Capítulo 4
— Aquela ali é a pequena toca deles.
O frio era mordaz, mas não fazia nada para diminuir a beleza da jovem. Ela parecia a filha da nobreza, como alguém que estaria mais em casa em um salão de baile elegante do que sob o céu cinzento das montanhas do norte.
Seu cabelo cor-de-mel encaracolado estava amarrado e dividido em dois, e suas características faciais possuíam um aspecto orgulhoso. O tamanho de seu busto era óbvio, apesar da armadura de torso que usava, e sua cintura era tão fina que não precisava de um espartilho.
O florete que pendia em seu quadril era de fabricação impressionante; a forma que demandava admiração dava a mesma impressão que sua mestra.
No pescoço da garota estava uma insígnia novíssima de nível porcelana, apanhando o sol que brilhava na neve.
Ela era uma aventureira, e ela e seus quatro companheiros passaram vários dias subindo o lado da montanha nevada. Agora, um pequeno e feio buraco se abria diante deles. Uma olhada na montanha nojenta de resíduos ao lado da entrada deixava claro que era um ninho.
E do que pertencia esse ninho? Com esses heróis recém-formados aqui para combater, o que mais poderia ser?
Goblins.
O coração de Esgrimista Nobre almejava a batalha só de pensar neles.
Agora, aqui, ela não possuía família e nem riqueza, nem poder ou autoridade. Apenas as suas próprias capacidades e seus amigos a ajudariam completar essa missão. Uma verdadeira aventura.
Como o seu primeiro ato, eles se livrariam dos goblins que atacavam a aldeia no Norte. Eles iriam fazer o mais rapidamente do que alguém jamais vira.
— Muito bem! Estão todos prontos? — Ela pôs suas mãos finas nos quadris em um gesto orgulhoso que enfatizava seu peito, então apontou o ninho com a espada. — Vamos expulsar os goblins deixando com fome!
Isso fora semanas atrás.
Foi bom eles terem obstruído os túneis dos goblins erguendo barreiras defensivas ao redor das saídas. E não tinham errado em criar uma tenda, acender uma fogueira para se aquecerem e preparar uma emboscada.
— Os goblins estão atacando a aldeia porque estão com poucas provisões — dissera Esgrimista Nobre, cheia de confiança. — Eles são pequenas criaturas tolas. Alguns dias sem comida, e eles não terão alternativa senão correr.
E, de fato, foi isso que aconteceu. Eles passaram por cima de um grupo de goblins tentando atravessar as barreiras defensivas e matá-los. Dias depois, um grupo de monstros morrendo de fome surgiram, e eles, também, foram massacrados. Era seguro dizer que tudo estava indo como planejado. Eles iriam completar a missão com quase nenhum perigo e o mínimo de esforço.
Mas esse era tanto um sonho quanto a ideia de que esses novos aventureiros inexperientes pudessem, de repente, se tornar ranques platina. Se fosse tão fácil quanto imaginavam, extermínio de goblins não poderia ser chamado de aventura.
Esse era o norte do país, um lugar gelado — havia até uma calota de gelo nas proximidades — para além do território daqueles que possuíam palavras. O hálito de uma pessoa poderia virar gelo logo que deixava a boca, queimando a pele, e as sobrancelhas congeladas faziam barulho cada vez que piscavam. Os equipamentos se tornavam pesados com o frio, o vigor drenava dia após dia com quase nenhum sossego.
Havia duas mulheres no grupo de cinco pessoas, incluindo Esgrimista Nobre, apesar dos homens, é claro, mantivessem distância. Eles comeram para tentar se distrair e manter as forças. Era tudo que poderiam fazer.
Mas a carga era pesada, dado que incluía seus equipamentos, as barreiras e o equipamento para tempo frio. Individualmente, cada um deles levava poucas provisões. Um de seus membros sabia os desígnios de um armadilheiro, mas não existia garantia de que seria possível obter comida para cinco pessoas.
Flechas, também, eram limitadas. Eles poderiam tentar recuperar aquelas que usavam, mas…
Antes de mais nada, no entanto, eles ficaram sem água.
Seu grupo cometeu o erro de comer o gelo e a neve, causando diarreia e mais desgaste a sua resistência.
Eles não eram estúpidos; sabiam que tinham que derreter as coisas no fogo, mesmo que fosse problemático.
Significando, é claro, que a seguir ficaram sem combustível.
Eles estavam com a comida escassa, sem água, e sem forma de se manter quente. Isso estampava o fim vergonhoso do plano de batalha aparentemente infalível de Esgrimista Nobre.
Ainda assim, seria ridículo desistir nessa altura. Eles estavam lidando apenas com goblins, o mais fraco dos monstros. Perfeitamente adequado para principiantes, para uma primeira aventura. Correr para casa sem nem ter lutado contra as criaturas seria humilhante. Eles iriam ser marcados para sempre como os aventureiros que fugiram de goblins…
Assim sendo, alguém teria que descer a montanha, buscar suprimentos na cidade, e voltar.
Os aventureiros olhavam uns para os outros, apinhados sob sua tenda apertada, e todos focados em uma coisa. Especificamente, em Esgrimista Nobre, que tremia de frio, usando sua espada prateada como cajado para se apoiar, ainda assim devolvendo o olhar de todos.
Ninguém quer se culpar quando as coisas vão mal.
— Você vai — disse o rhea batedor, rispidamente o bastante para perfurar o coração. Mesmo sendo o primeiro a concordar quando ela tinha sugerido a tática de inanição, dizendo que achava soar interessante. — Nesse momento, sou o único a fazer todo trabalho por aqui. Vá buscar! Pegue um jantar para nós! — Não aguento, murmurou ele.
— …Ele tem razão — disse o mago, concordando sombriamente sob o manto pesado. — Sabe que mais? Fui contra essa ideia desde o começo. Eu nem sequer tive a oportunidade de usar minhas magias.
— É, concordo — disse a guerreira meio-elfa a seguir, abafando um bocejo enquanto falava. — Estou ficando cansada disso.
Se Esgrimista Nobre se lembrasse corretamente, nenhum deles pensou que expulsar os goblins deixando com fome fosse uma ideia excelente no começo. Quando ela explicou que esse seria o método mais seguro, contudo, eles mudaram de ideia.
Não apenas isso, Esgrimista Nobre achava que ela e Guerreira Meio-Elfa se tornaram mais próximas nesses últimos dias de caminhada. Ela voltou seu olhar para a guerreira, se sentindo traída, e deu uma pequena fungada desdenhosa.
