Capítulo 4

Recompensa (Parte 2)

Ser incapaz de fazer algo… Isso é a única coisa que eu não quero.

Sério… Mesmo que eu tenha que depender dos outros, de algum jeito… eu quero sobreviver. Quero ver todo mundo. Não quero ficar sozinha. Não quero encarar o fim… completamente sozinha.

Fico imaginando como… Manato-kun e Moguzo-kun se sentiram. Nós pudemos estar com eles… então talvez essa tenha sido a única coisa boa nisso.

A chuva… Ah, a chuva… Não parece fria, nem nada.

Eu não quero… partir assim.

Assim… completamente sozinha.

Eu não quero… morrer.

Queria… que alguém estivesse ao meu lado.

Será que Yume está bem? Se ela estiver… fico feliz. Não quero que Yume morra… assim.

Deixe que seja só comigo. Que eu seja a única… a enfrentar um fim assim.

Eu odeio isso.

É tão solitário.

Mas… o tempo que passei com todos… não foi em vão.

É isso… que eu quero acreditar.

Porque eu deveria ser capaz… de levar as vozes de todos… de levar essas memórias comigo…

Eu…

Eu fiz o meu melhor, né…?

Manato-kun.

Eu… Eu não perdi.

Será que Moguzo-kun… virá me buscar, talvez…?

Se ele vier… vou saber… que não estou sozinha…

— Hm, isso parece bem grave — disse uma voz.

Eu não consigo ver. Tudo está tão escuro. Apenas o som da chuva. E essa voz. Só isso.

— Você foi bem.

Sim, eu fui bem. Alguém reconheceu isso.

— Ó Luz, que a proteção divina de Lumiaris esteja sobre você. Sacrament.

Não pode ser! Eu…

A luz brilhou. De todos os lados, ela se derramava sobre ela. A luz se espalhava, preenchendo-a. Ela se tornou a própria luz.

Calorosa.

A luz a puxou de volta.

Levantando-a, mais e mais alto.

— Ah…!

Os olhos de Shihoru se abriram.

Uma pessoa com cabelo raspado, com uma expressão serena, como se tivesse alcançado algum tipo de iluminação, olhava para ela de cima.

— Que bom que conseguiu. Foi por pouco.

— Tsuga-san…

— Onde estão os outros? Não vejo ninguém por aqui. Vocês se separaram?

— Huh? …Ah, sim. No caminho…

— Entendo — disse Tsuga. — Bem, nossa party está mais ou menos na mesma situação. Nada novo aí.

Tsuga não disse algo como: Vai ficar tudo bem. Mesmo assim, ela se sentiu melhor. Shihoru havia pensado por conta própria e tomado a melhor decisão que podia. Ela arriscou tudo em uma pequena esperança, e pode-se dizer que ela ganhou essa aposta.

No fim, ela não tinha saído daquela situação apenas com sua própria força, então não sentia orgulho disso. Mesmo assim, não precisava sentir vergonha. Não importava como acontecesse, ela havia sobrevivido. Enquanto estivesse viva, poderia encontrar uma solução. Enquanto estivesse viva, existia a possibilidade.

— E-erm… — disse ela. — Muito obrigada.

— Não foi nada. — Os olhos de Tsuga se voltaram para o peito de Shihoru. — Posso curar suas feridas, mas não posso remendar suas roupas.

— Minhas roupas… — Shihoru ergueu a cabeça e olhou para si mesma. — Ah!

Rapidamente se levantando, ela pressionou o braço direito contra o peito. Puxando a barra de sua roupa rasgada, tentou cobrir a parte de baixo o melhor que pôde.

Aquilo era ruim. As roupas, rasgadas pelos lobos negros, estavam em um estado lastimável.

Quando olhou para Tsuga, ele havia virado para o lado, com uma expressão tranquila, como se estivesse apreciando a paisagem.

— D-Desculpe ter visto isso… — gaguejou Shihoru.

— Foi uma visão interessante, devo dizer.

— Hã…?

— Só vi um pouco, então não se preocupe com isso.

— …Isso me preocupa.

— É, faz sentido. Ah, certo. — Tsuga colocou a mochila no chão e tirou algo de dentro. — Aqui, é uma capa contra o frio. Se não se importar em usar a minha…

— …Vou aceitá-la.

— Agora é sua. Se não precisar mais, é só jogar fora.

— Desculpe — disse Shihoru. — Por todo o incômodo.

A capa cinza que Tsuga lhe entregou parecia ser de lã e tinha forro de pele. Era grande demais para ela e um pouco pesada, mas cobria seu corpo completamente. Ficar feliz ao ver que podia fechá-la na frente era um alívio.

Ela não conseguiu encontrar seu chapéu, mas seu cajado estava jogado no chão ali perto. Agora que Dark era sua única magia, Shihoru não precisava necessariamente de um cajado. Mas se sentia desconfortável andando sem nada nas mãos. Era melhor ter um cajado do que não ter.

— Onde estão os outros…? — arriscou perguntar.

— Quem sabe. Ouvi a voz do Sakanami, pelo menos.

— Sakanami-san foi quem me salvou.

