacumbas.

A sudoeste do distrito comercial ficava o Quartier 14, conhecido como Quartier du Jardin Botanique11. No domingo, Lumian estava agendado para tratamento com uma psicóloga na Cafeteria de Mason. Esta área também foi chamada de Quartier du Sans-Culottes devido às grandes fábricas localizadas ao sul do jardim botânico.

E assim, Lumian passou quase a manhã inteira percorrendo as ruas do Le Marché du Quartier du Gentleman.

À medida que o meio-dia se aproximava, Lumian retornou às proximidades da estação ferroviária de Suhit, com a intenção de encontrar um lugar para almoçar antes de ir para as catacumbas em busca do falso feiticeiro, Osta Trul.

Caminhando, Lumian avistou o casal — Ruhr e Michel — que também residia no Auberge du Coq Doré.

Eles vendiam pacotes de itens embrulhados em sacos de papel para grupos que pareciam ser estrangeiros.

À medida que Lumian se aproximava, Ruhr, de cabelos grisalhos, esfarrapados e enrugados, inclinou-se para ele e baixou a voz. — Você quer fotos de uma Dona de Ateliê de Rua?

— O que é uma Dona de Ateliê de Rua? — Lumian não escondeu sua confusão ou repulsa pelo fedor de Ruhr.

Ruhr acenou com o fino saco de papel em sua mão e sussurrou: — Em Trier, lindas garotas que modelam para pintores são chamadas de ‘Dona de Ateliê de Rua’.

— Com o advento das câmeras e dos fotógrafos, eles também começaram a tirar fotos. Como você pode imaginar, algumas dessas fotos foram vendidas a pintores como material de referência, enquanto outras…

Ruhr deu um sorriso malicioso e apertou o saco de papel em sua mão novamente.

— Quatro licks por saco, com duas fotos dentro!

— Outros os vendem por mais de 10 licks!

Lumian riu.

— Monsieur Ruhr, Madame Michel, esta é a lembrança que você vende aos turistas?

Ao ouvir Lumian chamá-los pelo nome, as expressões de Ruhr e Michel mudaram dramaticamente.

Eles se viraram, tentando escapar, mas Lumian foi mais rápido e segurou o ombro de Ruhr.

Michel, que abriu caminho no meio da multidão, percebeu que o marido não conseguia acompanhar o ritmo e voltou com o rosto marcado pela amargura.

— Também moro no Auberge du Coq Doré. Meu nome é Ciel, — Lumian se apresentou.

Finalmente, percebendo como Lumian os conhecia, o casal deu um suspiro de alívio e olhou para ele suplicante. — Qual é o problema, Monsieur Ciel?

— Que tipo de fotos você está vendendo? — Lumian perguntou curioso.

Ruhr respondeu timidamente: — Fotos panorâmicas do rio Srenzo, bem como imagens dos castelos e palácios de Trier.

— Ninguém está causando problemas para você? — Lumian perguntou, sorrindo.

Ruhr engoliu em seco e disse: — As pessoas que as compram não se atrevem a abri-las na hora ou a nos confrontar mais tarde. Elas se sentem culpadas.

— Além disso, nenhum policial irá incomodá-lo se você vender fotos de paisagens. — Lumian assentiu. — Alguém realmente vende aqueles tipos fotos?

— Sim, — Ruhr confirmou. — No mês passado, a polícia prendeu um grupo de fotógrafos e negociantes de arte. Eles disseram que confiscaram mais de 10.000 fotos. Se ao menos eles pudessem entregá-las para nós. Quem sabe por quanto poderíamos vendê-las!

Madame Michel, também com rosto enrugado e corpo curvado, murmurou: — Havia uma modelo hospedada em nossa pousada anteriormente, mas ela não tem aparecido ultimamente. Talvez tenha se tornado amante de algum pintor, ou talvez tenha sido capturada para ser Dona de Ateliê de Rua.

“O Auberge du Coq Doré tem uma grande variedade de hóspedes…” Lumian perguntou com interesse: — Quanto você pode ganhar em uma semana enganando estrangeiros para que comprem fotos?

— Nós as vendemos muito barato. Cerca de 10 verl d’or, — respondeu Ruhr, com o olhar ligeiramente evasivo.

“Pelo que parece, são mais de 10 verl d’or, mas não muito mais. Vou contar como 12 verl d’or, que é 1.200 coppet ou 240 licks… 60 tolos caem nessa toda semana?” Lumian examinou a praça e expressou seu desdém pela inteligência média das pessoas de lá.

Quanto a Ruhr e Michel, correram um risco significativo para enganar os outros; no entanto, eles ganhavam apenas cerca de 50 verl d’or por mês, muito menos do que os aprendizes atendentes ou mesmo trabalhadores.

Observando suas costas ligeiramente curvadas, corpo esbelto e rostos enrugados, Lumian entendeu que não era que eles não quisessem fazer um trabalho mais legítimo por melhores salários, mas sim que não conseguiam lidar com esses trabalhos.

Com um aceno de mão, ele deixou a estação de locomotivas a vapor de Suhit e seguiu para noroeste em direção ao Quartier de l’Observatoire.

  1. a partir de agora, substantivos em francês não serão traduzidos, eu apenas deixarei uma nota do que significa na primeira vez que forem mencionados.. pq? pq nao sei frances né porra…[↩]
  2. Rua das Blusas Brancas[↩]
  3. O Mercado dos Cavalheiros[↩]
  4. Bairro 13[↩]
  5. Bairro da Catedral de Festas[↩]
  6. Bairro Universitário[↩]
  7. Faculdade Comum de Trier[↩]
  8. Faculdade Superior de Mineração de Trier[↩]
  9. Academia de Belas Artes de Intis[↩]
  10. Bairro Natalino[↩]
  11. Bairro do Jardim Botânico[↩]

Capítulo 115 – Lenda

Combo 41/50


A entrada principal das catacumbas ficava na Place du Purgatoire1, perto do observatório. A estrutura que encerra a entrada era sustentada por grandes pilares, coroados por uma cúpula adornada com intrincadas esculturas em pedra, que lembram um salão memorial em miniatura ou a base de um imenso mausoléu.

Ao se aproximar, Lumian notou uma multidão de 20 a 30 pessoas já reunida perto da escada. Seus trajes variavam, mas a maioria estava vestida formalmente, tanto homens quanto mulheres.

Um homem na casa dos trinta, vestindo um colete azul, calças amarelas e uma barba espessa, estava diante da multidão. Seus cachos castanhos emolduravam os olhos voltados para cima, e ele segurava uma lâmpada de metal duro preto e apagada.

Dirigindo-se ao grupo reunido, ele anunciou em voz alta: — Sou Kendall, um dos administradores das catacumbas. Estarei guiando vocês pelo ossuário hoje.

— Todo mundo tem uma vela branca? Se não, por favor me avise imediatamente.

“Turistas?” Os olhos de Lumian percorreram a escadaria de pedra atrás de Kendall.

Mergulhou na escuridão impenetrável, com seu fim escondido da vista.

Ao lado de Kendall havia uma enorme porta de madeira, metade dela estampada com o Emblema Sagrado do Sol em ouro, enquanto a outra metade era adornada com um intrincado triângulo cheio de símbolos de vapor, alavancas, engrenagens e muito mais.

Ao receber a confirmação, Kendall acendeu sua lâmpada de carboneto e conduziu o grupo para as profundezas abaixo. Os turistas seguiam atrás dele, alguns carregando lanternas.

Lumian o seguiu, mantendo uma distância de quatro a cinco metros. Agarrando a lâmpada de carboneto que obtivera de Ramayes, desceu a escada em passo constante.

Graças à sua audição aprimorada pela poção Beyonder, Lumian ouviu facilmente o discurso informativo de Kendall na frente.

— Depois de 138 degraus, você se encontrará 26 metros abaixo das ruas de Trier, cercado pelos restos mortais de quase 50 gerações de Trienenses.

— Essa é uma estimativa conservadora. Na verdade, a história de alguns desses ossários remonta à época anterior…

— Quarenta e sete anos atrás, não havia mais espaço para os mortos no Cimetière des Innocents2 ou no Cimetière des Prêtres3. — Ossos brancos estavam espalhados e o fedor levava os moradores próximos a protestarem diariamente, exigindo a realocação do cemitério…

— No final das contas, a Prefeitura optou pelo subsolo. Eles reaproveitaram sepulturas da Quarta Época e pedreiras subterrâneas adjacentes, criando uma vasta tumba… Hoje, você visitará apenas uma mera fração dela…

A voz de Kendall ecoou pela escadaria silenciosa e interminável, imbuindo a atmosfera com uma estranha sensação de mau presságio.

Enquanto Lumian continuava descendo, um caminho ladeado por pilares e paredes de pedra apareceu.

Esta passagem, ao contrário de outras áreas subterrâneas, era bem conservada e frequentemente reparada. Era suave, ampla e muito sinistra. Uma brisa gelada ocasionalmente varria o corredor.

Lampiões a gás foram estrategicamente colocados ao longo do caminho, lançando uma luz fraca e amarelada que permitia que as sombras se misturassem à iluminação, estendendo-se pela escuridão.

Kendall, vestido com seu colete azul, alertou mais uma vez os visitantes: — Fiquem por perto e não se afastem!

