Capítulo 24: Pomba?

Na mesa estava uma pomba branca como a neve, parecendo uma escultura finamente trabalhada em mármore, adornada de forma incomum com uma bússola de latão ao redor de seu delicado pescoço — uma bússola pela qual Duncan havia procurado diligentemente por todo o navio. Perto dela, o brilho escuro de uma faca de obsidiana chamou sua atenção. A pomba mantinha uma postura digna, como se estivesse posando para uma pintura clássica.

Surpresa e confusão marcaram o rosto de Duncan, que encontrou uma expressão igualmente perplexa na pomba. Interpretar as expressões faciais de uma ave era uma tarefa difícil, mas Duncan sentiu que entendia o olhar penetrante da pomba. Ele conseguia ler suas expressões complexas e percebeu uma sabedoria estranha no leve rubor de seus olhos. Os olhos esmeraldas da pomba focaram-se com precisão, um olho acompanhando os movimentos de Duncan enquanto o outro se movia de forma errática.

“Uma… pomba?” Duncan quebrou o silêncio, sua voz tingida de confusão e um tique no canto de sua boca. Sua mente foi invadida por perguntas — por que uma pomba? Qual era o propósito dela ali? Por que a bússola estava ao redor do pescoço da pomba e qual o papel da faca nesta cena bizarra?

Será que algo normal aconteceria algum dia neste navio extraordinariamente estranho?

Enquanto a mente de Duncan zumbia com perguntas e especulações, a pomba, antes pensativa, voltou à realidade. Ela assentiu de uma maneira surpreendentemente humana e deu alguns passos na mesa, inclinando-se em direção a Duncan. Esticando o pescoço, soltou um “coo” alto e ressonante.

Duncan olhou silenciosamente para a ave, imagens icônicas de capitães piratas com seus companheiros aviários passando por sua mente. Ele olhou para seu próprio uniforme de capitão e murmurou, “É verdade que um capitão geralmente tem um pássaro, mas normalmente é um papagaio… O que há com essa pomba?”

Para sua surpresa, a pomba balançou a cabeça como se concordasse, depois falou com uma estranha voz feminina e mecânica: “Transportação completa!”

Os pensamentos e murmúrios de Duncan pararam abruptamente, e ele quase engasgou de surpresa ao ouvir a pomba falar.

Ele se lembrou do seu primeiro dia neste navio, quando encontrou uma cabeça de bode falante nos aposentos do capitão. Já não era mais um novato no Desaparecido, as peculiaridades deste mundo já mal o surpreendiam. No entanto, a pomba falante o pegou de surpresa momentaneamente, antes que ele recobrasse a compostura. Uma expressão séria se instalou em seu rosto enquanto conjurava uma chama verde e fantasmagórica em sua mão, mantendo o olhar fixo na pomba.

“De onde você veio?” ele exigiu.

 

Com uma curiosa inclinação de cabeça, a pomba manteve um olho em Duncan enquanto o outro se desviava para o teto. “Erro de endereço. Por favor, verifique o endereço ou entre em contato com o administrador do sistema”, respondeu mecanicamente.

Duncan: “…?”

Uma sombra de confusão passou pelo rosto de Duncan, seguida por uma onda mais profunda de incerteza e espanto. O termo “administrador do sistema” usado pela pomba estava completamente fora de lugar em seu mundo atual. Não tinha nada a ver com a linguagem da cabeça de bode falante, Alice ou dos cultistas envoltos em sombras, mas sim algo que Duncan, um nativo da Terra, achava familiar.

Sem perceber a mudança nas expressões de Duncan, a pomba bicou suas penas imaculadas, ajustou a bússola de latão ao redor do pescoço e passeou ao redor da mesa. Pausou perto da faca de obsidiana, empurrou-a em direção a Duncan com sua garra e declarou com a mesma voz feminina robótica:

“Pegue este machado de batalha movido a energia solar e abrace a glória do combate!”

Sobressaltado, Duncan se levantou tão abruptamente que sua cadeira tombou com um estrondo alto que reverberou pela sala. Ele ficou olhando para a pomba, perplexo e divertido com a absurdidade da situação.

Essa pomba com certeza não podia pertencer ao Desaparecido ou a este mundo bizarro!

As palavras que ela disse eram compreensíveis apenas para “Zhou Ming”!

O estrondo da cadeira provavelmente ecoou para fora dos aposentos do capitão. Logo, Duncan ouviu a voz mental da cabeça de bode falante: “Capitão? Está bem?”

Enquanto mantinha seu olhar intenso na pomba, Duncan respondeu calmamente: “Estou bem.”

 

“A Senhorita Alice chegou e deseja vê-lo. Devo…?”

“Cuide disso”, Duncan interrompeu o Cabeça de Bode.

“Sim, Capitão.”

Duncan suspirou e olhou rapidamente para a porta que dava para a sala de mapas.

