Capítulo 428
Cidade de Giabella (3)
Isso realmente não era típico dele.
Eugene próprio estava mais ciente desse fato do que qualquer outra pessoa. Era verdade que ele estava curioso sobre os Rostos Giabellas, mas a ponto de entrar voluntariamente no quarto de Noir Giabella por conta própria?
No final, dizer que ele poderia ver algo diferente de dentro era apenas uma desculpa. O que ele estava realmente observando atualmente era a vista da Cidade de Giabella lá de cima, assim como o reflexo do quarto que estava vagamente visível no vidro. Incluindo…
O reflexo de Noir Giabella.
Eugene já havia percebido a intenção por trás do olhar que ela dirigia a ele. Era porque ele entendia que Noir havia percebido que algo estava errado para Eugene se sentir tão descontente e perturbado.
A divindade que havia vazado para seus pensamentos e a intuição que isso havia despertado haviam permitido que, por um único momento, os olhos de Eugene vissem e entendessem demais.
Isso lhe permitiu avaliar a verdadeira força de Noir Giabella. Isso lhe deu uma compreensão profunda de sua própria existência. Até aquele ponto, não havia problemas. Não era como se Eugene tivesse visto algo muito incomum.
No entanto, Eugene naturalmente também chegou a uma revelação particular.
Isso tinha a ver com o momento da morte de Agaroth.
Quem foi que teve o maior impacto sobre Agaroth naquele momento? Quem foi que Agaroth ordenou que fugisse para salvar a própria vida no final?
Mesmo naquele momento, quando o próprio Deus da Guerra havia decidido enfrentar a própria morte e conduziu seu próprio exército divino à aniquilação, Agaroth esperava que uma mulher específica escapasse e conseguisse sobreviver pelo menos um pouco mais. Ele não queria que ela testemunhasse a morte do deus.
Aquela mulher era a Santa do Deus da Guerra.
A Bruxa do Crepúsculo.
E de Noir Giabella, Eugene havia sentido a presença da Bruxa do Crepúsculo. Embora nem sequer um fio do poder divino de Agaroth permanecesse na Noir atual, a inspiração divina de Eugene havia permitido que ele intuísse a natureza da alma de Noir.
Então Eugene agora estava diante de um misto de emoções.
Eugene poderia se pensar como Hamel, mas não se identificava como Agaroth. Isso porque ele nunca havia vivido como Agaroth.
No final, as memórias e emoções de Agaroth, toda a bagagem que vinha com isso, pareciam pertencer a outra pessoa. Mesmo depois de se tornar consciente de que era a reencarnação de Agaroth, Eugene ainda queria se distinguir daquele deus.
— … — Eugene fez uma careta em silêncio.
A Rainha dos Demônios da Noite, Noir Giabella, entre todos os demônios, ela era vista como a mais próxima de se tornar um Rei Demônio, não, uma Rainha Demônio Superior. Sua reputação não foi desenvolvida apenas ao longo da era da guerra. Mesmo antes disso, ela já possuía uma notória reputação como a Rainha dos Demônios da Noite. O fato dela ter esse título só podia significar uma coisa. Significava que Noir já havia sido reconhecida como estando no auge de todos os demônios mesmo antes da guerra.
É claro que examinar tal história antiga era um desafio, mas não havia necessidade de ir tão longe no passado apenas para ter uma ideia geral de quem era Noir. Durante a era da guerra, o número de soldados derrotados apenas por Noir poderia ter preenchido várias legiões. Pelos padrões tanto de Eugene quanto de Hamel, Noir era um inimigo que precisava ser morto a qualquer custo.
Mas tal certeza agora estava sendo contaminada com os sentimentos de Agaroth. Isso representava um problema terrível e repugnante para Eugene.