— Entretanto, não haveria nenhum sentido em nosso sofrimento — adicionou a meio-elfa. — E o que acha, Pequenino?
— Eh, eu não me importo com quem quer que vá. — O anão brincou com o símbolo do Deus do Conhecimento, aparentemente tentando responder com o menor número de palavras possíveis. — Mas anões e rheas possuem pernas bem curtas. E meio-elfos são muito leves. Acho que um humano é a nossa melhor aposta aqui. — Ele olhou para Esgrimista Nobre com um lampejo astuto nos olhos, que estavam quase perdidos em seus pelos faciais negros.
Guerreiros eram mais adequados para ir sozinhos do que conjuradores. Ele podia ter lhe pedido definitivamente para ir.
— …Muito bem. Vou fazer isso — respondeu secamente Esgrimista Nobre, que escutara em silêncio até aquele momento. — Obviamente é a escolha mais lógica.
Sim, era isso. Ela iria porque era lógico. Não porque seu plano falhara. Ou, pelo menos é o que repetia a si mesma enquanto fazia o caminho para baixo na longa estrada da montanha.
Se apoiando em sua espada de família como um cajado, ela tirou o peitoral de aço e guardou nas costas, já não conseguindo aguentar o peso e o frio. Ela mordeu os lábios, envergonhada que seu equipamento de aventureira havia acabado como nada mais do que mais bagagem.
Sobre isso estava a saudação a esperando de volta à aldeia.
— Oh! Mestra aventureira, você retornou! Vocês conseguiram?
— Bem, hum…
— Algum de vocês ficaram feridos?
— Ainda não… digo, não… lutamos contra eles ainda…
— Gracioso…
— Mas, queria saber… poderia… poderia compartilhar um pouco de comida conosco, por favor?
A resposta foi não.
Poderia-se imaginar como o chefe e os aldeões se sentiam. Os aventureiros que convocaram mediante a rede de missões estavam em ação há semanas e ainda assim não conseguiram nada! E agora eles queriam mais comida, mais combustível e mais água. Se a aldeia tivesse recursos sobrando para suprir cinco jovens fortemente armado, eles precisariam apelar para aventureiros para começar? Eles mal tinham para si mesmos para o inverno. Tentar apoiar um grupo aventurando ainda por cima seria demais.
Só poderia ser chamado de golpe de sorte que Esgrimista Nobre conseguiu persuadir um pouco de bagatelas deles.
— …
A ironia cruel foi que esses suprimentos adicionais só tornaram sua viagem de volta muito mais lenta e difícil. A cada passo que dava pela neve, arrependimento preenchia seu coração como o gelo que encharcava suas botas.
Eles deviam ter feito mais preparações previamente? Convidado mais aventureiros para fazer parte do grupo? Ou talvez devessem ter feito uma retirada estratégica em vez de avançar com a ideia da inanição…?
— Não! Absolutamente não! Ninguém está fugindo de goblins!
Ela deixou suas emoções falarem, mas não havia ninguém para responder.
Agora ela estava envolvida pela noite, uma noite que enegrecia ainda mais a “escuridão branca” da neve que açoitava. Ela já estava exausta quando começou essa marcha com carga pesada, e tudo sobre isso era uma crueldade com ela.
— Não vamos ceder… aos goblins…
Ela soprou em suas mãos dormentes, tentando desesperadamente montar sua tenda. Só de ter alguma coisa, qualquer coisa entre ela e a neve e o vento fariam muita diferença…
— Está frio… Tão frio…
O ar gelado da noite era impiedoso. Abraçando-se e tremendo, Esgrimista Nobre fuçou em um pouco de lenha.
— Tonitrus — murmurou ela, entoando a magia Raio. Pequenos raios elétricos crepitaram da ponta de seus dedos e acenderam as toras.
Esgrimista Nobre era uma combatente da linha de frente que poderia usar magia de relâmpago, que aprendeu porque era uma tradição de família. E qual seria o mal de um pouco de raio aqui? Ela poderia usar uma ou duas vezes por dia; fazia sentido pôr em ação para acender o fogo, para que conseguisse um pouco de calor. Mas mesmo isso era um luxo, pois gastava algumas das escassas lenhas que os aldeões lhe dera.
— ………
Ela não disse mais nada, senão abraçar os joelhos, tentando se enrolar o máximo para se ajudar a evitar o som do vento e a neve uivando.
Até alguns dias atrás, ela possuía amigos.
Agora, estava sozinha.
Seus companheiros estavam algumas horas de subida. Eles estavam esperando por ela. Provavelmente.
Mas, Esgrimista Nobre simplesmente não possuía forças para alcançá-los.
Estou tão cansada…
Isso era tudo, tudo o que conseguia pensar.
Ela afrouxou o cinto e as correias de sua armadura. Era algo que ouvira uma vez que se deveria fazer. O calor do fogo começou a se infiltrar em seu corpo, e seu espírito acalmou.
Ela imaginava despachar os goblins rapidamente, facilmente. Em um piscar de olhos, ela iria subir para o ouro ou até mesmo o platina. Ela faria o seu próprio nome, sem depender do poder de seus pais. Mas quão difícil estava se tornando!
Acho que… talvez devesse ter esperado por isso.
Coisas como fama e fortuna não vinham a uma pessoa de um dia para o outro. Elas se acumulavam ao longo de décadas, séculos. Acreditava ela que, sozinha e sem ajuda, conseguiria exercer de repente um esforço digno de tais realizações?
É melhor me desculpar.
Ela queria dizer com seus amigos ou com sua família? Ela não tinha certeza, mas a humildade que sentia em seu coração era real quando fechou os olhos.
Ela começou a adormecer, com a consciência ficando mais distante. Com tanta fadiga em seus ossos, como ela poderia desejar algo além de descansar?
Foi por isso que ela não perceber de imediato o que estava ouvindo.
Paf. O som de algo úmido batendo.
De alguma forma, a extremidade da tenda erguera — o vento a apanhou? — e alguma coisa caiu próximo a fogueira.
Esgrimista Nobre se sentou onde estava dormindo e olhou sonolenta para a coisa, de forma questionadora. — Me pergunto o que… é isso…
Era uma orelha.
Não de humano, mas a orelha de um meio-elfo, cruelmente decepada até a metade.