— Existem inúmeras áreas subterrâneas sobre as quais sabemos pouco. Se você se perder, será quase impossível encontrá-lo.

— Não se desvie do caminho. Existem passagens que levam a câmaras mais profundas e sinistras. Os espíritos malévolos da Quarta Época espreitam naquela escuridão. Louvado seja o Sol e a Luz. Aderindo às rotas endossadas pelos padres, podemos evitar todos os perigos.

Alguns visitantes estenderam os braços em louvor ao Sol, enquanto outros traçaram um triângulo sobre o peito.

Depois de seguir Kendall e os outros por quase 200 metros, Lumian avistou a tumba subterrânea.

Diante dele havia uma caverna rochosa natural, modificada ao longo do tempo. Suas paredes eram adornadas com intrincados relevos de caveiras, braços esqueléticos, girassóis e símbolos de vapor.

Acima da entrada, duas inscrições em Intis ordenavam:

“Pare!”

“O Império da Morte está à frente!”

Kendall, o administrador da catacumba, voltou-se para os visitantes mais uma vez: — Apaguem suas lanternas e acendam as velas brancas. Todos devem fazer isso!

— Se você preferir não entrar na catacumba, sinta-se à vontade para explorar esta área, mas não se afaste muito. É muito fácil perder o rumo e isso seria um problema.

— Se você se separar do grupo dentro da catacumba, não entre em pânico. Localize uma placa. Se não houver, olhe para cima e siga a linha preta desenhada no teto da tumba. Ela o guiará de volta à entrada principal…

Logo, as lanternas foram apagadas e substituídas pelo brilho bruxuleante da luz laranja das velas.

Os visitantes acenderam suas velas brancas e seguiram Kendall até as catacumbas.

Lumian observou à distância, observando enquanto as chamas amareladas se fundiam em um riacho que serpenteava na escuridão.

Ele se absteve de entrar. Agarrando sua lâmpada de carboneto, circulou a entrada da tumba, com a intenção de localizar o falso feiticeiro, Osta Trul.

Poucos minutos depois, Lumian descobriu uma pequena fogueira.

Ao lado de um pilar, musgo úmido grudava na parede de pedra acima.

Um homem estava sentado numa pedra atrás do fogo, vestido com uma túnica preta com capuz. Seu nariz grande e olhos castanhos escuros eram emoldurados por uma barba loira que obscurecia seu queixo. Ele olhou atentamente para as chamas dançantes.

Lumian se aproximou e perguntou: — Você é Osta Trul?

O homem encapuzado ergueu o olhar para encontrar o de Lumian e respondeu com uma voz deliberadamente contida e severa: — Alma perdida, por que você me procurou?

Chamas e sombras dançavam no rosto de Osta Trul, obscurecendo sua idade. Ele parecia ter algo entre 30 e 40 anos. Lumian falou seriamente: — Ouvi rumores sobre você. Dizem que você é um bruxo místico que pode me ajudar a resolver meu dilema. — Osta Trul respondeu em tom baixo e magnético: — A bruxaria é um tabu. A bruxaria é uma maldição. Não prestarei ajuda sem justa causa.

— O que devo fazer? — Lumian pressionou, a ansiedade evidente em sua voz.

Osta respondeu suavemente: — A essência da bruxaria reside na troca equivalente. Revele primeiro a natureza da ajuda que você procura.

“Troca equivalente. Você tem lido muitas novels?” Lumian suprimiu a vontade de ridicularizá-lo e antagonizá-lo, adotando uma expressão de dor. — Eu perdi todos que eu amava. Sinto-me abandonado pelo mundo. O sono me escapa todas as noites. Quero esquecer esses fardos e começar de novo.

Osta Trul examinou o semblante de Lumian, não encontrando nenhum vestígio de engano. Ele assentiu levemente. — Eu também sofri grandes perdas. É uma maldição nascida da bruxaria. Posso simpatizar com seus sentimentos e pensamentos. No entanto, esquecer a dor não é uma tarefa simples.

— Muito bem… — Lumian exalou um longo suspiro e virou-se para partir.

Osta gritou apressadamente: — Espere. Só porque é difícil não significa que seja impossível.

— Realmente? — Lumian jogou a cabeça para trás, a excitação inundando suas feições.

Osta assentiu sutilmente e continuou: — Você já ouviu falar da Fonte das Mulheres Samaritanas?

— Não. — Lumian balançou a cabeça. Osta olhou para a fogueira acesa e explicou simplesmente: — Em um dos ossários dentro das catacumbas, há uma fonte turva conhecida como Fonte das Mulheres Samaritanas, ou Fonte do Esquecimento. Beba dela e toda a sua dor será apagada da memória.

— Claro, é uma invenção. A fonte é apenas uma poça deixada por um erro de construção durante a criação das catacumbas. Os administradores transformaram isso em lenda. — Enquanto os olhos de Lumian brilhavam de esperança, Osta Trul continuou: — No entanto, como um Bruxo, posso revelar que nas profundezas deste reino subterrâneo existe uma verdadeira Fonte das Mulheres Samaritanas, escondida em uma tumba que se acredita ser uma relíquia da Quarta Época.

— Muitos cadáveres lá cantam: ‘Beba as águas felizes do esquecimento e purgue-se da dor primordial.’

— Posso ajudá-lo a recuperá-la, mas o princípio da troca equivalente deve ser honrado. Vai custar 100 verl d’or.

“100 verl d’or? O preço pedido não é um pouco baixo demais? Como alguém pode acreditar que adquirir um item lendário tão perigoso como este poderia ser genuíno sem exigir alguns milhares de verl d’or?” Lumian estava ouvindo atentamente, mas o serviço absurdamente desvalorizado o divertiu.

Como poderia uma água de nascente de valor inestimável não valer mais do que o salário de dois meses de um aprendiz de atendente?

Ele havia lido sobre a lenda da Fonte das Mulheres Samaritanas em Física. Aurore murmurou uma palavra que ele não entendeu. Sua pronúncia provavelmente lembrava ‘Vovó Meng’. Fisica também afirmou que a Fonte das Mulheres Samaritanas era uma lenda inventada pelos administradores das catacumbas, mas eles estavam convencidos de que a história tinha suas origens. A Fonte do Esquecimento pode existir genuinamente em algum lugar do Continente Norte. Os olhos de Lumian se arregalaram quando ele correu para o lado de Osta. Agarrando seu ombro, ele exclamou: — Sério?

Osta afastou a mão e assentiu com serenidade.

— Esta é a promessa de um Bruxo.

— Tudo bem, tudo bem! — Lumian respondeu emocionado.

— Mas eu não trouxe tanto dinheiro. Vou voltar agora e voltar aqui para encontrar você amanhã?

Osta assentiu com aprovação.

— Sem problemas.

Lumian expressou profusamente sua gratidão, pegou a lâmpada de carboneto e partiu entusiasmado.

Uma vez fora da vista de Osta, o sorriso de Lumian desapareceu. Ele levantou a palma da mão direita e cheirou a leve fragrância. Antes de chegar ao Quartier de l’Observatoire, borrifou deliberadamente uma colônia de qualidade inferior na mão direita e tocou o corpo de Osta.

De volta à superfície, Lumian escondeu-se atrás de um pilar e esperou pacientemente.

O céu escureceu gradualmente. À medida que o crepúsculo descia, ele detectou o leve e familiar aroma de colônia.

Lumian não se apressou em perseguir Osta. Depois de um tempo, emergiu de seu esconderijo e da fragrância persistente, mantendo uma distância tão grande que era quase invisível. Carruagens passavam zunindo por ele e engenhocas mecânicas extravagantes apareciam esporadicamente.

  1. Praça do Purgatório[↩]
  2. Cemitério dos Inocentes[↩]
  3. Cemitério dos Sacerdotes[↩]

Capítulo 116 – Cidade da Moda

Combo 42/50


De manhã, enquanto fazia compras no Le Marché du Quartier du Gentleman, Lumian notou que os cidadãos de Trier se vestiam de maneira bastante casual, ou talvez com ousadia. Isso ficou evidente nas mulheres que usavam mangas curtas que expunham os antebraços ou roupas com ombros recortados que exibiam as clavículas. Por outro lado, não faltaram trajes peculiares.

Na região de Dariège, um feiticeiro como Osta, vestindo uma túnica preta e um capuz, lembrava uma lenda antiga. Era impossível para ele andar abertamente pelas ruas sem ser parado pela polícia. Em Trier, porém, os transeuntes não lhe prestaram atenção.

Essas aparições eram muito comuns. Pessoas vestidas com uma variedade de roupas antiquadas.

Osta Trul foi sem dúvida mais cauteloso. Periodicamente, olhava por cima do ombro para localizar alguém suspeito, mas Lumian mantinha uma distância tão grande que nenhum deles estava na linha de visão do outro.

Lumian acompanhou Osta de uma rua a outra, seguindo o leve aroma da colônia de qualidade inferior.

À medida que as lâmpadas a gás iluminavam os arredores, Osta virou uma rua protegida por cúpulas de vidro e estruturas de aço.

Este lugar era bem iluminado e repleto de lojas de luxo. Mármore liso pavimentava o chão e a área fervilhava de pedestres — um forte contraste com as ruelas em ruínas do Marché du Quartier du Gentleman.

