Capítulo 7 – Layout. (Parte 1)

Mas, bem, sabe? Não era como se a party de Haruhiro e os Tokkis tivessem passado três dias e três noites apenas cavando um buraco. Não havia noites no Reino do Crepúsculo, então dizer isso era estranho… talvez? Sim? De qualquer forma, nesses três dias, menos da metade das setenta e duas horas foram gastas cavando. No máximo, umas vinte e quatro horas. O resto foi dormindo.

Não, isso não era bem verdade. Claro, eles faziam pausas, dormiam e até revezavam para voltar ao assentamento e tomar banho, mas faziam outras coisas também.

Taro apareceu por acaso e sugeriu que fossem ver o deus gigante e a hidra por si mesmos. A propósito, a hidra era aquela criatura branca que se contorcia. O pai de Taro, Gogh, havia dado esse nome a ela.

— É um bom nome. — O jovem de beleza inigualável, Taro, sussurrou para si mesmo, com o rosto tomado por uma felicidade incontida. — A hidra. É legal. Meu pai é incrível. Ele é mesmo o meu pai.

Seguindo Taro, que tinha uma profunda admiração e amor por seu pai, e provavelmente por sua mãe também, a party de Haruhiro e os Tokkis se aproximaram do deus gigante e da hidra.

Tanto o deus gigante quanto a hidra estavam em constante movimento, perseguindo as equipes de isca, então, no final, o mais perto que conseguiram chegar foi a uns cinquenta metros. Mesmo assim, isso já era perigoso o suficiente para eles.

O deus gigante, em particular, tinha um tamanho que só podia ser descrito como além da compreensão humana. Quando Taro disse que estimavam que ele tinha 300 metros de altura, eles só conseguiram dizer: Ah, tá. Tudo isso?

Haruhiro tinha cerca de 1,70 metros de altura, então 300 metros era aproximadamente 176,5 vezes isso. Mesmo comparado aos 1,90 metros de Kuzaku, ainda era 156,25 vezes maior. Nem fazia sentido comparar.

Derrotar aquela coisa? De jeito nenhum. Impossível. Que tipo de piada era essa? Não havia nada que pudessem fazer. Não tinha como funcionar.

Era por isso que, segundo Taro, as equipes de isca estavam começando a achar que talvez fosse demais lidar com isso dessa vez.

Bom, óbvio.

Tipo, o que queriam dizer com “dessa vez”? Ia haver uma próxima? Eles iam enfrentá-lo na próxima? Eles eram idiotas? Ou simplesmente incríveis? Será que pessoas tão incríveis vivenciavam as coisas de forma diferente?

De qualquer maneira, era uma boa notícia para Haruhiro que o deus gigante estivesse sendo riscado da lista de alvos.

Quero dizer, pense nisso. Os pés de Haruhiro tinham 25,5 centímetros. Se ele multiplicasse isso por 176,5, dava 4.500,75 centímetros. Isso era mais de 45 metros.

Aquela coisa não cairia em uma armadilha com 30 metros de diâmetro. Quanto à profundidade, com um corpo massivo de 300 metros de altura, mesmo sendo conservadores, eles precisariam de uns duzentos metros.

Impossível.

Mesmo deixando de lado a armadilha, era impossível.

Para começar, embora fosse verdade que o deus gigante parecia humanoide visto de longe, e até caminhava como um, ele estava mais para uma megaconstrução pura e branca em movimento. Era insano pensar em matar aquela coisa. No mínimo, deveriam falar em “destruí-la”.

Além disso, se fossem destruí-la, Haruhiro tinha que ser humilde e reconhecer que isso exigiria algum tipo de armamento pesado. Como armas de cerco, talvez? Embora, mesmo se conseguissem reunir o suficiente, o inimigo não iria ficar parado, esperando ser destruído. Não, provavelmente atacaria, e isso não seria fácil de lidar. Essa era apenas a opinião de Haruhiro, mas não era meio impossível?

Agora, quanto à hidra…

Devia ser porque eles tinham visto o espetáculo incrível do deus gigante primeiro, antes de ver a hidra. Só podia ser isso. Porque quando Haruhiro a olhou, sua primeira impressão foi: Hã? É só isso?

À primeira vista, era mais ou menos do tamanho de um prédio de dois andares. Não, talvez um pouco maior. E era longa.

A hidra era uma criatura de muitas cabeças que parecia uma massa de cobras brancas de até dois ou três metros de espessura.

Ela tinha nove cabeças, parecidas com cobras, mas, surpreendentemente, sem olhos. As criaturas do Reino do Crepúsculo pareciam todas ter um olho, então ele esperava que houvesse um por cabeça, mas esse não era o caso. Talvez isso significasse que, na verdade, elas não eram cabeças, mas sim tentáculos.