— Oo… quêê!
Esgrimista Nobre caiu para trás. Ainda gritando, ela recuou.
Naquele momento, veio uma risada horrível; parecia cercar a tenda.
Foi pouco depois disso que alguma coisa lá fora agarrou a tenda e a destruiu.
— Ahh… oh! Não! O que é isso?! Por que está…?!
Esgrimista Nobre se contorcia debaixo da tenda caída, meio louca. A fogueira se alastrou pela tenda, provocando grandes quantidades de fumaça, fazendo seus olhos lacrimejarem e induzindo um ataque de tosse.
Quando a lutadora finalmente conseguiu sair da cilada, ela quase não era reconhecível do que já fora. Seu cabelo dourado arrumado estava desarrumado, seus olhos e nariz estavam cheios de lágrimas e ranho, e havia cinzas no rosto.
— M-merda! G-goblins…?!
Ela gritou e recuou ao avistar as pequenas criaturas sujas, se afastando do som de seus risos hediondos. Esgrimista Nobre estava completamente rodeada de goblins na noite escura e nevada. Eles possuíam clavas brutas, armas de pedra e vestiam um pouco mais do que peles.
No entanto, não era a aparência dos goblins que tanto aterrorizava Esgrimista Nobre. Era o que eles seguravam nas mãos: a cabeça familiar de um rhea, de um anão e de um humano.
Mais ao longe, a meio-elfa estava sendo arrastada frouxamente pelos cabelos, através da neve. Ela deixava uma listra vermelha para trás como um pincel por uma tela.
— Ah… por favor…
Não, não. Esgrimista Nobre balançou a cabeça como uma criança mimada, com o movimento fazendo ondas no cabelo.
Eles esperaram até que estivesse longe para atacar?
Os outros decidiram atacar a caverna enquanto Esgrimista Nobre não estivesse lá, conduzindo a esse fim terrível?
Esgrimista Nobre foi pegar a espada com a mão que não parava de tremer, tentando sacá-la da bainha…
— P-por quê? Por que não c-consigo retirá-la…?!
Ela cometera um erro crucial. O que pensou que aconteceria? Sua espada foi encharcada pela neve, depois ela deixou ao lado do fogo; e agora foi exposta ao frio outra vez. A neve derretera no cabo e na bainha. O que mais poderia fazer nessa situação, senão congelar mais uma vez?
Dezenas de goblins se aproximaram de todos os lados da combatente chorosa. A garota, contudo, apertou os lábios. Talvez não pudesse desembainhar sua espada, mas ela começou a tecer uma magia, com a língua presa pelo frio.
— Tonitrus… oriens…!
— GRORRA!!
— Hrr… ugh?!
Claro, os goblins não teriam a gentileza suficiente para deixá-la terminar. Ela foi atingida na cabeça por um golpe implacável com uma pedra; isso deixou Esgrimista Nobre de joelhos.
A “simpatia” dos goblins servia apenas um único propósito: zombar de sua presa patética, chorosa e apavorada.
Seu nariz formoso fora esmagado, com o sangue escorrendo tingindo o campo de neve.
— GROOOOUR!!
— N-não! Parem… parem, por favor! Ah! U-ugh! Não, por favor…!
Ela chorou quando eles agarraram seu cabelo, gritou quando eles pegaram sua espada.
A última coisa que viu foi seus próprios pés se debatendo no ar. Esgrimista Nobre foi soterrada por mais goblins do que poderia contar com as duas mãos.
Então, quem é que passara fome aqui? Foi isso que eles conseguiram por desafiar os goblins em seu território? Ou por deixarem de se preparar bem o bastante para executar sua própria estratégia?
Seja como for, certamente não precisamos imaginar seu destino traçado.
Esse foi o fim desses aventureiros.
Os olhos de Esgrimista Nobre se abriram com o som crepitante de centelhas voando. Ela sentia um leve calor, mas a dor em seu pescoço — uma sensação de ardor — a fez saber que isso era a realidade.
O que tinha acontecido? O que tinham feito com ela? Uma sequência de lembranças passou pela sua mente.
— …
Esgrimista Nobre pôs em silêncio a coberta de lado e se sentou. Ela parecia estar em uma cama.
Quando ela olhou ao redor, viu que estava em um edifício feito de troncos. Um odor formigou seu nariz; vinho? Foi um pouco de sorte que mesmo sendo enfiada em uma pilha de resíduos, não havia danificado seu olfato.
Ela estava no segundo andar de uma pousada. Em um dos quartos de hóspedes, pensou ela. Se ela não tivesse simplesmente alucinando.
Paralelamente, ela podia ver uma figura humana agachada em um canto escuro do quarto, que estava iluminado apenas pelo fogo.
A figura usava um capacete de aparência barata e uma armadura suja. A espada que carregava possuía um comprimento estranho, e um pequeno escudo redondo estava apoiado contra a parede. Ele parecia singularmente nada impressionante, exceto pela insígnia de prata em seu pescoço.
A voz de Esgrimista Nobre já não tremia. — Goblins — disse ela. Ela falou em um sussurro, mais consigo mesma do que a qualquer outra pessoa.
— Sim — respondeu o homem da mesma forma, com a voz calma e palavras francas. — Goblins.
— …Entendi — disse ela, e então se deitou de novo na cama. Ela fechou os olhos, olhando para a escuridão na parte de trás de suas pálpebras, e então os abriu bem pouquinho. — E quanto aos outros? — perguntou ela depois de um momento.
— Estão mortos — veio a resposta desapaixonada. Era quase misericordioso em sua franqueza gélida, lhe dando apenas os fatos.
— E… entendi…
Esgrimista Nobre pensou por um tempo. Ela ficou admirada com a forma que a agitação passou pelo seu coração. Ela esperava chorar, mas seu espírito estava surpreendentemente calmo.
— Obrigada por me ajudar. — Pausou. — O que quero dizer é… acabou?
— Não. — As tábuas rangeram quando o homem se levantou. Ele apertou o escudo no braço esquerdo, verificou a condição do capacete, depois se aproximou dela com um ritmo ousado e indiferente. — Há algumas coisas que gostaria de te perguntar.
— …
— Só me diga o que conseguir.
— …
— Não se importa?
— …
Provavelmente tomando o silêncio de Esgrimista Nobre como aprovação, o homem estranho continuou imparcial: Quantos goblins ela encontrara? Qual era a disposição do ninho? Que tipos de goblins havia? Onde ela os encontrou? Que direção?
