Capítulo 2
O dia de Matador de Goblins começou cedo.
Ele acordou antes do amanhecer, vestiu seu equipamento e patrulhou a fazenda.
O horário da madrugada criava uma boa prática de visão noturna.
Particularmente, assim que o verão acabava e o outono começava, as manhãs se tornavam escuras e frias. Um tempo bem adequado para ele, e para o goblins.
Nesses minutos gelados antes do horizonte se tornar visível ao longe, ele se dedicava ao treinamento e a vigilância.
Com olhos no chão à frente e arma na mão, ele dava um passo cuidadoso de cada vez.
Se um goblin aparecesse naquele exato momento, ele teria lidado com o tal calmamente e silenciosamente.
Eis quão minucioso ele era, quão minucioso ele queria ser.
— Bom dia! Está um bocado frio hoje, hein?
Assim que o sol nasceu, sua velha amiga se levantou com o canto dos galos.
Ela reclamou da temperatura, principalmente porque não usava nada além de roupas íntimas e um lençol.
Ela se apoiou para fora da janela, expondo alegremente seus grandes seios. Não era de se admirar que estivesse congelando.
— Vai pegar um resfriado. — Matador de Goblins mal olhou para ela, embainhando desapaixonadamente sua espada.
— Ah, estou acostumada. Vou ficar bem. O café da manhã estará pronto daqui a pouco, está bem?
— Não… — Ele inclinou a cabeça como se estivesse à escuta de algo, parecendo pensar. Por fim, ele balançou lentamente a cabeça. — Tem uma coisa que preciso fazer primeiro.
— Oh, sério?
— Por favor, vá em frente e coma. E… — Ele pensou por um momento, mas quando falou, foi no mesmo tom de sempre. — Provavelmente vou me atrasar à noite.
— …Claro. Está bem. — Vaqueira contraiu seus lábios com um pouco de decepção, mas logo depois estava sorrindo de novo. — Se certifique de guardar seus utensílios quando terminar de comer.
— Eu irei.
Com um aceno, ela desapareceu da janela. Ele se afastou dela, com seu olhar fixado no celeiro.
Bem, na verdade era o armazém inutilizado que ele passou a alugar.
Ele abriu a porta que rangeu e entrou.
O chão estava bagunçado com equipamentos e itens inidentificáveis. Ele empurrou as coisas para um lado ou outro, para abrir espaço.
Ele se sentou no espaço aberto que tinha feito desordenadamente, retirou a espada do seu quadril e pegou uma pedra de amolar.
Na luz tênue, Matador de Goblins conseguia ver que a lâmina estava começando a entortar, lascar e enferrujar.
Era dito frequentemente que uma espada não poderia cortar mais que cinco pessoas antes de cegar com sangue e gordura. Era verdade.
Mas, quantas vezes um cozinheiro de nível mundial, permanecendo o dia inteiro na cozinha, afiava sua faca?
Para um excelente espadachim, matar centenas de pessoas era essencialmente a mesma coisa. Mas o que era uma espada, na verdade, senão uma faca de cortar carne?
Só que no calor da batalha, a história era diferente. Muito mais para as espadas roubadas de goblins.
Para ele, armas e armaduras eram consumíveis. Elas poderiam ser retiradas dos inimigos se necessário.
— …
Mas, isso não era razão para negligenciar os cuidados dos seus equipamentos.
Matador de Goblins começou a polir sua espada.
Ele retirou a ferrugem, bateu na lâmina até se endireitar novamente e usou a pedra de amolar para retirar e afiar os lugares lascados.
Em geral, as pessoas acreditavam que uma espada só era boa se pudesse dobrar sem quebrar.
Mas a única coisa boa nessa arma era a habilidade do fabricante da Guilda que a fez. Era claramente uma obra simples de produção em massa, não uma lâmina famosa. Do jeito que era, ele poderia lançá-la sem hesitação.
— Próximo.
Ele pôs a espada de volta na bainha e se moveu para a próxima peça do equipamento.
Para o melhor ou para pior, ele havia substituído inteiramente seu escudo, armadura e capacete durante os acontecimentos na cidade da água. Particularmente, ele não queria usá-los para sempre, mas ele estava grato por eles ainda assim.
Consequentemente, tudo o que eles precisavam era de um bom polimento e uma inspeção rápida. Suas botas exigiam consideravelmente mais atenção, no entanto.
Elas, também, não eram nada especiais, do tipo que poderiam ser encontradas em qualquer lugar. Dito isso, elas eram importantes para andar e correr pelas cavernas e planícies, expulsar e esmagar inimigos. Ele dificilmente poderia ficar atolado em extensões normais de lama, muito menos em uma Trapeira.
Ele checou as solas das botas, raspando toda terra incrustada e limpando.
Ele verificou os cadarços, e se estivessem desgastados, ele os substituiria por novos.
Isso por si só reduzia a chance de ter um tropeço infeliz, e isso era razão suficiente para o fazer.
A seguir foram suas meias. Sua importância não pode ser subestimada. Elas eram cruciais para prevenir bolhas e problemas nos pés em caminhadas longas por terrenos ruins ou pântanos.
Seu mestre tinha feito pouco uso de calçados, mas isso foi porque ele fora um rhea. A raça de baixa estatura normalmente ficava descalça, o que era dizer que seus próprios membros eram “sapatos” melhores.
Se você pudesse ir a qualquer lugar sem fazer barulho, sem sequer escorregar, não havia nada a temer. Matador de Goblins sempre pensou que era uma habilidade que valia a pena aprender.
— Agora.
Tendo dado aos seus equipamentos uma olhada, ele ficou lentamente de pé.
Um capacete com manchas carmesim-escuras parecia ter caído de uma prateleira.
Era um equipamento antigo. Matador de Goblins o pegou e colocou de volta no lugar.
Agora seu armazém de itens estava bem organizado. Era hora de arranjar algum equipamento agrícola também.
Deixando a pedra de amolar onde estava, ele estava prestes a sair do galpão, quando viu uma figura na porta.
— …Você é um trabalhador dedicado.
— …Sim, senhor.
Ele avistou o fio de fumaça do tabaco na manhã magnífica.
O dono da fazenda estava encostado na parede, fumando seu cachimbo.
Ele tinha uma expressão sombria e Matador de Goblins curvou seu capacete bem levemente.
— Bom dia, senhor.
— Bom dia — disse o dono com a aspereza de uma clava. — Soube que prometeu ir ao festival com a minha garota.
— Sim, senhor.
— …Como seu pai adotivo, não sei se deveria ficar com raiva por isso.
Ele falou com um olhar azedo. Seus olhos se encontraram. Mas então ele sorriu.
Matador de Goblins notou que tinha esquecido inteiramente de como o sorriso do homem se parecia.
O dono franziu o rosto, abaixou a cabeça e coçou seus poucos cabelos.
— Sem me intrometer na sua vida, mas… — murmurou ele para ninguém em particular. — Sei que não tem intenção de a enganar. Mas, bem… não dê esperanças a ela.
— Sim, senhor.
— Ouvi dizer que você tem um bom número de mulheres perto de você… Eu sei, eu sei. Você não é do tipo em ser tão afetado por isso.
— Sim, senhor.
— Ela provavelmente deve saber também… Mas pense um pouco em seus sentimentos de vez em quando.
— …Sim, senhor.
O dono observou o aceno firme de Matador de Goblins, e aquela expressão ilegível regressou em seu rosto.
— Contanto que entenda isso. Ou… — Ele se cortou e lançou um olhar duvidoso para o capacete. — Você entende?
— Acredito que sim — respondeu Matador de Goblins. — Embora eu não esteja confiante.
Nisso, o dono esfregou a ponta do nariz com o dedo.
— …O que pretende fazer, depois disso? — perguntou o dono da fazenda.
— Depois de acabar de fazer a manutenção no equipamento da fazenda, pensei em ir à cidade fazer compras.
— Você vai, agora…?
O dono mordeu sem graça o final do seu cachimbo e fechou os olhos. Ele parecia inseguro do que dizer a seguir.
Quando ele finalmente falou, disse com uma voz tensa.
— …Pelo menos espere até após o café da manhã.
— …
— Aquela garota fez para você.
— Sim, senhor.
— Você tem um dia de folga dessa vez. Vá com calma.
— Sim, senhor. Contudo… — Ele parou por um momento, quase perdido. — Tempo livre é algo que não entendo muito bem.
Matador de Goblins não esqueceu de limpar depois do café da manhã.
Era uma roupa íntima.
Ou, mais precisamente, era uma armadura que se parecia bastante com uma roupa íntima.
O conjunto incluía uma cobertura para o peito, luvas e uma coisinha para os membros inferiores. Categoricamente falando, poderia ser chamado de armadura leve.
Em termos de mobilidade, superava facilmente um conjunto completo de armadura de placas.
A armadura em si era lindamente curvada, elaborada e sólida.
O problema era que não cobria área suficiente.
Era só uma armadura de torso — na verdade, armadura de mama — e calcinha.
Havia ombreiras, verdade, mas isso não era bem a questão. Um bom golpe no abdômen e as entranhas de um aventureiro tomaria um sol. Também não fornecia defesa contra uma apunhalada por trás, um ferimento que poderia ser crítico facilmente.