“Este é o ‘arcade’ que Aurore mencionou?” Lumian observou Osta parando em frente a uma loja para admirar a vitrine. Ele também diminuiu a velocidade, examinando a área.

Ele rapidamente identificou pessoas envolvidas em comportamentos incomuns.

Vestidos com trajes formais, homens e mulheres passeavam com tartarugas de tamanhos variados.

As tartarugas avançaram lentamente e seus donos, segurando uma corda, seguiram-nas vagarosamente.

Ao ver um homem vestido com um terno formal preto e cartola de seda passeando com uma tartaruga, Lumian não pôde deixar de perguntar: — Meu amigo, o que você está fazendo?

O homem virou a cabeça, revelando um rosto empoado.

Ele respondeu com um sorriso: — Estrangeiro, estou simplesmente dando um passeio, passeando com minha tartaruga.

— Por que uma tartaruga? — Lumian não escondeu sua perplexidade.

O cavalheiro impecavelmente preparado pareceu satisfeito em compartilhar sua filosofia de moda. Ele sorriu e explicou: — A maioria dos Trienenses gosta de caminhar sem pressa, mas não consegue compreender a essência do lazer e da elegância. Eles sempre andam rapidamente e parecem apressados.

— Um verdadeiro passeio é mais lento que uma tartaruga. Assim, caminhamos com as tartarugas e deixamos que elas conduzam para enfatizar nosso ritmo tranquilo.

— É um medidor para medir a velocidade de caminhada e um dispositivo para quantificar a elegância.

Lumian teve que admitir que os Trienenses expandiram consistentemente sua perspectiva como um caipira de Cordu.

Aurore não poderia nem ter escrito uma história sobre passear com uma tartaruga!

— Um verdadeiro Trienense! — Lumian aplaudiu, seu tom cheio de sarcasmo.

Lamentavelmente, o cavalheiro não conseguiu captar a mensagem subjacente. Ele sorriu modestamente e continuou a seguir a tartaruga em um ritmo lento.

Em pouco tempo, Osta chegou ao outro lado da galeria.

Lumian esperou um momento antes de segui-lo com cautela.

Depois de sair da galeria, Osta se posicionou perto da parada de transporte público próxima.

Em poucos minutos, uma enorme carruagem, puxada por dois cavalos, chegou.

A carruagem foi dividida em dois níveis. O exterior pintado de amarelo trazia palavras como “Linha 7” escritas em Intis. O motorista vestia um casaco verde curto e um chapéu de abas largas para se proteger da chuva.

Quando a carruagem parou, um condutor com chapéu pequeno, camisa listrada e calças pouco atraentes apareceu na porta aberta, examinando cada passageiro que embarcava na carruagem como se fossem criminosos.

Osta foi a terceira pessoa a embarcar. Escolheu um assento na janela, observando os transeuntes e os homens e mulheres que se sentavam.

Lumian observou à distância, sem se aproximar.

Foi só quando a carruagem da Linha 7 se afastou que ele acelerou o passo, praticamente correndo para alcançá-lo.

Dada a velocidade relativamente lenta do transporte público e a regra de parar em todas as estações, Lumian não se preocupou em ficar para trás.

Enquanto corria, alguns pedestres olhavam para ele com curiosidade, enquanto alguns até corriam ao lado, aparentemente acreditando que esta era a última tendência.

“Há algo errado com seu cérebro?” Lumian não sabia se ria ou chorava.

Depois de três paradas, viu Osta Trul desembarcar da carruagem pública. Esta área já fazia parte do Le Marché du Quartier du Gentleman.

Osta atravessou duas ruas e entrou na Rue des Bluses Blanches, que Charlie mencionara. Ele entrou em um antigo prédio bege de número 20.

Lumian parou em frente a uma banca de jornais na rua, pegou um jornal e folheou-o casualmente.

Simultaneamente, observou a entrada do prédio com o canto do olho.

— São 11 coppets por um, — lembrou o dono da banca a Lumian ao perceber que estava apenas lendo e não comprando.

Lumian segurava um exemplar do Le Petit Trienense1 e, sem se importar, tirou duas moedas de 5 e uma de 1 coppet e jogou-as nos outros jornais.

O dono da banca de jornal ficou em silêncio.

Lumian continuou lendo o jornal.

“Prefeitura discutindo novos planos de preços com a empresa de abastecimento de água…”

“Valéry considera o consumismo um fetiche…”

“O maior projeto da história da humanidade busca colaboração…”

O anúncio final chamou a atenção de Lumian porque o lembrou de algo: cheirava a um brincalhão ou a uma estratégia de vigarista! Enquanto Lumian ficava de olho no apartamento, leu o conteúdo correspondente com interesse crescente.

“O futuro da humanidade está nas estrelas. A história da humanidade foi forjada pelos corajosos para explorar.”

“Nesta era de rápido progresso tecnológico, faltam-nos pioneiros da civilização, visionários com visão e visão excepcionais, e aventureiros com coragem. Da última vez, ficamos presos no Mar Berserk.”

“Desta vez, estamos presos na atmosfera. No entanto, a civilização humana e a tecnologia irão, sem dúvida, superar todos os obstáculos e perigos para forjar um futuro verdadeiro.”

“Procuramos colaborar com todos os sonhadores para construir uma ponte espacial que nos permitirá caminhar da superfície até a lua carmesim. 

“Ponto de contato: Bulle Patil. — Método de contato: 9th Rue Saint-Martin, 5º andar, Quartier 2.”

Quanto mais Lumian lia, mais engraçado achava. Ele se viu em profunda contemplação.

Como o Rei Brincalhão de Cordu e influenciado pelas ideias excêntricas de Aurore, ele nunca havia concebido uma noção tão ultrajante, ridícula e absurda. No entanto, esses indivíduos anunciaram-na descaradamente, como se estivessem certos de que poderiam enganar uma multidão.

“Ainda estou subestimando o QI humano médio?” Lumian acariciou seu queixo com a mão esquerda enluvada.

Naquele momento, viu um grupo de pessoas se aproximando do antigo apartamento da Rue des Blushes Blanches, nº 20.

O líder era um cavalheiro de aparência distinta, com cartola de seda e terno preto. Ele tinha um perfil esculpido, um cachimbo cor de mogno na boca e um anel de diamante na mão esquerda que brilhava sob a luz. Os homens corpulentos que cercavam o cavalheiro pareciam ameaçadores. Eles usavam camisas de lona ou jaquetas escuras, transmitindo uma sensação de gangue.

Depois que desapareceram na entrada do apartamento, Lumian se aproximou com o jornal.

Na base da escada, detectou diversas colônias simultaneamente. Uma delas era fraca e familiar — a colônia de qualidade inferior que ele aplicara em Osta. A outra era mais aromática, doce e levemente enjoativa. “Colônia de almíscar? Do homem com o cachimbo?” Lumian seguiu o cheiro até o quinto andar.

Lá, ele viu Osta Trul. O impostor vestido de feiticeiro viu-se cercado pelo mesmo grupo de indivíduos. O cavalheiro do anel de diamante bateu na testa com o cachimbo cor de mogno, sorrindo educadamente. — Não pense que você pode se livrar de nós só porque se mudou. Até que você pague toda a dívida, eu te seguirei indefinidamente, como uma sombra. —

Osta gaguejou com medo: — Em breve terei dinheiro. Posso devolver uma parte para você amanhã!

— Muito bem, — o ‘cavalheiro’ assentiu com um sorriso.

Ele então virou o cachimbo e cutucou o rosto de Osta com a ponta ainda fumegante.

Osta recuou de dor, mas não ousou emitir nenhum som.

O ‘cavalheiro’ retirou o cachimbo e disse gentilmente, mas com firmeza: — Isto é um pouco interessante. Se você não me pagar amanhã, vou arrancar um de seus dedos.

Com isso, colocou a mão no peito e curvou-se educadamente.

— Vejo você amanhã, meu amigo. — Na escada, Lumian franziu os lábios e murmurou para si mesmo: “Será que as pessoas e os cães estão aprendendo com Gehrman agora?”

À medida que a série “O Aventureiro” de Fors Wall ganhou popularidade, imitadores de Gehrman Sparrow surgiram nos continentes Norte e Sul. Frases como isto é uma cortesia básica uma dádiva ou uma maldição se espalharam por toda parte.

À medida que o grupo se aproximava, Lumian abaixou a cabeça e deu um passo para o lado, agindo como um inquilino comum encontrando bandidos.

Passos caóticos ecoaram enquanto desciam andar por andar, logo dando lugar ao silêncio. Lumian olhou na direção de Osta Trul, notando que ele já havia se retirado para seu quarto e fechado a porta de madeira.

Depois de alguma contemplação, Lumian flexionou a mão esquerda enluvada e ajustou o chapéu. Ele saiu da escada e se aproximou da porta de Osta.

Bang! Bang! Bang! Ele ergueu a mão e bateu na porta.

Depois de um momento, Osta abriu a porta, com o rosto numa mistura de choque e medo. Ele gaguejou, trêmulo: — Eu realmente não posso conseguir esse dinheiro até amanhã…

Antes que ele pudesse terminar, a figura de Lumian entrou em foco em seus olhos.

Lumian abriu os braços e perguntou com um sorriso radiante: — Surpreso?

— Você, você, você … — Osta recuou como se tivesse visto um fantasma.

Lumian o seguiu até a sala e sorriu para Osta Trul.