Ela respondeu sem emoção.
Não sei. Não sei. Todos pareciam os mesmos. Perto da caverna. Norte.
O homem apenas grunhiu “Hmm” sem acrescentar mais nada.
Snap. Crac. Os momentos de fala intermitente foram unidos ao resmungo do fogo na lareira.
O homem se levantou e pegou um atiçador, mexendo tranquilamente no fogo. Por fim, ele falou, ainda de frente para a lareira e um pouco mais baixo que antes.
— O que vocês fizeram?
— …Tentei expulsá-los de fome — disse Esgrimista Nobre, algo puxou a beira de seus lábios. Foi só um ligeiro gesto, tão pequeno que ninguém senão ela notou. Mas ela pensou que sorriu. — Tinha certeza de que funcionaria.
— Entendi. — Ela assentiu com essa resposta calma.
Bloqueie as saídas da caverna, espere até que os goblins comecem a morrer de fome, então acabe com eles. Ela e seus amigos podiam fazer juntos, sem problemas. Ganhar um pouco de experiência, aumentar de ranque. E então… e então…
— Tinha tanta certeza…
— Entendi — repetiu ele e assentiu. Ele mexeu no fogo outra vez e colocou de lado o atiçador. Houve um retinir de ferro quando ele se levantou. O chão rangeu. — Sim, compreendo como isso poderia acontecer.
Esgrimista Nobre olhou vagamente para ele. O capacete a impedia de ver seu rosto. Ela percebeu que essas foram as primeiras palavras reconfortantes que ele lhe disse.
Talvez o homem já tivesse perdido o interesse em Esgrimista Nobre, pois ele caminhou até a porta. Antes de ele alcançar, ela o chamou.
— Ei, espere!
— O quê?
Algo estava passando por ela, uma imagem sombria e ambígua de algum lugar no extremo de suas memórias.
Aquela armadura suja. Aquele capacete barato. Aquela espada estranha e escudo redondo. Alguém obstinado e estranho, com uma insígnia de prata ao redor do pescoço. Alguém que matava goblins. Tudo apenas uma tênue lembrança.
Mas isso a fazia lembrar de certas partes de uma canção que ouviu em algum lugar. Trouxe de volta lembranças de tempos, tempos atrás, quando ela e seus amigos estavam rindo juntos na cidade.
Um aventureiro conhecido como o homem mais gentil da fronteira.
— Você é… Matador de Goblins?
— ……
Ele não respondeu de imediato; houve um momento de silêncio.
Então, sem se virar, ele disse: — Sim. Alguns me chamam assim.
Sua voz, como sempre, não dava dicas de suas emoções, e com isso, ele deixou a sala.
Houve o som da porta fechando. O atiçador no chão era o único sinal de que ele esteve ali.
Esgrimista Nobre olhou para o teto. Alguém havia limpado sua pele e lhe vestido, e lhe trocou com um traje bruto e sem adornos. Ela pôs a mão no peito, que erguia e descia no tempo de sua respiração. Foi aquele homem que limpou seu corpo? Ou não? Sinceramente, ela não se importava de todo modo.
Não sobrou nada para ela agora. Nada mesmo.
Ela abandonara sua casa, seus amigos se foram, e sua castidade foi roubada. Ela não possuía dinheiro nem equipamento.
Isso não é verdade.
Ela avistou algo em um canto do quarto, no canto onde o homem — Matador de Goblins — esteve sentado. Armadura de couro, surrada e furada, e sua bolsa de itens, agora suja.
A dor em seu pescoço reapareceu.
— Matador de Goblins… Aquele que mata goblins.
Parecia que os goblins não repararam que a bolsa de Esgrimista Nobre possuía um fundo falso costurado.
Tradicionalmente, ao usar um florete, a pessoa levava um objeto na mão oposta que ajudaria na defesa.
O que ela escondia no fundo de sua bolsa de itens era a segunda lâmina adornada com joias de sua família. Era uma adaga de alumínio forjado por um martelo rápido e certeiro contra uma joia vermelha.
— Como ela está?
— Acordada.
Quando Matador de Goblins desceu as escadas, Sacerdotisa o questionou com preocupação na voz, mas ele respondeu indiferentemente.
Ao contrário de sua discussão mais cedo, agora não havia aldeões na pousada.
A noite caíra completamente quando Matador de Goblins e os outros voltaram. Se os goblins estivessem todos mortos, então não haveria necessidade para os aldeões passarem a noite em vigilância temerosa. Seus dias de serem atormentados pela escuridão, o frio e o medo acabaram.
A única exceção era o chefe da aldeia. Ele teve o azar de saudar os aventureiros e o primeiro a ouvir o seu relatório.
“Os goblins parecem ter construído um ninho separado.”
O chefe dificilmente poderia ser culpado pela forma que seu queixo caiu. Como sua aldeia, aqui no Norte, deveria se preparar agora para o inverno? Eles tinham muito pouco sobrando. E agora chegou a esse ponto. Os goblins na caverna foram mortos; os aventureiros teriam todo o direito de considerar a missão concluída. Os aldeões teriam que voltar para a guilda, registrar outra missão, e pagar outra recompensa.
Se não fizessem, a aldeia seria simplesmente destruída.
Assim sendo, seu alívio foi imenso quando Matador de Goblins anunciou que o seu grupo continuaria lidando com os goblins. Mas, isso não resolvia o problema da aldeia com provisões. A mesa que o grupo se sentou só possuía pratos modestos, sobretudo vegetais com sal.
No espaço livre entre os pratos, uma folha de velino estava aberta. Era o mapa da montanha nevada que o armadilheiro lhes dera antes do ataque deles à caverna. Matador de Goblins organizou o mapa para que o norte estivesse para cima de onde ele se sentou.
— Ei — disse Alta-Elfa Arqueira com os olhos entreabertos. — Devemos realmente deixá-la sozinha?
— Não sei.
— Como assim, não sabe?
— Como poderia saber? — disse Matador de Goblins, parecendo um pouco aborrecido. Ele poderia ser rude, bruto e frio. Mas ele quase nunca gritava. — O que deveria ter dito a ela? “Lamento que seus amigos estejam mortos, mas pelo menos você sobreviveu”?
Isso tirou as palavras da boca de Alta-Elfa Arqueira. — Bem… Bem… — Ela abriu a boca, depois fechou outra vez, antes de finalmente dizer: — Existe essa coisa como a forma sensível de dizer as coisas.