Bem, nesse caso, pelo menos a armadura fornecia acesso fácil para a administração de primeiros socorros. Ou talvez deveria ajudar seu portador focar em não ser atingido.
Mas no final das contas, alguém estava realmente disposto a usar nada além disso sobre sua pele?
Certamente precisava de um complemento; uma camisa de cota de malha, algum tipo de armadura íntima? Poderíamos pelo menos parar um soco.
— Não, não, não, nunca irá dar certo.
— Por que não?
— Cobrir seu próprio corpo esconderia exatamente o que faz uma mulher atrat…
Cavaleira parou e lançou um olhar de lado para o guerreiro imundo ao lado dela.
— Ugh. Matador de Goblins?!
— Sim. — Ele assentiu.
Eles estavam na loja de equipamentos da Guilda dos Aventureiros.
Havia pilhas de itens por todo lado. Na oficina perto dos fundos, o mestre e seu aprendiz batiam com seus martelos.
Matador de Goblins vinha frequentemente pedir novos itens, mas essa foi a primeira vez que ele tinha visto Cavaleira aqui. Em parte, isso era porque o equipamento de uma cavaleira — de sua amada armadura de placas às suas espadas e escudos — não precisava ser substituído muitas vezes.
Como é que alguém como ela, que precisava de grande proteção para sobreviver ao seu papel de vanguarda, sequer consideraria uma armadura como essa?
— Está planejando mudar para armadura leve?
— Hã? Eu? Ah, não, eu só… — Sua forma firme habitual desapareceu quando ela ficou muda e olhou para Matador de Goblins de soslaio. — Francamente, ver você me faz querer desistir de usar armadura de couro.
— É mesmo?
Matador de Goblins inclinou a cabeça. Ele era o retrato de desleixado.
Cota de malha e armadura de couro suja, coberto por um capacete de aparência barata que escondia seu rosto.
É claro, a dureza da armadura de couro tratada com cera não devia ser desprezada. Era sem dúvida mais leve que armadura metálica, mas se bem-feita, permitia que o portador permanecesse ágil. Capacetes estavam fora de moda pelos jovens e aventureiros promissores, mas eles protegiam contra um ataque surpresa na cabeça. Em combinação com a camiseta de cota de malha, era perfeito para lutar com goblins em espaços apertados e escuros.
— Você não poderia, sabe… — Cavaleira observou ele da cabeça aos pés, tentando encontrar as palavras certas. — …polir um pouco?
Talvez só tirar essas manchas carmesins misteriosas dela.
— Isso é proposital. — Matador de Goblins falou com o mesmo desapego de sempre, no entanto, havia um toque de autossatisfação com seu próprio conhecimento. — Impede que os goblins notem meu cheiro.
— …Ao menos mantenha seu corpo limpo.
— Sim. — Matador de Goblins assentiu, severamente. — Ou as pessoas ficarão com raiva de mim.
Cavaleira presumiu que ele estava falando sério. Ela ergueu os olhos para o teto como se estivesse rezando aos deuses.
Ela não estava procurando por um oráculo ou ajuda, é claro. Era algo que ela fazia no calor do momento.
Acho que desistirei de fazer perguntas enquanto posso.
— …Então. O que está comprando hoje?
— Estacas e dois rolos de corda. Também preciso de arame e madeira. Tenho que substituir minha pá também.
— ……… — Cavaleira deu um gemido involuntário. — Pode repetir?
— Estacas e dois rolos de corda. Também preciso de arame e madeira. Tenho que substituir minha pá também.
— Que tipo de aventura precisa de tudo isso?
— Não é para uma aventura. — Matador de Goblins balançou a cabeça. — É para matar goblins.
Cavaleira deu um suspiro. É claro.
Mas Matador de Goblins estava alheio a reação dela, e em vez disso estudava a armadura com grande interesse.
Parecia para ele como um par de roupas íntimas, algo que ele hesitaria chamar de armadura.
— O que é isso? Parte de armadura?
— De certa forma, eu acho — disse Cavaleira, mas Matador de Goblins não entendia realmente o que ela quis dizer. De todas as aparências, era consideravelmente mais do que uma “parte de armadura”, mas consideravelmente menos que “armadura”. Ninguém em sã consciência usaria isso em qualquer aventura onde poderia se deparar com monstros.
Bem, talvez certos lutadores talentosos conseguiriam. Ou talvez alguém na retaguarda, uma maga ou ladra, ou mesmo uma monja.
Tendo chegado a essa conclusão, Matador de Goblins balançou a cabeça suavemente.
— Nunca daria certo.
— …É… Aventureiras, sabe… — Cavaleira parecia estar tentando responder sua objeção. Mas seu rosto estava vermelho e ela não conseguia olhar para ele. Ela mal conseguiu articular as palavras, muito diferente do seu eu normal. — Digo, não temos… muitos caras interessados por aí.
— É mesmo?
Matador de Goblins inclinou a cabeça.
Cavaleira, ao menos, impressionava ele pela beleza.
Seu cabelo dourado adorável. Seus olhos amendoados. Ela também tinha traços faciais belos e sua pele parecia lisa. Se pusesse um vestido, ela poderia se passar por filha de uma nobre.
Mas ela só respondeu “Sim, é”. E assim devia ser.
— Pense nisso. Aventureiros jovens sempre acabam se casando com princesas ou alguma aldeã que eles resgatam.
— Ouvi dizer. Não posso falar por experiência própria. — Matador de Goblins inclinou seu capacete um pouco.
Ele se lembrava de ouvir essas histórias dos livros quando era pequeno.
O cavaleiro matava o dragão e salvava a princesa. Ele a levava para seu castelo, onde recusava a realeza e em vez disso viajava para longe.
E em uma terra estranha e distante, ele se casava com a princesa e fundava um novo país.
— Bem, acredite em mim.
Matador de Goblins teve o mesmo tom sério que usava quando resolvia enigmas. — Então? E daí?
— Bem, o que acha que acontece com todas as aventureiras sobrando? — A expressão de Cavaleira era desapontada e sombria.
— Hm — murmurou Matador de Goblins, cruzando seus braços. — Talvez pudessem se casar com um dos seus companheiros.
— Conheço muitos grupos que terminaram quando o amor entrou no caminho e a situação se tornou insuportável.
— Histórias terríveis.
Realmente. Matador de Goblins falou do tema com grande gravidade.
Matador de Goblins tinha visto mais de um grupo com muitas mulheres, mas manter eles juntos era um desafio.
No entanto, ele também tinha ouvido dizer que grupos com apenas mulheres frequentemente se davam muito bem. Ele pareceu recordar de ouvir alguma coisa assim de uma Amazona há muito tempo.
Ele não tinha pensado na época que poderia ser de um benefício especial em extermínio de goblins, mas, pensando melhor, ele desejou ter pedido detalhes. Afinal, agora ele tinha duas mulheres em seu grupo. Então as histórias não teriam sido tão irrelevantes quanto pensava.
— Então, encontre um marido que não seja um aventureiro.
De qualquer forma, agora mesmo ele tinha de falar com a pessoa com quem estava. Matador de Goblins ofereceu o que ele pensava ser uma sugestão prática.
Mas, Cavaleira lhe deu um sorriso desesperado apto para ser usado durante o fim do mundo.
— Você realmente acha que algum cara está esperando por uma garota que pode derrubar um troll ou um dragão com um golpe de sua lâmina?
— Não há?
— …Bem, o que você acharia de uma mulher assim?
— Que ela deve ser bastante fiável.
— …Deixa para lá — disse ela, dando a Matador de Goblins um olhar duvidoso e um suspiro profundo. — Pessoalmente, não estou realmente interessada em não-aventureiros, mas… — A normalmente implacável cavaleira se moveu de um pé para o outro, insegura de onde repousar seu olhar. — Talvez valeria a pena parecer só um pouco menos… durona.
— Sim. — Nesse momento, Matador de Goblins começou finalmente a juntar as peças.
Aquele lutador abundantemente armadurado no grupo dela, Guerreiro de Armadura Pesada.
Matador de Goblins imaginou o rosto bem definido de um homem sempre cuidando dos membros mais novos do seu grupo.
— É ele?
— …É.
Cavaleira respondeu com um leve aceno, a imagem de uma garota inocente.
Espere…
Matador de Goblins soltou a metade de um suspiro.
Ele sempre tinha a tomado como sendo a mais velha, por causa de sua conduta comedida, mas, talvez ela fosse mais nova do que ele tinha imaginado.
Bem, então era assim.
— Pensei que amor entre membros do grupo tornasse as coisas insuportáveis.
— Há exceções a todas as regras!
— Entendo.
— …Ei, hum, Matador de Goblins… me dói pedir isso, mas… — Cavaleira engoliu em seco, e isso pareceu a constranger de novo quando ficou vermelha. — Se eu… Se eu usar algo assim, acha que iria chamar a atenção dele…?
— Confesso que devo duvidar da sanidade de alguém que me faça essa pergunta.
— Ugh…
Parada em frente à armadura biquíni, Cavaleira se viu sem saber o que fazer.
Como uma parede inabalável em combate, ela não estava acostumada a tomar acerto crítico.
— Se quiser lançar um ataque surpresa, você precisa mudar.
— …Hã?