— Eu realmente desejo esquecer a dor do passado, mas também sou uma pessoa cautelosa. Tenho medo de ser enganado e, pior, de ser ridicularizado como um tolo.

  1. O Pequeno Trienense[↩]

Capítulo 117 – Remuneração

Combo 43/50


Osta forçou um sorriso.

— Não estou mentindo. Realmente existe uma Fonte das Mulheres Samaritanas!

— É mesmo? — Lumian se aproximou de Osta com um sorriso e disse: — Quando chegar a hora, tome um gole primeiro. Se for útil, você esquecerá que não paguei. Se for inútil, por que deveria pagar?

Por um momento, Osta ficou sem palavras. Ele só conseguiu sorrir e acenar com a cabeça.

— Confie em mim, confie em mim…

De repente, ele olhou além de Lumian, com os olhos arregalados de terror.

Lumian ‘instintivamente’ virou-se para olhar para a porta, mas não havia ninguém ali.

Aproveitando a oportunidade, Osta abaixou-se e correu para a porta aberta.

Thud!

Osta tropeçou no pé direito de Lumian, que se estendeu rapidamente, e caiu no chão. O nariz ficou azul e o rosto magro inchou.

Lumian fechou lentamente a porta, puxou uma cadeira e sentou-se. Olhou para Osta, que estava fingindo estar morto no chão, e disse: — Não me diga que você tem alta percepção espiritual e ‘viu’ uma criatura bizarra atrás de mim. Você correu até a porta para me ajudar a lidar com isso?

Osta ficou pasmo por um momento antes de se levantar e balançar a cabeça repetidamente.

— Isso mesmo, isso mesmo!

Lumian sorriu e olhou para a mesa retangular de madeira encostada na parede.

Adaga de prata, velas brancas, algumas pequenas garrafas cheias de líquidos diferentes ou vazias, duas imitações de pele de cabra e uma caixa de papel que emitia a fragrância de plantas estavam espalhadas sobre ela.

“Ele tem um certo conhecimento de misticismo…” Lumian voltou seu olhar para o inquieto Osta e perguntou: — Quem era aquele cara com o cachimbo agora há pouco?

— Barão Brignais! — Osta respondeu apressadamente. — Ele é o líder do Savoie Mob no distrito comercial.

Sabóia era o nome de uma província do interior da República Intis, que fazia fronteira com as províncias de Haut1-Hornacis e Bas2-Hornacis. Era rica em recursos minerais e tinha uma cultura popular valente.

A expressão de Osta desmoronou, o ar de mistério desapareceu.

— Um barão? Ainda existem barões? — Lumian perguntou divertido.

Desde a morte do Imperador Roselle e o estabelecimento da República, os títulos aristocráticos desapareceram da vida quotidiana.

Osta disse com medo: — Esse é um apelido que ele deu a si mesmo. Talvez seus ancestrais tivessem um título tão aristocrático.

Lumian recostou-se na cadeira e perguntou casualmente: — Por que ele veio até você? Você deve dinheiro a eles?

Vendo o comportamento inofensivo de Lumian, como se estivesse conversando com um amigo, Osta relaxou um pouco apesar do medo.

Ele disse amargamente: — Para comprar um item, peguei emprestado 3.000 verl d’or de um agiota. Mais tarde, aquele homem vendeu a dívida para Brignais.

— Devolvi pelo menos 3.000 verl d’or, mas ele me disse que ainda havia 2.000 de juros!

— Se você se arrastar por mais dois ou três meses, não deverá 2.000, mas 4.000. — Lumian observou a expressão de Osta desmoronar, o ar de mistério desapareceu.

Ele então baixou a voz e disse em um tom sedutor: — Se eu fosse você, encontraria uma maneira de atrair Brignais e seus capangas para uma pedreira. Depois, derrubaria a camada de pedra acima, enterrando-os para eternidade.

— Sem credores, sem dívidas.

Quanto mais Osta ouvia, mais em pânico ele ficava. Ele olhou para Lumian como se fosse um demônio.

Ele suspeitava que Lumian já havia planejado tal esquema, mas com Osta Trul como alvo pretendido, e não Brignais!

— Isso é assassinato! Um crime! — Osta exclamou aterrorizado.

— Fale baixo. Você não gostaria de perder sua voz permanentemente, não é? — Lumian o avisou com um sorriso. — Então você percebe que isso é crime? Alguém já lhe disse que fraude também é crime?

Osta ficou sem palavras.

Lumian levantou-se e tirou o pó das luvas.

— Só estou brincando. Estava testando seu caráter.

— O quê? — Osta ficou perplexo.

Lumian não revelou que seu verdadeiro motivo era estabelecer uma personalidade implacável e fria na mente de Osta. Seria útil durante futuras negociações.

A confiança forçada ainda era confiança!

— Parabéns por passar no meu teste. Isso prova que você não é completamente sem escrúpulos. — Lumian sorriu e abriu os braços.

Ele rapidamente conduziu a conversa de volta ao curso.

— Por que você pediu tanto dinheiro emprestado?

Ele olhou ao redor, acrescentando: — Não parece que há nada valioso aqui…

Osta quis instintivamente contar uma mentira, mas lembrou-se do aviso de Lumian.

Ele tremeu e disse: — Você… você sabe sobre poções?

— Você é realmente um Beyonder? — Lumian riu.

Vendo que Lumian sabia sobre Beyonders e poções, Osta deu um suspiro de alívio. Ele estava feliz por não ter mentido.

Qualquer história fabricada estaria repleta de buracos na frente de um verdadeiro Beyonder, facilmente exposto. Se for pego, Osta poderia acabar dormindo para sempre em algum esconderijo subterrâneo de Trier esta noite.

Respirando fundo duas vezes, Osta continuou: — Há alguns meses, peguei emprestado 3.000 verl d’or de um agiota para comprar o ingrediente principal de uma poção. Combinado com os 4.000 verl d’or que economizei, ascendi com sucesso de uma pessoa comum para um Beyonder.

— A qual Sequência você pertence? Você não consegue nem lidar com alguns bandidos? — Lumian perguntou com suspeita fingida.

Osta parecia derrotado.

— Sou um Sequência 9: Suplicante de Segredos.

— Não parece fraco. — Lumian só pôde avaliar pelo nome da poção.

Osta lamentou frustrado: — Achei que os Suplicantes de Segredos também fossem poderosos. O vendedor até afirmou que isso me permitiria ver a verdade do mundo.

— No final, além da percepção espiritual elevada, tudo que consegui foi algum conhecimento sacrificial impraticável e magia ritualística. Ocasionalmente posso sentir a presença de entidades misteriosas, assustando-me até morrer, mas não consigo nem derrotar um bandido!

— A magia ritualística deve ser útil, — observou Lumian com conhecimento de causa.

Osta parecia à beira das lágrimas.

— Sou versado em misticismo. Sou um seguidor do Eterno Sol Ardente. Como posso orar para uma entidade desconhecida? Isso é muito arriscado!

— Fuuu, existem alguns nomes honrosos no conhecimento da poção, mas são todos entidades ocultas. Só de ouvi-los é assustador. Eu não ousaria invocar a depravação, os familiares verdadeiros ou o olhar do destino!

Ele olhou para Lumian e fingiu determinação.

— Mas eu considerei isso. Se o Barão Brignais e seus capangas me encurralarem novamente, rezarei para a existência oculta e ganharei força!

Osta abriu a boca, mas fechou-a novamente, com uma expressão mais de dor do que de choro.

Ele estava falando ostensivamente sobre o Barão Brignais, mas sua verdadeira intenção era alertar Lumian para não ameaçá-lo.

Lumian estudou o rosto inquieto de Osta e concordou: — Essa é uma decisão sábia. O Barão Brignais e seus capangas subestimam um Beyonder. Se eu estivesse no lugar deles, não lhe daria a chance de chegar a um beco sem saída.

Ele então sorriu para Osta.

— Você estaria morto antes que isso acontecesse.

Osta abriu a boca, mas fechou-a novamente, com uma expressão mais de dor do que de choro.

Lumian foi até a mesa de madeira e brincou com as garrafas vazias.

— Você se mudou várias vezes, mas o Barão Brignais continua encontrando você. Suspeito que ele ou o Savoie Mob têm Beyonders ao seu lado.

Osta engasgou em estado de choque.

Lumian pegou a adaga de prata da mesa, girando-a enquanto dizia a Osta: — Posso oferecer-lhe 100 verl d’or como recompensa.

— Quê? — Osta ficou perplexo mais uma vez.

Ele percebeu que não conseguiria acompanhar o processo de pensamento de Lumian.

— Você, você ainda quer a água da nascente da Fonte das Mulheres Samaritanas? — ele se aventurou.

Lumian sorriu e respondeu: — Diga-me, isso realmente existe?

Olhando para o olhar divertido de Lumian, Osta hesitou por um momento antes de admitir: — Não tenho certeza.

Lumian acenou com a cabeça satisfeito.

— O que eu quero é que você me leve ao lugar que você mencionou, aquele onde você comprou o ingrediente principal da poção. A recompensa é 100 verl d’or.

Lumian fez esse pedido em parte porque a missão da Madame Mágica poderia estar ligada à coleta envolvendo materiais de Beyonder, e em parte porque ele precisava de um lugar semelhante para adquirir armas, materiais, Artefatos Selados e conhecimento arcano.