A resposta de Matador de Goblins foi breve: — Isso não muda o que significam.
Pensando bem…
Sacerdotisa mordeu os lábios suavemente. Ele também não a confortou em seu próprio caso. Nem quando resgataram a aventureira elfa ferida das ruínas. Ele sempre foi…
O gosto leve de sangue era tão amargo que quase trouxe lágrimas aos seus olhos.
Ela olhou na direção de Matador de Goblins, mas ele não pareceu notar.
— Como está seu ferimento? Afeta algo no movimento?
Alta-Elfa Arqueira franziu os lábios. Mudanças tão diretas de assunto eram uma de suas especialidades. Por outro lado, ele estava preocupado com ela — mesmo que sua preocupação fosse principalmente sobre matar goblins! — e ela não podia se queixar disso.
— …Está tudo bem. Mesmo que ainda doa um pouco. Recebi tratamento por isso.
— Entendi — assentiu ele. Seu capacete balançou com o movimento. — Nesse caso, passando agora para a provisão de equipamentos. Como estão as coisas?
— Hum. — Lagarto Sacerdote assentiu soturnamente e tocou a bolsa simples colocada ao seu lado. Sua cadeira, em torno do qual ele conseguiu de alguma forma envolver toda sua cauda, rangeu. — Consegui obter provisões; ainda que bastante caras, já que pedi aos aldeões para retirar de suas próprias reservas.
— Lá se vai nosso lucro… outra vez — disse Alta-Elfa Arqueira com um suspiro. Ela estava tentando soar frustrada, mas um sorriso puxou os cantos de seus lábios. Eles estavam juntos há quase um ano, e ela ficou acostumada com isso. Embora a sua vontade para levá-lo em uma verdadeira aventura só havia aumentado também.
— O que é isso? Preocupada com dinheiro, Orelhuda? Normalmente não é desse tipo. — Anão Xamã riu ruidosamente, tendo ou não entendido o que Alta-Elfa Arqueira realmente pensava. Não satisfeito com apenas o vinho que usava como catalisador, ele pegou outro copo para ajudá-lo nessa conversa. Era um álcool insípido, inodoro e forte; a garrafa foi enterrada na neve e transformada em hidromel. Anão Xamã o emborcou.
Alta-Elfa Arqueira pensou que teria uma ressaca só de ver. — É claro que estou — disse ela, olhando irritada para o anão. — As recompensas por matar goblins são desprezíveis!
— Mas também, conseguimos resgatar uma aventureira dessa vez — disse Lagarto Sacerdote.
— Bom, não é todo dia que se vê cinco ou seis aventureiros ranques prata matando goblins, não é? — disse Anão Xamã.
— Ér… só sou obsidiana — murmurou Sacerdotisa, e sorriu ambiguamente.
Ela sabia o que era ser a única sobrevivente de um grupo aniquilado. Ela queria acreditar que não estava forçando a interpretação; mas não conseguia deixar de pensar quão diferente ela realmente era dessa Esgrimista Nobre.
Ela não sabia se era o destino ou o acaso… Mas, cada vez que pensava nos dados invisíveis rolados pelos deuses, ela sentia algo como resíduos se acumulando em seu coração.
— Ouçam, eu consegui pegar uns medicamentos — disse Anão Xamã. Ele esvaziou o copo, encheu e bebeu de novo.
— A irmã mais velha daquela garota… — Matador de Goblins pausou por um momento. — A curandeira. Foi-nos dito que ela é inexperiente.
— Talvez não consiga fazer poções, mas disse que iria nos dar todas as ervas que queríamos — disse Anão Xamã com um sorriso largo. Então ele passou a mão na barba. — Não acha que ela é bem o seu tipo? Ela dá uma bela esposinha.
— Não tenho ideia.
— Hum… — irrompeu Sacerdotisa, incapaz de se conter.
Anão Xamã e Matador de Goblins, com sua conversa interrompida, olharam para ela, e Lagarto Sacerdote e Alta-Elfa Arqueira logo seguiram.
— Hum, bem… — Ela se contorceu sob o olhar coletivo deles. — Só… me pergunto o que vamos fazer a seguir — terminou ela sem jeito.
— Matar os goblins, é claro. — A resposta de Matador de Goblins foi tão fria como sempre. Ele se inclinou sobre a mesa, olhando para os copos e pratos que cercavam seu mapa. — Movam seus pratos.
— Pode deixar — disse Anão Xamã como se voltando a si de repente; ele pegou uma batata cozida ao vapor de um dos pratos e mordeu.
— Ei! — disse Alta-Elfa Arqueira, que pensou ter direitos sobre aquela comida. Ela tirou os pratos para longe parecendo muito explorada.
Preocupado de que seu licor pudesse ser recolhido junto com o resto dos pratos, Anão Xamã trouxe seu copo e garrafa para si protetoramente.
Lagarto Sacerdote considerou a visão dos dois sendo “muito engraçada”, estendendo a língua de fora e colocando mais vinho em seu copo vazio.
— ……
Quando tudo feito, Sacerdotisa limpou a mesa silenciosamente.
— Bom — disse Matador de Goblins, assentindo e reorganizando o mapa na mesa. Depois ele pegou um utensílio de escrever — apenas um pedaço de carvão preso a um pedaço de madeira — de sua bolsa de itens e marcou a localização da caverna com um X.
— É óbvio que a caverna não era seus aposentos.
— É, era definitivamente uma capela ou algo assim — disse Alta-Elfa Arqueira, bebericando um pouco de vinho tinto. — Embora ainda não consiga acreditar.
— Credível ou não, aparentemente é. Acho que temos que reconhecer isso. Mesmo assim… — Lagarto Sacerdote deu um suspiro sibilante, fechando os olhos. Segundos mais tarde, ele abriu um deles e olhou para Sacerdotisa. Ela encontrou seus olhos e tremeu. — …Gostaria de saber o que nossa honrada clériga pensa.
— É, era definitivamente uma capela ou algo assim — disse Alta-Elfa Arqueira, bebericando um pouco de vinho tinto. — Embora ainda não consiga acreditar.
— Credível ou não, aparentemente é. Acho que temos que reconhecer isso. Mesmo assim… — Lagarto Sacerdote deu um suspiro sibilante, fechando os olhos. Segundos mais tarde, ele abriu um deles e olhou para Sacerdotisa. Ela encontrou seus olhos e tremeu. — …Gostaria de saber o que nossa honrada clériga pensa.