Teria sido um descrédito ao seu papel como um tanque se a declaração inesperada fosse o suficiente para atordoá-la, no entanto. Ela alterou duvidosamente sua postura.
— Tentar coisas semelhantes de novo e de novo terá pouco efeito. Ao menos, em extermínio de goblins.
— …Não perguntei sobre extermínio de goblins.
Cavaleira olhou para ele com exasperação.
Matador de Goblins cruzou os braços. Ele pensou, então continuou desapaixonadamente.
Ele realmente não tinha nada a utilizar a não ser sua própria experiência.
— Você está falando de roupas. Você normalmente usa armadura. Então precisa se afastar dela. Use roupas civis.
— Ahn… R-roupas civis…? …C-certo. Vou pensar nisso.
— Entendo.
— É. Hum… desculpe a pergunta estranha.
— Não me importo. — Matador de Goblins balançou a cabeça. — Somos colegas.
Isso fez Cavaleira pestanejar.
Ela não estava preparada para isso, parecia. Ela olhou atentamente para o capacete sujo e então seu rosto relaxou.
— …Você é um esquisito estranho e teimoso.
— Entendi.
— Mas, parece que você não é um cara mau.
Esse foi o seu ataque surpresa. Ela sorriu.
— Até mais — disse ela, brilhantemente, e deixou Matador de Goblins lá parado, sem palavras.
— Keh-heh-heh! Que acha disso? Acho que ela gosta de você.
Matador de Goblins descobriu a fonte da risada fraca, o mestre da oficina.
Há quanto tempo ele esteve ouvindo? O velho, suficientemente baixo para ser confundido com um anão, saiu de dentro da loja.
Matador de Goblins transferiu sua conversação recente para a parte de trás de sua mente, avançando ousadamente.
— Quero fazer um pedido. Estacas e…
— Acha que não pude te ouvir? Já tenho tudo pronto aqui. Você, garoto, traga as mercadorias!
— Simssenhor!
O aprendiz obedeceu rapidamente seu mestre. Ele carregou estacas, arame e tudo mais para o balcão.
— Obrigado — disse Matador de Goblins, e começou a inspecionar os itens.
Alguns itens tiveram de ser ordenados nessa oficina, mas outros, eles já tinham em estoque em algum lugar ou outro.
Agora, com tudo o que precisava, ele enfiou os itens debaixo do braço. Ele ajeitou a pá contra o ombro, depois colocou todo o resto em um pacote.
Aventureiros aprendem rapidamente como empacotar tudo no menor espaço possível.
— Você fez um bom trabalho se fazendo popular aqui nos últimos cinco anos, não é?
Matador de Goblins puxou sua bolsa do pacote, deixando algumas moedas retinir pelo balcão.
O mestre contou elas com o dedo musculoso, deslizando elas pela superfície plana. Seus olhos se estreitaram acima de suas bochechas enrugadas.
— Está certo?
— Está.
— Entendi.
— Aham.
O velho sorriu, como se recordando de alguma história embaraçosa sobre um parente.
— Quando você chegou aqui, um garoto de quinze anos que queria equipamento barato, pensei que nunca mais o veria.
— Sendo a abordagem mais rentável, foi a escolha adequada na época.
— Verdade, e pensei que você poderia melhorar um dia. Mas você continuou usando esses itens e comprando novos.
— Mataria você comprar uma espada decente de vez em quando?
Matador de Goblins não respondeu.
Ele sabia que isso era todo o equipamento necessário para matar goblins.
Mesmo se tivesse existido uma espada encantada só para matar goblins, esse aventureiro provavelmente não a teria usado.
— Ah, bem. — O mestre se apoiou contra o balcão como um velho cansado de sua própria tolice. — Com disposição para comprar algo mais hoje? Tenho uma coisa só um pouquinho incomum.
— O quê?
— Uma faca de arremesso do estilo do sul.
— Oh-ho.
A reação de Matador de Goblins não escapou da atenção do mestre.
— Chamou sua atenção, não é? — disse o velho com um sorriso ousado. Ele não esperou por uma resposta antes de se virar.
Ele pegou da prateleira uma faca com forma estranha e a colocou no balcão com um tuc sólido.
Era uma adaga muito incomum.
A lâmina se dividia em três, cada uma dobrada como um ramo. Não parecia destinada a combate corpo-a-corpo típico. A única forma de usá-la seria lançar.
Mas era claramente uma faca, em outras palavras, uma arma não muito formidável.
— Pequena invenção minha. O que acha?
Matador de Goblins pegou a lâmina retorcida na mão. Ele fez uma postura, desferiu alguns golpes casuais e finalmente assentiu.
— Goblins teriam problemas em imitá-la.
— Qualquer um teria problemas em imitá-la!
— …Quais são suas vantagens?
O mestre franziu a testa. Mas, apesar de seu aspecto tenso, ele continuou alegremente, talvez aproveitando a oportunidade de discutir sua arma.
— Sei o que se parece, mas é realmente uma espada.
Seus dedos, brutos dos anos trabalhando na forja, apontou para as três lâminas.
— Elas giram quando você joga… para estabilidade e fazê-la ir mais longe. É mais para cortar que esfaquear.
— Assim como facas de arremesso orientais.
— Essas são armas perfurantes. Armas perfurantes de baixa qualidade.
— Entendi.
Matador de Goblins passou seu dedo pelo cata-vento de lâminas.
Parecia aceitável, ao menos. Não machucaria.
— Vou levar uma então.
— Prazer em negociar. Cinco… não, quatro peças de ouro.
Um pouco caro para uma arma de arremesso, mas Matador de Goblins contabilizou prontamente.
Ele enfileirou as moedas novíssimas em cima do balcão, e o velho as pegou sem sequer parar para assegurar sua qualidade.
Esse jovem, esse caçador de goblins obstinado, preferia armas como essas a qualquer armamento lendário.
Ele era um cliente regular daqui há cinco anos, e qualquer lojista que não conseguisse descobrir as preferências de um cliente depois desse tempo todo estaria fora do negócio.
E ele duvidava muito que esse homem incomum fosse do tipo de tentar pagar com dinheiro falso.
— E pergaminhos. Se você conseguir algum, guarde-os para mim. — Matador de Goblins pendurou a faca em forma de hélice atrás de si, em seu cinto. Ele tentou sacá-la por diversas vezes, a movendo até que já não esbarrasse contra seu pacote de item.
O lojista o observou com uma expressão satisfeita e respondeu: — Claro, como sempre. Embora não vejo muitos deles. Mais alguma coisa?
— Hmm.
Finalmente satisfeito com a posição da arma de arremessar, alguma coisa pareceu passar pela cabeça de Matador de Goblins de repente.
— …Não me incomodaria um pouco de peixe seco.
— Eu vendo armaduras e armas aqui. Não sou um peixeiro.
— Entendo.
O capacete inexpressivo se inclinou. O lojista suspirou.
Todos esses pedidos estranhos. Será que ele realmente percebe…?
— …Se conservado está bom… eu tenho alguns.
— Nesse caso, por favor, entregue dois ou três barris deles na fazenda.
— Barris? Já te disse, aqui não é a mercearia.
Mas saiu como um murmuro. O velho pegou seu livro de encomendas, lambeu sua pena e anotou.
Terminado as compras, Matador de Goblins deixou o arsenal com seu habitual passo despreocupado.
Ele marchou ousadamente para o quadro de avisos da Guilda, analisando cada missão nova.
Todos os outros aventureiros já haviam escolhido suas missões. O quadro de avisos era visível nos locais onde pedaços de papéis tinham sido retirados.
Problemas com dragão. Ruínas inexploradas. Ogro (o que era isso?). Reunir recursos na floresta. Uma caça ao tesouro. Um vampiro em um castelo velho (ele tinha ouvido falar de tais criaturas). Extermínio de ratos no esgoto. Acabar com um bando de bandidos.
Ele via periodicamente palavras como Seita do Mal, Deuses das Trevas, extermínio de demônios e investigação.
Ele procurou do canto superior direito ao canto esquerdo, linha por linha, até que chegou na parte inferior esquerda.
Ele repetiu isso duas ou três vezes, depois chegou finalmente a uma conclusão.
— …Nada hoje.
Era incomum. Goblins podiam aparecer em qualquer lugar, a qualquer momento.
Ele olhou na direção da recepção, mas não viu nenhum sinal de Garota da Guilda.
— …Hum.
Com o menor dos grunhidos, ele foi em direção à recepção de qualquer forma.
Seu capacete de metal girou para esquerda e para direita, até que viu uma funcionária da Guilda que parecia ter tempo livre.
— Ei.
— O qu…? Hum, ah!
A funcionária assustada deixou cair o livro que estava lendo secretamente atrás do registro.
A funcionária — Inspetora — pegou seu livro como se nada tivesse acontecido e pôs rapidamente um sorriso.
— Oh, se não é Matador de Goblins.
O aventureiro excêntrico era famoso em toda a Guilda, em mais de um sentido.
— É sobre a missão de ontem? Temos a recompensa pronta para pagar…
— Tudo bem então. Por favor, divida em dois sacos. Igualmente.
— Claro, senhor.
— Gostaria também de fazer meu relatório detalhado.
