Hai to Gensou no Grimgar – Capítulo 04 – Vol 07 - Anime Center BR

Hai to Gensou no Grimgar – Capítulo 04 – Vol 07

Capítulo 4 – U naa. 

Tanto a magia de luz quanto a magia das trevas eram utilizáveis. No entanto, seus efeitos e duração haviam sido reduzidos para cerca de um terço do que eram normalmente, e não apenas o consumo de poder mágico tinha mais que dobrado, como também parecia ser incrivelmente exaustivo tanto para a mente quanto para o corpo utilizá-las.

Por causa disso, Protection era tão ineficiente que era praticamente inutilizável. Mesmo com feitiços de cura, sete conjurações de Cure, quatro de Heal ou até mesmo uma de Sacrament já esgotavam completamente o poder mágico de Mary.

Decidiram que Ranta deveria usar o Demon Call para invocar o Zodiac-kun o mais frequentemente possível. Ranta era um cavaleiro das trevas horrível, que não conseguia usar sua magia das trevas de maneira eficiente de qualquer forma. Além disso, o Zodiac-kun já era útil só por estar por perto.

Haruhiro e a party nomearam a vila onde ficava o poço de Vila do Poço, e o rio de águas mornas de Rio Morno. As direções cardeais não eram claras, mas seguindo a teoria de que o Rio Morno corria de norte a sul, eles decidiram que a montante seria o norte e a jusante seria o sul.

Durante o dia, o fogo subia, e o céu oriental, onde ficava o cume em chamas, ficava um pouco mais claro. Não parecia que poderiam atravessar o Rio Morno, então, por enquanto, teriam que explorar a oeste dele.

Havia uma floresta que se estendia a oeste da Vila do Poço. E ao sul? Parecia haver inimigos agressivos na margem do rio, então decidiram escalar o penhasco e tentar seguir ao sul a partir dali.

— Estamos… a que distância da Vila do Poço? — Kuzaku se virou para olhar.

— Uns um quilômetro? — Yume soltou um som estranho, mnngh, enquanto pensava. — Talvez por aí?

— Tsc. — Ranta estalou a língua e bateu os pés algumas vezes. — Droga, é difícil andar assim. Isso aqui é tão escorregadio! Qual é o problema com esse troço?! Parece que tá me provocando!

— Ehehe… Ranta… Sua própria existência já é uma forma de provocação… Ehe… Eehehehe… — Zodiac-kun provocou.

— Ei, Zodiac-kun, o que foi que você quis dizer com isso, hein?!

— M-Mas, isso aqui é meio cansativo… — Shihoru estava usando seu cajado para se apoiar enquanto caminhava.

— Você tá bem? — Mary perguntou. — Shihoru, se precisar, pode se apoiar em mim.

— Obrigada, Mary… Mas aí, se eu tropeçar, vou te derrubar também…

— Se acontecer, aconteceu. — Mary parecia estar sorrindo, só um pouco.

Haruhiro também sorriu levemente.

Não, um líder inútil que acabou de estragar tudo não tem o direito de sorrir. Mas, ainda assim, parece que Mary, Shihoru e Yume estão se dando muito bem agora. Não poderia estar mais feliz por elas.

No começo, Mary era meio difícil, mas ouvi dizer que antes ela era uma pessoa alegre, com uma personalidade agradável. Abençoada com uma boa aparência, leva o trabalho como sacerdotisa a sério, tem uma boa personalidade… Que tipo de supermulher perfeita ela é! Como companheira e como amiga, eu não poderia pedir mais. Ela é praticamente ideal. Como líder, estou feliz. Embora, com uma namorada assim, tenho certeza que Kuzaku deve estar ainda mais feliz…

— A área ao sul da Vila do Poço é um pântano, hein. — Haruhiro conteve um suspiro que quase escapou, apertando os olhos. — Parece que isso continua por um bom tempo…

— É difícil de andar, com certeza, mas nem tudo é ruim, sabia? — Yume disse. — O chão aqui faz uns barulhinhos. Faz squick, squick. Então, se alguma coisa estiver vindo, você vai saber na hora, né? — disse Yume.

— Droga, Yume — reclamou Ranta. — Mesmo com esses peitinhos aí, você vai e fala uma coisa bem útil!

— Para de falar que eles são pequenos o tempo todo! — gritou Yume.

