Capítulo 16: Viajando Pelo Mundo Espiritual

O portal se fechou atrás dele, e imediatamente o quarto foi libertado do olhar vazio do Cabeça de Bode, montado na mesa. No entanto, Duncan permaneceu profundamente conectado à presença espectral do Desaparecido, o navio fantasma que ele capitaneava. Esse vínculo etéreo permitia-lhe perceber cada mudança sutil a bordo. Por meio dessa ligação, ele podia “ver” a tripulação invisível trabalhando diligentemente, ajustando as velas para capturar a brisa marítima e impulsionar o navio adiante. O leme elegante e negro na popa girava suavemente, estabilizando ainda mais a embarcação enquanto ela deslizava pelas ondas.

Como Duncan previra, o Cabeça de Bode havia assumido brevemente o controle do leme, atuando como o navegador substituto com dedicação inabalável. Ainda assim, Duncan mantinha a capacidade de comandar o navio sempre que quisesse.

Embora a agilidade e a velocidade do Desaparecido fossem ligeiramente reduzidas sob o controle do Cabeça de Bode em comparação com o comando direto de Duncan, ele não estava preocupado. Seu objetivo principal era gradualmente dissipar o nevoeiro que obscurecia o mapa náutico. Sem destinos específicos ou rotas a seguir no momento, esse pequeno contratempo era irrelevante.

Após confirmar que o Cabeça de Bode não mostrava sinais de movimento e que a boneca gótica no convés inferior permanecia confinada em sua câmara, Duncan suspirou aliviado. Ele fez uma pausa para observar seu quarto de tamanho modesto.

Esse espaço privado servia como sua cabine de capitão, oferecendo o maior conforto e luxo a bordo do Desaparecido. O cômodo apresentava uma cama macia, um guarda-roupa clássico e uma prateleira de exibição voltada para a entrada. A prateleira continha uma coleção de itens curiosos, enquanto uma escrivaninha de mogno escuro ficava oposta à cama, vazia, exceto por alguns objetos decorativos e ferramentas de escrita e desenho.

Uma janela próxima à escrivaninha oferecia uma vista desimpedida do vasto mar além. Vários ganchos estavam fixados na parede ao lado da janela, onde Duncan costumava pendurar sua espada de pirata e sua pistola de pederneira.

Aproximando-se da escrivaninha, Duncan posicionou estrategicamente sua espada longa e sua pistola de pederneira ao alcance da mão e abriu uma gaveta. Dentro dela, verificou o suprimento de pólvora e balas de chumbo armazenados em uma caixa de madeira.

Ao lado dos cartuchos e sacos de pólvora havia uma bússola de latão compacta. Pegando a bússola, Duncan observou a agulha sob a tampa de vidro girar de forma errática, como se influenciada por alguma força invisível e caótica. Pequenas palavras estavam gravadas na base da bússola: “Estamos todos perdidos.”

Duncan brincou casualmente com a bússola em sua mão, observando a agulha girar como se estivesse embriagada.

Ele havia examinado cada canto daquele quarto inúmeras vezes, já que este foi o primeiro espaço que descobriu ao chegar ao navio. Tudo ali, incluindo a mensagem enigmática na bússola, havia sido deixado, sem dúvida, pelo capitão Duncan original.

 

Após catalogar mentalmente as informações reunidas, Duncan exalou lentamente, colocou a bússola delicadamente sobre a escrivaninha e levantou a mão direita, esfregando levemente as pontas dos dedos.

Uma chama verde suave surgiu de repente na ponta de seus dedos. Sob sua aura cintilante, a parte inferior de sua mão tornou-se translúcida, com um aspecto espectral. No entanto, o controle preciso de Duncan impediu que a chama se espalhasse como havia acontecido antes. Em vez disso, ela pairava sobre seus dedos, tremeluzindo como uma pequena vela.

Assim que a chama se estabilizou, Duncan aproximou a outra mão, sentindo o calor emanado pela chama etérea. Ele então pegou uma pena da escrivaninha e a tocou levemente com a ponta da chama.

Não havia calor, e a pena não pegou fogo. Em vez disso, uma leve aura verde começou a percorrer o eixo da pena, emitindo um brilho sutil.

No entanto, Duncan não “sentiu” nenhum retorno vindo da pena, em nítido contraste com o que ocorria quando tocava o mapa náutico ou o leme do navio com a chama.

Silenciosamente, ele registrou essa nova descoberta em seu arquivo mental. A “chama espiritual” não tinha calor, não incendiava objetos e parecia interagir apenas com os itens “anômalos” a bordo do Desaparecido, não respondendo a objetos comuns.

Ele ponderou se aquela chama poderia reagir a objetos “anômalos” vindos de fora do Desaparecido. Por um breve momento, uma imagem da estranha boneca gótica chamada Alice cruzou sua mente — uma entidade que aparentemente se originava além do Desaparecido. Será que ela seria afetada por essa chama espiritual?

Tão rapidamente quanto o pensamento surgiu, Duncan o descartou. Embora Alice não fosse humana e fosse identificada como a amaldiçoada ‘Anomalia 099’, ela também era uma entidade autônoma, capaz de falar, se mover e pensar de forma independente. Além disso, ela era atualmente um “membro da tripulação” do Desaparecido. Instintivamente, Duncan a considerava uma “pessoa”.

Ele não se via capaz de submeter um ser vivo a um teste com sua chama, incerto sobre a profundidade de sua influência ou o potencial dano que poderia causar aos chamados “objetos anômalos”.

Sem desanimar, Duncan prosseguiu com seus experimentos com a chama, explorando suas peculiaridades e testando se os diversos itens na sala possuíam atributos sobrenaturais.

