Capítulo 6 (Parte 1)

As Etapas da Felicidade.

Kuzaku estava com uma mulher de manto verde… ou pelo menos achava que era uma mulher. Ele tinha medo de perguntar, e duvidava que ela falasse o mesmo idioma que ele, então não havia como confirmar. Mas, bem, ela provavelmente era uma mulher.

Seu peito, bom, sabe… ela tinha? Tipo, eram enormes. Dava para dizer que ela era alta, mas existiam mulheres por aí que rivalizavam com qualquer homem em altura. Mas, bem… e o rosto dela? Era difícil chamá-lo de bonito.

A cor de sua pele, também, era uma espécie de verde cremoso. Ela não tinha nariz. Bom, na verdade, meio que tinha. Só as narinas, talvez. Sua boca mostrava os dentes e a gengiva. E seus olhos eram vermelhos.

Ela era meio assustadora. Mais do que um orc. Oh, e o nome dela era, aparentemente, Yanni.

Yanni o guiou pelas montanhas, e, após andarem por um tempo, apareceu uma construção que parecia uma espécie de cabana de montanha. Não, não era apenas parecida; era uma cabana.

Ao lado da cabana havia uma pilha de troncos cortados no mesmo comprimento. Pensando bem, ele tinha ouvido periodicamente sons de “toc, toc” por um bom tempo. Alguém estava derrubando árvores por ali. Nesse caso, aquela era uma cabana de lenhador?

Yanni apontou com o queixo para a pilha de troncos. Estaria dizendo para ele fazer algo com eles?

— Nem pensar. Não pode ser isso — murmurou. Kuzaku fez um gesto como se estivesse carregando um objeto longo e balançou a cabeça na direção de onde tinham vindo. — Quer que eu carregue? Para a aldeia? É isso, certo?

Yanni assentiu, como se dissesse que sim.

Kuzaku apontou para si mesmo. — Eu? Sozinho?

— Hah? — Yanni inclinou a cabeça para o lado.

— Hum, não sei como dizer isso, mas esse trabalho? Esse serviço? Tipo, eu vou fazer sozinho? Sabe, tem bastante coisa ali, né? Fácil uns cem, certo? Talvez mais. E além disso, essas árvores, elas são bem grandes, não acha? Será que consigo carregar isso sozinho? Estou meio em dúvida…

Yanni ouviu em silêncio, mas no momento em que Kuzaku parou de falar, ela apontou para a pilha mais uma vez, como se dissesse: “Ande logo.”

Kuzaku franziu o rosto e segurou a cabeça. — Droga. Sem espaço para negociação, hein? Estou exausto ao máximo, e trabalho físico vai ser complicado…

Yanni fez um som alto, sugando o ar pelos dentes. Certamente para intimidar. Assustadora.

Kuzaku deu de ombros e baixou a cabeça. — Certo. Já vou começar.

— Wolla.

— …Huh? O que é isso? O que você quer dizer?

— Waouf.

— Não, eu não entendi. Mas estou supondo que signifique algo como “Ande logo” ou algo assim. Vou fazer. Vou fazer. Quero dizer, as garotas não podem fazer esse tipo de trabalho, e o Enba-kun só tem um braço.

— Neak!

— Certo! Eu disse que vou fazer! — Kuzaku correu em direção à pilha de troncos. Ele tinha a intenção de correr, mas seu estômago roncou alto, e ele tropeçou.

Ah, droga. Minhas pernas vão ceder. Não tenho forças.

Ele conseguiu não cair, de alguma forma, mas acabou se agachando, incapaz de se manter em pé.

— Ohh — murmurou. — O que é isso? Minha visão está girando. Ohh…

Yanni se aproximou. — Rua? — Ela inclinou-se para olhar o rosto de Kuzaku. Seu rosto era tão assustador quanto ele esperava, mas dava para ver algo que parecia preocupação em sua expressão.

— Estou meio que, um… no limite, sabe? Tipo, estou sem energia. Oh, é a mesma coisa, né? Não tenho comido direito. Sei que provavelmente não deveria estar dizendo isso, mas…

Yanni suspirou, começou a remexer no manto, e então, voilà, ela apresentou um embrulho para Kuzaku.