Osta engoliu em seco.

— E-eu posso tentar, mas precisarei da aprovação do organizador da reunião.

— Sem problemas. — Lumian tirou uma moeda de ouro e chamou Osta. — Esta Louis d’or é sua recompensa por pedir. Darei a você as 80 verl d’or restantes quando puder comparecer à reunião.

Osta não previu que sua surra se transformaria em uma oferta de emprego. Ele ficou momentaneamente estupefato.

Depois de alguns segundos, aproximou-se cautelosamente da mesa de madeira e pegou os 20 verl d’or, equivalente a 1 Louis d’or. Ele disse a Lumian: — Não tenho certeza de quando receberei uma resposta, mas o mais tardar na próxima quarta-feira. Passo o dia perto das catacumbas e durmo aqui à noite. Você pode me encontrar a qualquer hora.

Lumian assentiu, sorrindo enquanto erguia a adaga de prata na mão e a enfiava no ombro de Osta.

O sangue jorrou e Osta cambaleou para trás aterrorizado. Ele encostou-se na parede e gritou ansiosamente: — Não me mate! Não estou mentindo!

Lumian pegou uma garrafa de vidro da mesa de madeira e se aproximou de Osta com um sorriso.

— Não se preocupe. Se eu quisesse você morto, já teria feito isso.

— Isso se chama juramento de sangue. Tenho muito cuidado com engano e traição.

Enquanto Lumian falava, segurou a garrafa de vidro vazia contra o ferimento de Osta, permitindo que o sangue escorresse.

Durante esse processo, ele sorriu para Osta e disse: — Você tem uma forte compreensão do misticismo. Você deveria saber o que o sangue significa nas mãos dos outros. Não minta para mim.

— Maldição… — Por um momento, Osta não conseguiu decidir se deveria se alegrar por não ter sido morto no local ou se desesperar por seu sangue agora pertencer a um homem mais perigoso que o Barão Brignais.

Lumian não disse mais nada. Ele apertou a tampa da garrafa, rasgou uma tira de pano do quarto e jogou-a para Osta.

— Faça um curativo em seu ferimento você mesmo.

Ele não estava familiarizado com nenhuma maldição para Beyonders, mas poderia testar se o sangue expirado poderia ativar a habilidade de troca de destino da Mercúrio Caído.

Mesmo que não funcionasse, tudo o que precisava fazer era convencer Osta de que sabia lançar maldições.

Lumian olhou para Osta, que tentava desesperadamente estancar o sangramento, e perguntou casualmente: — Qual é o seu plano para lidar com o Barão Brignais?

— Com esta Louis d’or e algum dinheiro que economizei, poderei acalmá-los por uma semana, — disse Osta com um sorriso amargo. — Eles não receberão uma única coppet se cobrarem seus devedores até a morte.

  1. alto[↩]
  2. baixo[↩]

Capítulo 118 – Invocação

Combo 44/50


Lumian acenou com a cabeça, perguntando: — Você mencionou que sua percepção espiritual é bastante avançada?

Osta entrou brevemente em transe antes que um medo persistente se espalhasse por seu rosto.

Ele levou um momento para se recompor e disse: — Essa parece ser uma característica do Suplicante de Segredos. Posso sentir criaturas ocultas espreitando nas profundezas escuras, e também posso sentir o mundo real envolto em um véu espesso. Além desse véu, olhos sem emoção nos observam…

Ao terminar, Osta ofegou pesadamente. Lumian esperou pacientemente que o feiticeiro impostor recuperasse o fôlego. Quase um minuto depois, Osta exalou, dizendo: — No distrito comercial e no Quartier de l’Observatoire, está tudo bem, mas no Submundo de Trier, muitas vezes posso sentir o fim de certos caminhos. Em lugares que não consigo ver, alguma criatura me chama para chegar mais perto.

— Eu me pergunto o que aconteceria comigo se eu realmente entrasse naquela escuridão.

“Um excelente sensor místico, de fato…” Lumian zombou silenciosamente de sua Visão Espiritual de Caçador, ao mesmo tempo em que sentia que um Suplicante de Segredos não era tão inútil quanto Osta afirmava.

Osta continuou: — Às vezes, quando vejo turistas entrando nas catacumbas com velas brancas, tenho essas ilusões. Acho que é um ritual que forma um vínculo mágico com alguma entidade oculta, protegendo os turistas de serem devorados pela escuridão ou levados embora por mortos.

Lumian ficou surpreso, suspirando interiormente.

“Em termos de misticismo, um Suplicante de Segredos é bastante potente… Só que eles não são habilidosos em combate…”

Pelo relato de Osta, Lumian suspeitava que levar uma vela branca acesa para as catacumbas era de fato um ritual que permitia aos visitantes escapar dos perigos ocultos ali.

Os administradores das tumbas provavelmente sabiam disso, mas, em busca do lucro, não apenas permaneceram em silêncio, mas também incentivaram os superiores a promoverem as catacumbas como atração turística.

Lumian lembrou-se do lamento frequente de sua irmã Aurore: — O dinheiro muda as pessoas.

“Eu me pergunto, em um nível inferior, o que pode provocar a mudança de uma pessoa de forma mais eficaz: poções, bençãos ou dinheiro…” Lumian murmurou silenciosamente com uma atitude provocadora.

Ele então perguntou a Osta: — Você sentiu algum perigo espreitando na escuridão do distrito comercial?

O rosto de Osta mudou quando ele respondeu em tom sério: — Não me atrevo a me aproximar da casa incendiada no Le Marché du Quartier du Gentleman.

Na extremidade do Le Marché du Quartier du Gentleman, perto da Rue des Blusas Blanches, havia uma casa chamuscada e desabitada. Os membros do Parlamento lá há muito exigiam sua demolição e conversão em prédio comercial, mas por algum motivo a proposta nunca chegou à pauta da Prefeitura. Mesmo depois de uma década, a monstruosidade de seis andares ainda estava de pé.

“Não senti nada quando passei por aqui hoje de manhã…” Lumian se virou e foi em direção à porta.

— Vou visitá-lo novamente. Espero que você não me decepcione.

Osta, com o ferimento no ombro agora enfaixado, lançou um sorriso insinuante.

— Fique tranquilo, eu lhe darei uma resposta.

Depois de sair do quarto de Osta, Lumian de repente acelerou o passo. Num piscar de olhos, ele se agachou nas sombras da escada que levava ao telhado, olhando silenciosamente para a porta de madeira bem fechada.

Quase meia hora depois, tendo confirmado que nada estava errado, desceu lentamente as escadas.

Foi então que ele finalmente ouviu seu estômago roncar.

Olhando para a barricada improvisada de pedras, troncos, lajes de barro e itens variados com uma abertura estreita como passagem, Lumian avistou uma padaria próxima e gastou três licks para comprar meio quilo de croissants.

Ele também provou o característico refrigerante de suco de frutas de Trier.

O líquido efervescente girou enquanto o xarope de groselha se dispersava como nuvens dentro dele. A mistura custou-lhe 13 coppets.

Se ele devolvesse a garrafa de refrigerante, ele poderia recuperar 3 coppets.

Rue Anarchie, Auberge du Coq Doré.

Antes que Lumian pudesse entrar no bar do porão, o barulho e o caos chegaram aos seus ouvidos.

Pouco depois das nove horas, quase vinte pessoas lotavam o espaço. Eles se sentavam no bar ou se amontoavam em torno de algumas pequenas mesas redondas, com a atenção voltada para o barman.

O elegante barman com rabo de cavalo explicou a engenhoca no bar para um cliente desconhecido.

— Isso é chamado de Instrumento Idiota. Ele testa sua inteligência.

— Quer tentar?

O homem de jaqueta escura pareceu intrigado e perguntou: — Como faço para tentar?

O barman apontou para o tubo de borracha exposto com uma expressão solene.

— Sopre aqui até formar bolhas na jarra de vidro acima.

— Sua capacidade de produzir bolhas e seu tamanho determinam os resultados finais do teste.

Sem hesitar, o homem pegou a mangueira de borracha e soprou nela.

À medida que bolhas verde-claras emergiam da jarra de vidro em cima da máquina, todos no bar se levantaram, aplaudindo loucamente e exclamando: — Bem-vindo, idiota!

O homem pareceu perplexo por um momento antes de entender a piada. Seu rosto ficou vermelho.

Ele lançou um olhar feroz para o barman e para os clientes turbulentos antes de reprimir sua raiva e murmurar: — Interessante. Essa pegadinha é realmente incrível. Vou trazer alguns amigos para tentar amanhã.

“É para isso que servem os amigos?” Lumian zombou interiormente. Ele puxou uma banqueta e sentou-se, dizendo ao barman: — Dê-me o de sempre: um copo de absinto de erva-doce.

O barman sorriu. — Dessa vez é por minha conta. Sua máquina é fantástica. A notícia de seus poderes místicos se espalhou e as pessoas vieram especificamente para conferir. Meu negócio dobrou desde então.

— A propósito, sou Pavard Neeson, dono deste bar e pintor amador. Como devo chamá-lo?

— Ciel, — Lumian respondeu, seu sorriso inabalável.

Ele notou a diferença entre os Trienenses e os aldeões de Cordu.