Não importa que tipo de relacionamento Agaroth possa ter desenvolvido com a Bruxa do Crepúsculo depois de aceitá-la como sua Santa, tudo relacionado a esse vínculo deveria pertencer exclusivamente a Agaroth, não a Eugene. Então, por que aquele vínculo e aquelas emoções, que nem mesmo pertenciam a ele, estavam abalando a vontade de Eugene?
Eugene virou a cabeça para encarar Noir.
— Você realmente está fazendo isso por curiosidade? — Noir perguntou-lhe com uma expressão interrogativa.
Noir não estava em posição de se identificar com as emoções atuais de Eugene. Sua estranha sensação de afeto anterior ao ver o dedo anelar esquerdo nu de Eugene tinha vindo e ido num instante, e assim como Eugene com Agaroth, isso não deixara muita impressão sobre quem Noir era.
Eugene tinha herdado primeiro a Espada Divina de Agaroth. Como resultado, a divindade reavivada estava crescendo lentamente mais forte, e Eugene próprio havia buscado propositalmente ver mais das memórias de Agaroth.
Assim como as memórias que a cidade enterrou no abismo sob o mar profundo haviam despertado em Eugene, os sentimentos persistentes de Agaroth pela Bruxa do Crepúsculo, que permaneceram com ele até o final, também estavam afetando emocionalmente Eugene.
No entanto, Noir não tinha tais conexões que permitiriam que ela recordasse as memórias ou emoções de sua vida passada como Eugene tinha. Ela havia experimentado alguns fragmentos de nostalgia após sentir a divindade de Eugene, mas isso era tudo, e não sentira mais do que isso.
Mas isso era apenas natural. Neste momento, ela não era mais a Santa do Deus da Guerra, nem era a Bruxa do Crepúsculo.
Ela era Noir Giabella, Rainha dos Demônios da Noite, Duquesa do Império de Helmuth, Mestra de Dreamia e da Cidade de Giabella, e Proprietária do Parque Giabella.
Com um sorriso brincalhão, Noir se inclinou mais perto de Eugene.
Cada ação dela exalava sedução. O vestido que ela tinha jogado às pressas escorregou um pouco, expondo descaradamente mais da pele pálida de Noir.
Noir baixou a voz e disse:
— Hamel, eu sempre me certifiquei de que você soubesse o quanto eu tenho afeto por você — a ponto de meus lábios doerem só de dizer as palavras repetidas vezes — mas mesmo assim, nós ainda somos inimigos, não é? Mesmo que seja você, não posso simplesmente revelar todos os segredos do meu incrível Rosto Giabella.
Noir sabia que esse tipo de abordagem não era algo que Eugene gostava.
Embora as coisas possam não ser tão diferentes para a era atual, no passado, mercenários e prostitutas eram as duas profissões que eram especialmente vistas como inseparáveis. Isso era especialmente verdade durante a era da guerra, quando a maioria das empresas de mercenários era acompanhada por um grupo de prostitutas.
Mas mesmo assim, Hamel, que havia se destacado primeiro como mercenário, não tinha tolerância para esse tipo de tentação.
Noir esperava que o rosto de Eugene corasse ou que ele se afastasse, com sua expressão contorcida em uma carranca. Porque de qualquer maneira, Noir ficaria divertida ao ver Hamel incomodado por seus avanços.
No entanto, desta vez, o rosto de Eugene não corou, nem sua expressão se contorceu em uma carranca.
— Isso mesmo. — Eugene concordou prontamente, acenando sem agitação, a ponto de ser Noir quem se sentia envergonhada. — Nós somos inimigos. — Afirmou.
O senso de razão de Eugene definia Noir como sua inimiga. Ele sempre pensou que definitivamente teria que matar Noir um dia.
No entanto… do fundo do seu coração, um desejo por um relacionamento um pouco diferente com ela estava começando a brotar.
Eugene era capaz de distinguir claramente a origem desse sentimento. Não pertencia nem a Hamel nem a Eugene.
Como Noir acabara de sussurrar, Eugene e Noir se viam como inimigos. Suas palavras conseguiram acalmar o coração agitado de Eugene.