— Ah… Pode deixar ele comigo, se não houver problema… — Inspetora olhou hesitantemente para uma sala dos fundos do escritório. — Espero que ela não fique chateada comigo, no entanto…
Matador de Goblins não compreendeu bem o que Inspetora estava murmurando.
— Você não está designado a mim, então talvez eu não entenda tudo. Outro dia está bem?
— Não ligo — disse Matador de Goblins com um aceno indiferente. — Mas… ela está bem?
— Ah, está ótima. — Inspetora abaixou a voz em um sussurro, evidentemente atenta aos seus arredores e sorriu. — Há muito para se cuidar antes de tomar uma folga. Ela teve que fazer tudo ao mesmo tempo hoje.
— Entendi.
— Posso lhe contar que Matador de Goblins estava preocupado com ela?
— Não estou preocupado. — Mas ele não recusou exatamente, acrescentando “Não me importo” com um aceno.
O sorriso de Inspetora se ampliou. Ele virou seu capacete para indicar o quadro de avisos.
— Goblins. Nenhum hoje?
— Extermínio de goblins? Só um momento, por favor. — Inspetora sumiu em uma das salas de trás e voltou com uma bolsa de couro de um cofre.
Ela mensurou as peças de ouro de dentro com uma balança, depois as transferiu para dois sacos novos.
— Aqui está.
— Obrigado.
— Agora, quanto ao extermínio de goblins…
Matador de Goblins pegou a recompensa indiferentemente e enfiou os dois sacos em sua bolsa. Enquanto fazia isso, Inspetora pegou um registro e folheou as páginas.
— Vejamos… Tem razão. Parece que não há pedidos envolvendo goblins hoje.
— Houve alguma outra pessoa que já pegou?
— Não, senhor. Não parece ser assim hoje.
— Entendi — disse Matador de Goblins, com algo como um suspiro baixo.
— Você parece desapontado.
— Sim. — Inspetora tinha falado despreocupadamente, mas Matador de Goblins assentiu seriamente. — Muito desapontado.
— Lamento não poder ajudar — disse Inspetora, desnorteada com sua resposta. Matador de Goblins se virou e se afastou.
Goblins eram criaturas larápias e conspiradoras. Embora eles criassem armas e ferramentas rústicas, nunca passava pelas suas cabeças fazer sua própria comida ou mesmo sua própria residência. Eles sobreviviam roubando o que precisavam…
— …
…Em outras palavras, eles estavam aguardando o momento.
Matador de Goblins grunhiu e balançou a cabeça. Ele olhou em volta do saguão enquanto reunia seus pensamentos.
— Ouuch! Minha cabeça parece como se fosse explodir! E Garota da Guilda nem está aqui!
— Tolo. É porque, você bebeu, demais.
Lá estava Lanceiro, segurando sua cabeça outrora confusa, e Bruxa, como de costume.
— Oh, ei, você voltou. Céus, quanto tempo leva para comprar um item? — disse Guerreiro de Armadura Pesada, descansando seu queixo nas mãos. Cavaleira corou furiosamente.
— A-ah, silêncio. Há vários tipos de coisas para se considerar…
Meio-Elfo Guerreiro saltou alegremente. — Então, até a nossa amada Cavaleira quer parecer elegante para o festival!
— Uau, sério?! Oh, isso é ótimo. Me pergunto também se deveria usar um vestido ou algo parecido — disse Druidesa, envolvendo suas bochechas com a mão. Mas, Garoto Batedor brincou com ela friamente.
— Querendo parecer elegante, hein, mana? …Bem, pelo menos você é bonita por dentro.
— O-o que você disse?!
— Ei, fale baixo, não grite!
O grupo de Guerreiro de Armadura Pesada estava bastante encantado em discutir sobre o festival. Perto deles, Guerreiro Novato e Sacerdotisa Aprendiz pareciam desinteressados.
— Você só vai ficar com suas vestes votivas? Eu esperava te ver com suas roupas de ritual…
— Cuidado, ou te deixo estirado.
— É, mas quero dizer, é um festival…
— ……B-bem, acho que talvez eu possa… me arrumar um pouco…
— Sério?! Ooo!
— Ei, não faça disso grande coisa, está me envergonhando!
Os outros aventureiros estavam da mesma forma. Todos cheios de entusiasmo com as festividades por vir. Nenhuma única pessoa parecia estar não ansiosa por isso.
— …Quase nenhuma — murmurou Matador de Goblins dentro de seu capacete, enquanto seu olhar se encontrou com um aventureiro sentado no canto. O jovem usava um sobretudo preto, quase audaciosamente, e observava os aventureiros com um olhar reluzente.
Não era estranho. Ambição era necessária para ter sucesso nesse tipo de trabalho.
Matador de Goblins começou a andar lentamente, observando todo mundo de sua visão periférica.
Havia sempre muitas coisas em que pensar. Sempre muita poucas pistas.
E muito a se fazer, pensou ele…
— Hmm
— Oh!
Sacerdotisa veio frenética do lado de fora e tudo mais, e quase se chocou com ele. Ela se ajeitou e agarrou sua mitra.
— Ah, hum, ah, M-Matador de Goblins, senhor! — Suas bochechas coraram diante de seus olhos, embora ele não tivesse ideia do que ela estava envergonhada. Ele praticamente esperava que fumaça saísse das orelhas dela enquanto inclinava sua cabeça.
— Você foi capaz de dormir ontem à noite?
— S-sim. Estou bem.
Talvez estivesse só sendo paranoico. Os olhos de Sacerdotisa se moviam de um lugar ao outro ansiosamente.
— Hmm — grunhiu levemente Matador de Goblins. — Quero dar isso a você antes que me esqueça.
— Oh!
Matador de Goblins passou sua bolsa de moedas, e Sacerdotisa pegou com ambas as mãos para evitar deixar cair. O embrulho ressoou discretamente enquanto ela agarrava ele ao seu peito modesto.
— De ontem.
— Obr-obrigada…
Ela guardou o dinheiro da recompensa cuidadosamente, mas seus pensamentos pareciam estar em outro lugar. Seu olhar se mantinha na oficina.
Matador de Goblins ficou quieto por um momento antes de perguntar categoricamente: — Precisa de equipamentos novos?
— Oh! Hum…
Ele parecia ter adivinhado corretamente.
Agora toda a sua cabeça girou, se movendo para frente e para trás, entre Matador de Goblins e a oficina. Ele não conseguia entender o que poderia estar a incomodando.
— Precisa de conselho?
— N… — A voz de Sacerdotisa chiou. — N-não, não… preciso. Estou muito… bem… obrigada!
— Entendi.
Ele deixou as coisas assim, passando por ela.
Para ele, pelo menos, tudo isso era perfeitamente natural. A gargalhada do velho por detrás dele nem sequer provocou um olhar para trás. Talvez o sênior estivesse interessado na garota.
Isso não era — ou deveria ter sido — uma coisa ruim.
Diz-se que o período antes de um festival é o próprio festival.
Quando saiu na cidade, ele ouviu martelos batendo em madeira, estandartes balançando, a brisa soprando.
Aventureiros não eram os únicos que viviam nessa cidade fronteiriça. Mulheres jovens vasculhavam os estoques de lojas, decorados para as celebrações, pensando no que fazer em relação as suas roupas. Crianças corriam pelas ruas amplas, pensando, sem dúvida, como gastariam seus trocados. Seria bastante fácil para seus planos se revelarem ao verem um brinquedo em uma vitrine.
Vegetais cortados estranhamente estavam secando à beira da estrada, aguardando a hora de serem tecidos em lanternas. Mais carroças e carruagens do que o habitual percorria as ruas.
Uma abundância de alimentos e roupas estavam à venda, e visitantes também não estavam escassos. Era apenas natural com um festival chegando.
Essa área ainda era a fronteira, sempre atacada por monstros, ameaçada por Deuses Demônios e sob seu ordenamento. Assim, era compreensível que, pelo menos, na época do festival, todos queriam se divertir tanto quanto pudessem.
— Hmm.
Matador de Goblins lançou um olhar em tudo isso, então, seguiu pela rua atrás do edifício da Guilda.
A luz do sol brilhava na diagonal, muito mais fraca que no verão. O sol pairava no alto do céu, mas a brisa fresca fazia parecer como a primavera.
O cheiro de algo grelhado flutuava da galeria da Guilda.
De fato, vestígios de fumaça de cozinha estavam subindo de muitas das casas na cidade. Era hora do almoço.
Então, é por isso que aquelas crianças estavam correndo.
Os campos de treino estavam vazios. Qualquer aventureiro em uma missão já havia partido, e o resto provavelmente não era tão dedicado ao seu treinamento a ponto de perder o almoço.
Perfeito.
Ele abaixou a cabeça uma vez e foi para um canto dos campos, onde se sentou à sombra de uma árvore.
Depois ele abaixou a pá e desamarrou o embrulho ligado a ela, estabelecendo uma loja rapidamente.
Estacas, madeira, arame, corda, etc… Uma variedade de itens, muitos deles sem relações com aventuras.
Depois de sacar sua espada curta, ele começou imediatamente seu trabalho.
Ele raspava as estacas em pontas incrivelmente afiadas, batia elas na madeira e as angulava. Então ele amarrava a corda em torno de tudo isso de uma forma estranha.
Seus movimentos eram espadaúdos, mas precisos, entretanto, o que quer que ele estivesse fazendo parecia perigoso demais para ser de uso diário.