Em Cordu, qualquer pessoa que fosse vítima de tal brincadeira buscaria vingança. Mas os Trienenses gostavam de encontrar novas vítimas e vê-las cair na pegadinha, aliviando o seu próprio constrangimento.

— Você tem um cérebro aguçado. Você é melhor em pegadinhas do que muitos Trienenses. — Para o barman nativo, Pavard Neeson, esse elogio foi um grande elogio.

Ele deslisou pelo balcão um copo fino cheio de um líquido alucinógeno verde-claro em direção a Lumian.

Tomando um gole de absinto, Lumian saboreou a leve amargura que mexeu com seus sentidos e o fez sentir-se vivo.

Ele fechou os olhos, absorvendo a sensação antes de perguntar: — Tenho alguns amigos que chegaram a Trier antes de mim, mas não tenho as informações de contato deles. Existe uma maneira de encontrá-los?

Pavard Neeson limpou um copo.

— Se você é rico, anuncie no Jornal de Trier. Se não for, contrate um caçador de recompensas ou um corretor de informações para ver se eles aceitam o emprego. Se você estiver sem dinheiro, volte para o seu quarto e durma. Talvez um dia você encontre seus amigos na rua.

— Alguma recomendação? Um caçador de recompensas ou corretor de informações confiável? — Lumian não estava com falta de dinheiro por enquanto e poderia receber uma ‘doação’ de um benfeitor generoso a qualquer momento, mas a publicidade nos jornais estava além de suas possibilidades. Custaria pelo menos 3.000 verl d’or. Publicações menores poderiam ser mais baratas, mas foram ineficazes.

Além disso, não podia arriscar-se a alarmar Guillaume Bénet e Madame Pualis se estes lessem os jornais.

Pavard acenou com a cabeça, dizendo: — Anthony Reid se hospeda no quarto 5, no terceiro andar do hotel. Você pode visitá-lo amanhã.

— Ele é um militar aposentado que virou corretor de informações. Altamente confiável.

Lumian anotou o número e o nome do quarto. Ele ergueu o absinto, girando-o suavemente antes de erguer o copo para homenagear o barman.

Ao retornar ao quarto 207, Lumian não perdeu tempo descansando.

Fechou as cortinas esfarrapadas e executou a Dança de Invocação no espaço apertado.

Seu objetivo era ver que criaturas estranhas ele poderia atrair no Auberge du Coq Doré e na Rue Anarchie, preparando-se para possíveis ataques, perseguições ou emboscadas futuras.

Segundo Osta, além do prédio incendiado, não havia locais particularmente perigosos no distrito comercial. Além disso, estava bastante distante da Rue Anarchie, tornando improvável que fosse afetada por um equivalente da Sequência 9: Dançarino. Afinal, estas não eram as ruínas da Vila Cordu, onde o poder da inevitabilidade era generalizado.

Desconsiderando os mais perigosos e aqueles que os Dançarinos não conseguiam atrair, Lumian acreditava que mesmo que as estranhas criaturas que apareceram mais tarde fossem mais fortes que ele, seria quase impossível para elas forçarem-no. O símbolo preto-azulado que representa a grande existência e o padrão com espinhos negros da inevitabilidade seriam suficientes para impedi-los de agir de forma imprudente.

Numa dança que alternava entre loucura e distorção, a espiritualidade de Lumian fundiu-se com o poder agitado da natureza, espalhando-se furtivamente em todas as direções.

Em pouco tempo, ele sentiu olhos atentos sobre ele. Várias figuras translúcidas e borradas flutuavam pela sala.

Algumas pareciam humanas, obsessões aparentemente residuais que persistiam após a morte. Outras eram grotescas, parecendo garrafas ou almôndegas empilhadas, possivelmente originárias do mundo espiritual correspondente.

Lumian não reconheceu nenhuma delas e não conseguiu determinar suas características ou habilidades.

Naquele momento, uma figura emergiu das cortinas esfarrapadas.

Ligeiramente translúcida, era uma mulher com longos cabelos turquesa entrelaçados com folhas verdes que envolviam seu corpo e ocultavam áreas vitais. O resto de sua pele clara e lisa estava exposta, deixando o coração acelerado e a imaginação em chamas.

Com olhos verde-esmeralda, lábios vermelhos e um rosto requintado e atraente, um único olhar para Lumian despertou uma excitação inexplicável dentro dele.

Capítulo 119 – Criatura Estranha

Combo 45/50


Quase simultaneamente, Lumian sentiu seus cabelos se arrepiarem enquanto um arrepio percorria sua espinha. Ele experimentou uma forte sensação de perigo iminente.

Inconscientemente, puxou a Mercúrio Caído de sua cintura, pronto para arrancar o pano preto enrolado nela a qualquer momento.

A figura translúcida com cabelo turquesa e coberturas de folhas flutuava no ar, examinando Lumian na sala. Seus olhos verde-esmeralda alternavam entre uma expressão enevoada e sorridente, reminiscente de um vórtice profundo atraindo a alma humana a afundar nele.

Por um lado, Lumian experimentou um impulso familiar, porém estranho, que varreu sua mente, interrompendo a maioria de seus pensamentos. Por outro lado, não pôde deixar de sentir medo, semelhante a um inseto voador que encontra uma aranha tecendo sua teia.

Ele desacelerou a dança, preparado para parar a qualquer momento.

A mulher translúcida exibia uma expressão ansiosa, mas instintivamente sentiu que algo estava errado e hesitou em se aproximar de Lumian.

Às vezes inclinava-se para a frente, às vezes recuava para dentro das cortinas, mas no final das contas não fazia nada.

Depois que Lumian terminou sua Dança de Invocação, ele ouviu um som fraco em seus ouvidos. Estava tão perto que parecia estar bem ao lado, fazendo com que as estranhas criaturas que permaneciam na sala desaparecessem uma por uma.

A última a sair foi a mulher de cabelos turquesa e cobertura de folhas. Parecia relutante e perplexa.

Lumian soltou um suspiro de alívio e fechou os olhos, ouvindo silenciosamente as vozes indistintas dentro dele.

Ele não conseguia entender uma única palavra, mas ansiava por ouvir cada uma delas claramente.

Depois de um momento, Lumian abriu os olhos e olhou para a janela obscurecida pela cortina esfarrapada. Ele murmurou para si mesmo: “O que foi isso?”

Sua intuição lhe disse que a mulher translúcida era muito mais poderosa do que as outras criaturas estranhas convocadas. Não era algo que Beyonders em seu nível pudessem suportar.

Se não fosse pela corrupção selada dentro de seu corpo e pelo padrão preto-azulado em seu peito que dissuadia as criaturas espirituais de se aproximarem subconscientemente dele, mesmo sem ativação, Lumian suspeitava que algo poderia ter acontecido com ele.

Isso despertou sua curiosidade.

“Como outros dançarinos sobrevivem?”

Ele só se atreveu a realizar a Dança da Invocação depois de confirmar que a área não era muito perigosa, mas algo quase aconteceu. Como poderiam outros Dançarinos evitar tais riscos?

“É porque obtive minha benção através de roubo e tenho algum conhecimento místico, ou é porque outros Dançarinos só conseguem atrair criaturas estranhas semelhantes a eles? Além disso, a Dança da Invocação vem de uma existência oculta, então não deveria haver problemas em circunstâncias normais?” Lumian ponderou por um momento. Quanto mais pensava nisso, mais sentia que era a anomalia.

Ele acreditava que a corrupção em seu corpo estava em um nível extremamente alto. Mesmo selada, poderia ocasionalmente atrair entidades estranhas e perigosas.

“Felizmente, a corrupção também fornece proteção…” Lumian exalou, guardou a Mercúrio Caído e acendeu a lâmpada de metal preto como ferro. Ele se sentou à mesa de madeira e folheou o caderno de Aurore.

Ler o caderno de misticismo de trás para frente foi insuportável. Na falta do conhecimento correspondente, ele ocasionalmente se sentia analfabeto. Não teve escolha a não ser pegar o primeiro caderno de Aurore e memorizar o simbolismo e o significado místico dos símbolos correspondentes.

Porém, Lumian não conseguia sentar e aprender aos poucos, de frente para trás. Ele acreditava que se o caderno de bruxaria de Aurore realmente escondia informações cruciais, certamente estaria no conteúdo dos últimos dois anos, quando anormalidades apareceram gradualmente na vila de Cordu e os pastores começaram sua caça.

Depois de quase duas horas lutando para entender o conhecimento, Lumian admitiu a derrota e decidiu continuar na noite seguinte.

Ele banhou-se brevemente e deitou-se na cama.

Relembrando a estranha criatura que acabara de invocar, Lumian colocou a Mercúrio Caído ao lado do travesseiro, sentindo-se apreensivo.

Antes de deixar Cordu, ele inspecionou a perversa adaga preta e confirmou que o destino que ele havia trocado do monstro flamejante foi “dor da imolação”.

A escuridão se aprofundou gradualmente, mas a Rue Anarchie nunca experimentou um momento de paz. Cantar, gritar, xingar, brigar, perseguir, tossir, chorar e fazer exercícios enchiam o ar, compondo uma sinfonia noturna.

Lumian já havia se acostumado com o barulho, o que até o fazia sentir-se vivo.

Inconscientemente, adormeceu.

Às 6h, a catedral distante tocou, lembrando Cordu.