Noir não ficou desapontada com a falta de uma reação óbvia de Eugene.
— Hamel, você veio aqui para me matar? — Noir perguntou com um sorriso no rosto.
Noir não ficou desapontada com a resposta de Eugene; em vez disso, ela estava emocionada com a intenção assassina arrepiantemente fria que emanava dele.
— Se for esse o caso, então eu… Eu certamente lhe darei uma resposta entusiasmada, mas tenho medo de que você acabará se decepcionando no final. — Noir avisou.
Deixando de lado sua própria excitação, os olhos de Noir cintilavam enquanto vários pensamentos passavam por sua mente.
Sienna Merdein não estava ali com Eugene. Era verdade que pode não haver ninguém neste mundo que pudesse realmente substituí-la, mas Eugene nem mesmo havia pensado em trazer outro ajudante em seu lugar.
Será que ela deveria realmente considerar um filhote como algo feroz quando nem sequer estava completamente crescido? Deveria sufocá-la com todas as suas forças antes que pudesse se tornar um poderoso dragão? Mas no final, mesmo que fosse ajustado pelo seu mestre, um familiar ainda era apenas um familiar.
E quanto a Kristina Rogeris, a Santa desta Era?
Certamente, Noir sabia que não podia mais se dar ao luxo de subestimar Kristina. Quando se encontraram pela primeira vez no campo de neve, não parecia que Kristina tivesse algo que a marcasse particularmente como a Santa, mas…
Talvez fosse porque Kristina foi influenciada pela presença do Herói, ou talvez fosse graças à sua experiência em participar da subjugação de um Rei Demônio, mas Noir agora podia sentir um tipo especial de força vindo de Kristina que tornava impossível duvidar que ela era de fato a Santa.
— E se não estamos aqui para te matar? — Eugene perguntou. — O que você vai fazer então?
Noir sorriu.
— Podemos ser inimigos, mas não é só isso que somos um para o outro, não é? Acho que nosso relacionamento é muito especial. Mas falando honestamente, enquanto nós dois tentarmos acabar um com a vida do outro um dia… então não importa que tipo de relacionamento tenhamos antes disso.
“Um relacionamento muito especial,” ela disse. Eugene clicou a língua enquanto mais uma vez virava a cabeça para longe dela.
— Agora mesmo, seria impossível eu te matar. — Eugene admitiu relutantemente em voz alta.
— Hehe. — Noir riu, sentindo um senso travesso de sadismo ao ver seu silencioso reconhecimento.
Pensar que haveria alguma vez uma situação em que Hamel acabaria andando direto para a palma de sua mão por conta própria. Se ele tivesse apenas aceitado suas ofertas anteriores para se divertir, ela poderia tê-lo proporcionado toda a diversão que ele quisesse, mas… Noir deixou de lado tais pensamentos. Trezentos anos atrás, Hamel não teria tido motivo para aceitar nenhuma de suas ofertas, mas agora eles não estavam no meio de uma guerra. Além disso, Noir tinha coisas mais importantes com que se preocupar porque esta não era apenas uma cidade qualquer; esta era a cidade de Noir.
— Bem-vindo ao Parque Giabella! — Noir declarou orgulhosamente.
Esta era a cidade mais luxuosa de toda Helmuth. Uma cidade onde você podia desfrutar de qualquer prazer ou entretenimento que desejasse, contanto que pudesse pagar o preço.
Os funcionários do Parque Giabella receberiam todos os hóspedes que viessem até eles com um sorriso. Mesmo que esse hóspede fosse o Herói que um dia pretendia destruir esta cidade. Não, pelo contrário, isso era ainda mais motivo para Noir, como mestra da cidade, ser quem deveria dar as boas-vindas a Eugene com seu sorriso mais brilhante.