Tem uma verdade no que Yume disse, pensou Haruhiro. É fácil ficar alerta aqui. Por enquanto, quero expandir nossa área, então vamos tentar ir um pouco mais longe.

Com isso decidido, eles caminharam mais uns trezentos metros, mas, nesse ponto, o chão não estava apenas lamacento, havia poças e parecia que seus pés iam ficar presos. A água tinha, no máximo, uns cinco centímetros de profundidade, mas havia partes mais moles e outras mais duras no fundo, o que tornava tudo pior. Na verdade…

— Ei, não tem alguma coisa enterrada aqui? — Haruhiro perguntou.

— Tesouro! — Ranta imediatamente se agachou e enfiou as mãos na lama. — …Oh? Tem algo aqui. Isso é…

— Devemos iluminar isso? — Yume perguntou, e Haruhiro assentiu.

Yume pegou uma lanterna e acendeu.

— Aqui. — Ranta trouxe o que tinha puxado para perto da lanterna de Yume. Era um objeto branco, em forma de bastão.

Haruhiro percebeu imediatamente. Era bem óbvio o que era.

— Um osso…?

— Tem um monte deles — disse Ranta. — Será que o lugar todo está cheio de corpos?

Zodiac-kun deu uma risadinha.

— Uhe… Ranta… Você também vai virar osso aqui… Uhehe… Uhehehehe…

— Não fala essas coisas sinistras! Droga, Zodiac-kun!

— Vamos ver. — Haruhiro tomou sua decisão e assentiu. — Bem, eu não estou tão empolgado, mas pode não ser só ossos… podemos encontrar os pertences deles também. Pode haver moedas pretas. Precisamos delas desesperadamente agora.

Não houve objeções. Ao contrário da água do Rio Morno, a água nas poças ali era gelada. Quando se agachavam nela, podia ficar bem frio. Não era um trabalho fácil, mas comparado à fome e à desidratação, não era nada.

Eventualmente…

— Ah…! — Shihoru engoliu seco ao levantar algo. — Moedas!

— Oh, ho! — Ranta deu um tapa nas costas de Shihoru. — Muito bem, Shihoru!

— …Não aproveite a situação para me tocar.

— Qual é?! Tá me atacando agora?! Sério mesmo?! Não é hora pra isso, não tá feliz?!

— Kehehe… Ranta… Sua existência estraga tudo… Kehehehehe…

— Se a minha própria existência é o problema, não tem como consertar isso, sabia?! Só avisando! — gritou Ranta.

As descobertas continuaram depois disso. Não encontraram apenas moedas pretas. Acharam duas espadas curtas, sem ferrugem, uma espada longa, um objeto metálico em forma de máscara, além de quatro moedas pretas.

— Hmm… — Ranta examinou a espada longa antes de entregá-la a Kuzaku. — Segura essa, Kuzacky. Parece boa, e provavelmente podemos usá-la depois de afiá-la, mas é muito simples pra mim. Um pouco longa demais, também. Além disso, o efeito de dormência da minha Lightning Sword Dolphin ainda não acabou.

— …Obrigado.

— As duas espadas curtas vão para o Haruhiro — continuou Ranta.

— Kehe… Ranta tá se achando importante… Morre, seu fanfarrão… Kehehe…

— Ei, Zodiac-kun?! Será que você pode parar de me zoar o tempo todo, como se fosse normal?!

— Hmm — disse Haruhiro, examinando as espadas curtas. — Não, acho que uma já é o suficiente para mim. Que tal você ficar com a outra, Yume? A maior é mais ou menos do tamanho do seu facão.

— Miau. Agora que mencionou, é mesmo, né? Bom, então Yume vai pegar.

— E a máscara? — Mary tentou colocá-la. — Oh. Ficou perfeita.

Era feita para parecer alguma criatura. Não humana. Não parecia com nenhuma criatura que Haruhiro conhecesse, mas se tivesse que nomear uma… talvez um macaco? Parecia meio boba, com um formato engraçado.

— C-Combinou com você… de verdade — Shihoru disse, tentando manter a voz firme.

— Buahahah! — Ranta explodiu em risadas e apontou para Mary. — Combinou sim! É perfeita! Uma obra-prima! Essa vai pra Mary! Decidido!

— E-Eu não quero! — Mary tirou a máscara, tentando passar para outra pessoa, mas todos recusaram cruelmente. — Eu realmente não quero, tá?! Eu só tava experimentando!