Lumian acordou pontualmente, mas relutou em abrir os olhos.

Depois de alguns minutos, sentou-se e amarrou a Mercúrio Caído em sua cintura.

Seus sonhos foram caóticos durante toda a noite, mas nada fora do comum ocorreu.

— Estou pensando demais? — Lumian murmurou.

Abriu a porta e entrou no banheiro mais próximo. Usando a luz da manhã que entrava pela janela, ele se examinou no espelho.

Comparado ao mesmo momento do dia anterior, ele não mudou nada.

A cor e o comprimento de seu cabelo eram fatores externos e não combinavam com sua condição física.

Lumian se abaixou e escovou os dentes.

Enquanto enxaguava a boca, avistou Charlie entrando pelo canto do olho.

— Você não mora no quinto andar? — Lumian cuspiu o líquido e se virou para perguntar a Charlie.

Charlie vestiu uma camisa branca amarelada com os punhos enrolados até os cotovelos. Ele bocejou e disse: — Dá para acreditar? Esses caras já acordam antes das seis. O banheiro do quinto andar está lotado!

Ele então sorriu.

— Ainda gosto mais desse banheiro do segundo andar. Sabe por quê?

— Embora aquele desgraçado do Laurent tenha as sobrancelhas muito altas e não saiba como ajudar a mãe em nada, ele tem seus pontos fortes. Ele adora limpeza. Enquanto estiver no apartamento, ele limpa o quarto todos os dias e cuida do banheiro também. Haha, será que ele não pode usar o banheiro se estiver sujo?

“Então é ele quem está limpando…” Lumian ficou surpreso.

Sua impressão do jovem chamado Laurent foi a de que ele era frio, arrogante e impecavelmente vestido. Ele claramente se considerava muito bem e parecia alheio à situação de sua mãe. Ele não parecia a Lumian alguém que limparia um banheiro.

Anteriormente, Lumian presumia que os outros inquilinos do segundo andar estavam fartos dos modos mesquinhos do proprietário e assumiram a responsabilidade de limpar seus espaços compartilhados.

Percebendo o rosto abatido de Charlie, como se ele tivesse passado a noite acordado, Lumian sorriu e perguntou:

— Você foi à Rue de la Muraille ontem à noite?

Rue de la Muraille era o infame bairro da luz vermelha de Trier.

— Como posso me dar ao luxo de ir para a Rue de la Muraille? Mas com certeza irei para lá um dia desses! — Charlie cerrou os dentes e continuou: — Voltei para o hotel às 22h da noite passada. Depois fui para o bar subterrâneo e bebi com os caras até meia-noite. De madrugada, eu até tomei um… digamos, bastante um sonho vívido. Ciel, nossos nomes têm o mesmo som, mas são escritos de maneira diferente. Você pode imaginar como eu estava em êxtase naquele sonho? E quando acordei, como estava arrasado e como… uh, uh…

— Vazio? — Lumian forneceu o adjetivo.

— Sim, Sim, Sim! — Charlie foi até o banheiro e desatou o cinto.

Seus olhos já estreitos enrugaram-se de satisfação.

Lumian apertou o nariz e zombou.

— Você teve um sonho molhado?

Charlie estremeceu, apertou a mão direita e riu.

— Foi o sonho mais real que já tive. A mulher nele era muito mais bonita do que qualquer outra na Rue de la Muraille. Ela era tão terna e apaixonada. Eu nunca quis acordar.

— Bem, claramente você não poderia aguentar por muito tempo. Acordar foi uma misericórdia, — brincou Lumian.

Charlie não se preocupou em discutir e, em vez disso, disse seriamente:

— Estou planejando ir para a Rue du Rossignol1 aos domingos, depois de receber o pagamento e quando estiver de folga do trabalho. Existem alguns salões de dança lá com algumas bucetas acessíveis. Um colega de trabalho me disse que eu só preciso de 52 coppet para me tratar.

— Mas agora, perdi o interesse.

De repente, a excitação de Charlie aumentou. Abaixando a voz, ele confidenciou a Lumian,

— Quer saber? Um hóspede rico do hotel tem me tratado muito bem, me pedindo para entregar comida e ajudar a arrumar o quarto.

— Um homem? — Lumian perguntou com uma pitada de malícia.

Charlie balançou a cabeça apressadamente.

— Não, é uma mulher. Acho que ela gostou de mim. Estou indeciso. Se ela fizer uma proposta, devo comprometer meus princípios? Você sabe que esse tipo de coisa é muito comum em Trier. Se ela for minha passagem para meu primeiro grande pagamento, em breve poderei ter meu próprio hotel.

— Achei que você não hesitaria. — Embora eles se conhecessem há apenas dois dias, Lumian estava convencido de que a bússola moral de Charlie era bastante flexível.

Charlie suspirou, visivelmente perturbado, e admitiu: — Ela está na casa dos cinquenta.

Lumian soltou um longo “oh” e sua expressão transmitiu seus pensamentos.

Despedindo-se de Charlie, Lumian voltou ao seu quarto para vestir uma jaqueta, calças e outros trajes adequados para Rue Anarchie. Ele gastou 6 coppets em uma panqueca de cebolinha e 1 lick em meio litro de Whiskey de Maça. Sentando-se em uma esquina da rua, tomou seu café da manhã sem pressa.

As sombras dos edifícios de ambos os lados o envolviam enquanto ele saboreava os sabores de cebola e farinha, observando os vendedores ambulantes, as mulheres comprando mantimentos, os trabalhadores apressados, as crianças procurando lixo e uma barricada em um beco próximo.

Eram nove horas da manhã quando Lumian finalmente se levantou, sacudiu a poeira e voltou ao Auberge du Coq Doré. Subiu até o terceiro andar e bateu na porta do quarto 5.

O corretor de informações, Anthony Reid, residia aqui.

Depois de uma sequência de batidas, uma voz masculina composta com sotaque da Costa Oeste de Midseashire respondeu: — Por favor, entre.

Lumian girou a maçaneta e abriu a porta. A primeira coisa que o atingiu foi um odor levemente acre e mentolado, provavelmente destinado a repelir insetos.

Então, viu um homem de quarenta e poucos anos sentado ao lado da cama.

O homem usava uma camisa verde militar, calças combinando e botas de couro sem cadarços. Seu cabelo estava cortado em um corte fino.

Ele não possuía o ar organizado e eficiente de um veterano. A linha do cabelo amarelo claro havia diminuído consideravelmente, deixando uma vasta extensão na testa. Seu rosto estava rechonchudo e a barba meticulosamente raspada. Sua pele estava ligeiramente oleosa e os poros do nariz entupidos. Ele parecia um tanto inocente e pouco sofisticado.

Quando Anthony Reid se virou para Lumian, seus olhos castanhos escuros espelharam a figura de Lumian.

Por alguma razão, Lumian de repente sentiu uma pontada de desconforto.

  1. Rua do Rouxinol[↩]

Capítulo 120 – Delírios do Lunático

Combo 46/50


Anthony Reid olhou para Lumian com frieza e perguntou: — Qual é o problema?

— Ouvi de Pavard que você é um corretor de informações confiável. — Lumian rapidamente revelou sua fonte para evitar perda de tempo em investigações mútuas.

Com seu rosto rechonchudo, Anthony Reid assentiu com conhecimento de causa e apontou para uma cadeira no centro da sala.

— De que informações você precisa? Ou melhor, que informações você gostaria que eu descobrisse?

Lumian sentiu uma pontada de desconforto ao encarar Anthony Reid, que exalava um ar de honestidade e confiabilidade. Ele sentou-se e declarou sucintamente: — Estou procurando duas pessoas.

— Nomes, aparências e características distintas. — Anthony Reid lançou um olhar para o quadril esquerdo de Lumian.

Lumian refletiu por um momento antes de responder: — Um é Guillaume Bénet, ex-padre da Igreja do Eterno Sol Ardente. O outro é Pualis de Roquefort. Há mais de um mês, ela chegou a Trier com seu marido, Béost, seu mordomo Louis Lund, e a empregada, Cathy.

— Não tenho fotos deles. Tudo o que posso dizer é que Guillaume Bénet tem cabelos pretos curtos e olhos azuis. Ele possui um comportamento solene e fortes ambições. Sua característica mais notável é o nariz aquilino1. Pualis tem longos cabelos castanhos e olhos castanhos brilhantes. Suas sobrancelhas são mais claras e finas, e ela exala uma aura elegante, mas sedutora…

Anthony Reid ouviu atentamente antes de se levantar da cadeira. Ele atravessou a sala até uma mesa de madeira perto da janela, abriu uma gaveta e pegou uma pilha de papel branco e um lápis apontado.

Em pouco tempo, esboçou dois retratos.

— Veja se eles se parecem com eles. — Anthony Reid entregou os esboços para Lumian.

Lumian inspecionou os desenhos e ficou impressionado com sua qualidade vívida e realista. Além da ausência de cor, eram quase indistinguíveis das fotografias.

Ele olhou surpreso para Anthony Reid, comentando: — Estranho. Como você pode reproduzir a semelhança deles com tanta precisão com base na minha breve descrição?

Ele presumiu que Anthony Reid faria vários esboços para ele revisar antes de finalizar os retratos.

Anthony Reid abriu um sorriso raro.