— Ah! Uh… Hum, sim… — Sacerdotisa se endireitou rapidamente na cadeira, segurando seu cajado de monge que estava em seu colo. Ficou claro que ele estava tentando mostrar alguma consideração por ela.
Tenho que responder.
Ela tomou um gole de vinho, lambendo seus lábios agora úmidos. — Concordo com Matador de Goblins. Foram… trinta?
— Trinta e seis — pontuou Matador de Goblins. — Isso é quantos deles matamos.
— Não acho que trinta e seis deles pudessem dormir lá.
— Verdade, o lugar não parecia ter muito em termos de comida, vinho ou qualquer uma das suas coisas favoritas — disse Anão Xamã.
A palavra goblin era praticamente sinônimo da palavra estúpido, mas isso não significava que eles não tivessem algum cérebro. A razão de eles não terem tecnologia para criar qualquer coisa era porque tendiam a considerar a pilhagem o suficiente para satisfazer as suas necessidades. Mas o mesmo não podia ser dito das cavernas que esses viviam. Se eles tivessem roubado uma casa, alguma ruína, ou alguma estrutura pré-existente, talvez fosse uma questão diferente. Mas, uma caverna…
Os goblins, com sua própria maneira desagradável, preparariam armazéns, locais para dormir e pilhas de lixo. No mínimo, seria de se esperar encontrar os restos de uma de suas grandes festas por lá, mas os aventureiros não descobriram tais restos. Eles encontraram só aquele altar de pedra, um lugar que parecia uma capela, e uma mulher prestes a ser oferecida…
— Isso sugere que a sua principal habitação está em outro lugar — disse Matador de Goblins, circulando no mapa uma colina para lá das montanhas. — Segundo os moradores, existem algumas ruínas antigas em algum ponto mais alto de onde escalamos.
— Há uma grande probabilidade de que os goblins estejam assentados lá. — Lagarto Sacerdote assentiu. — Você tem alguma noção de que tipo de ruínas são?
— Uma fortaleza de anões.
— Hum — murmurou Anão Xamã com essa menção de sua raça; ele tomou outra golada de hidromel. — Uma das fortalezas do meu povo da Era dos Deuses, isso? Isso significa que um assalto frontal arriscaria as nossas vidas, Corta-barba. Vamos tentar o fogo?
— Tenho um pouco de óleo — disse Matador de Goblins, retirando uma garrafa cheia de um líquido preto de sua bolsa. — Mas, presumo que a fortaleza seja feita de pedra. Um ataque com fogo pelo lado de fora não a colocaria em chamas.
— Pelo lado de fora… — repetiu Sacerdotisa, tocando o dedo contra os lábios. — E quanto a partir de dentro, então?
— Um bom plano — disse de imediato Lagarto Sacerdote, abrindo as mandíbulas e assentindo. Ele passou a garra ao longo do mapa de pele de cordeiro, traçando cuidadosamente a rota de sua marcha. — Castelos infiltrados pelo inimigo são e sempre foram vulneráveis.
— Mas, como vamos conseguir entrar? Estou certa de que não podemos simplesmente entrar pela porta da frente — disse Sacerdotisa com um toque de aflição.
Nisso, no entanto, as orelhas de Alta-Elfa Arqueira se levantaram, e ela se inclinou bastante para frente. — Então vocês querem se esgueirar em uma fortaleza! — Ela parecia positivamente leviana. Ela continuou murmurando “Claro, claro” consigo mesma, com suas orelhas balançando junto às suas contemplações. — Certo! Isso está quase começando a parecer uma verdadeira aventura. Ótimo!
— I-isso é… uma aventura?
— Com certeza — disse Alta-Elfa Arqueira com sua forma alegre e vívida. Ela estava evidentemente animada, embora fosse possível que estivesse fazendo uma fachada encorajadora. Nada dizia que tinha que agir triste só porque se estava em uma situação deprimente.
— Montanhas antigas dentro das terras selvagens! Uma fortaleza imponente controlada por algum cabeça poderoso! E nos esgueiramos e acabamos com ele!
Se isso não é uma aventura, o que é?
Alta-Elfa Arqueira ofereceu essa explicação com muitas gesticulações, depois olhou sugestivamente para Matador de Goblins.
— Acho que não estamos exatamente lutando contra um Senhor Demônio ou algo assim… mas não é um clássico extermínio de goblins, de certo.
— Não é bem uma infiltração também — murmurou Matador de Goblins. — O inimigo saberá que há aventureiros. Temos que aproximarmos cautelosamente.
— Você tem um plano? — perguntou Anão Xamã.
— Estou pensando em um agora. — Matador de Goblins olhou para eles. Sua expressão estava mascarada pelo seu capacete, mas ele parecia olhar para os seus dois clérigos.
— Disfarçar em relação sua religião?
— Hummm. Imagino — disse Lagarto Sacerdote, com os olhos revirando. Então seus olhos reptilianos se fixaram em Sacerdotisa e cintilaram travessamente. Ela captou seu significado e sorriu suavemente consigo mesma.
Não posso simplesmente deixar todos me paparicarem o tempo todo.
— A… acho que depende da hora e da situação.
— Tudo bem. — Matador de Goblins vasculhou sua bolsa de itens e, finalmente, pegou algo. Ele rolou pela mesa, sobre o mapa e então parou.
Era o marcador que portava o símbolo do mal.
— Já que eles foram gentis em nos deixar uma pista, eu não poderia recusar em prosseguir.
— Ha-ha. Muito astuto — disse Lagarto Sacerdote, batendo as mãos escamadas. Ele parecia perceber o que se passava. — Se tornar um membro da Seita do Mal. Hum, muito bem.
— Sim.
— Sou um homem-lagarto que serve ao Deus das Trevas. Meu discípulo é um guerreiro, e estamos acompanhados por um anão mercenário…
— Suponho que isso faz de mim uma elfa negra! — disse Alta-Elfa Arqueira com um sorriso felino. Então se virou para Sacerdotisa. — Vou ter que pintar meu corpo com tinta. Ei, talvez você possa colocar algumas orelhas falsas! Poderíamos ser gêmeas!
— Hã? Ah… hum? Eu vou… eu vou ter que me pintar também?