Por algum motivo, Haruhiro olhou para Kuzaku. Não, o motivo era óbvio. Algo como: Kuzaku, você não vai ajudar ela? Como eu poderia não pensar nisso? Quando algo assim acontece, é sério. Afinal, os dois eram, bem… você entende?

Kuzaku foi o primeiro a desviar o olhar, abaixando a cabeça. Parecia desconfortável.

Por quê? Ahh. Entendi. Eles ainda não contaram aos outros companheiros sobre o relacionamento deles. Porque estão escondendo? É por isso que, mesmo em momentos assim, fica difícil para ele tomar uma atitude clara para defendê-la.

Tudo bem. Não há necessidade de esconder. Por que não simplesmente abrir o jogo de uma vez? Isso está começando a ficar incômodo. Se vocês fizessem isso, eu também ficaria mais tranquilo.

Mas, pensando bem, agora não é exatamente o melhor momento para anunciar isso. Se de repente dissessem “Ei, pessoal, adivinhem”, ninguém saberia como reagir.

Mesmo enquanto Haruhiro pensava nisso, Yume ofereceu-se para pegar a máscara de Mary.

— Nesse caso, talvez Yume pegue? Seria mais fácil ter uma máscara quando voltarmos pra Vila do Poço. Essa aqui não é fofa, mas talvez, quando Yume se acostumar com ela, comece a achar bonitinha.

— Hum… sobre essas moedas pretas… — Shihoru pegou uma das quatro moedas pretas que estavam na palma de sua mão e mostrou para a party. — Há uma leve diferença nos tamanhos delas. Esta aqui é grande, mas as outras três são bem menores. E as coisas escritas nelas? Parece que as letras são um pouco diferentes…

— Whoo. — Yume levantou a lanterna mais perto. — Você tá certa. Essa é bem maior, né.

Haruhiro comparou a que Shihoru estava segurando com as três que estavam em sua palma.

— Você acha que o valor delas é diferente? Como é com prata e cobre? Mas o material é o mesmo aqui. Como eram as primeiras duas que encontramos? Hmm, não lembro…

— Você deveria ao menos lembrar disso. — Ranta bufou. — Bem, como se eu lembrasse também!

— Kehehe… Porque sua cabeça é vazia… Kehe… Kehehe… Em breve será abraçado por Skullhell… — Zodiac-kun de repente baixou a voz. — Não vai demorar muito…

— Ei, Haruhiro. — Ranta fez um gesto com o queixo.

— …É. — Haruhiro flexionou o joelho, abaixando o centro de gravidade. — Eu sei.

Seriam todos os demônios dos cavaleiros das trevas assim? Haruhiro, sendo um ladrão, não sabia muito bem, mas Zodiac-kun era realmente imprevisível. Então, eles não podiam contar muito com ele. Só era útil porque, quando o perigo estava se aproximando, ele dava um aviso sutil—às vezes.

Haruhiro não precisava dar ordens; seus companheiros já estavam em alerta. Ele hesitou por um momento. Deveria mandar Yume apagar a lanterna? Não, se ela apagasse agora, eles mal conseguiriam ver qualquer coisa até os olhos se ajustarem à escuridão. Isso seria ruim.

Ele ouviu atentamente. O barulho. Um som de respingos. Vindo do oeste. Estava ficando mais alto. Algo estava caminhando pela água.

Estava se aproximando.

Haruhiro olhou para Kuzaku e apontou para o oeste. Kuzaku assentiu, então abaixou a viseira do elmo, virando-se para o oeste.

Aconteceu logo em seguida.

A coisa começou a correr. Yume virou a lanterna na direção dela.

Eles viram. Uma fera negra. Enorme. Olhos amarelos brilhantes—quatro deles.

Era um cachorro? Um lobo? Não, não era nada disso. Era grande o suficiente para ser um tigre ou um leão. Talvez até maior.

Ela avançou na direção deles. Kuzaku tentou bloquear a investida com o escudo, mas foi inútil. Ele foi arremessado.

— Gwah…!

— Isso não é ruim?! — Ranta desferiu um golpe com sua Lightning Sword Dolphin. A fera não se esquivou. Incrivelmente, ela rebateu com a testa.

Por um instante, parecia que tinha sido atordoada, mas mais ou menos ignorou o efeito.

Ranta saltou para trás.

— Droga, é dura! Quão cabeçuda é essa coisa?!