Se Alta-Elfa Arqueira estivesse ali ela teria, sem dúvida, vibrado suas orelhas de curiosidade. Sacerdotisa teria perguntado vacilantemente o que ele tramava.
Mas, não foi nenhuma delas que o chamou enquanto ele ficava lá, absorvido em seu trabalho.
— Oh!
— Ho ho!
Duas vozes muito intrigadas. Matador de Goblins levantou brevemente seu capacete.
Um homem em forma de barril, e outro alto e magro. Anão Xamã e Lagarto Sacerdote, dois de seus companheiros.
Suas sombras — uma alta, outra baixa — se sobrepuseram com a de Matador de Goblins debaixo da árvore.
— Ah, meu senhor Matador de Goblins. Mais um belo dia hoje. — Lagarto Sacerdote juntou suas mãos em um gesto estranho, contumaz por olhar para Matador de Goblins. — Esperamos que o tempo para o festival de amanhã seja tão agradável quanto esse.
— Sim. — Matador de Goblins assentiu sem pausar com seu trabalho. — Espero que seja ensolarado.
— Concordo, concordo. — Lagarto Sacerdote bateu no chão com a cauda. Ao lado dele, Anão Xamã acariciava seu queixo.
— Não somos trabalhadores árduos. O que você tem aí?
— Estou preparando uma coisa.
Matador de Goblins teve poucas palavras para o anão, que analisava o aparato com a mão ainda em sua barba.
Era uma coisa ou outra envolvendo várias estacas, uma pá, alguns arames e um pouco de madeira.
Os olhos de Lagarto Sacerdote reviraram e brilharam com a perspectiva de batalha.
— Está planejando expulsar um vampiro?
— …? — Matador de Goblins inclinou seu capacete. — Por que acha isso?
— Creio que está bem estabelecido que alguém pode derrotar um vampiro com uma estaca de madeira branca.
— É?
— Acho que deveríamos ficar impressionados por você ao menos saber o que é um vampiro — disse Anão Xamã, meio exasperado e meio entretido.
Vampiros eram ranqueados com dragões como os monstros mais famosos do mundo.
É claro, a maior parte do conhecimento sobre os mortos-vivos era segredo, conhecido em detalhes apenas por magos e clérigos. Mas, para um homem que nem sabia o que era um ogro, ser capaz de reconhecer vampiros merecia uma atenção especial.
— Não estou muito interessado neles.
Depois de sua resposta breve e completamente previsível, Matador de Goblins voltou a apontar as estacas.
Mas então ele murmurou “Hm”, e parou subitamente de trabalhar, inclinando a cabeça. — Vampiros… Eles aumentam seus números mordendo as pessoas, não é?
— Ou assim se ouve.
— …Se um goblin se tornasse um vampiro, me pergunto como iria me preparar.
Anão Xamã suspirou, mas Matador de Goblins estava completamente sério.
— Bem, então — disse Lagarto Sacerdote, tocando a ponta de seu nariz com a língua. — Um goblin morto é um cadáver goblin. Caso venha a se mexer, não seria considerado algum tipo de zumbi?
— Seja como for — retorquiu Anão Xamã, mal conseguindo conter seu riso — não consigo imaginar ninguém querendo beber sangue de goblin para começar.
— Entendo. — Matador de Goblins balançou a cabeça firmemente. Se ele estava respondendo a insinuação de Lagarto Sacerdote ou de Anão Xamã, não ficou claro.
Depois ele retomou seu afazer, e a pilha de cavaco crescia enquanto eles observavam.
Anão Xamã abanou as lascas de madeira com seus dedos grossos, então começou a escolher os outros alojados em sua barba.
— Isso é para extermínio de goblins?
— É.
— Pensei que sim.
Aqui era onde Alta-Elfa Arqueira teria posto normalmente suas orelhas para trás com uma mudança gélida de atitude.
Mas, depois de meio anos juntos, Anão Xamã estava acostumado com essas coisas. Ele deixou passar.
— Então, suponho que não deveria perguntar os detalhes.
— É impossível saber de onde os goblins surgirão.
— Verdade, de fato — disse Lagarto Sacerdote, com sua cauda balançando suavemente. — É preciso estar sempre vigilante.
— Sim. — Matador de Goblins assentiu. — Eles são estúpidos, mas não são tolos.
Goblins não tinham desejo algum em aprender, mas quando eles aprendiam, poderiam usar ferramentas e estratégias. Mesmo Anão Xamã e seus amigos tinham sido muito pressionados lidando com goblins, que haviam aprendido o suficiente para tentar um movimento naval em uma aventura anterior. Se uma estratégia se espalhasse entre os goblins, significava problemas, mas esse homem em particular era muito rigoroso.
Anão Xamã e Lagarto Sacerdote eram ambos, à sua maneira, profissionais de suas raças. O anão era apaixonado por ferraria e trabalho, enquanto o homem-lagarto tinha uma inclinação para a batalha e força.
Para eles, obsessão e teimosia tinha uma espécie de beleza.
— Podemos tomar esse lugar ao seu lado então? — perguntou com cortesia Lagarto Sacerdote.
— Não ligo — disse Matador de Goblins indiferentemente. — Não sou dono desse lugar.
— Ah, ainda educado para perguntar — disse o anão. Mesmo enquanto falava, ele esticou um pano grande e se sentou.
Lagarto Sacerdote desamarrou um pacote que estivera carregando, espalhando seu conteúdo no pano.
Um olhar era o suficiente para dizer que os materiais eram para algum tipo de artesanato, mas não necessariamente o que seria. Ele tinha tiras de bambu, pedaços pequenos de papel de várias cores, juntamente com papel-óleo.
— Hm — murmurou Matador de Goblins, sem indicar uma pitada de surpresa. — Lanternas de papel… não, balões de papel.
— Ho, você é muito perspicaz, Corta-barba — disse Anão Xamã aprovadoramente, enquanto começava a montar os pedaços com movimentos hábeis.
As tiras de árvores de bambu nodoso eram leves e fortes, e os balões de papel formados delas eram uma parte clássica do ambiente do festival.
Eles eram simples o suficiente para se fazer: papel envolto sobre uma estrutura de bambu. Depois o papel oleado seria fixado dentro da estrutura, e a lanterna seria acesa.
— E aí, pelo que me disseram, eles flutuam para o céu. — Lagarto Sacerdote balançou lentamente sua cabeça alongada, como se estivesse com dificuldade em acreditar. — Tenho que ver com os meus olhos. Estou realmente ansioso por isso.
— Eles costumavam fazer isso em minha terra natal. Estou fazendo isso por Escamoso.
— Hum. — Matador de Goblins assentiu, examinando sua estaca na luz. — Não está perfeito… Mas também não está ruim.
— Então minhas expectativas por isso estão maiores — disse Lagarto Sacerdote, balançando a cauda em um dos seus gestos significativos. — Pois coloco grande fé no que você diz, Matador de Goblins.
“…É mesmo?” foi toda a resposta de Matador de Goblins. Ele se preparou para a próxima estaca.
O anão entendia o que significava quando um artesão ficava em silêncio. — Vamos, então, devemos começar também. — Ele pegou os materiais com um sorriso suave. — O festival é amanhã. Temos de estar prontos.
— De fato. Aguardo as suas instruções.
Lagarto Sacerdote enrolou sua cauda longa e se sentou perto de Anão Xamã.
Mas as mãos do anão se moviam muito rápido. Quem adivinharia que seus dedos atarracados poderiam fazer um belo trabalho? Ele tecia uma estrutura atrás de outra, sua produção não era menos mágica do que algumas de suas magias.
Ninguém poderia se igualar aos anões em trabalho manual. Mesmo os elfos estavam um passo atrás.
A função de Lagarto Sacerdote era colocar os papeis cobrindo as estruturas terminadas. Ele se esforçou em impedir suas garras de rasgar o papel, mas, francamente, era bastante difícil para ele.
Ao mesmo tempo, no entanto, seu trabalho era preciso e prudente. Parecia refletir sua personalidade.
— Me pergunto que costumes residem por trás dessas coisas — disse Lagarto Sacerdote. Ele exalou e limpou sua testa, como se para limpar o suor que não podia estar lá.
Anão Xamã pegou uma jarra de vinho com a mão e molhou os lábios, então murmurou: — Boa pergunta. Não sou daqui dessa área. Sei como fazer um balão de papel, mas não porque os usam nesse festival…
— …Você os vê em muitos lugares — disse brevemente Matador de Goblins. Os outros olharam para ele, surpresos.
Ele continuou aparando a estaca, aparentemente alheio a eles.
— Eles atraem bons espíritos e expulsam os maus. Eles mostram aos mortos o caminho para casa. Eles são semelhantes às lanternas de vegetais.
— Sabe um bocado sobre eles, hein?
— Minha cidade natal — disse Matador de Goblins — era perto desse festival. Como poderia não saber disso?
— Hmm. Confesso que não faz muito sentido para mim. — Lagarto Sacerdote coçou o nariz com a garra.
Seu povo acreditava que coisas mortas retornavam à terra, ou na carne daqueles que os comeram, em um grande ciclo. Os “mortos-vivos” não eram aqueles que haviam voltado da morte, mas cadáveres possuídos por espíritos malignos.
