Capítulo 3 – A Floresta do Rei Elfo
O lugar era estranho, assustador.
O sol estava nascendo, um raio de luz vindo logo além do horizonte. O céu visível através dos galhos era de um azul profundo.
Matador de Goblins vasculhou sua bolsa de itens na luz do amanhecer. Da simples área de dormir atrás dele, além de uma rede contra insetos, vinham gemidos e roncos suaves.
Eram Lagarto Sacerdote e Anão Xamã, ambos ainda dormindo. O anão poderia não se levantar até o café da manhã, mas o homem-lagarto acordaria ao amanhecer.
Quanto às mulheres, Sacerdotisa já estaria de pé e em oração ao lado de sua cama. Garota da Guilda acordava na mesma hora todos os dias, antes do café da manhã; ela disse que era mais conveniente para seu trabalho. Vaqueira logo também estaria acordada.
Alta Elfa Arqueira assumiu um turno de guarda cedo, pois planejava dormir até que alguém a acordasse.
Um grupo que não permitisse que seus lançadores de feitiços descansassem o suficiente era um grupo que logo seria destruído. Por esse motivo, Alta Elfa Arqueira e Matador de Goblins trocavam turnos de vigia. Ele, por acaso, ficou muito feliz em assumir o turno posterior.
Da meia-noite até o amanhecer, não sentia vontade de dormir. A chance de deixar outra pessoa assistir do entardecer até o anoitecer, enquanto ele descansava, era uma novidade deste ano, um pequeno…
— Luxo, talvez. — Ele colocou algumas ervas aromáticas pela viseira de seu capacete e as mastigou. Um sabor amargo se espalhou de sua garganta até o cérebro, estimulando seu foco. Então mastigou as folhas amargas pela segunda vez.
Sim, o lugar era assustador.
Matador de Goblins ajustou o controle de sua espada para poder sacá-la a qualquer momento.
Será que os goblins se uniriam e os atacariam no meio do dia?
Atacar um grupo de aventureiros armados, talvez presumindo que o elemento surpresa superaria qualquer disparidade de armas.
Era possível?
Acima de tudo, havia a alcateia a considerar. Os goblins eram ruins o suficiente, mas tinham um contingente de cavaleiros. Imagine os números aos quais precisariam resistir.
E, ainda assim, eram capazes de fazer isso.
Comida, estábulos, equipamento e diversão – sim, diversão.
Era por isso que estavam atacando os barcos?
Estavam localizados ao lado da vila dos elfos. Por que estabeleceriam uma operação tão elaborada?
Pelo quê? O que estavam planejando?
Matador de Goblins mastigou a folha uma, duas, três vezes mais.
Seus pensamentos resultaram em uma enxurrada de ideias desconexas, borbulhando e depois desaparecendo.
De repente, uma voz gritou.
— Despertem, de pé! Onde vocês, vigaristas, pensam que estão?
Uma rajada de vento na floresta levou o interrogatório até eles.
Matador de Goblins sacou sua espada e saltou sobre seus pés. Vendo além de si mesmo, no entanto, encontrou uma lâmina de obsidiana.
Com grande aborrecimento, olhou para o dono da arma.
Alguém estava de pé no piso elevado, tendo rasgado a rede contra insetos. O sol estava em suas costas, mas estava claro que ele era…
— Um elfo?
— De fato. E este é o nosso território.
Aquele que falou com tanto orgulho foi um guerreiro elfo, jovem e bonito – como todos os elfos são. Ele usava uma armadura de couro, carregava um arco e tinha uma aljava com flechas em forma de botão em seu quadril.
Mais impressionante do que qualquer coisa, porém, era a armadura protegendo sua cabeça. Era um capacete brilhante feito de mithril.
O elfo com o capacete cintilante observou Matador de Goblins malignamente, sua expressão cheia de suspeita.
— Você luta mesmo com essa espada…? — perguntou o elfo.
— Contra goblins, sim — respondeu Matador de Goblins uniformemente.
O olhar afiado do elfo mudou da espada com seu comprimento estranho para o escudo redondo, a armadura de couro suja, então o capacete de metal de aparência barata.
— Algum guerreiro bárbaro, não é? E um anão…
— E um homem-lagarto, ao seu serviço… — Lagarto Sacerdote, que se sentou nesse ínterim, juntou as palmas das mãos em um gesto estranho. Anão Xamã, que acabara de se levantar, estava sentado ali e não fazia nenhuma tentativa de esconder seu descontentamento. Ser atacado por elfos enquanto dormia era a humilhação máxima para um anão.
O elfo olhou para cada um dos três de cada vez, tendo mais ou menos discernido quem e o que eles eram.
— Então, aventureiros…
— A grosso modo.
— De fato… Foram vocês quem lutaram contra os goblins ontem?
Matador de Goblins acenou com seu capacete encardido.
— Entendo — disse o elfo, semicerrando os olhos e deslizando a mão sobre sua espada. — Acabamos com os que você deixou para trás.
Com isso, Matador de Goblins grunhiu, isso significava que sua tentativa de espalhar doenças no ninho foi frustrada. Por outro lado, os goblins fugitivos foram mortos. Talvez estivesse tudo bem.
O elfo parecia incerto sobre o que dizer diante dessa atitude não intimidada.
— Só tenho uma pergunta para lhe fazer — disse ele rispidamente.
— O que é?
— A flecha que perfurou um dos goblins parecia pertencer a um colega nosso.
O elfo com o capacete brilhante puxou o projétil em questão. Tinha uma ponta de botão. Estava coberta de sangue escuro de goblin, mas a ponta estava defeituosa, pendurada em um ângulo.
— Sabemos, no entanto, que essa garota nunca usaria algo tão bruto.
— …
— Diga-me o que você fez com ela. Sua resposta pode decidir seu destino em minhas mãos…
Matador de Goblins não disse uma palavra que fosse, mas Lagarto Sacerdote e Anão Xamã se entreolharam.
— Você deve ser aquele que cantou um poema épico em vez de uma canção de amor.
— Na verdade, parece que foi esse mesmo amor que o corrigiu.
— O quê…?! — O elfo com o capacete brilhante foi lançado em um aperto. Ele agarrou a espada com mais força, como se estivesse pronto para erguê-la a qualquer momento. Seu semblante pálido, o orgulho de seu povo, ficou instantaneamente vermelho-rubi, e ele tremia violentamente.
— S-Seu verme imundo…! Onde no mundo você…?!
— A garota que você está procurando — disse Matador de Goblins com um suspiro incomum. — É ela ali, não é?
— Hrk…!
Em um piscar de olhos, o elfo disparou como um tiro.
— Filha de Vento Estelar, você está aí?!
Ele saltou vários metros em um único salto gracioso; quando encontrou o abrigo, arrancou a rede contra insetos sem hesitação.
— Sim?
— Huh?
— Ah…
Ele logo ficou carrancudo. Diante dele estavam três moças – moças que, acordadas com a agitação do lado de fora, rapidamente se maquiaram para ver o que estava acontecendo.
Três pessoas, seis olhos, fitaram para contemplar o elfo intruso.
Estavam no meio de uma aventura, é claro, e ninguém naquela posição deliberadamente colocaria um pijama para dormir. Mas isso não significava que ficariam felizes por algum estranho as ver em seu descanso.
E havia outra coisa.
Em um canto da área de dormir, uma bola de cobertores se mexeu e se contorceu.
— O que está acontecendo? O sol mal nasceu…
Alta Elfa Arqueira bocejou, espreguiçou-se como um gato e saiu de baixo das cobertas. Ela esfregou os olhos, coçou a cabeça e olhou distraída ao redor.
— Buh? Cunhado? O quê, você veio me buscar?
— …
Sacerdotisa parecia prestes a chorar, Vaqueira estava carrancuda e Garota da Guilda tinha um sorriso suave no rosto.
O elfo com o capacete brilhante engoliu em seco.
Então ele disparou para trás, como se arrastado por um barbante, enquanto as garotas começavam a gritar ruidosamente.
— Bom trabalho de guarda-costas… — disse ele quando pousou, tossindo uma vez. — Aprecio você trazer minha cunhada até aqui. A compensação será preparada, que suas honras percorram um caminho seguro para casa.
— Estes são meus amigos, cunhado. — Alta Elfa Arqueira enfiou a cabeça para fora do abrigo e olhou para ele, mas o outro elfo apenas deu de ombros com elegância.
— Apresento-lhes os elfos, eles só…
Mas qualquer comentário rude que estava destinado a encerrar aquela frase, até mesmo Anão Xamã teve bom senso o suficiente para guardar para si mesmo.
— Peço desculpas, por te chamar de volta quando você acabou de sair para sua jornada.