 

Seu olhar finalmente repousou sobre a pequena bússola de latão, com sua enigmática “mensagem” gravada na base.

A bússola de latão permanecia imóvel sobre a mesa, mas o ponteiro sob a cobertura de vidro girava de forma errática. Duncan manteve a chama acesa, observando o ponteiro inconstante com uma expressão cética. Talvez fosse uma ilusão, mas, enquanto observava, o ponteiro pareceu por um breve momento estacar, parando por um instante fugaz.

Então, como se rejeitasse sua própria pausa momentânea, o ponteiro retomou sua dança sem direção.

Duncan ficou em silêncio por um momento, uma expressão de curiosidade surgindo em seu rosto.

Não havia dúvidas em sua mente: a bússola reagira ao seu olhar!

Sua cautela inicial em relação à bússola era justificada pela inscrição enigmática, aparentemente deixada pelo ‘verdadeiro Capitão Duncan’. Duncan suspeitava que o antigo capitão espectral pudesse ter dotado este item pessoal com um poder especial, possivelmente até uma “armadilha” para afastar potenciais ladrões. Essa apreensão o havia impedido anteriormente de expor a bússola à chama verde. No entanto, após observar a reação sutil, sentiu uma onda de determinação.

Duncan estendeu a mão e pegou a bússola. O metal frio parecia ao mesmo tempo familiar e estranho sob seus dedos. Após lançar um breve olhar ao ponteiro inquieto, ele cuidadosamente colocou o objeto na palma de sua mão direita — a mesma que segurava a chama etérea — e gentilmente fechou os dedos ao redor dela.

A chama espectral verde espalhou-se por seus dedos como fogo líquido, envolvendo a bússola em um brilho verde suave. Dentro de sua luz cintilante, inúmeras ilusões efêmeras apareciam e desapareciam. De repente, o ponteiro anteriormente errático parou abruptamente, apontando firmemente em uma direção específica sobre o vasto mar.

Duncan sentiu um impacto dentro de si. Naquele momento, ele percebeu distintamente o ‘resposta’ da bússola, confirmando seu status como um “objeto anômalo” influenciado pela chama espiritual. Mas, antes que pudesse processar completamente os detalhes dessa resposta, foi atingido por uma força semelhante à “gravidade”.

O corpo de Duncan estremeceu ligeiramente, e sua visão ficou turva. O mobiliário da cabine do capitão, as paredes e até mesmo o teto se desintegraram em nada. Eles se transformaram em um turbilhão caótico de luzes e sombras, como flocos de neve em uma tempestade, mergulhando-o em uma profunda escuridão.

 

No centro dessa desorientadora escuridão, a mente de Duncan disparou alarmes. Seu instinto inicial foi alcançar a pistola de pederneira e a espada próximas. No entanto, logo percebeu que apenas a bússola de latão permanecia tangível — ainda estava firmemente presa em sua mão.

Duncan piscou, e, de repente, incontáveis fios de luz finos começaram a emanar da bússola de latão em sua mão.

Esses fios se estendiam e se entrelaçavam na escuridão ao redor, formando uma teia que parecia se estender até o infinito. Em meio a essa rede de tentáculos luminosos, múltiplos pontos de luz emergiram, assemelhando-se a estrelas. Alguns se moviam de forma errática, enquanto outros se agrupavam, lembrando rios celestiais. Contra o fundo dessa intricada malha de luz, elas cintilavam como uma vasta galáxia.

Um misto de confusão e um leve receio cruzou o rosto de Duncan enquanto observava a cena hipnotizante. Ele permaneceu cauteloso e ligeiramente inquieto, mas, curiosamente, não sentia nenhum perigo imediato. De fato…

Em meio à teia luminosa e aos pontos cintilantes de luz estelar, Duncan experimentou uma sensação inesperada de tranquilidade. Era uma sensação de paz e conforto que ele não conhecia havia muito tempo.

No instante seguinte, Duncan sentiu uma sensação incomum percorrer seu corpo. Seu olhar foi irresistivelmente atraído para uma constelação específica dentro da intricada matriz de luz. Ele observou a luz das estrelas, sentindo uma iminente transição da claridade para a escuridão.

Impulsionado por um instinto que não conseguia compreender completamente, ele estendeu a mão em direção à luz das estrelas que enfraquecia.

Naquele exato momento, uma força de atração esmagadora tomou conta dele. Duncan sentiu como se seu espírito estivesse sendo lançado no cosmos enquanto ele involuntariamente se precipitava em direção à luz estelar que enfraquecia. Enquanto isso, a complexa rede de luz gerada pela bússola recuava rapidamente de sua visão. Como um rio celestial, a constelação ao seu redor começou a girar e a se transformar!

Durante essa jornada vertiginosa, Duncan instintivamente olhou para sua mão direita, que segurava a bússola. Para sua surpresa, percebeu que a bússola havia desaparecido em algum momento desconhecido. Simultaneamente, quando estava prestes a alcançar a luz estelar que se apagava, notou uma silhueta emergindo da escuridão ao seu redor.

A silhueta parecia ter surgido naturalmente das trevas, acompanhando-o em sua rápida descida. Juntos, eles mergulharam em direção à luz estelar enfraquecida.

 

Ao examiná-la mais de perto, Duncan conseguiu distinguir que a silhueta se assemelhava a um pássaro, com as asas majestosamente abertas em pleno voo. Mas antes que pudesse observar seus detalhes por completo, sua visão foi subitamente engolida pela escuridão.

Uma sensação de peso, uma intrusão do mundo real, começou a pressionar seus membros. Junto com essa sensação, veio o fedor repulsivo de carne em decomposição e o som áspero de pesadas correntes de ferro arrastando-se pelo chão.

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