Era algo envolvido em uma folha grossa?

— Ohhh. Obrigado — disse Kuzaku ao pegar. Ele aproximou o embrulho do nariz e—

Isso é… Não tenho certeza, mas deve ser o cheiro de algum tipo de grão. Sua boca começou a salivar instantaneamente.

— É-é… é comida?

Yanni virou o rosto, um pouco embaraçada, e então disse “Wolla” em um tom baixo. Talvez fosse sua imaginação, mas ela parecia um pouco fofa. Seu rosto era assustador, mas ela não era uma pessoa ruim…? Ah, espera, ela nem era uma pessoa.

Quando ele desenrolou a folha, havia essas coisas marrons e achatadas que pareciam uma mistura de pão e bolinho. Três. Eram três delas. Ele pegou uma e deu uma mordida faminta.

— Oh! — exclamou.

Dentro. Tinha algo dentro delas. Era uma coisa parecida com carne, com um sabor agridoce. Algum tipo de recheio.

A parte de fora, seja pão ou bolinho ou o que fosse, não tinha um sabor muito forte, mas era mastigável e…

Boa. Isso é bom.

Em uma palavra, era delicioso, mas tão delicioso que ele não conseguia descrever em palavras. Talvez não fosse nada especial se ele não estivesse com tanta fome, mas naquele momento, era delicioso. Delicioso o suficiente para fazê-lo se sentir grato por estar vivo. Era tão incrivelmente delicioso que ele achava que sua cabeça ia começar a vazar algum líquido estranho.

Delicioso. Deeleecioso. …O que é deeleecioso? Bem, é delicioso.

Antes que percebesse, estava devorando tudo enquanto chorava. Não chore, pensou Kuzaku consigo mesmo, mas ele não podia se culpar tanto por isso.

Depois de devorar aquelas três coisas que eram uma mistura de pão e bolinho, sua cabeça ficou preenchida com uma sensação entorpecente de felicidade e saciedade. Suas pálpebras e narinas não paravam de tremer.

Quero mais. É isso que sinto honestamente. Agora mesmo, eu comeria cem dessas coisas parecidas com pão e bolinho. Mas nunca seria suficiente, e parece que já consigo me mexer também.

— Yanni-san. — Kuzaku sorriu para Yanni. Ou melhor, seu rosto se abriu em um sorriso espontâneo. — Obrigado. Estava muito bom. Você me salvou.

Yanni cruzou os olhos com Kuzaku por um momento, mas logo desviou o olhar. Ela murmurava palavras como “nuan” e “wakundawo,” entre outras que ele não entendia. Estava brava? Não parecia ser isso.

Ele não entendia. Comunicação entre raças diferentes era algo complicado.

Kuzaku se levantou. Ele não estava usando sua armadura. Tinha tirado e deixado para trás. Naturalmente, também não tinha sua espada ou escudo. Ele lançou um olhar para a montanha de troncos.

— Quem não trabalha, não come, hein — murmurou.

Era uma troca justa. Jessie tinha dito que não mataria Kuzaku e os outros, e que forneceria comida, água e um lugar para dormir, mas não seria de graça. Além disso, ele tinha imposto mais uma condição.

“Não vou permitir que vocês deixem esta aldeia, Jessie Land.”

Haruhiro estava sendo mantido como refém, e todos eles haviam sido amarrados e presos, então não tinham escolha.

Para ser sincero, Kuzaku havia pensado: Sério, é só isso? Ele esperava algo muito mais insano, envolvendo perigo direto para todos, incluindo Haruhiro. Eles podiam comer, dormir e viver. Não era suficiente?

Mas, quando chegou a hora de trabalhar, e Yanni indicou que ele começasse a andar, a condição de não poder deixar Jessie Land começou a pesar. Mesmo que aceitasse isso como inevitável por enquanto, quanto tempo teriam que ficar ali? Para sempre? Por toda a eternidade? Isso significava que eles viveriam naquela aldeia até morrerem? Não poderiam mais voltar para Altana?

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