— Acabou de sair? Já se passaram anos. Na verdade, já faz muito tempo, irmão.
— Você cheira a humanos… — O elfo com o capacete brilhante franziu a testa enquanto caminhava ao lado de Alta Elfa Arqueira, que caminhava confiante pela floresta.
O visual podia ser inspirado em parte pela atitude petulante de sua cunhada, mas provavelmente foi por causa dos olhares que ele estava recebendo por trás enquanto guiava o grupo. Especificamente das três mulheres.
— Eu entendo o que está em seu coração — disse Lagarto Sacerdote para o elfo, mostrando a língua. — Meu povo vive em uma grande floresta própria, mas o reino dos elfos é realmente impressionante.
— Tem crescido desde a Era dos Deuses. Um mortal que entra não poderia esperar encontrar seu caminho de volta em sua vida.
O elfo não poderia ser culpado pelo tom de orgulho em sua voz. A floresta era de fato um grande labirinto verde. Havia uma profusão de vinhas, árvores enormes que bloqueavam a estrada e caminhos tão estreitos que nem mesmo os animais selvagens podiam atravessar. A vegetação rasteira parecia estender a mão para pegar os passantes pelo pé. Já era difícil para os aventureiros; devia exigir um tremendo esforço de Garota da Guilda e Vaqueira.
O fato de ainda seguirem relativamente desimpedidos em direção ao interior já era um sinal da hospitalidade dos elfos. Isso explicava em parte por que as mulheres se contentavam em olhar feio em vez de reclamar em voz alta.
— Mas — disse o elfo com um olhar duvidoso para trás — pensar que Orcbolg, cujo nome ouvi, acabaria sendo… assim.
— Não sei o que as pessoas dizem sobre mim — disse Matador de Goblins com indiferença, provocando um bufo do elfo.
— Sua maneira de falar — disse ele — deixa muito a desejar.
— Mais importante, fale-me sobre aqueles goblins.
— Não eram especialmente incomuns, são como os goblins costumam ser. — Pouco importam. Às vezes, há mais deles, às vezes menos. — Tem estado quente recentemente, aquelas criaturas não se multiplicam com o calor?
— “Recentemente”?
— Nos últimos dez anos ou mais. Tem sido assim desde que o furor pelos Deuses das Trevas começou.
— É mesmo? — disse Matador de Goblins suavemente. — Recentemente…
— Se os goblins não são ameaça o suficiente para nos forçar a construir fortalezas, então não vale a pena se preocupar com eles.
— Você não tem que agir totalmente indiferente. — Alta Elfa Arqueira deu um pulo. — Apenas diga a ele que casamento não é momento para conversar sobre goblins.
— As crianças devem ser vistas e não ouvidas — disse o elfo com o capacete brilhante para sua cunhada mais nova.
— Eu não sou uma criança — disse Alta Elfa Arqueira. Seus lábios se curvaram em um beicinho, mas ficou claro pelo balançar de suas longas orelhas que ela ainda estava de ótimo humor.
Sacerdotisa, que fazia parte do grupo, sussurrou suavemente para Garota da Guilda:
— Então acho que os elfos realmente não se preocupam com os goblins, não é…?
— O quê, você também? — respondeu Garota da Guilda com uma piscadela. — Se essa é a primeira coisa em que você pensa nesta situação, pode querer tomar cuidado para que ele não grude mais em você.
— Errr, he-he-he…
Sacerdotisa coçou a bochecha e riu como se fosse deixar o assunto de lado, fazendo com que Garota da Guilda murmurasse:
— Ó Deuses. — Então ela continuou: — Na verdade, muitos aventureiros elfos agem assim, especialmente os que acabaram de deixar a floresta, não é que não tenham noção do perigo, é só que a escala deles para as coisas é diferente.
O fato mais básico sobre os goblins era que eles tinham a inteligência e a força física de crianças humanas, que eram os mais fracos dos monstros. Os elfos só podiam ter medo de coisas muito maiores e mais poderosas.
— Afinal, eles têm aqueles relatos de testemunhas oculares.
— …? Sobre o quê?
— As batalhas dos deuses.
— Oh. — Sacerdotisa engasgou, então rapidamente cobriu a boca. Não era impossível que alguns dos elfos anciões fossem de fato velhos assim.
Teria sido muito tempo atrás, antes que todas as coisas fossem decididas pelo lançamento dos dados. Uma época pouco conhecida até mesmo pelos mitos e lendas.
— Espíritos malignos, dragões, deuses das trevas, lordes demônios e todos os tipos de criaturas horríveis vieram de outro plano.
Fazia sentido, então, que os elfos considerassem os goblins apenas um incômodo em comparação.
Sim, ocasionalmente alguma alma azarada morreria em suas mãos. Mas para aqueles que já estavam destinados a uma vida tão curta, o que significava alguns anos, de qualquer maneira? Compare isso com o tipo de cataclismo que ocorre apenas uma vez a cada década, século ou milênio…
— Não importa o que os goblins façam, eles não vão causar algo assim — explicou Garota da Guilda.
— Hum — disse Vaqueira suavemente.
— Entende? — comentou Garota da Guilda.
Sacerdotisa, no entanto, olhou para o chão com uma tristeza inexprimível.
Goblins não importavam, eles dificilmente valiam a pena notar.
— Sim, você está certa — disse ela o mais indiferente que pôde, mas com um olhar para ele.
Ele estava perto do início da fila, como aquele que estava na primeira fila do grupo, imprensando o resto deles entre ele e ela. Ela queria dizer algo, mas hesitou.
Então descobriu que sua chance foi roubada pelo elfo com o capacete brilhante.
— Na verdade, há algo ocupando mais a minha mente do que o casamento — disse ele.
— Oh! Vou contar para a mana que você disse isso! — exclamou Alta Elfa Arqueira. Anão Xamã disse a ela para não tagarelar, mas ela acenou para que ele se afastasse.
— Parece que aquele que para as águas está cada vez mais perto da aldeia.
— De que coisa você está falando?
— Uma coisa antiga que vive na floresta. Sempre fomos instruídos a não colocar a mão nisso — disse o elfo a Matador de Goblins.
— Oh-ho — disse Lagarto Sacerdote calmamente. — E há quanto tempo, se me permitem perguntar, esta coisa antiga está viva?
— Não sei — respondeu —, mas já era chamado de velho, mesmo quando eu era jovem.
— O Triássico, então? Ou o Carbonífero, ou Cretáceo… — Lagarto Sacerdote começou a resmungar coisas que soavam importantes para si mesmo, antes de finalmente concordar sombriamente: — Hmm, muito intrigante.
— Seja o que for, seu território é separado do nosso. Raramente surge, mas…
— A verdade é que eu nunca tinha visto isso, embora as pessoas continuem me dizendo que está lá — disse Alta Elfa Arqueira, suas orelhas tremendo ao pensar. Ela se virou para o cunhado. — Isso realmente existe?
— Já vi rastros várias vezes. Meu avô afirma que uma vez viu a própria criatura.
— Há quantas eras foi isso? — Alta Elfa Arqueira riu.
Naquele momento, o vento soprou. Era um vento fresco, doce e de verão, cheio de aromas de folhas e grama.
Soprou por entre as árvores como se pudesse durar para sempre. E de onde saiu isso?
A fonte bocejou no meio da floresta, um grande espaço que se estendia do céu à terra.
Era uma aldeia em forma de floresta? Ou era uma floresta que parecia uma aldeia?
A cobertura de folhas se estendia a alturas insondáveis, as casas eram feitas de árvores enormes e ocas. Caminhos tecidos com vinhas e folhas se estendiam entre eles.
E elfos, belos elfos em trajes impecáveis, percorriam esses caminhos como se dançando no ar.
Os padrões que adornavam a casca das árvores eram muitos e variados, e o sibilar das folhas enchia o ar com sua música.
Camada após camada se estendia para cima e ainda mais para cima, a aldeia espalhando-se até tão alto que ameaçava rasgar o céu.
— U-Uau… — Vaqueira piscou, seus olhos brilhando, enquanto o som de espanto escapava dela. Ela nunca tinha visto tal coisa em toda a sua vida, nunca tinha imaginado que poderia presenciar algo assim enquanto vivesse.
Este era o tipo de lugar que havia imaginado quando seu velho amigo falou sobre o desejo de se tornar um aventureiro. Ela deu um passo à frente, depois dois. Estava parada ao lado dele, e à frente deles havia uma grande galeria em espiral que subia e contornava o exterior da aldeia. Ela descobriu que queria se inclinar e olhar, mas ele a advertiu:
— É perigoso. Você vai cair.
— Ah, sim, mas olha… Isso é incrível…!
Ainda segurando seu braço, Matador de Goblins disse uma única palavra:
— Sim.