O Cabeça de Bode continuou a importunar Alice, e apesar de suas tentativas de sair, ela foi repetidamente frustrada. Duncan sentiu-se compelido a intervir, mas decidiu deixar Alice se virar por mais um tempo enquanto se concentrava em questões mais urgentes.

Dando um momento para se recompor, Duncan se acomodou de volta em sua cadeira, pronto para engajar em uma conversa normal com a estranha pomba em sua mesa. Mas, ao se preparar para falar, ele percebeu algo que havia negligenciado antes.

Um fio esguio de fogo etéreo, tão fino quanto um cabelo, se estendia da chama fantasmagórica verde dançando entre seus dedos. Esse fio de chama se esticava cerca de um pé antes de se dissipar no ar.

Espelhando isso, uma leve névoa da mesma chama etérea envolvia a pomba. O fogo fantasmagórico se aninhava nas penas brancas da pomba, estendendo-se para fora e desaparecendo no ar da mesma maneira.

Com uma linha de preocupação em sua testa, Duncan levantou a mão direita. Com um simples pensamento, a pomba que estava empoleirada na mesa desapareceu no ar.

O momento passou, e a pomba reapareceu, desta vez empoleirada no ombro de Duncan. Ela se ocupou bicando seu cabelo, emitindo um alto “coo”.

 

Com um movimento de dedo, Duncan devolveu a pomba à mesa. A bússola de latão pendia ao redor do pescoço da ave, sua superfície polida refletindo o brilho etéreo da chama verde.

Franzindo a testa, Duncan murmurou em voz alta:

“…Isso pode estar relacionado à bússola de latão?”

Agora ele acreditava fortemente que havia uma ligação específica entre ele e a pomba, um vínculo ainda mais forte do que o que compartilhava com o Desaparecido. Isso poderia explicar o conhecimento da pomba sobre coisas que eram exclusivamente familiares para ele de sua vida passada na Terra. No entanto, a verdadeira razão para a aparição repentina da pomba ainda permanecia um mistério.

Duncan olhou com desconfiança para a peculiar bússola de latão.

A sequência de eventos — desde seus experimentos com a chama etérea, projeção de alma e posse de cadáveres, até o comportamento estranho da bússola — parecia convergir para esse objeto.

Após um momento de hesitação, Duncan estendeu a mão para remover a bússola e examiná-la mais de perto.

A pomba permaneceu passiva, sem tentar fugir. No entanto, os dedos de Duncan passaram diretamente através da bússola como se fosse uma ilusão, tocando apenas as suaves penas do peito da pomba.

Divertida com as tentativas inúteis de Duncan, a pomba deu dois pulos no lugar e gritou: “Hoje é Quinta-feira maluca do KFC, 50 no Pix1…”

Duncan, com um tremor no olho, testou a bússola várias vezes, lutando para aceitar a realidade à sua frente. Eventualmente, teve que admitir que a bússola já não era tangível. Ela havia se transformado em uma ilusão, irremediavelmente ligada à pomba — uma ilusão que não podia ser tocada nem removida.

 

Seria possível que a pomba fosse a verdadeira manifestação da bússola de latão?

Uma enxurrada de teorias passou pela mente de Duncan, muitas tão fantásticas que até ele as achava difíceis de acreditar. A única certeza era que o surgimento da pomba estava profundamente ligado aos seus experimentos com a bússola de latão durante a projeção da alma. Esses encontros poderiam ter alterado a forma física da bússola.

Talvez essa fosse uma propriedade intrínseca da bússola de latão, uma característica fundamental desse “objeto anômalo”, ou poderia ser considerado um “pagamento pelo seu uso”. Quanto ao comportamento peculiar da pomba, não era um efeito da bússola, mas um resultado direto de “Zhou Ming,” o terráqueo.

Nenhuma dessas teorias podia ser confirmada ou refutada de maneira definitiva no momento, a menos que Duncan descobrisse um guia abrangente sobre os objetos incomuns a bordo do Desaparecido.

Por enquanto, sua maior preocupação era como lidar com essa pomba sobrenatural.

Após uma breve pausa para refletir, ele decidiu dar um nome à ave.

“Acho que está na hora de te dar um nome”, disse ele, batendo o dedo contra a mesa enquanto falava com a ave. “Tenho a sensação de que você entende o que estou dizendo, certo?”

Em resposta, a pomba inclinou a cabeça, seus pequenos olhos esmeralda brilhando enquanto olhava para Duncan.

“Ai?” perguntou com sua voz mecanicamente inflexionada.

  1. Em inglês e chinês é usado ‘V me 50’ e ‘V我50’, os dois significam a mesma coisa, que traduzido literalmente é ‘V eu 50’, que basicamente significa ‘me mande 50(reais, dólares, yuans ou afins)’, V se refere a pagamento via aplicativo, tipo Pix/PicPay, que no EUA é o Venmo e na China o Alipay/WeChat.

Deixe um comentário