— O que você gostaria de experimentar primeiro? A atração que mais atrai pessoas para esta cidade é o cassino, mas eu realmente não acho que você iria gostar de visitar o cassino tanto assim, Hamel… — Noir parou de falar enquanto tagarelava, seu olhar desviando para o lado.
Ela tinha avistado Mer e Ramira, que estavam segurando as mãos de Kristina enquanto se escondiam atrás da Santa. Notando a empolgação juvenil nos olhos das duas garotas, Noir deu a elas um amplo sorriso.
— Jovens—
Noir começou a falar, apenas para pausar logo em seguida.
Seria realmente apropriado se referir a essas duas como crianças? Noir ponderou essa questão por um momento antes de decidir que funcionaria, já que as duas na frente dela eram crianças com base em sua aparência externa. Ela continuou a falar…
— Também temos muitas atrações para crianças mais jovens. O lema do nosso Parque Giabella é que somos um parque temático que pode ser apreciado por pessoas de todas as idades. — Noir declarou orgulhosamente.
Ramira e Mer engoliram involuntariamente as palavras ‘atrações para crianças mais jovens’. Noir virou-se e caminhou em direção a Kristina.
Ela não apenas simplesmente caminhou. À medida que se aproximava, a túnica folgada de Noir começou a aderir ao seu corpo e então se transformou em um traje completamente diferente. A roupa de Noir se tornou um vestido de baile colorido e extravagante, como os usados pelas princesas nos contos de fadas dos Grimm.
Clic, clic, clic, clic.
Esse foi o som que os novos saltos de Noir fizeram a cada passo que ela dava. Como se estivesse mostrando, Noir empurrou descaradamente o peito para fora e encarou Kristina quando chegou até elas.
— … — Kristina, assim como Anise dentro dela, não puderam deixar de encarar Noir de volta, que ainda estava empinando o peito, com um olhar feroz nos olhos.
Se realmente quisessem competir com o desafio descarado de Noir, elas não achavam que perderiam, mas o que Noir estava fazendo parecia tão ridículo que a escolha não apelava para as duas Santas, sem mencionar que as ações de Noir eram tão vulgares que só as deixavam irritadas.
No entanto… além de tudo isso, elas não puderam deixar de se sentir intimidadas também. Os olhos roxos de Noir deram a Kristina uma sensação assustadora. Era como se eles quisessem devorar toda a existência da Santa.
— O que foi? — Anise exigiu, avançando para a frente de sua consciência compartilhada.
Por algum motivo, Hamel estava mostrando uma reação estranha a essa Rainha das Putas, mas agora não era hora de perguntar o motivo disso.
“Não pode ser…” Anise tentou apressadamente negar a primeira possibilidade que veio à mente.
— Não consigo pensar em nada em particular que você possa querer ver. Mas talvez até mesmo alguém como você tenha alguns desejos secretos? — Noir perguntou, seus olhos brilhando com luz.
Noir casualmente tentou alcançar além da superfície da consciência de Kristina para sondar levemente seu subconsciente, mas descobriu que as barreiras mentais da Santa eram mais fortes do que ela esperava. Embora apenas com base na aparência, parecesse que havia alguns desejos sombrios preenchendo as profundezas do coração de Kristina. Noir estava certa de que o dia chegaria em que ela exporia os desejos secretos da Santa.
— A Luz está constantemente iluminando tanto meu corpo quanto meu espírito, então como poderia haver algo como desejos secretos escondidos dentro de mim? Se você não tem motivo para continuar nos olhando, por favor, dê um passo para trás ou pelo menos vire a cabeça para o lado. Noir Giabella, toda vez que você abre a boca, o cheiro de panos sujos é tão forte que eu acho difícil respirar. — Anise disse com um sorriso sarcástico.
Seu desabafo saiu aparentemente do nada.
Os olhos de Noir se arregalaram em círculos enquanto ela encarava o rosto de Kristina e suspirava.
— Oh meu Deus… não há como.