— Ohm, rel, ect, del, brem, darsh. — Shihoru se envolveu em uma Armor Shadow (Armadura das Sombras). Ela anularia todos os ataques, ou, se falhasse nisso, ao menos amorteceria um pouco. Era o tipo de decisão fria que eles já esperavam de Shihoru.

— Kuzaku?! — gritou Mary, mas logo veio um “Tô bem!” seguido do som de alguém se levantando em uma poça d’água. Parecia que Kuzaku estava okay.

A fera movia a cabeça lentamente, observando cada um dos membros da party. Seus ombros estavam entre um e dois metros do chão. Seu tronco devia ter uns três metros de comprimento. Era ridiculamente enorme e mais que um pouco intimidadora, mas não era dez vezes maior que eles, ou algo assim. Dito isso, se ela mordesse um deles, parecia que poderia arrancar um braço, uma perna, ou até mesmo um pescoço sem esforço. Kuzaku teve sorte de estar bem depois de ser atropelado por aquela coisa.

Yume estava abaixada, respirando pesadamente. Ela segurava o facão na mão esquerda, mas não tinha o arco pronto. Seu arco e flechas não fariam nada de útil contra um inimigo como aquele. Já estavam em combate corpo a corpo, de qualquer forma. Honestamente, estavam muito próximos da criatura. Se tentassem fugir, a fera os atacaria imediatamente, sem dúvida. E seria o fim. Ela os mataria em um instante.

A fera ainda não havia soltado nenhum tipo de grito. Toda vez que Haruhiro ouvia o som da cauda dela batendo levemente na água, seu coração pulava. Se ela soltasse um rugido ou uivo, provavelmente morreria de susto.

Assustador…

Além disso, o que é isso aqui, afinal? Era o território da fera, e ela estava tentando expulsá-los por terem invadido? Mas, nesse caso, não teria tentado intimidá-los primeiro? Então, seriam presas dela? A fera estava tentando caçá-los? Para satisfazer sua fome? Era isso…?

Ele queria fugir.

Mas o terreno aqui é ruim, está escuro, a fera parece rápida, e seria muito difícil fugir sem sofrer baixas. Temos que lutar… não é?

Se ela estivesse tentando comê-los, talvez só precisassem machucá-la um pouco. Se fizessem a fera pensar: Esses caras são fortes, ela recuaria.

É a sensação que eu tenho. Quero acreditar que é verdade.

— Vamos nessa! — Haruhiro se preparou, declarando isso com a maior força que conseguiu. — Não fiquem juntos! Cerquem ela, mas tentem não ficar bem na frente dela!

Quando Haruhiro e a party começaram a se mover, a fera fez o mesmo. Tinha um corpo grande, mas era incrivelmente ágil.

A fera avançou contra Ranta.

— Whoa!

Parecia que Ranta não havia baixado a guarda. Ele tentou se esquivar dela, iludindo a fera com seus passos bizarros? Provavelmente era a habilidade de combate do cavaleiro das trevas, Missing.

Em um terreno mais firme, ele poderia ter conseguido. Infelizmente, não deu certo. Embora Ranta tenha saído do caminho da fera, tropeçou e caiu em uma poça de água.

— Gwah?!

— Continue tentando, Ranta… Kehe… Fwehehe…

— Ranta-kun! — Kuzaku tentou atacar a fera com Punishment. O Punishment do paladino era semelhante ao Rage Blow de um guerreiro, mas ele reforçava sua defesa com o escudo enquanto desferia o golpe com a espada. Essa diferença salvou Kuzaku. A fera se esquivou incrivelmente rápido, e então desferiu um golpe com a pata dianteira.

Um soco de uma fera. Era um gancho. Kuzaku bloqueou com o escudo de alguma forma, mas não conseguiu absorver o impacto e foi derrubado.

— Jess, yeen, sark, kart, fram, dart! — Shihoru lançou Thunderstorm contra a fera. Vários raios finos atingiram a fera. Ela soltou um gemido, seu corpo inteiro estava tremendo, mas não caiu. Balançou a cabeça, virando-se em direção a Shihoru.

Chu! — Yume soltou um grito estranho enquanto avançava diretamente contra a criatura.

Mary também tentava atacar a besta com seu cajado curto.

A fera rugiu, girando sobre si mesma e conseguindo derrubar tanto Yume quanto Mary. As duas caíram na água.

— Droga, não me subestime! Ó Escuridão, Ó Senhor dos Vícios! — Ranta estava de joelhos com a ponta da espada voltada para a besta. — Blood Venom (Veneno de sangue)!