— Mas… — Os olhos de Lagarto Sacerdote reviraram. — Luto pelos mortos, nós entendemos. Talvez seja bom pensar que eles vão voltar para casa.
— …Concordo. — Matador de Goblins assentiu. — Deveria ser.
Então ele não disse mais nada. Suas mãos continuaram trabalhando, com sua expressão completamente escondida pelo seu capacete.
Cada vez que a serragem se acumulava, ele as varria para longe, afiando sua lâmina sempre que se cegava com a madeira.
Lagarto Sacerdote, que estivera observando Matador de Goblins atentamente, soltou um suspiro suave.
— Em todo o caso, é um festival. Devemos nos orgulhar, o máximo possível.
— Bom para você, Escamoso, pegando o espírito.
— Mas é claro. Minha fé está em meus antepassados, o naga, cujo sangue flui em minhas veias. Eles são os meus espíritos ancestrais.
Seu comportamento não envergonharia seus antepassados. O anão assentiu com apreciação. Isso era algo que ele entendia.
— É melhor eu próprio não desistir. Vou lhe mostrar as melhores lanternas que qualquer anão jamais fez!
O trio de homens conversando à beira dos campos de treino foram destinados a ser notados eventualmente. Quando o almoço terminou, as pessoas começaram a voltar ao treino. Outros foram rondar a Guilda depois de terminar suas aventuras. Não foi surpreendente que alguns notaram os três.
— Oooh! Baixinho e Orcbolg estão fazendo algo juntos!
E se uma pessoa normal notou eles, um alto-elfo notaria eles duas vezes.
A voz clara e quase infantil era, naturalmente, de Alta-Elfa Arqueira.
Ela veio correndo como o vento e ficou com as mãos nos quadris.
Anão Xamã olhou para ela, alisando a barba, e provocou: — O que você é, uma criança?
— Que rude. Tenho dois mil anos, sabia?
Alta-Elfa Arqueira bufou, mas esticou seu peito plano ligeiramente, como se orgulhosa desse número.
O insulto não a impediu de se virar agilmente para olhar o que eles estavam fazendo.
— Que estão fazendo?
— Orelhuda, minha amiga. Dois mil anos e você não reconhece isso? Isso é um balão de papel. Isso é…
— É uma estaca.
— Não é o que eu quis dizer.
Após seu comentário, a elfa deslizou ao pano de Anão Xamã. Lagarto Sacerdote se levantou e moveu para o lado para abrir espaço para ela.
Suas orelhas se contraíram e seus olhos brilharam de interesse. Ela disparou pergunta uma após outra. — O que é isso? O que é aquilo? O que é essa ferramenta? Para que serve? Por que está fazendo uma estaca?
— É para extermínio de goblins.
— Não diga.
Seu ritmo era como um turbilhão. Diziam-se que as mulheres andavam em bando, mas ela era barulhenta o suficiente para ser uma multidão por si mesma.
— Quase que você poderia se passar por uma rhea — disse Anão Xamã, com um pouco de reprovação.
A agitação animada atraiu naturalmente os outros.
— Ei, não é aquele cara Matador de Goblins e sua equipe?
— Ah, é. Estão se preparando para o festival?
Era Garoto Batedor e Druidesa, juntamente com Guerreiro Novato e Sacerdotisa Aprendiz, voltando do almoço. Eles ainda quase não passavam de meninos e meninas. As preparações do festival ainda os preenchia com encanto e expectativa.
Mesmo Garoto Batedor, que tinha estado com o grupo de Guerreiro de Armadura Pesada há vários anos, o festival anual era motivo de entusiasmo.
— Ei — disse Garoto Batedor — o que é aquilo?!
— Você não sabe?! Esses são…
— Balões de papel! Já os vi antes. — Garoto Batedor estufou o peito, ávido para se gabar. Alta-Elfa Arqueira, que havia perdido a chance de explicar, estufou as bochechas.
— Que tal você se juntar então?
— Não estou acostumado com isso. Podemos aprender juntos.
O anão e o homem-lagarto não hesitaram em convidar as crianças para se juntar a eles.
Alta-Elfa Arqueira parecia não ter compunção por todos eles estarem se juntando, quase o suficiente para lançar em dúvida seu status como uma alta-elfa.
— ………
Matador de Goblins virou seu capacete, tomando uma vista do ambiente alegre e brilhante. Os rostos sorridentes, todos rindo entre si, tinham formado um círculo com ele, todos esses aventureiros.
No centro disso estavam os dois fazendo lanternas.
Muito provavelmente, todos teriam se reunido assim mesmo que ele não estivesse lá. E mesmo assim…
— Hmm.
Matador de Goblins se lançou silenciosamente ao trabalho com a faca de novo.
— O quê?! Orcbolg, você ainda não comeu?!
— Não.
A noite chegava rapidamente no outono. O anoitecer já havia aparecido e desaparecido, e o céu era de uma cor negra constelado só pelas luas e estrelas.
Matador de Goblins havia ficado enquanto seus amigos tinham partido pouco a pouco.
— Como assim… Espere, é por que você não tem dinheiro…?
— Não é.
— Eu lhe pago!
— Não é necessário.
— E se os goblins atacassem? Você poderia lutar com o estômago vazio?
— …Hum.
— Certo! Então, está decidido!
Alta-Elfa Arqueira agarrou ele sem esperar uma resposta e o arrastou para a taverna.
Muita gente dessa cidade fronteiriça além de aventureiros passavam um tempo lá. Era tão bom para comer quanto para beber. E, já que a maioria das tavernas também tinham quartos de hóspedes, estava sempre agitado com viajantes.
A taverna que Alta-Elfa Arqueira escolheu aleatoriamente calhou ser um lugar desses com uma pousada incorporada.
Eles abriram a porta e foram recebidos por uma onda de ruído e calor corporal. Juntamente com o falatório animado dos bebedores amontoados nos assentos, vieram os aromas misturados de vinho e carne.
— Humm! — Alta-Elfa Arqueira entrecerrou os olhos de apreciação, com as orelhas saltitantes.
— Achei que não gostasse de vinho.
— Justo — disse Alta-Elfa Arqueira com uma piscadela. — Mas eu amo uma atmosfera animada.
— É mesmo?
— Com certeza é… Ah, dois, por favor! — Ela esticou alegremente dois dedos para a garçonete que viera para recebê-los. Por sorte, havia lugares disponíveis.
A garçonete, que estava vestida com uma roupa provocadora e caminhava com um passo sedutor, os conduziu a uma mesa redonda há alguma distância do centro do local.
Matador de Goblins abaixou sua mochila e se sentou, a velha cadeira de madeira rangeu discretamente.
Alta-Elfa Arqueira, em contrapartida, se sentou com a leveza que era a especialidade do seu povo e não suscitou nenhum som de sua cadeira.
— …Ei, fico pensando — disse ela, com seu dedo fino e branco, indicando Matador de Goblins. — Não pode ao menos tirar isso na hora das refeições?
— Não posso. — O capacete se moveu suavemente de um lado para outro. — E se os goblins atacassem?
— Bem aqui na cidade?
— Goblins podem aparecer na cidade.
Ela deu um sorriso cansado e impotente.
Não era difícil compreender a perspectiva dela. Afinal, a aparência estranha de Matador de Goblins se destacava mesmo entre aventureiros, com a armadura de couro imunda, o capacete inferior, a espada de tamanho estranho e o escudo redondo e pequeno fixado em seu braço. Felizmente, não era raro ver por essas bandas aventureiros que mantinham seus equipamentos, mesmo no seu cotidiano. No entanto…
— O que é aquilo…? Um aventureiro?
— Pensei que fosse um morto-vivo ou algo assim…
— Caramba, isso olhou para mim!
— Então não era só a minha imaginação…
…Essa taverna não era frequentado exclusivamente por aventureiros. E os vários viajantes ali tinham, obviamente, notado ele.
Só havia um ou dois outros clientes que pareciam ser aventureiros, sentados em um canto da taverna onde não seriam muito visíveis. Um era alto e o outro era um rhea diminuto.
Ele parecia um mago, julgando pela capa que cobria cada centímetro de sua pele. Sua aparência não era tão incomum entre aventureiros.
Talvez debatendo uma missão, eles pareciam estar discutindo veementemente, embora suas vozes não fossem altas.
Alta-Elfa Arqueira sacudiu suas orelhas suspeitosamente, mas, eventualmente perdeu o interesse.
— Então — disse Alta-Elfa Arqueira, virando seu olhar dos dois aventureiros de volta ao capacete de Matador de Goblins. — O que você vai fazer?
— Sobre o quê?
— Sobre o festival de amanhã. Ouvi dizer, você sabe. — Um sorriso travesso surgiu em seu rosto, e ela apontou para ele. — Você vai passar a manhã brincando com aquela garota da fazenda e a tarde com a Garota da Guilda, não é?
— Não estou brincando. — Sua resposta foi absolutamente sucinta. Ele fixou seu olhar nela de dentro de seu capacete. Talvez ele estivesse encarando ela, mas sua viseira impossibilitava saber. — Você tem ouvidos aguçados.
— Bem, sou uma elfa.
Ela fez questão de mexer suas orelhas em forma de folhas das quais era tão orgulhosa e colocou um sorriso felino.