Anise também estava chocada, lamentando o fluxo de palavras logo depois de tê-las soltado.
“É porque ela é um clone de Anise?” Noir se perguntou.
Noir reconheceu a semelhança entre Anise e os traços faciais de Kristina desde o início, mas nunca imaginaria que sua semelhança iria até a afiada língua. Não, talvez Anise também tenha sido reencarnada do além para Kristina Rogeris…
Noir arrumou sua expressão enquanto elaborava várias suposições.
— As suas palavras são tão vulgares que são incompreensíveis… Eu nem quero dizer nada em resposta. — Noir disse em um resmungo antes de se agachar.
Noir fez isso para colocar-se no mesmo nível dos olhos de Mer e Ramira, que ainda estavam se escondendo atrás da Santa.
Com esse movimento, Anise deu um passo para trás. Na verdade, o que ela realmente queria fazer era plantar o joelho no centro do rosto de Noir assim que ela se inclinasse, mas Anise mal conseguiu conter o impulso de fazê-lo.
— Por favor, não se aproxime das minhas crianças. — Anise e Kristina disseram juntas com a mesma voz fria.
Noir arqueou a sobrancelha.
— Suas crianças…? Mesmo que elas na verdade não sejam suas crianças?
— Eu disse, não se aproxime. — As Santas apenas repetiram o aviso, ignorando as palavras de Noir.
Ramira ficou tão emocionada com essas palavras que lágrimas começaram a brotar em seus olhos.
Embora Ramira sempre tenha querido chamar Kristina de mãe, ela nunca conseguiu se convencer a chamá-la assim ou pedir permissão para fazê-lo. Mas pensar que ela realmente ouviria tais palavras afetuosas faladas diretamente por sua adorada Santa!
Mesmo Mer, que estava segurando a mão direita da Santa, sentiu uma onda de emoções semelhante à de Ramira. Claro, ela tinha Sienna Merdein como criadora, mas onde no mundo você encontraria uma lei que dizia que alguém só podia ter uma mãe? Em algumas situações, era normal ter duas mães. Uma mãe que pessoalmente deu à luz e outra mãe que amamentou. Enquanto Mer tinha esses pensamentos, ela apertou mais a mão da Santa.
— Eu não vou fazer nada de ruim com essas duas. Também acontece de eu gostar muito de crianças. — Noir disse enquanto levantava a mão.
Whoosh!
De uma área distorcida do espaço, uma cesta que não pareceria fora de lugar em um piquenique apareceu de repente.
— Também, com isso, tenho certeza de que essas duas definitivamente vão gostar de mim, certo? — Noir disse confiante.
Noir estendeu a mão e tirou da cesta, e quando seu punho cerrado se abriu, duas moedas cintilantes estavam deitadas na palma de sua mão.
— Esta é uma moeda que ultrapassa a famosa Moeda Especial do Parque Giabella, a Moeda Especial Especial. — Noir revelou.
Com as palavras ‘Especial Especial’, os olhos das duas meninas se arregalaram tanto em choque quanto em desejo.
— Deixe-me dizer, esta é uma moeda do tipo das quais existem apenas duas no mundo inteiro. — Noir descreveu sedutoramente. — Embora, é claro, isso seja natural! Afinal, eu pessoalmente fiz essas moedas especialmente para vocês duas agora mesmo. Nada é impossível com essas Moedas Especiais Especiais! Quem tiver essas moedas está no mesmo nível de um deus aqui no Parque Giabella!
Anise franziu a testa.
— Que tipo de loucura—
Noir a interrompeu.
— Eu estou apenas sendo generosa. De qualquer forma, não é como se vocês tivessem vindo aqui para tentar me matar. Não é mesmo, Kristina Rogeris? Se você realmente se importa com essas crianças, não pode simplesmente reprimir arbitrariamente seus próprios desejos e impedi-las de fazer o que querem.