Nunca saía algo de bom quando Ranta usava magia das trevas. Mesmo quando algo com uma aura bizarra e aterrorizante disparava do corpo de Ranta e realmente envolvia a criatura como deveria, Haruhiro ainda sentia um péssimo pressentimento sobre o que quer que estivesse acontecendo. Para começar, a eficácia da magia das trevas estava reduzida. Por que alguém iria usar isso de propósito?

No entanto, por um momento, a fera cambaleou. Recuperou-se rapidamente, mas algo estava claramente errado com ela.

Blood Venom. Era um feitiço que usava o miasma de Skullhell para enfraquecer o corpo do alvo, ou pelo menos era isso que Haruhiro lembrava. Certamente, a fera parecia estar se sentindo mal de repente, ou algo assim.

Graças a isso, ele teve uma abertura. Podia deixar para elogiar Ranta depois. Ou melhor, se conseguisse escapar sem precisar elogiá-lo, seria ainda melhor. Conhecendo Ranta, ele certamente ficaria convencido e se gabaria por isso.

Se ele dissesse que não estava com medo, seria mentira. Mas Haruhiro tinha confiança de que conseguiria. Por mais feroz que fosse, o inimigo deles era uma besta de quatro patas.

Ele saltou para cima da fera por trás, agarrando-se nas costas dela. Então, enfiou sua adaga no pescoço dela. Ele a enfiou com toda sua força. Cravou com tudo o que tinha.

Naturalmente, a fera começou a se debater. Torcia-se, sacudindo violentamente as patas dianteiras e traseiras, tentando jogá-lo para longe. Mas, por causa da sua estrutura corporal, nem as patas dianteiras nem as traseiras conseguiam alcançar suas costas. Ou foi o que Haruhiro pensou, até que uma das garras traseiras da fera afundou profundamente na coxa direita dele, rasgando-a.

— Wahhh?!

Doía tanto que Haruhiro facilmente se deixou ser lançado para longe. Pior ainda, ele largou a adaga, que ainda estava cravada no pescoço da fera. Para completar, ele caiu de cara em uma poça d’água, o que o deixou sem conseguir enxergar nada. Ele também não conseguia respirar direito.

Que inferno, será que vou morrer…?

— Jess, yeen, sark, fram, dart!

Se Shihoru não tivesse lançado seu feitiço Lightning, Haruhiro poderia ter sido a primeira vítima da fera.

— Nngahh! — Aquele certamente tinha machucado a fera. Pelo som do grito dela, e pelo fato de seu corpo enorme ter tombado de lado, levantando uma grande quantidade de água barrenta. Haruhiro não viu isso, mas pôde ouvir claramente.

A adaga. Por causa da adaga, né?

A adaga de Haruhiro ainda estava cravada no pescoço da criatura. Foi nisso que Shihoru mirou com seu Lightning.

— Ehe… Agora… Ehehehe… — Zodiac-kun os incentivou.

— Não precisa nos dizer! — gritou Ranta.

— É! — gritou Kuzaku.

Sentindo que aquele era o momento para atacar, Ranta e Kuzaku investiram contra a fera. Enquanto Haruhiro limpava o rosto e se levantava, ele pensou, A gente consegue.

Mas a fera estava fugindo. Disparou rapidamente.

Isso foi bem rápido.

Bem, o mundo era cruel para todos. Se tivesse ficado mais tempo, seria tarde demais. Ela precisava tomar decisões instantâneas ou não sobreviveria. A fera desapareceu completamente em pouco tempo.

— Alguém está ferido? — Haruhiro perguntou, levantando a mão. — Além de mim.

— Eu, só minhas costas que estão doendo um pouco, e só isso — disse Kuzaku.

— Yume tá ótima.

— Eu também estou bem — disse Shihoru. — Graças a todos vocês…

— Eu sou totalmente invencível, afinal! — Ranta se gabou.

— Não se preocupe… Kehe… Vai ser amanhã… Você vai morrer… Kehehe…

— Ei, Zodiac-kun! Isso me irrita, então dá pra parar de falar como se fosse uma profecia?!

— Haru, deixa eu ver. — Mary correu até ele e se agachou ao seu lado, colocando a perna esquerda de Haruhiro sobre o joelho dela. — Isso está bem feio. Não seja tão imprudente.