Vaqueira estufou as bochechas em aborrecimento, mas havia coisas menos mesquinhas das quais cuidar. Apoiando-se nele, ela olhou ao redor da vila dos elfos como se quisesse gravá-la em sua memória.
— Gracioso. Vocês elfos sabem como construir — comentou Anão Xamã com uma pitada de decepção, na verdade, de derrota, em sua voz.
— Eles realmente sabem — disse Lagarto Sacerdote. — Minha própria aldeia também fica em uma floresta, mas não se parece em nada com isso.
Anão Xamã olhou para o elfo com o capacete brilhante
— Suponho que você não tenha ajudado?
— As fae nos ajudaram, anão — respondeu o elfo. — Naturalmente.
— Heh! Isso é realmente incrível. Então vocês não fizeram isso com suas próprias mãos?
O choque coletivo do grupo era sem dúvida esperado. Alta Elfa Arqueira riu, projetando seu pouco peito, e gentilmente deu uma cotovelada em Sacerdotisa, que estava segurando seu bastão.
— Muito legal, né?
— Sim, muito mesmo! — Ela acenou com a cabeça para a arqueira, que estava piscando maliciosamente. — Nunca imaginei que um lugar tão maravilhoso existisse neste mundo.
— Heh-heh-heh! Você acha? Ah, caramba…!
Alta Elfa Arqueira estufou o peito enquanto se enchia mais e mais de orgulho. Garota da Guilda começou a rir.
— A capital era um lugar bastante impressionante, mas isso…
A capital humana era adorável, mas a escala de tempo em que fora construída era diferente. Este lugar não tinha sido feito pelas mãos de ninguém, mas sim pela própria natureza, uma verdadeira obra dos deuses.
Alta Elfa Arqueira correu para a frente da linha com pequenos saltos, assim como um pássaro. Quando abriu os lábios, as palavras que teceu estavam na linguagem melódica dos elfos.
— Bom dia e boa noite, por um sol e a luz de duas luas, da filha de Vento Estelar para seus amigos…
Ela se voltou para eles e abriu bem os braços. Seu cabelo esvoaçava atrás dela como um cometa.
— Bem-vindos à minha casa!
Ela mostrou um sorriso tão largo quanto o desabrochar de uma flor.
Passaram por um corredor tecido de galhos e descobriram que seu quarto era o oco de uma grande árvore zelkova. Uma cortina de videira estava pendurada sobre a entrada da grande câmara.
Um tapete de musgos compridos estava espalhado pelo chão e havia uma escrivaninha e cadeiras que pareciam ser nós estendidos da própria árvore. Folhas quase translúcidas estavam agrupadas em frente à janela, permitindo a entrada da luz da tarde com seu calor suave. As cortinas de videira aqui e ali deviam ser as entradas para os dormitórios.
A única coisa na sala que sugeria o trabalho de algo não natural era uma tapeçaria élfica que parecia ser tecida com fios de orvalho matinal. As ilustrações delicadas e fluidas retratavam uma série de histórias que remontavam à Era dos Deuses. Ao contrário dos mitos e lendas que os humanos contavam, as chances eram de que os elfos tivessem observado essa história com seus próprios olhos.
Não havia lareira, por razões óbvias, mas o calor da árvore em si, temperado pela brisa, era perfeitamente confortável.
Melhor ainda, toda a sala estava impregnada pelo aroma da madeira.
Vaqueira respirou fundo, saboreando o cheiro, e depois o exalou lentamente.
— Isto é incrível! Só ouvi falar de algo parecido em histórias.
Ela se sentiu errada, de alguma forma, entrando na sala com suas botas de couro sujas. Entrou o mais silenciosamente que pôde, um passo, depois dois.
Ao se aproximar de uma das cadeiras, descobriu que cogumelos cresciam nela como uma almofada.
Ela sorriu, realmente parecia um velho conto de fadas. Tentou se sentar suavemente. A almofada estava macia e inchada sob seu traseiro quando ela afundou nela. Depois se pegou exalando de admiração.
— Uau… Isso é ótimo.
— Hum, tá… Deixe-me tentar…!
Agarrando nervosamente o seu bastão, Sacerdotisa se deixou cair em uma das cadeiras. Os cogumelos habilmente sustentaram sua estrutura leve.
— Eek! Ack! — exclamou, como uma garotinha, arrancando uma risada de Garota da Guilda.
Essa clériga era como uma criança tentando agir como adulta. Ela sempre aproveitava para se divertir quando se apresentava.
— Conheci alguns elfos aventureiros, mas nunca fui convidada para a casa de algum deles — disse ela, olhando atentamente ao redor da sala. Então passou a mão pela tapeçaria na parede, uma que mostrava um herói meio-elfo e seus companheiros lutando pela Lança do Dragão. Devia ser uma cena de algum épico militar. — Como isso foi feito? — perguntou Garota da Guilda. — Isso é outra coisa feita pelas fae?
— Não foi feito, mas sua conjectura não está totalmente errada — respondeu o elfo com o capacete brilhante, com um toque de cortesia para com esta humana experiente. — A floresta nos dá sua afeição e cria a forma dessas coisas, uma expressão de seu poder.
— Dizem que se vai aos anões em busca de moradias robustas, aos rheas em busca de conforto e aos homens-lagarto em busca de fortalezas — disse Lagarto Sacerdote, varrendo o rabo com grande interesse ao longo do carpete de musgo. Ele soltou um suspiro, aparentemente aliviado ao descobrir que mesmo o apêndice longo e pesado não deixou nenhuma marca no revestimento do piso. — Mas que coisa, as casas élficas são profundamente intrigantes por si mesmas.
— Ouvir isso de um filho dos nagas é um elogio, de fato — disse o elfo com um gesto elegante. Uma demonstração de respeito, supunha-se, pelos corajosos e antigos homens-lagarto que tanto conheciam do ciclo da vida. Ele acrescentou de forma autodepreciativa: — Receio que, ocupado como estou com os preparativos para esta ocasião alegre, não tive tempo de tornar suas habitações adequadamente convidativas…
Alta Elfa Arqueira, no entanto, deu-lhe um soco impiedoso com o cotovelo e disse com os olhos semicerrados:
— Agora, irmão, não procure elogios.
— Erk…
— Não me importa o quão ocupado você estava, aposto que levou meses.
Ela fungou e então pulou sobre o musgo e para uma das cadeiras.
— Eu fico nesta aqui! — exclamou, pousando na almofada de cogumelo do assento com a melhor vista da janela.
Alta Elfa Arqueira parecia capaz de plantar seus pés ali mesmo.
— Que rude. — Seu cunhado franziu a testa. — Se ela visse isso, acho que você entenderia o que ela pensa.
— Você ouviu isso? Ainda nem casaram, e ele já está dizendo “ela isso” e “ela aquilo” como se ela fosse sua esposa! — Ela gargalhou com um som como o de um sino tocando, ignorando completamente a repreensão de seu cunhado. — Então, qual é o próximo?
— Hrm, vocês sem dúvidas estão cansados de sua longa jornada, então preparamos um banho e uma refeição do meio-dia para vocês.
O elfo com o capacete brilhante esfregou a testa como se estivesse lutando contra uma dor de cabeça, mas manteve a dignidade natural de seu povo. Talvez estivesse acostumado a ser incomodado por sua futura cunhada assim. Afinal, haviam passado dois mil anos juntos antes de ela partir.
— O que vocês gostariam de fazer? — perguntou ele.
— Vou descarregar a bagagem — respondeu Matador de Goblins de imediato. — Os goblins ainda podem vir.
A essa altura, dificilmente precisaria registrar as reações de seus companheiros a essa observação.
O elfo com o capacete brilhante se viu olhando com certo espanto. Alta Elfa Arqueira pressionou uma das mãos em sua bochecha e acenou com a outra.
— Então também vou ficar aqui. Nunca se sabe quando minha irmãzona pode aparecer. — Ela soltou uma risadinha resignada, à qual os outros estavam acostumados. Portanto, todos acenaram com a cabeça juntos.
— Acho que vou pegar um pouco de comida enquanto as mulheres cuidam de suas coisas.
— Creio que concordo com esse plano.
— Você tem… tem certeza? — perguntou Garota da Guilda, piscando. Pois sempre que ela cuidava de aventureiros, havia poucas oportunidades para os aventureiros mostrarem carinho por ela. Uma expressão ambígua surgiu em seu rosto com essa situação incomum, e ela balançou a cabeça hesitantemente. — Se você tem certeza de que podemos ir primeiro…
— Iremos primeiro à nossa maneira. As mulheres não devem ter prioridade em cuidar de sua aparência?