Com essas palavras, Anise franziu a testa. Ouvindo a conversa de dentro de sua consciência compartilhada, Kristina também não pôde deixar de se sentir desconfortável.
Para essas duas, que foram moldadas artificialmente em Santas, suas memórias de infância consistiam apenas em constante coerção e restrições. Nunca lhes foi permitido fazer o que queriam.
Noir, tendo claramente adivinhado como o passado dessas duas Santas deve ter sido, soltou um sorriso malicioso.
— Se você realmente quer fazer com que elas passem pela mesma coisa que você experimentou e odiou, hehe, eu suponho que posso entender isso. — disse Noir com um riso. — Afinal, a maioria dos humanos sente que é injusto se forem os únicos a terem experimentado infortúnios, então acabam criando uma cadeia de tragédias ao infligi-la em outra pessoa.
Anise rosnou.
— Você se atreve—!
Justo quando Anise estava prestes a cuspir outra torrente de abuso verbal, Eugene, que estava olhando pela janela, se pronunciou.
— Deixe-as pegar as moedas. Afinal, é verdade que esta cidade é bem administrada e um bom lugar para se divertir.
— Sir Eugene. — Disse Anise hesitante.
— Elas devem aproveitar a chance para se divertir antes que a cidade seja destruída. — Disse Eugene.
Depois de hesitar por mais alguns segundos, Anise soltou um suspiro.
Ela não pôde deixar de simpatizar um pouco com o argumento de Eugene. Comparada a qualquer outra cidade no continente, não havia outra cidade que se especializasse em fornecer entretenimento como esta. Quando Eugene eventualmente viesse matar Noir, este lugar — a Cidade de Giabella — certamente seria transformada em ruínas.
— Vocês podem pegar essas moedas. — Anise cedeu, soltando as mãos das meninas. — No entanto, não agradeçam a ela.
Mer e Ramira fizeram como Anise instruiu.
Mer orgulhosamente ergueu o queixo enquanto pegava a moeda da mão de Noir com um riso de desdém.
— D-Deixe aqui!
Embora seu queixo estivesse erguido, Mer não pôde evitar que seus olhos brilhassem e sua voz tremesse.
Como Mer já lhe havia fornecido um exemplo, Ramira também rapidamente reuniu sua coragem.
Esta era a Duquesa Noir Giabella, a pessoa que ela admirava desde que foi aprisionada dentro do Castelo do Dragão Demoníaco… Para Ramira, Noir poderia ser uma incrível mulher demônio que ela ainda aspirava gostar, mas sua admiração por Noir não podia superar sua admiração pela Santa.
— Esta Senhorita aceitará sua homenagem! — Ramira disse enquanto rapidamente estendia a mão e pegava a moeda da mão de Noir.
No entanto, mesmo depois de ser tratada com tanto desrespeito, o sorriso de Noir não desapareceu. Enquanto levantava a cabeça mais uma vez, ela girou enquanto segurava levemente a barra do vestido.
— Embora eu sinta que ficaria feliz se pudéssemos simplesmente voar por aí no céu para sempre… — Noir suspirou enquanto olhava para as costas de Eugene, que ainda estava encarando pela janela. — Mas se eu fizesse isso… sinto que teria que desistir de alguns dos meus outros desejos. Ou talvez, o que vocês acham? Por que não saem primeiro para que Hamel e eu possamos ficar aqui sozinhos?
— Vamos para lá. — Eugene falou.
Ele apontou o dedo para um dos prédios visíveis abaixo. Assim como o vestido de Noir, era um castelo decorado com uma aparência colorida e elaborada que parecia saída de um conto de fadas dos irmãos Grimm.
De acordo com as informações que ele havia lido nos guias de viagem a caminho dali, o Parque Giabella estava dividido em várias seções baseadas em diferentes conceitos. Embora fosse verdade que entretenimentos como clubes, cassinos e outros tipos de locais de jogo pudessem ser encontrados no centro do Parque Giabella, não faltavam áreas destinadas a famílias de turistas com crianças pequenas.