— Parece que ela fez planos para a sua tarde juntos, então cuide disso.
— Hmm.
— Só achei que talvez você tivesse alguma coisa para fazer de manhã, já que está saindo finalmente em um encontro e tudo mais.
— É mesmo?
— É.
— …Ainda não — grunhiu Matador de Goblins, balançando a cabeça. — Eu ainda nem mesmo pensei nisso.
— Você não tem jeito — disse Alta-Elfa Arqueira, arregalando os olhos e massageando a testa como se para aliviar uma dor de cabeça. — Mas pelo menos você é sempre você, Orcbolg.
Sua expressão mudou rapidamente para um de interesse, suas orelhas se moveram para cima e para baixo. — Enfim, e se você a levar a um lugar que goste?
— Em um lugar que ela goste…?
— É, ou fazer algo que ela goste… Você a conhece a muito tempo, certo?
Dessa vez foi a vez de Matador de Goblins parecer perplexo. Alta-Elfa Arqueira assentiu com satisfação
— Além disso, você tem que dizer mais do que apenas entendi, isso mesmo, é mesmo?, sim e não.
— Hrg…
Alta-Elfa Arqueira ignorou o Matador de Goblins engolindo em seco, voltando sua atenção para o cardápio na parede.
— O que pedir, o que pedir? — disse ela, com um tom que expressava claramente a sua alegria, mesmo sem a ajuda de suas orelhas balançando junto.
Sua algibeira deveria estar abarrotada com a recompensa do dia anterior. Por si só, ela provavelmente o teria gastado em um piscar de olhos.
— Alguma coisa que queira comer, Orcbolg?
— Qualquer coisa serve — disse Matador de Goblins tranquilamente. — Você está pagando. Compre o que quiser.
— Céus. Não consigo entender se está tentando ser considerado ou o quê.
— É da minha natureza.
— É, eu sei.
Alta-Elfa Arqueira suspirou, mas seu aborrecimento durou apenas um instante.
— Com licença! — Ela acenou para a garçonete, então procedeu pedindo uma grande parte do cardápio. Ela começou com uma salada maluca de algum tipo, e quando ela descobriu que havia um vinho tinto de alta qualidade disponível, ela não hesitou em adicioná-lo. Nesse momento, Matador de Goblins não pôde deixar de interromper.
— Não vou poder te levar para casa se ficar bêbada.
— Tsc — resmungou ela, com suas orelhas tremulando como se isso fosse completamente inesperado. — Não acredito que acha que irei ficar bêbada demais para andar.
— Não ficaria?
— Isso só acontece em ocasiões muito raras!
Ela fungou, mas Matador de Goblins continuou com palavras curtas: — Eu tenho coisas para fazer depois disso.
— Ai-ai…
Ela virou a cabeça para longe como se estivesse desinteressada.
Os empregados faziam seus caminhos pelo restaurante lotado como aventureiros desviando de armadilhas. Seus olhos seguiram o vapor se erguendo dos pratos que eles carregavam, até que seu olhar voltou a Matador de Goblins.
— …Você precisa de ajuda?
— Não. — Matador de Goblins balançou a cabeça, depois de um momento de pensamento, falou de novo. — Por enquanto estou bem.
— Hum.
Então eles se calaram, não fazendo nenhum esforço para conversarem até a comida chegar.
Para os outros clientes, os aventureiros silenciosos eram apenas mais uma parte estranha do cenário.
A comida que finalmente chegou incluía sopa, pão e queijo. E vinho.
A sopa fumegante era de grãos cozidos em creme doce. O pão preto e duro poderia ser mergulhado na sopa para amaciá-lo. O queijo úmido era salgado e picante para um excelente acompanhamento da sopa.
— Aposto que sei alguém que gostaria desse lugar. — Alta-Elfa Arqueira riu, incitada por um “Verdade” de Matador de Goblins.
— Não aquele anão, no entanto. Tenho certeza que ele iria reclamar do sabor do vinho como se fosse água ou algo assim. Com certeza.
— Você quer dizer vinho de fogo? — Matador de Goblins engoliu um pouco de vinho pela sua viseira. — É um bom tônico e um bom combustível. Também é útil como desinfetante.
— Presumo que não está brincando. Mas aquela coisa é imprópria para beber.
Ela riu, seu riso soou como um sino.
— Orcbolg… A propósito. — Ela empurrou seu prato para o lado, se inclinando para que seu rosto ficasse perto do dele. Ela parecia animada, mas sua voz era tensa.
— O quê?
— Hoje… Sabia que aquela garota fez uma compra na oficina?
— Sim.
“Aquela garota” provavelmente era Sacerdotisa.
Matador de Goblins assentiu.
— Bem, o que acha do equipamento que ela comprou?
— Hum? — Dessa vez, ele balançou a cabeça. Mediante a própria embriaguez ligeira do vinho, ele a imaginou naquela tarde. Ele despejou um pouco de água da garrafa em seu copo e deu outro gole. — Eu não perguntei.
— Ah, sério?
Alta-Elfa Arqueira pestanejou, murmurando “Incomum” de surpresa enquanto brincava com seu copo.
— Hummm. Bem, talvez eu devesse guardá-la para mim então… Quer saber?
— Se quer me dizer, então vou escutar.
— Se a pergunta era se eu queria, eu diria que sim. Mas ela realmente não disse nada a você?
— Não.
— Vou manter seu segredo então — disse Alta-Elfa Arqueira com uma piscadela. Isso não foi um gesto élfico típico. Ela havia aprendido isso por viver na cidade. Ela sorriu, se divertindo por ter pegado emprestado a linguagem do corpo humano. — Acho que vai ser mais interessante assim.
— Acha?
— Claro.
— Então… — Matador de Goblins assentiu mais uma vez, então procurou em seu saco de itens.
Ele pegou a bolsa de couro contendo sua recompensa, quase sorrindo quando ele a alcançou.
— Eu vou pagar enquanto você ainda pode se lembrar.
Clac, clac, clac. Ele enfileirou as três peças de ouro em cima da mesa.
Em um instante, a expressão da elfa passou de relaxada para hostil.
— Eu disse que ia pagar.
— Algum dia… — Matador de Goblins, muito anormalmente, cortou a si mesmo. Parecia como se ele mesmo não acreditasse no que estava prestes a dizer.
— …Algum dia, posso… pedir sua ajuda.
— Pagando antecipadamente, hum? — disse Alta-Elfa Arqueira.
— Sim.
— Hmm.
Devemos estar bêbados.
Ambos ela e Orcbolg.
Bem, acho que… huh. Não há problema.
— Não precisa.
— …Entendi.
Matador de Goblins assentiu impassivelmente.
Alta-Elfa Arqueira esticou seu dedo pálido, desenhando lentamente um círculo no ar.
— Você pode me pagar indo em uma aventura!
— Hm.
— Já não te disse? — perguntou a aventureira alta-elfa enquanto dava um gole no vinho. — Ah, não-goblinsesca, é claro.
— …
Matador de Goblins ficou em silêncio. Ele provavelmente não tinha ideia do que dizer. Alta-Elfa Arqueira se segurou, esperando ouvir o que sairia da boca dele. Elfos estavam acostumados a esperar. Dez segundos, dez anos… não fazia qualquer diferença.
— Está bem… Obrigado pela ajuda.
— Ótimo!
Agora que ela tinha sua promessa, Alta-Elfa Arqueira estufou suas bochechas. Ela semicerrou seus olhos como um gato e soltou aquela risada que se formou no fundo da sua garganta, que saiu como o sino de uma campainha.
— Agora anda, vamos comer. Vai ficar fria.
— Certo.
Enquanto ele se preparava para comer, Matador de Goblins olhou para o canto da taverna. Mas os dois aventureiros já haviam saído.
— Hmph — resmungou ele descontente, então arrancou um pedaço de pão.
— Aliás — começou ele.
— O que foi?
— Sabe o que a flor-do-imperador significa, na linguagem das flores?
O jantar consistia unicamente em comidas favoritas de Alta-Elfa Arqueira, mas Matador de Goblins não era de se queixar.
E quando ele a tinha levado até ao segundo andar da taverna, pagado pelo quarto e solicitado que a refeição fosse colocada na conta dela, ele deixou o edifício.
Ele sempre sabia o que tinha de fazer.
Ele sempre tinha que pensar, olhar em frente, permanecer vigilante, planejar contramedidas e as executar.
O que Matador de Goblins tinha de fazer nesse momento era cavar um buraco.
Era noite, as luas gêmeas já estavam entre as estrelas brilhantes que preenchiam os céus.
Completamente só, ele impulsionava a pá silenciosamente no chão, cavando e cavando.
O calor do vinho ajudava a afastar a brisa fria da noite.
Ele estava fora do portão da cidade, em uma trilha que saia da estrada principal. Ela cortava através de um campo, mas não uma grande planície gramada. Havia colinas, conjuntos de árvores, juncos. Fora da estrada, a terra era selvagem.
O lugar era deserto em grande parte, razão pela qual ele tinha escolhido cavar seu buraco ali.
Era tão fundo quanto uma pessoa alta. Não um anão ou um rhea, mas um humano.