— Bem, então, muito obrigada. Ficarei feliz em lavar a poeira e o suor. — Garota da Guilda acenou com a cabeça mais uma vez, desta vez se desculpando, mas não tinha nenhuma objeção real.
Sacerdotisa saiu de sua cadeira de cogumelo e foi até Matador de Goblins.
— Pois não? — perguntou o capacete, virando-se para ela. Ela o enfrentou com um dedo pálido.
— Matador de Goblins, senhor, você tem que se certificar de comer e tomar banho, viu?
— Sim.
Ele não parecia muito feliz com isso, mas Sacerdotisa estava satisfeita. Ela estufou o pouco peito em triunfo.
Vaqueira sorriu desamparadamente.
— Ei, não vá pegar as coisas das meninas, especialmente as mudas de roupa. — Ela conscienciosamente tocou nesse ponto. Contanto que o avisasse, ela sabia que ele teria cuidado, mas se não dissesse nada, bem, ele seria capaz de ser totalmente ignorante.
— Quais são elas…? — Matador de Goblins parecia um pouco preocupado.
Vaqueira acenou com a cabeça.
— Vamos pegar algumas roupas para depois do banho, então tente se lembrar de em quais malas as pegamos.
— Certo.
— Mas não olhe nelas!
— Talvez outra pessoa além de mim deva cuidar dessas malas.
— O quê? — A voz da Alta Elfa Arqueira soou, suas orelhas batendo e um sorriso cruzando seu rosto. Ela estava totalmente confiante de que deixar Orcbolg cuidar de toda a bagagem seria muito mais divertido do que deixar que outra pessoa o fizesse.
— Suponho que se dois mil anos não te mudaram, alguns a mais não iriam fazer isso — disse o elfo com um suspiro. Ele sentiu alguém dar um tapa em suas costas, embora fosse estranhamente baixo.
Ele se virou para ver o rosto barbudo de Anão Xamã, com um olhar muito conhecedor.
— Bem, vá em frente, Sir Noivo — disse o anão. — Tenho certeza de que as mulheres estão ansiosas para o banho. — Ele deu outro tapa de incentivo no elfo e riu ruidosamente. — Ao contrário dos elfos, nós, meros mortais, não podemos enrolar com cada coisinha.
— Você quer saber por que nós, elfos, não comemos carne?
— S-Sim. Só quero entender por que não estou sendo alimentado com nada além de folhas e frutas.
— É uma questão de equilíbrio, ó amigo que mora na terra.
— Então você quer dizer que é uma questão de números, das criaturas que vivem na floresta? Oh-ho, esta banana é deliciosa.
— Prove então esta bebida também, Honrado Sacerdote Escamado. Isso é feito com tapioca.
— Ah, a raiz de mandioca. Meu povo é conhecido por ferver e comê-la. Talvez esta seja a verdade por trás daqueles doces grelhados.
— Pois bem, para um animal crescer até a idade adulta leva muitos anos, mas para os frutos amadurecerem na árvore leva no máximo um ano, e o suprimento é abundante.
— Hmm… Bem, acho que deve ser bom não ter que se preocupar com seu suprimento de comida.
— Além do mais, não precisamos ter medo de ser comidos pelos animais, nem precisamos deixar a floresta.
— Você quer dizer que o ecossistema seria ameaçado se vocês tivessem que caçar para o sustento diário. Aha! De fato, de fato.
— Sim, portanto nos servimos apenas de gramíneas, frutas e bagas. Você entende agora, anão?
— Entendo, mas não preciso gostar.
Anão Xamã olhou para o prato de cogumelos à sua frente, bufando sem qualquer tato.
O grande salão construído sob as raízes de uma árvore alta também servia como área de jantar dos elfos. No lugar das lâmpadas, vários botões fechados cheios de brilhos do mar pendurados ao redor da sala, e as mesas estavam cheias de comida.
Havia uvas e bananas, tapioca e saladas com uma mistura de ervas e vegetais, além de vinho de uva e uma bebida também feita de tapioca. Quando se tratava de elegância e atmosfera, qualidade e quantidade de comida, até Anão Xamã não conseguia encontrar nada do que reclamar.
Mesmo assim…
— Simplesmente não consigo me imaginar comendo insetos…
— Eles se reproduzem rapidamente e há uma grande variedade deles. E ainda por cima, são deliciosos.
No enorme prato à frente do anão havia uma pilha de besouros grandes, sem a casca e fervidos. Ele arrancou uma perna de um deles e a mergulhou no molho; quando mordeu, achou crocante e responsivo na boca.
Tinha que admitir, era bom.
Para os anões, a comida não era menos importante e nem menos digna de honra do que as gemas e as joias. E como um anão, Anão Xamã, por sua barba, não negaria quando algo estava delicioso.
Mas… mas ainda assim.
— Ainda são insetos, não são?
— Eu os considero deliciosos.
— Hrmph! Um primo da selva deste grupo, você é…! — Anão Xamã olhou para Lagarto Sacerdote, que estava estalando os lábios enquanto mastigava um inseto, com casca e tudo.
Talvez pudessem evitar que as coisas parecessem insetos. Ou pelo menos adicionar um pouco de sal.
O prato tinha um sabor leve de bons ingredientes, mas era tão óbvio que se estava comendo insetos. Isso foi o suficiente para fazer até mesmo Anão Xamã perder o apetite.
— Ah, certo! Acho que isso me deixa com os doces grelhados.
— Ah, não está comendo o seu? Então suponho que…, aham, eu poderia apenas me servir de uma dessas pernas…
— Seu idiota — disse ele, afastando a mão escamosa estendida. — Um anão nunca divide sua refeição com os outros! — Então começou a transportar os doces grelhados para a boca.
O centro úmido da guloseima tinha uma doçura distinta; dizia-se que era a receita secreta dos elfos. Talvez houvesse mel aplicado nele; em todo caso, era nutritivo e ele parecia nunca se cansar disso, por mais que comesse.
Anão Xamã estava enfiando comida na boca, migalhas voando sobre sua barba, por algum tempo quando ele congelou, de repente tendo uma ideia.
— Não me diga. Essas guloseimas também contêm insetos…?
— Vamos deixar isso para sua imaginação honrada — disse o elfo com o capacete brilhante, ao que uma expressão difícil de descrever passou pelo rosto do Anão Xamã. Ele olhou para o doce meio comido em sua mão, em seguida, jogou-o na boca como se dissesse “ah, que se dane” e engoliu fazendo barulho.
Enquanto Lagarto Sacerdote observava o anão, ele sombriamente tocou a ponta do nariz com a língua e abriu as mandíbulas.
— Contanto que residamos em sua fortaleza… er, essa palavra é apropriada no caso dos elfos?
— Este não é um lugar preparado para a batalha, mas na medida em que o chefe mora aqui, você não está errado.
— Então eu certamente gostaria de saudar seu chefe.
Isso fez com que um leve sorriso brotasse dos lábios do elfo com o capacete brilhante.
— Já está planejada uma audiência para você. Na verdade, é como se todos os que visitam esta floresta já estivessem diante do chefe.
— Ahh…
Lagarto Sacerdote semicerrou os olhos e esticou o pescoço. O teto, que na verdade era a base da enorme árvore acima deles, estava bem longe, iluminado pelo brilho suave dos brilhos do mar.
Houve um farfalhar silencioso das folhas ao vento, acompanhado pelo som da água fluindo pelas raízes.
Enquanto um elfo não fosse morto e não desejasse a morte para si mesmo, continuaria vivendo.
Então, o que aconteceria se alguém desejasse a morte…?
— Entendo.
Tudo fazia parte da floresta, parte da natureza, do ciclo. Simplesmente desapareceria e se juntaria a tudo o que já estava ali.
O chefe vivia ali. Este mesmo lugar era o chefe.
Olhando para cima com admiração, Lagarto Sacerdote juntou as palmas das mãos em um gesto estranho. Embora tivessem uma visão diferente, os homens-lagarto também viam o retorno ao ciclo como um tipo de morte ideal.
— Ofereço meus mais sinceros agradecimentos por termos conseguido tocar até mesmo a bainha das vestes daquele que supervisiona esta grande floresta.
— Seu agradecimento é aceito — disse o elfo, olhando para Anão Xamã, que havia estufado as bochechas como se perguntasse o motivo para tanto barulho. — Saber que há alguém de fora do nosso bosque que entende isso é uma alegria inesperada. Posso perguntar: o que acha deste lugar?
— Oh, meu breve olhar ao redor sugere que todos estejam ocupados.
E de fato estavam.
O grande salão foi decorado com muitos tecidos em preparação para o casamento, junto com harpas amarradas com seda de aranha. Mas, com exceção de algumas criadas, não havia sinal de ninguém ali, muito menos artistas.