— É o Castelo Giabella! — Ramira exclamou enquanto corria para ficar ao lado de Eugene.
Percebendo algo tardiamente, Ramira rapidamente virou a cabeça para encarar Noir.
— Isso mesmo! — Noir disse orgulhosamente. — Atualmente, estou vestida como a bela Princesa Giabella, que está aprisionada na torre mais alta do Castelo Giabella!
Cada um dos edifícios na Praça da Fantasia, uma área do Parque destinada a crianças, tinha sua própria história escrita nos guias, mas isso não havia despertado o interesse de Eugene. No entanto, Mer e Ramira, que sempre quiseram ir ao Parque Giabella algum dia, conheciam bem todas as histórias da Praça da Fantasia.
Bem abaixo da Rosto Giabella flutuante em que estavam estava o Castelo Giabella, que era o hotel mais luxuoso encontrado na Praça da Fantasia. Ao mesmo tempo, era o centro de todas as atrações e histórias localizadas dentro da Praça da Fantasia.
Dizia-se que a Princesa Giabella havia sido aprisionada na torre mais alta do Castelo Giabella, esperando pelo Herói que um dia viria resgatá-la…
Enquanto uma história de conto de fadas tão clichê passava pela cabeça de Mer e Ramira, o Rosto Giabella se aproximava do castelo que Eugene havia indicado.
— Eu vou te dar o quarto no último andar. — Noir ofereceu. — É um quarto secreto que nem um dos reis do continente seria capaz de solicitar.
Um quarto secreto. Quão emocionantes soavam essas palavras? Mer e Ramira pareciam prestes a desmaiar de animação.
Ao examinar suas expressões, Noir habilmente extraiu as reações que desejava:
— Você sabe o que significa o quarto no último andar?
Os dedos de Noir se juntaram, fazendo um som de clique. Com esse gesto, a superfície do grande lago localizado no jardim do Castelo Giabella começou a tremer. Os turistas que estavam aproveitando os vários passeios no lago gritaram de surpresa, mas em vez de diminuir, o fenômeno ocorrendo no lago realmente se transformou em um grande redemoinho.
— É o Dragão Maligno!
— Kaikaria!
Mer e Ramira gritaram quando a cabeça enorme e negra de um dragão emergiu do redemoinho. Era óbvio quem era o dragão apenas por suas escamas negras, mas Ramira não parecia ter reconhecido.
Gaaaaah!
Voando para fora do lago, Kaikaria cuspiu chamas enquanto subia até a torre.
— Neste castelo, existem todos os tipos de perigos que ameaçam a princesa de bom coração… — Noir narrou.
Boom! Boom! Booom!
Os céus acima do castelo de repente escureceram. Junto com o som de raios crepitantes, uma sombra enorme foi lançada sobre o castelo. A sombra gigante era de um mago usando um chapéu grande e segurando um bastão.
— É a Bruxa Malvada!
— Aquela-Cujo-Nome-Não-Deve-Ser-Pronunciado!
O gênero poderia ser inferido através do cabelo longo e ondulante da sombra.
Aquela-Cujo-Nome-Não-Deve-Ser-Pronunciado, hein… De fato, teria sido arriscado para Noir caricaturar Sienna, que era admirada por todos os magos do continente, da mesma forma que ela havia feito com Raizakia.
— A torre mais alta do Castelo Giabella é onde a princesa, que se esconde do cortejo do dragão e da inveja da bruxa, se esconde. — Noir revelou.
Em algum momento, Noir havia se movido para ficar atrás de Mer e Ramira.
Ela colocou uma mão nos ombros das duas meninas enquanto sussurrava em seus ouvidos: — O fato de vocês duas ficarem nesse quarto significa que são as princesas aprisionadas no castelo.
Mer e Ramira soltaram um grito de empolgação ao mesmo tempo.