A hidra se movia torcendo vários desses tentáculos. Parecia que quatro tentáculos eram usados para se mover. Os outros cinco se contorciam no ar, como se estivessem procurando algo. Eles provavelmente eram algum tipo de sensores.

— A gente acaba com essa coisa fácil — Tada disse, dando uma risada debochada.

Não sei se “fácil” é a palavra certa, mas parece mais controlável do que o deus gigante e—Não, não, não… Haruhiro balançou a cabeça. Calma aí, calma aí. Eu digo isso, mas ainda é enorme, certo? Se eu levar uma pancada de um desses tentáculos, tenho certeza de que vou morrer na hora.

A hidra estava a uns cinquenta metros de distância de Haruhiro e dos outros, se movendo em direção ao oeste, mas não era perto demais? Eles não tinham chegado perto demais? No momento, os cinco tentáculos que a hidra não usava para se mover não estavam apontados para eles. Ou seja, a hidra ou não tinha notado Haruhiro e os outros atrás dela, ou simplesmente não se importava.

Mas e se ela notasse? O que aconteceria então? Não seria perigoso?

— Hum, não deveríamos nos afastar mais…? — arriscou Haruhiro.

Taro olhou para trás enquanto continuava a andar.

— Está tudo bem. Essa distância é segura. Provavelmente.

— “Provavelmente”?

— “Nada neste mundo é 100% certo.” Foi o que meu pai me disse.

— Bem, isso pode ser verdade, mas…

— Não, não é “pode” — disse Taro com confiança. — As palavras do meu pai são absolutas.

Como assim? Não era nada suposto ser 100% certo?

Quão bravo esse belo garoto ficaria se Haruhiro cutucasse os furos na lógica dele? Seria interessante ver. Não, ele não queria ver, e nem queria deixar Taro irritado. Isso parecia assustador.

Por sinal, Haruhiro e os outros estavam perseguindo a hidra a um ritmo que era um pouco mais do que uma corrida leve. Tokimune carregava Anna-san nas costas, porque ele disse que seria difícil para ela acompanhar, mas Haruhiro tinha que pensar que ele era um pouco mole demais com ela, mesmo que ela fosse a mascote deles.

— Quem tá servindo de isca? — perguntou Ranta.

Talvez Taro não tivesse ouvido, porque ele não respondeu.

— Ei, quem é? Ei? Quem tá servindo de isca? Ei? Ei? Ei? Ei, por que tá tão quieto? Tô falando com você, sabia? Heeeey. Ei, ei, heeeey. Tá me ouvindo? Tô perguntando, tá me ouvindo? Ei!

— Tô ouvindo. — Taro nem se dignou a olhar para Ranta. — Mas não quero responder. Minha mãe me disse: “A vida é curta demais para perder tempo falando com idiotas.”

— O quê, eu sou um idiota?! — gritou Ranta.

— É, você é um idiota — Haruhiro não conseguiu deixar de concordar.

— Você é um idiota, com certeza — Yume concordou.

— Pior que idiota… — Shihoru parecia ter sua própria opinião sobre o quão idiota Ranta era.

— É verdade que seria uma perda de tempo — Mary disse friamente.

— Bem… — Kuzaku, que não tinha dito nada, talvez ainda sentisse a necessidade de se segurar.

— Ahaha! — Kikkawa deu um tapinha no ombro de Ranta. — Mas eu adoro o quão idiota você é! O lixo de um homem é o tesouro de outro, né?!

— Sai fora! — gritou Ranta. — Você é irritante, Kikkawa! Eu não sou lixo! Se eles querem me jogar fora como lixo, eu vou jogar eles fora primeiro!

— A gente não se importaria, sabe? — disse Haruhiro.

Ranta entrou em pânico.

— V-você… você… seu idiota! Não é isso que você devia dizer! Era pra você falar algo tipo: “Não diga isso!” e me repreender! Falar que eu não deveria falar sobre jogar as pessoas fora ou ser jogado fora!

— Ranta! — Tokimune abriu um sorriso brilhante, mostrando seus dentes brancos. — Você é tão trabalhoso!

— Tokimune-san?! Sabe, isso não soou como um elogio pra mim!

— Não é elogio, yeah?! — Anna-san lhe mostrou o dedo do meio das costas de Tokimune. — De que tipo de bunda de javali verrugosa você saiu, seu pinto podre?!

— Heh… — Inui deu um sorriso maligno. — Caia na ruína, seu cão do fim…

— Cão? — Mimorin olhou ao redor.

Não vejo nenhum cão aqui… Haruhiro concordou.

— Quem é a isca? — perguntou Tada, como se nada tivesse acontecido.

Desta vez, Taro deu uma resposta adequada.

— A hidra tá sendo guiada principalmente pelo golem Zenmai, do Pingo. O deus gigante era a Lala e o Nono, acho. Eram eles. Já que vieram aqui montados em dragões-cavalos.