Ele revestiu o fundo com as estacas finas e afiadas que ele havia esculpido, escondendo a abertura com a terra que ele escavou. O solo ficou sobre um cobertor em cima da boca do fosso. À primeira vista, ninguém suspeitaria que havia alguma coisa ali.
Ele fez isso várias vezes, depois espalhou pedras pequenas e brilhantes ao redor da área.
— Agora…
O resto do trabalho era todo do chão.
Goblins podiam usá-las para reforçar as paredes de sua caverna, e assim não se incomodariam com isso, mas ele não tinha a mesma luxuria.
Fazer paisagismo manualmente era bastante problemático para um aventureiro.
Matador de Goblins pôs a terra em sacos que ele havia preparado previamente.
Agora eles eram sacos de areia.
Ele apertou a boca dos sacos, depois os carregou dois de cada vez, um em cada ombro.
Ele os escondeu nos juncos não muito longe do buraco, construindo um semicírculo.
Era incerto se isso os ajudariam mais tarde. Mas não custava nada estar preparado para qualquer coisa.
Ao menos, Matador de Goblins nunca recusou trabalho necessário.
Ele empilhou os sacos de areia cuidadosamente, sem deixar lacunas, depois terminou dando-lhes alguns golpes com a pá para os comprimir.
— …Hum.
Finalmente ele assentiu, satisfeito.
Isso serviria para os buracos. Os outros locais estavam todos prontos. Esse tinha sido o último.
Tudo o que restava era a armadilha que ele havia construído com as estacas restantes, a corda e a madeira, mas havia poucos lugares que ele poderia preparar.
Matador de Goblins verificou o céu, tentando avaliar quando tempo tinha pela inclinação das luas. As noites eram longas, e a manhã vinha atrasada no outono e inverno. Mesmo assim, ele duvidava se tinha muito mais tempo para trabalhar.
Ele pegou rapidamente as tábuas de madeira do pacote pelas suas amarras.
Ele se moveu para os arbustos e árvores, fazendo um serviço delicado antes de regressar.
— Hora de se apressar.
Ele colocou sua bagagem nos ombros, depois correu sob as luas como uma sombra.
Ele passou os juncos e pelas árvores quando aconteceu.
— Ei, o que você está fazendo aqui?!
Uma voz veio cortando o ar como uma emboscada. Matador de Goblins parou.
Houve o amassar de plantas sob suas botas e o raspar delas contra sua armadura.
— Hm — murmurou Matador de Goblins, mas sua mão não se moveu para a espada.
Nenhum goblin falava a língua comum tão fluentemente.
— Quem está aí? — perguntou ele brevemente. Um ruído veio como que respondendo.
Uma pessoa alta envolta por um sobretudo apareceu.
As botas da pessoa, apenas visível sob a bainha do casaco, estavam bem usadas, com a região dos dedos reforçados. Claramente um aventureiro.
Mas a voz rude que respondeu não ofereceu nenhuma resposta.
— Sou eu quem faz as perguntas.
O timbre fez Matador de Goblins murmurar: — Uma mulher?
— …Mais uma vez. Quem ou o que você é?
Quase que imediatamente, uma luz branca, penetrante para os olhos se ajustou na escuridão saltando pelo céu.
— Sou Matador de Goblins.
Com o dedo, ele afastou casualmente a lâmina da sua garganta.
Ele parecia incomodo, quase como estivesse lutando contra um bocejo.
Uma espada longa — lâmina de um gume — e uma guerreira hábil com espada.
Verdade, tinha acontecido rápido demais para uma reação, mas ele também havia escolhido não reagir.
Seria tolice perguntar quem o oponente era e abatê-lo na mesma hora.
Mesmo alguém nas garras da sede de sangue entenderia isso.
Envolta de seu casaco, a mulher semicerrou os olhos duvidosamente.
— Você… mata goblins…?
— Sim. — Matador de Goblins respondeu.
— …Parece loucura.
— Entendo.
A lâmina que ele tinha afastado deslizou de volta, procurando seu pescoço.
Ela levantou a corrente com a insígnia de prata que estava pendurada ali.
— Uma insígnia prata… Aventureiro ranque Prata?
— Aparentemente — disse Matador de Goblins com um aceno — a Guilda me reconheceu como tal.
— …Entendi.
A espada recuou como um sopro de vento e retornou a sua bainha com um clic.
A suavidade absoluta do movimento sugeria que era uma aventureira de alto ranque. Certamente no mínimo Cobre, imaginou Matador de Goblins.
— Parece que fui um pouco precipitada. Peço desculpas.
— Não, tudo bem.
— Pensei que fosse um morto-vivo ou algo assim…
A mulher parecia desajeitada enquanto se desculpava, mas seu tom suavizou.
Matador de Goblins balançou a cabeça suavemente. Particularmente não importava para ele.
O problema era…
— Ei, não tenho dito para você não fazer isso?
Naquele momento uma voz, brilhante como o nascer do sol, veio por trás dela.
— Ela tira as piores conclusões sobre todo mundo. Não se preocupe, eu parei ela.
— O fato é que ele era suspeito.
A próxima voz era fria como gelo. Duas pessoas novas.
Com um ruído, a grama se separou, revelando um aventureiro baixo também com um sobretudo.
Seria fácil confundir essa pessoa com um rhea, mas elas carregavam uma espada de tamanho completo em seu quadril.
Elas deveriam ser humanas. Uma rhea não teria força para brandir essa espada.
A outra pessoa carregava um cajado grande e estava mais bem vestida que as outras duas. Obviamente, uma usuária de magia de alguma espécie.
E todas elas, a julgar pelas vozes, eram mulheres. Grupos composto inteiramente de mulheres eram relativamente raros.
— Então, que se passa? Estou curiosa — perguntou a espadachim diminuta.
Antes que Matador de Goblins pudesse dizer algo, ela deu um par de passos ligeiros em frente.
Com um passo tão alegre quanto sua pergunta, ela encurtou o espaço entre eles como se estivesse em um passeio.
— Hum… — murmurou Matador de Goblins, e após um momento de consideração, deu sua resposta.
— Estou tomando precauções.
— Precauções? Hmm… — Ela espreitou Matador de Goblins, depois disse indiferentemente: — Equipamento estranho você tem…
— É?
— Ah, desculpe. Não tenho a intenção de zombar de você. Só acho que é engraçado.
Sua voz era tão animada que Matador de Goblins podia dizer que ela estava sorrindo sob seu capuz.
Não obstante, seu esclarecimento não evocou qualquer reação dele. Ele não fazia ideia do que poderia ser divertido sobre sua armadura de couro nojenta e capacete de aparência barata, ou sua espada e escudo.
Mas enquanto as mulheres o avaliavam, ele também o fazia, em contrapartida.
Elas não eram da multidão local de aventureiros. E elas não eram goblins… disso, ao menos, ele tinha certeza.
— …Não acho que ele está envolvido. Mais provável.
Depois de um tempo, a aventureira com o cajado falou com seu tom frígido.
— Francamente, mal consigo acreditar que alguém tão estranho exista.
— Acho… que sim. Reconheço que ele esconde seu rosto e pele, mas concordo que isso parece um pouco demais.
A resposta veio da primeira mulher. Com sua espada ainda na bainha, ela continuou com um tom estranhamente prepotente: — Eu vi a diferença em nossas habilidades. Ele não será um problema.
— Acha? Se você diz, acho que deve ser verdade.
A garota, que havia inclinado a cabeça enquanto suas companheiras discutiam, terminou batendo as palmas.
— Bem, senhor, desculpe o incômodo.
— Está tudo bem. — Matador de Goblins balançou ligeiramente a cabeça, depois colocou a carga no chão. — Vocês vieram ver o festival?
— Hã? Ah, hum, bem… Acho que sim. É bem aqui perto, não é?
— Sim. — Matador de Goblins assentiu. — Essa é a cidade que realizará o festival da colheita. — Então, depois de pensar um momento, ele acrescentou: — Se precisarem de uma pousada, consiga uma logo.
— Oh, nossa. Certo. Entendi. Já é muito tarde agora. É melhor irmos andando. Desculpe! — acrescentou ela uma última vez, e partiu com ânimo leve.
As outras duas se recompuseram apressadamente enquanto ela se afastava cada vez mais.
— Argh, ela sempre…! Nós devemos ir, então. Peço desculpas pelos problemas.
— Sinto muito.
As outras duas seguiram a garota que partia, desaparecendo como sombras.
Matador de Goblins, agora sozinho, só murmurou “Hm”.
Ele tinha colocado uma pedra pequena onde a espadachim baixa havia estado há um momento.
Como ele se recordava, era exatamente o lugar onde tinha cavado e ocultado um buraco.
A maneira como ela andava era treinamento marcial, magia ou simplesmente sorte? Ele não sabia.
E por falar em coisas que ele não sabia, ele não pôde determinar porque as mulheres haviam usado essa trilha e não a estrada principal.
— ……
Mas pensar nisso não trouxe nenhuma resposta, então ele simplesmente descartou a questão.
Elas eram quase que certamente apenas aventureiras que provinham de outro lugar para ver o festival.
E elas não eram goblins. Isso era o suficiente.
Mesmo assim, ele tinha certeza de que pessoas não passariam por essa área…
— …Terei que escolher meus locais com mais cuidado.
Havia muito a se fazer.
E ele sempre sabia o que devia ser feito.