— Tem tudo a ver com o casamento?
— Nem tudo — respondeu o elfo, tomando um gole de sua bebida de tapioca como se para juntar as palavras. O copo do qual bebeu era o chifre polido de um cervo, e nada mais, mas era uma obra de arte. — Tem havido muitos sussurros na floresta ultimamente. Muitos foram ver.
— Para ver “aquele que para as águas”, quer dizer?
— Então, há coisas na floresta que nem mesmo os elfos entendem — disse Anão Xamã com um sorriso malicioso.
Nunca deixando seu sorriso elegante sumir, o elfo respondeu:
— Então, deixe-me perguntar, ó anão: você conhece todas as coisas que dormem nas profundezas da terra?
— Entendo seu ponto… — grunhiu Anão Xamã. — Você me pegou nessa.
— He-he-he! Milorde Matador de Goblins certamente perguntaria se essas coisas foram obra de goblins — disse Lagarto Sacerdote, rindo alegremente e agarrando a perna de outro inseto. Ele deixou escapar o pensamento de que não teria reclamação se houvesse um pouco de queijo por perto.
— Quanto a isso… — disse o elfo.
Lagarto Sacerdote acenou com a cabeça sobriamente.
— Hmm… O queijo é o leite de uma vaca ou de uma ovelha, ou algo semelhante, fermentado; como se costuma dizer…
— Não foi isso que eu quis dizer… Ele é realmente o famoso Orcbolg, o Matador de Goblins? O homem mais gentil da fronteira?
— De fato, ele é.
— Ele parece muito pouco.
Lagarto Sacerdote revirou os olhos.
— Eu sei que ele pode parecer bastante inexpressivo à primeira vista, mas o que te faz dizer isso?
— Minha cunhada parece ter gostado dele — disse o elfo ironicamente, soando como um irmão mais velho preocupado com sua irmã mais nova. — Ela tem uma personalidade bastante… única, muito parecida com outra pessoa que conheço… Erm, acho que não há necessidade de esconder isso de você. Devo dizer, muito parecida comigo.
— Ho! É exatamente isso, er, eh, Sir Noivo — disse Anão Xamã, parecendo reanimado enquanto pegava um copo de chifre. O vinho era fraco, mas álcool era álcool. Ainda era bom para incitar um anão. — Não há nada que você possa fazer para controlá-la um pouco?
— Nós tentamos instruí-la nas artes mais femininas. Tecelagem, música, canto e muito mais.
— E funcionou?
— Passamos dois mil anos no projeto…
— Entendo… — E é isso que eles têm a mostrar. Os três se entreolharam e suspiraram ao mesmo tempo.
— Ainda digo, porém, que ela não é uma jovem ruim.
— Sim, eu sei disso. — A resposta de Anão Xamã foi breve, e então ele estendeu a mão e agarrou uma perna de seu besouro. Ele exigia sal enquanto o mastigava, o molho voando por toda parte enquanto se deliciava com a carne.
Ele arrotou diligentemente, depois bebeu mais vinho e soltou outro arroto.
— Admito que sua incapacidade de ser uma dama me desagrada e às vezes gostaria que ela se acalmasse e agisse de acordo com sua idade — disse o elfo.
Lagarto Sacerdote semicerrou os olhos.
— Hmph — Anão Xamã bufou, como se dissesse que não estava totalmente feliz com essa avaliação. — Contanto que ela não nos atrapalhe, querido noivo, ficamos felizes o suficiente em tê-la.
Uma batida podia ser ouvida, como água caindo, e um borrifo branco era visto.
Uma cachoeira? Sim, havia uma.
Mas não são como aquelas que caem sobre a superfície da terra. Não era o tipo que é iluminada pelo sol.
Este era um rio que corria nas cavidades da terra, subia sua cachoeira, subia pelo grande tronco e seguia para o céu.
Passe pelo grande salão, desça um lance de escadas e haverá outra vasta câmara.
Uma grande caverna de pedra esculpida pela água ao longo de muitos milhares de anos, trabalhada exatamente nesta forma. A rocha foi trabalhada pelo fluxo incessante em uma caverna de calcário espetacular. Era surpreendente ver uma floresta tropical que também tinha estalagmites se erguendo do solo e estalactites penduradas como folhas de cima.
Era uma floresta de pedra. Um rio inteiro fluía por ela com uma cachoeira e um lago profundo e escuro.
Esse lago exalava um leve brilho esmeralda.
A própria água, entretanto, não era a fonte; era o musgo.
O musgo, que cobria o leito do lago, estava cintilando.
— Oh… Uau…
Então era isso que significava ficar sem palavras.
Vaqueira estremeceu com o cenário de outro mundo, incapaz de dizer qualquer coisa. O ar úmido, mas frio do subsolo soprou sobre seu corpo nu e bronzeado envolto em uma toalha.
Ela olhou para trás para ver a criada elfa retirando-se com as roupas que Vaqueira havia tirado.
Vaqueira olhou duvidosamente para Garota da Guilda, que estava ao seu lado.
— V-Você acha mesmo que está tudo bem para nós entrarmos nisso?
— Disseram que este lugar é para se lavar, então acho que está bem.
Ela talvez estivesse acostumada com esse tipo de coisa, porque parecia não hesitar em expor sua beleza polida.
Garota da Guilda deu uma rápida olhada ao redor, então mergulhou o dedo do pé na água. Aquele frio especial da água da fonte subterrânea enviou um choque através dela. Ela soltou um grito involuntário, fazendo Sacerdotisa rir.
— É mais quente do que a água que usamos para a lavagem no Templo — disse ela. Depois deslizou as pernas delicadas na piscina, fechando os olhos como se saboreasse a sensação.
— Vocês clérigas sempre parecem ser tão boas nesse tipo de coisa — murmurou Garota da Guilda com algo semelhante a ressentimento, depois deslizou lentamente para o lago.
Vaqueira, relutante em ser a única restante na borda, juntou sua coragem e então quase entrou na água.
— Eee… Ei…!
Ela sentiu o musgo macio sob seus pés. Pensou que estava prestes a escorregar, mas quase na mesma hora descobriu que segurava seu peso com firmeza. A princípio, a água estava fria, mas logo se acostumou e até achou agradável.
Concluiu, então, que ficaria tudo bem.
Isso a encorajou a submergir até os ombros; a água a sustentou e ela balançou suavemente para a frente e para trás em seu abraço.
— Ahh… — Vaqueira se pegou deixando escapar um som suave e relaxado, seu rosto ficando vermelho. Ela olhou para as outras duas garotas, cujas expressões estavam muito parecidas com a dela. Isso a ajudou a relaxar. — Você está certa, é mais quente do que água de poço — disse. — Gostaria de saber por quê.
— Uma vez ouvi uma história que dizia que há um rio de fogo que flui por baixo da terra — disse Sacerdotisa. Ela inclinou a cabeça. Imagino se é por isso. Talvez Alta Elfa Arqueira ou Anão Xamã pudessem contar a elas.
— Vocês aventureiros são realmente incríveis — disse Vaqueira. — Sempre vão a lugares como este.
— Nem sempre — respondeu Sacerdotisa com um sorriso ambíguo.
Caverna, ruínas, ruínas, ruínas, caverna, caverna, ruínas, caverna…
Quando ela pensou em suas aventuras, percebeu que a maioria delas acontecera em cavernas ou ruínas. E a maioria das ruínas que visitou acabaram queimadas ou explodidas, ou inundadas com gás tóxico…
— Bem, ainda assim, nem sempre…
Ela teria que falar com Matador de Goblins sobre avaliar suas ações com um pouco mais de cuidado.
— Muitas pessoas se tornam aventureiras na esperança de encontrar tesouros escondidos — disse Garota da Guilda. Ela segurou o cabelo com uma das mãos para mantê-lo fora da água enquanto ouvia a conversa das outras garotas. — A confiança concedida a algum invasor de ruínas sem-teto e a um aventureiro estabelecido é muito diferente.
— Ah, sim, isso faz sentido. — Vaqueira acenou vigorosamente com a cabeça, gotas de água voando de seu cabelo curto. — Às vezes, as pessoas param na fazenda pedindo algo para comer, mas sempre fico com medo de viajantes aleatórios.
E hospedagem? Sem chance. Ela acenou com a mão enfaticamente.
— Os porcelanas também podem ser um pouco assustadores. Er, jovens sacerdotisas viajantes nem tanto.
— Eu já sou Aço, de qualquer forma — respondeu Sacerdotisa. A leve sugestão de orgulho em sua voz fez Garota da Guilda sorrir ainda mais.
A ainda jovem (apesar de ter dezesseis anos) colocou a mão no peito modesto, como se a placa de nível aço estivesse pendurada lá mesmo neste momento.