Dragões-cavalos eram pequenos dragões que andavam eretos sobre as patas traseiras. Se um dragão jovem fosse criado desde o ovo, ele podia ser treinado para carregar um humano como um cavalo. Tendo os visto de vez em quando no Posto Avançado do Campo Solitário, a princípio Haruhiro pensara que gostaria de montar um algum dia. No entanto, quando soube que os dragões-cavalos tinham suas asas removidas ainda jovens para se tornarem adequados para montar, ele rapidamente perdeu qualquer desejo de fazê-lo.

— Entendi. — Tada assentiu e parou de andar de repente. — Heeeey, sua hidra estúpida! Olha pra mim! Sim, pra mim! Tô aqui! Bem aqui!

Será que um humano conseguia gritar tão alto? Como ele estava conseguindo fazer aquela voz tão alta? Ele não estava transcendendo os limites do corpo humano?

Haruhiro parou, horrorizado. Todos os outros fizeram o mesmo. Até Tokimune e os outros Tokkis ficaram boquiabertos.

— Espere— — Taro parou, arregalando os olhos. — O que você…?

— Vem pra cima! Heeeey! — Tada apontou seu martelo de guerra para a hidra. — Eu disse, vem pra cima de mim, sua covarde! Tá se sentindo medrosa?! Percebeu que não pode me vencer?! Você é só uma fracote gigante!

Foi então que aconteceu.

A hidra não parou. Na verdade, com seu tamanho, talvez nem pudesse parar de repente. No entanto, sua velocidade claramente diminuiu. Um de seus tentáculos, a parte com aparência de cabeça na ponta, se virou na direção deles.

Finalmente, a hidra parou de avançar.

Um segundo, depois um terceiro tentáculo se moveram, e suas cabeças sem olhos se voltaram para Haruhiro e o grupo.

— Heh… — Tada apoiou seu martelo no ombro, ajustando os óculos com o dedo indicador da mão esquerda. — Finalmente me notou, hein. Demorou. Demorou demais.

Tada, pensou Haruhiro. O que você quer dizer com “Heh”? Tada! Tadaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa!

Mesmo que ele dissesse em voz alta, não faria diferença. Haruhiro percebeu isso. Não era incomum conversas simples com Tada desmoronarem. Bem, o que ele podia fazer então?

— Ah, pelo amor de…! — Haruhiro resmungou. Ele ia agir.

Haruhiro agarrou Tada pelo colarinho da roupa de sacerdote.

— Gweh! — Tada gritou.

Talvez estivesse sufocando-o, mas Haruhiro não se importava. Era o Tada, afinal. Ele ia sobreviver.

— Todo mundo, corram! — Haruhiro gritou.

Ele disparou em uma corrida desesperada. Felizmente, os Tokkis o seguiram porque parecia divertido, então todos conseguiram começar a fugir sem problemas. A maior preocupação era a ação da hidra.

Se ela viesse atrás deles, conseguiriam escapar? O que aconteceria se fossem pegos? Teriam que lutar? Ou melhor, teriam que morrer? Era assustador só de pensar nisso, mas a hidra não veio atrás deles.

Será que tiveram sorte? Não, o golem Zenmai, que estava servindo de isca, devia ter feito algo para provocar a hidra com sucesso. Eles deviam muito a Zenmai.

Depois de terem colocado uma distância de 200 metros entre eles e a hidra, Haruhiro soltou Tada. Ele estava suando muito. Aquilo tinha sido assustador.

— Mano! — Tada segurou a garganta, se aproximando de Haruhiro. — Isso doeu, sabia, Haruhiro!

Ele deu uma cabeçada em Haruhiro, mas este conseguiu se manter firme de alguma forma.

— Ack!

Os olhos de Tada estavam vermelhos. Ele era assustador pra caramba. Mas, se Haruhiro recuasse agora, parecia mais provável que fosse morrer. Ele não entendia Tada, e duvidava que algum dia entenderia, mas essa era a sensação que tinha.

— R-Reflete sobre o que você acabou de fazer! — Haruhiro gritou. — Aquilo foi perigoso! Eu nem quero saber o que você estava pensando, e não vou perguntar, mas por favor, para com essas besteiras!

— Cala boca! Quem tem que refletir é você!

— Eu não estava errado, então não vou refletir!

— O que você disse?!

— Não vou refletir! V-Você que deveria!

Ohh, será que era seguro ir tão longe? Seria perigoso? Ele não sabia. Mas se não reagisse à pressão que Tada estava colocando sobre ele, provavelmente seria subestimado. Para resistir, provavelmente precisava manter uma postura firme.

— Quem tem que refletir é você, Tada! — Haruhiro gritou. — Você não pode colocar seus companheiros em perigo por impulso assim!

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