— …Hum, eu não queria ser imprudente. Nem pensei que ia me machucar. Só fui otimista demais, posso dizer. Desculpa por isso.

— Você estava tentando compensar pelo que aconteceu antes? — Mary perguntou em um sussurro.

Isso era… honestamente, talvez fizesse parte. Quando foram emboscados no leito do rio, Haruhiro foi o único a se machucar e precisou que Mary o curasse. Aquilo tinha sido um erro. Desta vez, ele queria fazer algo impressionante e mostrar seu lado bom.

Ele poderia dizer com certeza que não estava tentando fazer isso? Provavelmente ele tinha esse tipo de motivação em algum canto da mente.

Ainda assim, ele era o líder. Era um ladrão simples, no fim das contas. Não era do tipo que levava o time com sua habilidade, nem do tipo que exibia muita liderança, mas… de vez em quando, sabe? Se ele não os fizesse pensar: Ei, ele é melhor nisso do que a gente imaginava de vez em quando, seria difícil continuar.

Se Ranta começasse a menosprezá-lo, causaria todo tipo de problema, afinal. E, além disso, o irritaria.

Não se limitava a Ranta, no entanto; valia para todos eles. Ele preferia ser respeitado do que menosprezado.

Haruhiro desviou o olhar, respondendo com um — Talvez um pouco — em voz baixa.

— Eu respeito você, Haru, e sou grata a você — Mary disse em uma voz ainda mais baixa que a dele. — Todos nós somos. Saiba disso.

— Eu sei disso… acho.

— Bom, então está tudo bem. Deixe-me curá-lo.

— Certo… — Haruhiro fechou os olhos.

Não quero ver a Mary tão de perto assim, ele pensou. Não quero que ela seja tão gentil comigo. Eu gosto disso, claro. Mas é doloroso, dá pra dizer. Não, eu sou realmente grato por isso, de verdade.

Haruhiro tinha se ferido, Mary o curou, e ele perdeu sua adaga favorita. A espada curta que encontraram enquanto remexiam na lama no fundo da poça d’água não seria utilizável do jeito que estava. Não era como se ele não pudesse afiá-la sozinho, mas ele não tinha uma pedra de amolar. Se possível, ele queria que um ferreiro de verdade fizesse o trabalho.

Decidiu chamar aquela área com as poças d’água, onde muitos restos mortais estavam adormecidos, de Pântano dos Cadáveres.

Parecia que ainda podiam encontrar mais moedas e itens no Pântano dos Cadáveres, mas havia animais perigosos como aquela fera de quatro olhos vivendo por ali. Eles teriam que ser muito cuidadosos enquanto realizavam o trabalho. Se baixassem a guarda, seriam devorados. Tinham que pensar dessa forma.

De qualquer forma, como tinham conseguido uma grande moeda preta e três pequenas, decidiram voltar para a Vila do Poço. Além de o Pântano dos Cadáveres já ser frio, todos estavam encharcados, então sentiam frio até os ossos. Queriam se aquecer ao redor de uma fogueira ou algo assim. Também queriam comer e beber água.

Haruhiro e a party esconderam seus rostos e cruzaram a ponte. Uma vez dentro da Vila do Poço, sentiram um grande alívio. Mesmo com esse alívio, a atmosfera sombria da vila e a estranheza de seus moradores, cujo idioma eles não entendiam, ameaçava oprimi-los.

Havia muitos obstáculos. Eles conseguiriam garantir as necessidades básicas daqui pra frente? Poderiam viver ali? Conseguiriam ter um padrão de vida razoável? Não era como se quisessem viver naquele mundo. Queriam voltar para casa. Para Grimgar. Havia um caminho de volta? Se não houvesse…

E se nunca pudermos voltar para casa? E então? O que deveríamos fazer?

— Ei… — Ranta apontou para o ferreiro. — Olha. Tem… alguém ali, né?

O ferreiro, com seu torso enorme e olhos que pareciam sangue, estava martelando com força.

Havia alguém na frente dele.

— Alguém, sim, mas… — Kuzaku balançou a cabeça. — Bem, sim, é alguém.

Seria um cliente, talvez? Podia ser um dos moradores da Vila do Poço, mas Haruhiro não o reconhecia. Se tivesse visto essa pessoa uma vez, lembraria.