De repente, Sacerdotisa não sabia para onde olhar. Alta-Elfa Arqueira se moveu rapidamente ao redor dela, cheia de sorrisos.
— É melhor do que entranhas de goblins, não é?
— Não acho que isso diz muita coisa…!
Dado a liberdade para escolher, ela não teria escolhido nenhuma dessas coisas. Mas, se fosse preciso…
Matador de Goblins olhou para as duas garotas tagarelando, depois se virou para o outro homem. Lagarto Sacerdote entrecerrou os olhos bem levemente.
— Elas são duas belas jovens.
— Sim — disse Matador de Goblins, assentindo — eu sei.
Se tivesse que fazer algo ultrajante ou inacreditável para alcançar a vitória, ele faria. Se ele tivesse que ficar deprimido ou sério a fim de combater eficazmente, ele faria isso.
Mas, a realidade era diferente. Risos e regozijo: o grupo todo reconhecia quão importante eram essas coisas.
— Bom, agora, creio que devemos decidir o que faremos de modo a se disfarçar — disse Lagarto Sacerdote.
— Seria inconveniente se os goblins descobrissem que éramos aventureiros — disse Matador de Goblins. — Seja o que façamos, temos que mudar o que usamos.
— Pfft — disse Anão Xamã com uma gargalhada, seu hálito fedia à álcool. — Se não se importarem que sejam bem usadas, eu tenho algumas roupas.
— Oh-ho. Você é um anão de muitos talentos, Mestre Conjurador.
— Boa comida e vinho, boa música e canção, e algo bonito de se usar. Se já tem tudo isso mais a companhia de uma bela mulher, você tem tudo o que precisa para aproveitar a vida. — Ele se ajeitou com outro copo de hidromel em mãos e fechou os olhos. — Posso lidar com cozinha, música, canção e costura por mim mesmo. Quanto a uma mulher, há sempre as cortesãs na cidade.
— Céus. Você não tem esposa, então? — Lagarto Sacerdote pareceu bastante surpreendido, mas Anão Xamã respondeu: — Na verdade não. Penso em passar mais ou menos cem anos aproveitando a vida de solteiro, bancando o bon vivant.
Lagarto Sacerdote riu, pondo a língua para fora e bebendo alegremente sua bebida. — Mestre Conjurador, quão jovem você parece. É o suficiente para deixar um lagarto velho com inveja.
— Ah, mas acredito que sou mais velho que você. — Ele estendeu a jarra de vinho convidativamente; Lagarto Sacerdote assentiu e levantou o copo.
Matador de Goblins foi o próximo. Ele grunhiu “Hum” e simplesmente estendeu seu copo. Álcool o preencheu.
— Céus. Você não tem esposa, então? — Lagarto Sacerdote pareceu bastante surpreendido, mas Anão Xamã respondeu: — Na verdade não. Penso em passar mais ou menos cem anos aproveitando a vida de solteiro, bancando o bon vivant.
Lagarto Sacerdote riu, pondo a língua para fora e bebendo alegremente sua bebida. — Mestre Conjurador, quão jovem você parece. É o suficiente para deixar um lagarto velho com inveja.
— Ah, mas acredito que sou mais velho que você. — Ele estendeu a jarra de vinho convidativamente; Lagarto Sacerdote assentiu e levantou o copo.
Matador de Goblins foi o próximo. Ele grunhiu “Hum” e simplesmente estendeu seu copo. Álcool o preencheu.
— Se certifiquem de desfrutar de sua vida — disse o xamã, acrescentando: — Seja com goblins, deuses ou o que for. — Então ele se acomodou para apreciar o vinho.
Seu olhar se instalou sobre as duas jovens conversando.
— Rir, chorar, raiva, desfrutar; a garota orelhuda é boa nisso, não é?
— …
Matador de Goblins olhou para seu copo, sem dizer nada. Um capacete de aparência barata encarava de volta do vinho, tingido com a cor dos candeeiros. Ele ergueu o copo até o capacete e bebeu em um gole. Sua garganta e estômago pareciam estar queimando.
Ele soltou um suspiro. Assim como ele fazia quando estava em um longo caminho, olhando para trás, olhando para frente e continuando.
— Nunca é tão simples — disse ele.
— Não, suponho que não — respondeu o anão.
— Não é? — perguntou Lagarto Sacerdote. — Acho que tem razão.
Os três homens riram sem fazer barulho.
Foi só então que as garotas os notaram, olhando para eles com perplexidade.
— O que foi? — perguntou Alta-Elfa Arqueira.
— Há algum problema? — disse Sacerdotisa.
Anão Xamã pôs de lado suas questões, e depois de dar as coisas um momento para sossegar, Matador de Goblins disse:
— Agora. Sobre os goblins.
— Ah-ha! Então chegamos ao ponto, Corta-barba. — Anão Xamã retirou as gotículas de sua barba e se moveu no assento. — Acho que esse seguidor paladinesco é o líder deles.
— Sim — assentiu Matador de Goblins. — Nunca lutei com tal goblin também.
— A questão é: quão inteligente ele é?
— Ele foi capaz de imitar minha flecha, pelo menos. — Matador de Goblins pegou a ponta da flecha de sua bolsa, a rolando pela mão. Estava manchada com o sangue de Alta-Elfa Arqueira. Isso lhe dava uma sensação sombria. — E se conseguimos destruir trinta e seis deles em uma expedição, significa que nossos inimigos são muitos.
— Então, quer dizer um pouco de cérebro e um monte deles? Parece outro dia de trabalho com goblins — disse Anão Xamã.
As coisas no Festival da Colheita de alguma forma acabaram a favor deles, mas isso foi porque eles conheciam o terreno e fizeram preparativos. Ainda que não houvesse mais inimigos do que na fazenda, os aventureiros eram apenas cinco. Lutar em território hostil parecia bastante intratável.
Lagarto Sacerdote, que escutava em silêncio, fez um barulho com a garganta e depois disse seriamente: — E há mais um problema. — Ele golpeou o chão com a cauda, esticou os braços e tocou a garra na marca mais nova que Matador de Goblins fizera no mapa. — Especificamente, caso tenhamos sorte em entrar nas fortificações inimigas, o que faremos de lá?
— Ah, sobre isso — disse Matador de Goblins. — Se conseguirmos entrar…
Criiiic.
Tão logo ele falou, houve um som de madeira rangendo. Imediatamente, todos os aventureiros pegaram suas armas.