Não fazia muito tempo que havia passado na entrevista de promoção e subido para a oitava classificação.
— Aventureiros… Homens, aventureiros — disse Vaqueira, também olhando para a Sacerdotisa. — Lembro de quantas vezes pensava nos aventureiros quando era criança.
— Você gostava muito deles, não é? — perguntou Garota da Guilda, inclinando a cabeça. Uma gota d’água caiu de uma estalactite, fazendo pequenas ondas ondularem pela superfície do lago.
— Er, quem, eu? N-Não os aventureiros como tais, não — disse Vaqueira, apertando sua mão de uma forma que fez mais ondulações.
— Ahh — disse Garota da Guilda com um aceno de cabeça. — Das princesas, então?
— Não diga isso.
— Ou talvez das noivas dos heróis?
— Não me faça dizer isso!
Vaqueira afundou na água até as bochechas, como se tentasse esconder o rubor em seu rosto. Ela ficou sentada em silêncio, soprando bolhas para a superfície como uma garotinha.
Por um momento, o único som na caverna foi o barulho do rio subterrâneo.
Pense nisso – era realmente tão incomum?
Os meninos sempre queriam ser heróis ou cavaleiros, ou matadores de dragões, ou aventureiros. As meninas também tinham seus sonhos.
Princesas ou donzelas de santuário, lindas noivas. Talvez esperavam que alguma fada pudesse um dia aparecer para levá-las para casa consigo.
Embora, no final, a paixão fosse apenas paixão e sonhos apenas sonhos…
— Mas… — A única palavra de Sacerdotisa foi como uma gota d’água e também ondulou pelo ambiente. — Acho que ser uma noiva seria bom.
— Vou preparar as coisas — disse Matador de Goblins, mal se incomodando em soltar um suspiro. Todas as bagagens foram depositadas em seus respectivos quartos.
— Huh? — exclamou Alta Elfa Arqueira. Ela estava caída entre uma coleção de tecidos, olhando para o nada por lazer. Algumas das peças eram triângulos invertidos, outras pareciam grandes tigelas; ela as observou com uma mistura de oohs e ahhs. — Desculpe, ainda não limpei — disse.
— Disseram-me para não tocá-las.
A observação de Alta Elfa Arqueira foi sem malícia; Matador de Goblins, por sua vez, parecia frio.
Ele obedientemente não tocou nem olhou para as roupas e roupas íntimas das garotas. Em vez disso, transportou o resto da bagagem com seu silêncio usual.
A princípio, Alta Elfa Arqueira, recostada em uma cadeira, declarou que ajudaria – e foi esse o resultado.
— Limpe antes que todos voltem.
— Sim claro, eu sei…
Matador de Goblins nem se incomodou em olhar para ela enquanto falava, fazendo com que Alta Elfa Arqueira fizesse beicinho. Foi ela quem fez a bagunça, e ela sabia disso, então, lentamente, mas com firmeza, recolheu uma calcinha.
— Cara, olha para isso. É enorme. Eu poderia colocar minha cabeça inteira aqui.
— Não me mostre isso. E não espalhe tudo.
— Não se preocupe, estou trabalhando nisso! — insistiu Alta Elfa Arqueira, mas então se levantou levemente.
— O que é?
— O trabalho está me deixando com sede. Pensei que talvez pudéssemos tomar alguma bebida.
— Entendo.
Ele estava apenas comentando por cortesia, mas ela interpretou isso como concordância e foi para a cozinha.
Ela murmurou e revisou o conteúdo das prateleiras (também ocos da árvore).
— Ei, Orcbolg — disse, suas orelhas sacudindo para trás —, quer que eu também faça um pouco de chá para você? Só para experimentar.
— Se você me der, eu tomarei. — Ele pareceu não perceber nada da oferta.
— Hmm — disse Alta Elfa Arqueira novamente, parecendo descontente. Logo, estava se preparando para fazer o chá.
Primeiro, pegou algumas ervas e temperos, que pegou quase ao acaso, e começou a picar tudo com uma grande faca de obsidiana. Examinando as medidas, as colocou em xícaras feitas de nozes vazadas e derramou água sobre elas.
A garrafa era feita de mithril, uma peça única que manteria a água fria quase indefinidamente.
Os anões consideravam o aço como seu servo e o mithril como seu amigo, mas seria errado imaginar que os elfos não conhecessem metalurgia. Afinal, o que vem das dobras da terra também faz parte da natureza. O elfo com o capacete brilhante poderia ter dito: “Gentilmente alteram suas próprias formas para nós.”
Normalmente, levava algum tempo para fazer um chá frio, mas nesta terra levava menos tempo do que na maioria dos lugares. Qualquer elfo, mesmo que não fosse um lançador de feitiços, poderia simplesmente fazer um pedido educado e a natureza se dobraria à sua vontade.
Quando Alta Elfa Arqueira fez alguns círculos preguiçosos no ar com o dedo indicador, a água nos copos já estava tingida de cor.
Ela ofereceu uma das xícaras para Matador de Goblins, que havia se acomodado no chão e desfazia sua própria bagagem.
— Olha, sem promessas sobre o sabor.
— Certo — disse Matador de Goblins, pegando a xícara. No mesmo movimento, tomou tudo pelas ripas de seu visor. — Contanto que não seja veneno, não me importo.
— Poxa, fico lisonjeada.
— Quis dizer apenas o que eu disse — falou Matador de Goblins indiferentemente. — Não tive a intenção de te lisonjear.
Com outro bufo, Alta Elfa Arqueira se sentou na cadeira, deixando suas pernas balançarem. Ela tomou um gole de chá, ignorando a maneira como a almofada de cogumelos se mexeu embaixo dela.
— Ei, isso está muito bom — disse, piscando. Então sorriu com um sorriso felino. — Então, o que você está fazendo, Orcbolg?
Matador de Goblins estava sentado firmemente no chão, fazendo algum tipo de trabalho.
Ele puxou três tiras de couro de vaca e as juntou em um monte, quase como se estivesse fazendo uma corda. Alta Elfa Arqueira desceu da cadeira e olhou por cima do ombro, observando os movimentos complicados de seus dedos. A agitação inquieta era característica dela.
— Lembra do goblin campeão?
— Sim…
Para Matador de Goblins, a pergunta era normal, mas fez com que Alta Elfa Arqueira franzisse a testa profundamente.
Essa não era uma batalha de que ela queria se lembrar. Sua dolorosa derrota no labirinto sob a Cidade da Água permaneceu como uma lembrança desagradável.
— Isso foi há quase um ano, como eu poderia esquecer? Vou precisar de pelo menos alguns séculos para tirar isso da memória.
— Isso é algo que preparei para encontros como aquele, ou com o goblin paladino que enfrentamos.
— Hmm…
Matador de Goblins trabalhava mecanicamente, tecendo as tiras juntas. As três tiras unidas pareciam difíceis de rasgar.
— Poderia chamar isso de algo muito pequeno. É só uma corda.
— Vou prender uma pedra pesada em uma das pontas.
A corda era excepcionalmente longa. Poderia contar com uns três metros completos quando concluída.
Para Alta Elfa Arqueira, no entanto, sentar e tecer tiras de couro silenciosamente não parecia coisa de aventureiro.
— Fico impressionada que você pensaria em fazer algo tão volumoso…
— Não vendem em nenhuma loja.
— Não é bem o que eu quis dizer — suspirou ela, suas palavras parte sérias e parte sarcásticas. Então, soltou um segundo suspiro. — Se fosse eu… — Agarrou uma das tiras que Matador de Goblins tinha em mãos, com algumas joias de estilingue da bagagem de Anão Xamã. — Acho que faria assim!
— O que você tem aí…?
Em vez de responder, Alta Elfa Arqueira colocou o dedo no meio da tira e começou a girá-la. A pedra no final balançou em um amplo arco, voando pelo ar.
— Está ouvindo o barulho que isso faz?
— Sim, o que tem isso?
— É divertido!
— Hrm…
Matador de Goblins virou seu capacete de metal, amarrando uma pedra pesada com segurança na ponta de sua trança de couro.
Ele deslizou o dedo apenas para fora do nó, agarrando a corda; deu um golpe para verificar o peso.
Deve ter gostado da sensação, já que começou a embrulhar a pedra, dando os toques finais no dispositivo.
— Estou pensando em fazer vários. Já ouvi falar desse tipo de coisa.
— Excelente. Então vou querer um!
— Que tal este que acabei de fazer?
— Não! Um diferente!
— Não me importo.
Talvez fosse porque Alta Elfa Arqueira estava absorvida em toda a diversão que estava tendo naquele momento. Ou talvez, tendo voltado para sua própria casa depois de tanto tempo, tivesse baixado a guarda.