Era alto. Facilmente duas vezes a altura de Haruhiro. Parecia, bem, parecia um espantalho. Se assemelhava a um espantalho. Se não tivesse se movido com passos vacilantes, ocasionalmente se agachando, inspecionando as mercadorias do ferreiro—em outras palavras, se tivesse ficado completamente imóvel—ele poderia ter pensado: Oh, o que um espantalho está fazendo ali?

Naturalmente, espantalhos não se movem, então não era um espantalho de verdade. Além disso, tinha aqueles braços longos e finos. Havia mãos no fim dos braços, com o que parecia ser dez ou mais dedos como fios de arame. Usava algo como uma capa de chuva sobre a cabeça. Havia algo que parecia uma máscara no rosto também.

— Cê acha que é um cliente? — Yume perguntou baixinho.

— Um cliente… — Shihoru repetiu, estremecendo. — Está arrastando algo atrás de si?

— Um cadáver…? — Mary cobriu a boca com as mãos.

Haruhiro soltou um suspiro profundo. Vamos nos acalmar. Certo. Acalme-se. Mantenha a cabeça fria. Está tudo bem.

A Vila do Poço era uma zona segura, ou pelo menos era suposto ser, certo? Ele pensava que sim. Mesmo que encontrassem uma criatura de aparência perigosa ali, se apenas agissem como, Ah, olá, ou simplesmente a ignorassem, nada aconteceria… provavelmente? Ou Haruhiro estava apenas presumindo que isso era verdade? Ele estava totalmente errado? Que motivos ele tinha para pensar assim? Parecia que não havia nenhum…

O cadáver. Como Mary havia dito, provavelmente era um cadáver. Espantalho-san (um nome temporário) estava arrastando o que só podia ser o cadáver de uma criatura humanoide atrás de si. Além disso, olhando mais de perto, não era também o cadáver de uma besta jogado sobre o ombro direito?

Espantalho-san pegou abruptamente uma espada enorme e se virou para o ferreiro, dizendo: — U naa?

Não, ele realmente disse “u naa”? Era uma voz rouca, difícil de ouvir claramente, então Haruhiro não tinha certeza, mas foi o que pareceu.

O ferreiro parou de martelar, levantou três dedos da mão esquerda e depois mais cinco.

— Son zaa.

Sim. O ferreiro não tinha cinco dedos em cada mão; ele tinha oito.

— Ouun daa — Espantalho-san balançou a cabeça.

— Bowna dee — o ferreiro respondeu.

— Giha — Espantalho-san colocou a espada enorme de volta onde a tinha pegado.

— Zeh naa.

O ferreiro parecia insatisfeito, acenando com a mão esquerda, e então voltou a martelar. Espantalho-san tinha tentado comprar aquela espada, mas não tinham chegado a um acordo sobre o preço ou algo assim. Espantalho-san saiu do ferreiro e agora estava indo em direção à mercearia.

— U naa? — Yume disse, inclinando a cabeça de lado, pensativa. Ela estava usando a máscara semelhante à de um macaco. — Será que isso quer dizer “Quanto custa” ou algo assim?

— Ei, não diz o que eu ia dizer, ainda mais quando você tem esses peitos tão pequenos! — Ranta gritou.

— Não chama eles de pequenos, Ranta estúpido!

— Se isso significa isso mesmo… — Shihoru assentiu levemente — …pode facilitar as compras…

— U naa. — Mary repetiu algumas vezes para si mesma. — Vale a pena tentar, eu acho.

— Isso parece uma boa ideia — disse Kuzaku.

Haruhiro concordou em silêncio. Era uma boa ideia. O “U naa” da Mary era meio fofo. Sim. Mas, quero dizer, e daí? Ou melhor, quero parar de ficar estranhamente consciente de tudo que a Mary faz. Não posso deixar isso continuar. Não é bom ficar pensando assim.

Parece que Espantalho-san havia comprado um prato de ensopado de insetos. Ele levou a boca à tigela, engolindo tudo de uma vez. Mastigou os insetos com gosto, até terminar tudo.

— Será que isso começou quando perdemos aquela pessoa? — Haruhiro disse em voz alta. — Foi aí que eu comecei a ter medo de tentar várias coisas?

Notas: Jusante e montante são direções por onde correm as águas de uma corrente fluvial. A jusante significa em direção à foz, ou seja, o fluxo normal da água. Enquanto isso, a montante significa em direção à nascente, ou seja, contra-corrente.

Assim, a foz de um rio é o ponto mais a jusante dele, enquanto a nascente é o seu ponto mais a montante.

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