Eles seguraram a respiração. O dono da pousada se retirara muito antes.
Lentamente, os rangidos se tornaram passos calmos. Alguém descia as escadas, depois expirou.
— Goblins…?
A voz era tensa, quase como um suspiro. Ela veio de Esgrimista Nobre, que estava segurando o corrimão da escada, balançando instavelmente. Ela usava uma armadura esfarrapada sobre suas roupas de cama leves, e em sua mão, uma adaga prateada cintilava na luz.
Mítrio…? Não, a cor é clara demais. Um item mágico de algum tipo, talvez…?
Anão Xamã se viu entrecerrando os olhos com o brilho. Pensar que isso deveria ser algo que ele, um amigo do metal, nunca vira.
— ……Então… Também vou.
— Nem pensar! — Alta-Elfa Arqueira foi a primeira a responder. — Viemos para resgatar você devido a missão que seus pais publicaram. — Ela olhou para os olhos de Esgrimista Nobre com a franqueza élfica característica. Aqueles olhos eram profundos e escuros, como o fundo de um poço; ou assim pareciam para ela.
A menção de seus pais não pareceu mexer tanto com Esgrimista Nobre.
Houve um suspiro, bem levemente.
— Antes de colocar sua vida em perigo novamente, não acha que devia pelo menos ir para casa falar com eles? — disse Alta-Elfa Arqueira.
— ……Não. Não posso fazer isso. — Esgrimista Nobre balançou a cabeça, seu cabelo cor-de-mel sacudiu. — ……Tenho que recuperar.
Lagarto Sacerdote juntou as mãos de uma forma estranha, apoiando o queixo nelas. Com os olhos fechados, ele parecia meio que em uma oração, meio como se com uma dor duradoura. Calmamente, ele perguntou:
— E ao que se refere?
— Tudo — respondeu firmemente Esgrimista Nobre. — Tudo o que perdi.
Sonhos. Esperanças. Futuros. Castidade. Amigos. Camaradas. Equipamentos. Uma espada.
Tudo o que os goblins roubaram dela e levaram para o fundo de seu buraco sombrio.
— Não posso dizer que não compreendo — disse Lagarto Sacerdote após algum tempo, com sua respiração sibilante. Esgrimista Nobre falava de orgulho, de um modo de vida. Lagarto Sacerdote juntou as palmas em um gesto estranho. — Um naga tem o seu orgulho precisamente por ser um naga. Se não tiver orgulho, não é mais um naga.
— S-só um momento…! — disse Alta-Elfa Arqueira. Lagarto Sacerdote estava bem calmo e controlado; embora, pensando bem, ele parecia gostar de combate. As orelhas da elfa caíram com pena, mas agora elas se ergueram de novo. — Anão! Diga alguma coisa!
— Por que não a deixar fazer o que quer? — disse o xamã.
— Agh?!
Mais um som não-élfico — ela parecia ter um repertório cada vez maior — veio da garganta de Alta-Elfa Arqueira.
Anão Xamã não ligou, mas, agitando a última gota de sua garrafa de hidromel, disse: — Nossa missão era resgatá-la. Cabe a ela o que fazer depois disso.
— Et tu, anão?! E se ela morrer, hein?! E então?
— Você mesma pode morrer. Ou eu. Ou qualquer um de nós. — Ele esvaziou esse último copo e limpou a boca. — Todo ser vivo morre um dia. Vocês elfos deveriam saber disso melhor do que ninguém.
— Bem… bem, é, mas…
Suas orelhas voltaram a cair. Alta-Elfa Arqueira olhou ao redor com a expressão de uma criança perdida que não sabia o que fazer.
Sacerdotisa encontrou seus olhos, e isso quase impediu a garota de dizer o que diria a seguir. Ela olhou para o chão, mordeu os lábios e bebeu silenciosamente a última parte do vinho de seu copo. Se não tivesse, Sacerdotisa achava que não teria conseguido dizer. — Vamos… vamos levá-la junto.
Se ela não dissesse a eles, ninguém mais o faria.
— Se… se não…
Ela não pode ser salva.
Sem dúvida, não haverá salvação para ela.
Sacerdotisa mesma fora assim uma vez.
E — ela suspeitava — até ele.
— Eu… — começou ele (Matador de Goblins), escolhendo suas palavras com muito cuidado — …não sou seus pais, nem sou um amigo.
Esgrimista Nobre não disse nada.
— Você sabe o que deve ser feito quando se tem uma missão em mente.
— Sei.
— Ei!
Mas, quase antes que Alta-Elfa Arqueira conseguisse colocar as palavras para fora da boca, houve um som dilacerante desagradável.
O cabelo dourado saiu voando pelo ar.
— ………Sua recompensa. Estou pagando adiantado.
Ela pegou uma mecha de cabelo que acabara de cortar. Ela cortou outra mecha com sua adaga — mais um som dilacerante — e colocou na mesa. Os seus dois rabos de cavalo, uma vez amarrados com uma fita, agora foram cruelmente arrancados.
— ………Eu também vou.
Seu cabelo estava brutalmente curto agora, e seus lábios repuxados com determinação; a imagem de alguém empenhado na vingança.
Sacerdotisa ouviu um grunhido suave de dentro do capacete de Matador de Goblins.
— Matador de Goblins… senhor…?
— O que você consegue fazer?
Ele ignorou o olhar de Sacerdotisa, em vez disso, atirou essa pergunta a Esgrimista Nobre.
Sem hesitação, a garota respondeu: — Consigo usar espada. E uma magia, Raio.
O capacete se virou, olhando para Anão Xamã.
— Invocar raio — disse ele desinteressadamente. — Uma coisa muito poderosa, como um canhão.
— …Muito bem — disse suavemente Matador de Goblins. Depois perguntou: — Não se importa?
O capacete se virou para Alta-Elfa Arqueira, que estava olhando para ele de modo suplicante. Agora, ela evitou seus olhos; ela agarrou o copo com as duas mãos e olhou para chão. Por fim, ela esfregou os cantos dos olhos com seus braços e olhou para ele compassivamente. Ela disse apenas: — Se está bem com isso, Orcbolg…
— Ótimo. — Matador de Goblins enrolou o mapa e se levantou.
Era claro o que devia ser feito.
Era a mesma coisa que sempre tinha de ser feito.
Sempre e em todo lugar.
Não importa o quê.
Era o que ele fizera nos últimos dez anos.
— Então vamos exterminar goblins.