Seja qual fosse o motivo, algo que normalmente seria impensável para ela aconteceu.
Ahem.
Não percebeu a pessoa parada na porta até que ouviu a tosse.
— Posso perguntar o que está acontecendo aqui…?
A voz soava musical, mesmo quando irritada. Desnecessário dizer que sua dona tinha orelhas pontudas.
Era uma mulher com olhos dourados e cabelos como os céus espalhados pelas estrelas. Um único olhar para ela deixava clara sua nobreza. Seu corpo pálido, envolto em um vestido de linha prateada, era gracioso e alto.
O busto que empurrava aquela roupa, porém, passava a impressão de abundância.
Às vezes, uma pessoa estava além de qualquer descrição, não por causa de falta de palavras, mas porque superava a imaginação.
A princesa da floresta, com a cabeça enfeitada com uma coroa de flores, tinha uma expressão esguia. Alta Elfa Arqueira quase se levantou em um salto.
- O-O-O-O-O q-q-quêê?! I-Irmã?! Por que você está aqui?!
— Por que não deveria estar? Ouvi dizer que você veio comemorar comigo, então pensei em dizer olá…
— Err, ha-ha… I-Isso, quero dizer, não é realmente o que parece…
— Que grande quantidade de roupas íntimas obscenas você trouxe.
— Ah, mana, você sabe sobre roupa íntima? — murmurou Alta Elfa Arqueira, suas palavras não passando despercebidas pelos ouvidos afiados de sua irmã elfa.
— E quanto a isso? — perguntou a irmã, provocando um som abafado de Alta Elfa Arqueira.
— Er, uh, essas coisas não são minhas, pertencem às minhas amigas, sabe?
— Então é ainda pior. Revirando os pertences de outras pessoas.
— Awww…
— Por falar nisso, você… — E uma vez que as palavras começaram, saíram em uma torrente, como um poema épico. — Sua pele está em péssimo estado. Seu cabelo está desgrenhado. Você se esqueceu de toda moderação? Está se cuidando direito?
— Sei o quão perigosa é uma aventura, e sei o quão imprudente você pode ser, e você está bem?
— Perguntei se você está evitando missões estranhas, e então você me diz que se arrepende sempre que pega uma missão.
— Afinal, dizem em todo o mundo, até mesmo os demônios ficam atrás dos humanos na criação de planos insidiosos.
— Quantas vezes eu já disse que você tem que ouvir atentamente às pessoas e então pensar com ainda mais cuidado antes de agir?
Por fim, a elfa com a coroa de flores, que dirigira até mesmo seu sermão para a irmã mais nova com a maior eloquência e equilíbrio, se recompôs mais uma vez.
— Fui terrivelmente rude.
— …
Matador de Goblins não falou de imediato. Ele virou seu capacete de aço para a elfa, ficou em silêncio por mais um momento, então finalmente balançou a cabeça e disse:
— Está tudo bem.
A elfa com a coroa de flores, percebendo que a irmã havia mais uma vez começado a organizar assiduamente as calcinhas, soltou um pequeno suspiro.
— E… você — disse ela, semicerrando os olhos e com um sorriso surgindo em suas bochechas e lábios — deve ser Orcbolg.
— Essa garota me chama assim.
Ah, então é você. A elfa bateu palmas.
— Eu sabia que pessoalmente você não seria como é nas músicas.
— Canções são canções — disse Matador de Goblins, balançando a cabeça. — E eu sou eu.
— Bem… — Tee-hee. Sua risada era como um sino tilintando. Parecia muito com a de Alta Elfa Arqueira. — Obrigada por sempre cuidar da minha irmã. Espero que ela não esteja causando muitos problemas.
— Hmm — Matador de Goblins grunhiu, seu olhar movendo-se por trás de seu visor.
As orelhas da Alta Elfa Arqueira caíram.
— Não — disse ele no fim, balançando a cabeça lentamente. — Ela costuma ajudar.
Isso fez com que as orelhas da arqueira se erguessem.
— Se algum dia encontrar outra arqueira ou rastreadora capaz, um batedor ou algo assim, por favor, não hesite em deixar minha irmã de lado.
— A capacidade não é a única…
Mas Matador de Goblins parou no meio de sua frase.
— Hmm? — Alta Elfa Arqueira inclinou a cabeça. Esse comportamento era incomum para ele. — O que há de errado, Orcbolg?
— Hmm. Nada.
Hmmm? Alta Elfa Arqueira se questionou, seguindo seu olhar.
Ela encontrou uma criada – desnecessário dizer, outra elfa – ajoelhada e esperando.
Ela estava meio na sombra e seu cabelo era comprido em apenas um lado da cabeça.
— Ah, ela é… — A princesa elfa com a coroa de flores parou de falar, como se não conseguisse falar.
— Eu sei.
O comentário casual fez com que os ombros da criada tremessem de surpresa.
Matador de Goblins se levantou e caminhou corajosamente até ela.
— Ei, uh, Orcbolg?
Ele ignorou a tentativa de Alta Elfa Arqueira de detê-lo, apenas parando na frente da criada. Então, sem hesitação, ele se ajoelhou no lugar para que ficassem cara a cara.
— Eu os matei.
A criada olhou para ele, seu olhar oscilando. Matador de Goblins acenou com a cabeça e continuou:
— Matei todos eles.
Ao ouvir isso, uma única lágrima rolou do olho esquerdo da mulher e desceu por sua bochecha.
Uma sacudida de seu cabelo revelou o lado direito de seu rosto. O inchaço parecido com uma uva havia agora desaparecido.
Ela mesma já fora aventureira.
— Certo, foi ele quem a ajudou. Como eu pensava.
Uma brisa suave soprou, pegando o cabelo de Alta Elfa Arqueira. A respiração da floresta. A respiração de sua casa.
Ela inalou profundamente, enchendo seu pequeno tórax com o máximo de ar que pôde. Então respondeu:
— Orcbolg não estava sozinho, sabe.
— Sim, sei disso.
Uma das portas do quarto de hóspedes levava a uma varanda. Era formada por enormes galhos, conectados por trepadeiras que se entrelaçavam para formar um ponto de apoio.
Tal arquitetura só poderia ser encontrada entre os elfos, mas o que realmente merecia destaque era a paisagem.
A vila dos elfos estava localizada em um espaço aberto em meio ao mar de árvores, como um átrio gigante.
Dali, tudo podia ser visto ao mesmo tempo – ali, podia-se sentir o vento que soprava por tudo.
Seu próprio status de princesa elfa impedia que Alta Elfa Arqueira soubesse que tinham esses quartos de hóspedes até este momento.
Deixaram a criada com Matador de Goblins; aquele parecia o melhor lugar para passar o tempo até que ela parasse de chorar.
A elfa com a coroa de flores prendeu o cabelo soprado pelo vento e se virou lentamente para Alta Elfa Arqueira.
— Você a salvou. Você e seus amigos.
— Tive que fazer algo para mostrar meu lado bom.
Afinal, ela havia deixado a floresta por pura insistência. Ela soltou uma risada nasalada e triunfante.
Em resposta, a elfa com a coroa de flores semicerrou os olhos para a irmã mais nova. Ela apoiou o cotovelo na hera que servia de corrimão, encostando-se nela.
— E agora você conseguiu — disse. — Isso é o suficiente?
— Suficiente?
— Kuchukahatari. Aventuras.
As orelhas compridas da Alta Elfa Arqueira tremeram um pouco.
— Você corre um grande perigo por apenas um mínimo de recompensa, não é?
— Er, sim…
Não havia mais nada a dizer. O status de aventureiros, como tal, poderia ser garantido pelo rei humano, mas ainda era um empreendimento mercenário. Um mergulho nas profundezas com a arma na mão, cortando e rasgando e ficando coberto de sangue e lama.
A juventude e a morte andavam de mãos dadas nesta profissão.
Desde que deixou sua casa, Alta Elfa Arqueira se jogou em tudo isso.
— Então há a questão de seus companheiros. Homem-lagarto é uma coisa, mas não posso aprovar você ficar perto de um anão dia e noite. Você não é filha de um chefe élfico, mesmo que nem sempre aja como tal?
Alta Elfa Arqueira franziu a testa a esse pequeno adendo.
Ela era de fato uma princesa elfa, mas ali estava ela fazendo o trabalho sujo dos humanos. Com, como sua irmã se esforçara para apontar, um anão a reboque.
Alta Elfa Arqueira sabia como uma irmã mais nova deveria agir nessa situação. Em dois mil anos ela tinha adquirido pelo menos contenção suficiente para não simplesmente ceder às suas emoções e começar a lamentar e reclamar.