— É mesmo? Não sei dos outros, mas tenho certeza de que o Moyugi vai resolver tudo. Mesmo quando a situação parece péssima, aquele cara tende a colocar tudo nos eixos no final.

— …Você realmente confia nele.

— Não confio, okay? — disse Tsuga com simplicidade. — Só que tem sido assim até agora, só isso.

Isso não significava que confiava nele? Shihoru não pôde evitar pensar nisso, mas apenas acenou de forma vaga, sem querer se aprofundar mais.

Cada um era diferente. Era natural haver distâncias ou diferenças entre as pessoas, e forçar para preenchê-las ou igualar a todos não era necessário. Tsuga era seu veterano, do mesmo clã, e a havia salvado. Parecia que ele também tinha dado uma “olhada” nela, mas eles não eram amigos.

— …O que pretende fazer agora, Tsuga-san? — ela perguntou.

— Acho que vou correr por aí até que o Moyugi venha me buscar. E você?

— Eu… preciso encontrar meus companheiros.

— Kuzaku, o cara alto, e Yume, a caçadora?

— …Eles, e o Haruhiro-kun e a Mary também. Temos um ponto de encontro combinado. Acho que todos estão indo para lá.

— Aquela caverna, certo?

— Certo.

— Será que conseguem chegar lá? Parece difícil. Aliás, você mesma consegue chegar?

— …Eu preciso ir.

— Apelando para a força de vontade, hein. — Tsuga jogou a mochila no ombro. — Acho que isso não vai te ajudar muito. Não sou muito fã disso, sabe.

— Poder… — Shihoru mordeu o lábio, olhando para baixo. — Eu não tenho poder. Eu sei disso. Mesmo que eu não seja boa o suficiente… eu preciso fazer isso. Há momentos em que simplesmente é necessário. Para mim… para mim… esse momento é agora.

— Você não está pensando nisso de forma errada?

— …Estou?

— Você está sendo ingênua.

Shihoru ergueu o rosto.

Era justo dizer que Tsuga tinha uma expressão impassível, mas seus olhos e boca pareciam transbordar compaixão. Por outro lado, ele também parecia indiferente, ou talvez tramando algo, ou simplesmente sem pensar em nada. Basicamente, ela não o entendia.

— Você vai fazer isso mesmo sabendo que não tem poder? Isso não é praticamente uma receita garantida para o fracasso? Acho que é sem sentido. Você só quer poder dizer “dei o meu melhor” para se sentir bem consigo mesma?

— Isso… não é verdade — protestou Shihoru.

— Então você realmente está só apelando para a força de vontade.

— Pense… ou diga o que quiser. Não me importo. Eu vou superar isso.

— Você é teimosa, hein.

— …Talvez.

— Acho que você está se colocando em desvantagem, sendo assim.

— Com licença, Tsuga-san, mas… não consigo imaginar que você ou qualquer pessoa da sua party aja com base no que é mais vantajoso para si.

— Agh. — Tsuga bateu na própria testa. — Você me pegou. É, está absolutamente certa.

— Hum… — Shihoru inclinou a cabeça profundamente. — Obrigada novamente por curar meus ferimentos. Eu não vou esquecer essa dívida de gratidão… Eventualmente, eu vou retribuir… se eu puder, é claro.

— Ei, escuta.

— …Sim? — Shihoru olhou para ele.

— Você não está esperando que eu te ajude sem que precise dizer uma palavra, ou algo assim, está?

— Não… Não estou, de verdade. Huh…? Por que pergunta isso…?

— Só imaginei. Não gosto desse tipo de coisa. — Tsuga suspirou enquanto olhava ao redor. Parecia um pouco irritado, de algum jeito. — Ah, tanto faz. Tá bom. Vamos.

— …Vamos? Para onde?

— Procurar seus companheiros. Não tenho muito o que fazer até o Moyugi vir me buscar, então vou ajudar.

Shihoru piscou repetidamente.

Tsuga estava olhando para o lado e coçando a cabeça raspada. Ele tinha um corpo relativamente sólido, e, embora sua expressão fosse tranquila, tinha um rosto masculino normal. Mesmo com o cabelo tão curto, não passava uma impressão muito masculina.

Talvez fosse por isso que Shihoru não se importava com Tsuga. Talvez porque ela não queria se apaixonar agora, Shihoru tinha dificuldades com pessoas que a faziam perceber demais que eram do sexo oposto. Tsuga não era assim.

Ainda assim, será que… Tsuga estava envergonhado agora?

Ele é meio fofo, ela pensou, sem querer.

Shihoru apressou-se em esconder o sorriso.

— …Obrigada.

— Quantas vezes você vai dizer isso?

— J-Já disse quantas vezes?

— Bom, não me importo. Além disso, não se preocupe em retribuir depois. — Tsuga começou a andar, então acrescentou, em um tom mais baixo: — Eu já tive uma boa visão, afinal.

— …Tsuga.

— Hã? Você me chamou sem usar honoríficos?

— Acho que você deve ter ouvido errado.

— Ouvi?

— Absolutamente, sim.

Shihoru se concentrou enquanto seguia Tsuga. No fim, todos os homens eram iguais?

Ela não podia baixar a guarda. Era isso que aquilo significava.

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