— Recriei as imagens dos cartazes oficiais de procurados.

— As autoridades também estão procurando por eles.

“Não é à toa…” De repente, tudo fez sentido para Lumian.

Tanto o Padre Guillaume Bénet quanto a Madame Pualis eram devotos de deuses malignos aos quais haviam sido concedidas bênçãos. Assim que Ryan e seus companheiros relatassem a situação, certamente atrairia a atenção necessária!

Com esta constatação, a inquietação de Lumian cresceu.

“Eu também devo ser procurado… Anthony Reid viu meu retrato? Ele me reconhece?” Tentando manter a compostura, Lumian perguntou ao corretor de informações: — Não estou surpreso. Quero saber o valor de suas recompensas.

— Guillaume Bénet tem uma recompensa de 20.000 verl d’or. Cada informação vale 500 verl d’or. O mesmo vale para Pualis, — respondeu Anthony Reid com indiferença.

Lumian sorriu. — Se você descobrir alguma informação útil, poderá lucrar com a recompensa duas vezes.

Ele estava insinuando que Anthony poderia reivindicar uma parte das autoridades e outra dele.

Anthony assentiu concordando.

— Vou aceitar sua tarefa. 500 verl d’or, com 100 adiantados.

— Estes são os meus termos. Se você não pode aceitá-los, procure outro corretor de informações ou caçador de recompensas.

Lumian sabia que não havia espaço para negociação. Ele só conseguiu assentir levemente e admitir: — Sem problemas.

Quando estava prestes a entregar o dinheiro, um tiro irrompeu de repente do lado de fora da janela.

Todo o corpo de Anthony Reid estremeceu como se fosse confrontado com seu inimigo mortal. Ele instintivamente se abaixou sob a mesa de madeira para se proteger.

Lumian ficou surpreso.

“Essa reação não foi um pouco extrema? Isso não era típico da vida na Rue Anarchie?”

Tiros, brigas e escaramuças em grande escala eram comuns aqui. Quem morava nesta área já deveria ter se adaptado, bastando apenas ficar longe das janelas para evitar balas perdidas.

Em pouco tempo, a comoção diminuiu.

Anthony Reid levou alguns segundos para recuperar a compostura antes de sair de debaixo da mesa.

Ele ofereceu a Lumian um sorriso tímido e explicou: — Peço desculpas. Alguns anos atrás, durante a guerra, sofri de estresse pós-traumático no campo de batalha e não tive escolha a não ser me aposentar e retornar para Trier.

“Então por que escolher morar na Rue Anarchie, onde tiroteios eram uma ocorrência regular?” Lumian não pressionou mais. Ele não tinha interesse nos problemas psicológicos de Anthony Reid.

Ele retirou uma nota de 50 verl d’or e passou suavemente o dedo sobre a imagem de Levanx, as movimentadas ruas comerciais e as silhuetas dos comerciantes que passavam.

Sentindo a textura restante, Lumian entregou a nota azul-acinzentada, dois Louis d’or e duas moedas de cinco verl gravadas com o Pássaro do Sol para Anthony Reid.

Sua carteira parecia um pouco mais leve e ele não conseguia se livrar da sensação de dinheiro escorregando por entre seus dedos.

Ao examinar o Le Marché du Quartier du Gentleman atrás das notas, Anthony Reid dobrou o dedo e sacudiu a superfície para verificar sua autenticidade sob a luz do sol.

Satisfeito, ele embolsou o dinheiro e perguntou: — Você quer entrar em contato comigo periodicamente para saber de atualizações ou devo ter um endereço? Se eu encontrar alguma informação, posso entregá-la na sua casa”

— Estou no quarto 207. — Lumian sabia que não poderia esconder de Anthony Reid sua estadia no Auberge du Coq Doré, então forneceu o número do quarto.

Ao sair do quarto 305, a expressão de Lumian ficou cada vez mais solene enquanto murmurava para si mesmo, “preciso ser extremamente cauteloso nos próximos dias para evitar que Anthony Reid me traia… Talvez eu devesse encontrar uma oportunidade para demonstrar minha força na frente dele, convencendo-o de que não deixarei nenhuma transgressão impune.”

Enquanto Lumian refletia sobre seus pensamentos, ele caminhou em direção às escadas.

De repente, ele ouviu alguém exclamar, rir e soluçar: — Estou morrendo, estou morrendo!

Lumian olhou na direção da voz e avistou um homem agachado perto da porta do quarto 310.

O homem usava uma camisa de linho imunda e calças amarelas. Seu cabelo preto despenteado caía em cascata até os ombros.

Naquele momento, ele segurou a cabeça com as duas mãos e olhou para o chão, murmurando repetidamente:

— Estou morrendo, estou morrendo!

Sua voz oscilava entre o medo e a insanidade.

“O lunático ocasionalmente lúcido que Charlie mencionou?” Lumian avaliou-o por alguns segundos, inclinou-se e perguntou curioso: — Por que você acha que está prestes a morrer? Você tem uma doença terminal?

Sem levantar a cabeça, o homem continuou a gritar: — Estou morrendo, estou morrendo!

Lumian sorriu e passou por ele até o quarto 310, com a porta de madeira escancarada.

O layout da sala refletia o seu no 207. Estava relativamente arrumado, exceto pelos inevitáveis ​​insetos que não podiam ser removidos.

O olhar de Lumian percorreu o lampião de querosene, uma infinidade de livros, canetas-tinteiro, malas e outros pertences. O lunático levantou-se e declarou atordoado: — Este é o meu território.

— Eu sei, — respondeu Lumian com um sorriso. — Mas se você está prestes a morrer e não tem filhos ou parentes, por que não usar sua herança para ajudar vizinhos pobres como nós?

Ele observou que o lunático tinha apenas vinte e poucos anos. Sua espessa barba preta e cabelos não eram feitos sabe-se lá quanto tempo, fazendo com que seus olhos azuis parecessem enterrados nas profundezas de uma floresta.

O lunático ficou olhando fixamente por alguns momentos antes de agarrar seus cabelos e gritar de angústia: — Eles estão todos mortos. Eles estão todos mortos! Eu vi o fantasma de Montsouris. Eles estão todos mortos. Estou prestes a morrer também!

“O fantasma de Montsouris?” Lumian finalmente ouviu algo distinto do lunático.

Ele havia provocado deliberadamente o outro homem para ver se conseguia uma reação diferente.

O feedback positivo fez com que ele se sentisse como se estivesse progredindo na digestão da poção.

“Um dos princípios de atuação de um Provocador é que a provocação é apenas um meio e não um fim?” Lumian estudou o lunático pensativamente e perguntou: — Por que o fantasma Montsouris os faria morrer e empurraria você para as portas da morte?

O lunático abaixou a cabeça e murmurou: — Qualquer um que ver o fantasma de Montsouris morrerá. A família deles também morrerá. Eles morrerão dentro de um ano!

“Isso é ilusão do lunático ou algo assim realmente aconteceu? Se sim, foi uma maldição?” Lumian cutucou,

— Onde você encontrou o fantasma de Montsouris?

— No submundo, submundo! Fica abaixo do distrito comercial! — O lunático se agachou novamente, com as costas pressionadas contra a parede enquanto abraçava seu corpo trêmulo.

“O submundo abaixo do distrito comercial? Ele não poderia simplesmente reportar isso às duas Igrejas e fazer com que enviassem pessoas para erradicar os seres impuros?” Lumian refletiu silenciosamente.

Vendo que o lunático havia voltado ao estado de “estou morrendo, estou morrendo”, ele abandonou o assunto, saiu do quarto 310 e desceu as escadas.

Amanhã era domingo. Lumian planejou visitar a Cafeteria de Mason no Quartier du Jardin Botanique ao meio-dia para se familiarizar com a área. À tarde, iria ao cemitério subterrâneo para ver se Osta havia recebido uma resposta do organizador do encontro.

Os becos ao redor da Rue Anarchie estavam cheios de obstáculos feitos de pedras, madeira, galhos e detritos diversos. Mesmo na estrada principal, era possível tropeçar neles de vez em quando. No entanto, já havia um caminho largo o suficiente para a passagem de duas carruagens.

Estas eram chamadas de barricadas de rua e podiam ser encontradas em muitos distritos. Algumas apresentavam marcas de fumaça e fogo, enquanto outras ainda apresentavam restos de sangue seco. Eram uma característica única de Trier, contrastando fortemente com as ruas pedonais da arcada.

Lumian passou por um ponto baixo na beira de uma barricada, saiu do beco escuro e entrou na rua.

Ele então se dirigiu à placa de transporte público, pretendendo pegar esse transporte até o Quartier du Jardin Botanique.

Enquanto caminhava, Lumian avistou vários vagabundos deitados nos cantos, tomando sol e catando piolhos. Todos estavam imundos, magros e desprovidos de energia.

Isso trouxe de volta memórias de seus próprios dias como vagabundo.

Ao contrário do Reino de Loen, que proibia os vagabundos de dormir nas ruas e nos parques, a República Intis não tinha tais regras em vigor. No entanto, eles foram proibidos de entrar em estabelecimentos pagos ou locais privados. Frequentemente zombavam de Loen por sua falta de cultura.

Perdido em pensamentos, os olhos de Lumian se estreitaram.

Ele sentiu que alguém o estava seguindo!

  1. nariz de bruza[↩]
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