— Certamente, não há.
— Não! Definitivamente não há.
Apesar de suas tentativas de permanecer fria, ela não pôde deixar de rir disso.
Sim, antigas canções de amor continham algumas baladas que falavam do amor entre elfos e anões, mas era justo dizer que essas letras não a descreviam.
Mesmo enquanto sua irmã mais nova gargalhava e acenava a mão com desdém, a elfa com a coroa de flores soltou um suspiro triste.
— E então tem ele…
— Orcbolg?
— Sim.
A outra elfa acenou com a cabeça, seu olhar fixando-se no horizonte. A floresta parecia se espalhar para sempre além da aldeia. Essas árvores vinham crescendo desde a Era dos Deuses. Essa madeira.
As folhas balançavam suavemente com cada rajada de vento, e os pássaros podiam ser ouvidos batendo as asas.
Havia um bando de flamingos rosa-claro, e a cortina da noite estava começando a cair sobre a floresta.
— Pensei que ele seria como o herói da música — disse Alta Elfa Arqueira, o vento acariciando seus lábios enquanto ela sorria suavemente.
O Rei Goblin perdeu a cabeça em um golpe crítico terrível!
Em chamas azuis, o aço de Matador de Goblins brilha no fogo.
Assim, o plano repugnante do rei chega ao seu adequado fim,
E a adorável princesa estende a mão para seu salvador, seu amigo.
Mas ele é Matador de Goblins! Em nenhum lugar ele habita,
Mas jurou vagar, não terá outro ao seu lado.
É apenas o ar ao seu alcance que a grata donzela encontra.
O herói partiu, sim, sem nunca olhar para trás.
Alta Elfa Arqueira recitou a letra com apenas o vento como acompanhamento. Era uma canção de valor. A história de um herói da fronteira que lutava sozinho contra os goblins.
O assassino dos diabinhos: Matador de Goblins.
Apesar de seu tom ousado, conforme o vento carregava as palavras, elas pareciam imensamente tristes.
A elfa com a coroa de flores balançou as orelhas como se quisesse limpar as sílabas do ar.
— Ele realmente não parece nada com isso…
— Bem, é só uma música — Alta Elfa Arqueira ergueu um dedo pálido e fino, desenhando um círculo no ar.
Uma canção é uma canção. E ele é ele mesmo.
— Mesmo assim — disse ela —, admito que a espada de mithril é um pouco de exagero.
A elfa com a coroa de flores baixou os olhos enquanto sua irmã ria. Se um homem estivesse presente, ele certamente teria se prostrado na esperança de espantar sua tristeza.
Uma princesa dos Altos Elfos deve ser a epítome da beleza em todos os momentos e em todas as coisas.
— Por que você está com um homem assim?
— Por quê? Irmã, isso é…
Por que eu estou com ele?
Hmm. Compelida pela questão a ser considerada, Alta Elfa Arqueira sentou-se na grade – outra gafe.
Ela chutou as pernas para frente para que seu corpo se inclinasse para trás, fazendo com que sua irmã mais uma vez arregalasse os olhos.
Alta Elfa Arqueira, entretanto, a ignorou. Elas tinham sido assim por dois milênios. Por que se preocupar com isso agora?
Mas eu me pergunto o mesmo.
No começo, era porque ela precisava de alguém para matar goblins. Ela ficou mais interessada porque ele era um tipo de humano que ela nunca tinha visto antes, e então…
— Já que tudo o que ele fazia era lutar contra os goblins, pensei que era meu trabalho apresentá-lo a uma aventura real pelo menos uma vez na vida.
Sim, parecia que sim. E então ela se tornou cada vez mais atraída para a caça e aventura envolvendo goblins. Contou nos dedos e descobriu que tinha passado por mais de dez aventuras com ele, ao longo de mais de um ano de convivência.
— Quanto mais eu o conheço, menos sinto que posso deixá-lo para trás. Eu meio que… nunca me canso dele? Talvez seja isso. E isso é tudo.
— E é por isso que você continua a caçar goblins…?
— De vez em quando.
Alta Elfa Arqueira de repente chutou as pernas para cima, lançando-se para trás no ar, de forma que acabou pendurada de cabeça para baixo na grade, igual a um morcego, de onde olhou para sua irmã. Ela estava sorrindo como um gato.
— E a cada vez, me certifico de que ele vá para a primeira fila em uma verdadeira aventura.
— Sabe… — disse a elfa com a coroa de flores, com a voz trêmula enquanto olhava rapidamente para o quarto de hóspedes. — Como isso vai acabar, certo?
Alta Elfa Arqueira nunca deixou o sorriso ambíguo em seu rosto sumir. E também não falou.
Não precisava: o desespero de um elfo que descobriu que viver é um fardo não precisava de explicação.
— Então por quê…?
— Cada um de nós tem apenas uma vida, irmã — disse Alta Elfa Arqueira, girando de volta no ar. Ela bateu palmas para limpar a poeira, deixando o vento levar seu cabelo enquanto balançava a cabeça. — Elfos e humanos, anões e homens-lagarto não são diferentes. Somos todos iguais, certo?
— É possível que você…?
Mas antes que a elfa com a coroa de flores pudesse encerrar seu pensamento, um grande uivo surgiu das profundezas da terra.
O som, não muito diferente de um trovão, fez com que o bando de flamingos voasse em pânico.
O rachar das árvores continuou, com uma nuvem de poeira.
— Irmã, abaixe-se!
— Hwha?!
Alta Elfa Arqueira imediatamente se moveu para cobrir sua irmã. Ela instintivamente estendeu a mão para trás, mas seu grande arco estava no quarto de hóspedes.
Ela estalou a língua, mas então suas orelhas se contraíram e um sorriso apareceu nos cantos de seus lábios.
Então ergueu a mão e, um instante depois, o arco caiu nela.
— O que aconteceu?
— Não jogue as armas das pessoas, por favor.
Ela nem mesmo teve que se virar.
Haveria um homem ali, com um capacete de aço de aparência barata e armadura de couro encardida, com uma espada de comprimento estranho no quadril e um pequeno escudo redondo amarrado no braço esquerdo.
Matador de Goblins, em armadura completa, saiu da sala tão calmo quanto sempre.
— São goblins?
— Não sei.
Ele jogou a aljava para ela, e ela rapidamente a amarrou na cintura, com as orelhas tremendo.
— Por favor… Cuide da minha irmã.
— Eu vou.
Matador de Goblins puxou uma tipoia de sua bolsa de itens e preparou uma pedra. Ele se ajoelhou, cobrindo a cabeça da outra elfa com seu escudo.
— Fique abaixada. Rasteje de volta para a sala.
— V-Você se atreve a me pedir para rastejar…?!
— Se houver goblins aqui, eles podem ter arqueiros.
Alta Elfa Arqueira lançou um olhar furtivo e de canto de olho para a irmã sem palavras, sorrindo o tempo todo, e então pulou no parapeito da varanda.
Ela manteve o equilíbrio sem nenhum problema e então deu outro salto. Escalou o tronco da grande árvore e saiu até a borda de um de seus enormes galhos. Ela era leve como só um elfo poderia ser, não tanto para quebrar um galho ou esmagar uma folha.
— Mm… Hmmn…?!
Então arregalou os olhos. Ela viu algo impossível.
Era uma besta enorme. Aquilo pisou na terra com pernas grossas como pilares, e sua cauda fez um som audível ao cortar o ar.
Algo parecido com um leque brotou de suas costas e seu corpo, mais grosso que uma parede, estava coberto por uma pele dura.
Ele limpou as árvores com chifres como lanças, e seu dorso, que parecia um trono, tinha que ter pelo menos quinze metros de altura.
A besta girou seu pescoço semelhante a uma corda, abrindo suas grandes mandíbulas com presas.
— MOOOKKEEEEELLL!!
— Entendo — disse Matador de Goblins, olhando para a besta do outro lado da varanda enquanto o ar balançava. — Então isso é um elefante.
— Não, não é! — gritou de volta Alta Elfa Arqueira.
Foi a primeira vez em sua vida que ela viu aquela criatura. Mas todo elfo que foi criado na floresta tropical sabia o que era.
— Emera ntuka, mubiel mubiel, nguma monene! — Assassino de monstros aquáticos, criatura com leque nas costas, Grande Senhor das Serpentes.
Em outras palavras…
— Mokele Mubenbe…!! — Aquele que para as águas.
Nota: Para quem não se recorda dessa criada elfa resgatada, ela estava na primeira missão deles juntos. Alta Elfa Arqueira, Lagarto Sacerdote e Anão Xamã se juntaram com Matador de Goblins para formar uma equipe de resgate para salvar uma elfa que havia sido capturada em uma masmorra.