Capítulo 6: Grato Por Este Reencontro
Tradução: Reiki Project
A lua estava brilhando lindamente naquela noite.
Dois anos atrás. O verão em que Alice substituiu Cedric após eliminá-lo.
Shin ficou de guarda dentro do Grandville Village, no sul da Inglaterra. Não se poderia dizer que isso era o trabalho de um mordomo, estava mais para uma medida de precaução. Esses próximos meses seriam críticos para determinar o sucesso de seus planos.
Sua Senhora apareceu de repente na sacada.
O que o luar iluminava não era uma bela jovem de cabelo loiro, mas sim uma linda garota de cabelos prateados.
Ela não estava transformada— o efeito do Brocken foi cancelado!
O plano seria arruinado assim que alguém acabasse por vê-la com essa aparência. Shin rapidamente saltou para a sacada—
E foi aí que ele as viu.
Suas lágrimas que caíam no chão, brilhando como pedras preciosas.
Alice virou o rosto depois de notar seu mordomo.
As lágrimas em seus olhos já haviam desaparecido quando ela voltou a se virar.
— Você esqueceu que a sacada também faz parte do meu quarto? Eu não posso acreditar no quão insolente alguém pode ser para entrar assim sem permissão. O mordomo dos Bernstein não consegue entender nem isso?
— Neste momento… eu sou o mordomo dos Grandville.
— Verdade.
A risada de Alice ecoou oca pelo quarto, algo que não era comum a ela.
— Você está preocupada com alguma coisa?
— Preocupada? Eu? Sobre o que poderia ser?
— Com toda a honestidade— você já não está entediada de enganar as pessoas o tempo todo?
Alice riu, como se estivesse ridicularizando as palavras que acabara de ouvir.
— Eu amo enganar as outras pessoas mais do que desfrutar das minhas três refeições diárias. Você não viu o rosto do Cedric— a expressão que ele fez no momento em que foi enganado por mim e caiu nas mãos da nossa unidade? Sempre que engano alguém, penso no quanto sou astuta e no quanto todos são tolos por caírem em meus planos. Pensar nisso só me traz alegria. O único momento em que posso avaliar meu próprio valor é quando engano os outros. Eu…
Suas palavras, que até então estavam fluindo naturalmente, foram cortadas abruptamente.
Alice involuntariamente colocou as mãos sobre o parapeito da sacada, olhando para algum lugar distante.
— Ei, Shin. Você lutaria por mim?
— É claro.
— Nesse caso, você também morreria por mim?
— Seria algo simples de fazer se você assim ordenasse.
— E o que você faria se eu te pedisse algo mais difícil do que morrer?
— …O que você quer dizer?
— Não morra.
Shin ficou sem palavras. Do que sua Senhora estava falando?
— Se você diz que é para o meu próprio bem, então você não tem permissão para morrer. Quanto você acha que custaria para construir alguém como você novamente?
— Mas— o que aconteceria se chegasse o momento em que eu não seria capaz de protegê-la a menos que eu morra?
— Você realmente é incrivelmente burro, Shin. Eu sou uma pessoa muito inteligente. Uma pessoa astuta não pode ser morta por alguém que não seja, pelo menos não enquanto eu tiver meu mordomo perfeito ao meu lado.
— …O mordomo dos Bernstein pode ser muito capaz, mas ele não é perfeito. Se eu fosse citar um dos meus defeitos, seria o fato de que eu ainda morreria por minha Senhora, mesmo que isso significasse ir contra uma de suas ordens— sendo desleal assim.
Essa resposta tinha, aparentemente, desapontado Alice. Ela recomeçou a falar com um tom de voz diferente desta vez.
— Você é o mordomo dos Grandville, Shin.
— Sinto muito, mestra.
A senhora e o servo em desacordo foram banhados pela luz radiante da lua.
Essa memória doce, ainda que também amarga, dissolveu-se rapidamente junto com seu despertar.
Ele podia discernir vagamente algo parecido com um palácio à sua frente, O Santuário dos Tolos. Shin estava cercado pela ordem de cavaleiros, crucificado naquela sacada.
As correntes mágicas de contenção estavam firmemente presas ao pilar. Sua magia estava sendo selada, então ele não podia se mover.
Alguns pensamentos começaram a se formar dentro de sua cabeça pesada enquanto ele observava as gotas de sangue que escorriam por seu peito.
Eu jurei minha lealdade naquele momento…
Viver e morrer por causa daquela pessoa, não por sua família ou pátria.
É por isso que agora ele tinha que tomar sua decisão.
Parte 2
— Vamos explicar o plano.
Alice virou-se para todos os presentes depois de chegarem a uma área espaçosa dentro das cavernas subterrâneas.
Eles estavam dentro de uma seção no duto subterrâneo, uma sala que Alice já havia usado como quartel-general. Charl exibia uma expressão de desgosto. Ela provavelmente estava se lembrando dos tormentos que Alice tinha causado a ela naquele mesmo local.
Charl, Raishin, Loki, Frey e seus respectivos autômatos estavam naquele local. Irori e Shouko já haviam se retirado, e Komurasaki estava atualmente fazendo algum reconhecimento na grande cavidade adiante, conforme instruído por Alice.
— Você descobriu onde eles estão? Como estão posicionados?
A primeira pergunta foi de Loki.
— Consegui confirmar suas posições. Com isso.
Alice puxou uma bola de cristal. Raishin aproximou sua cabeça com curiosidade.
— Essa coisa de novo? Com certeza ela é conveniente.
— Não é tão conveniente quanto você imagina. Você precisa de alguma preparação antes de usá-la, como posicionar sensores nos locais que você quer que sejam refletidos de antemão.
Alice mostrou a bola de cristal mais uma vez, depois de mudar a cena que o objeto estava refletindo. Raishin e Charl estavam muito perto um do outro, enquanto Frey estava nas pontas dos pés para tentar observar. Loki tinha acabado de se inclinar um pouco mais para frente.
— O Shin atualmente está confinado na parte central da cavidade, no Santuário dos Tolos. O lugar é muito espaçoso porque fica bem no fundo deste abismo. Além de terem uma vantagem visual em relação a nós, eles também nos detectariam se chegássemos um pouco mais perto. Ao menos há apenas dois pelotões Katzbalger guardando o Shin. A ordem dos cavaleiros ainda está lá em cima na Academia, tentando rastrear nossos movimentos.
— Eles os mandaram para longe daqui? Eles não deveriam ter feito o contrário?
Charl torceu um pouco o pescoço. Alice inclinou a cabeça em resposta.
— A Academia está tentando se reconciliar com a Alemanha, mas não tem a intenção de fornecer a eles qualquer tipo de segredo sobre o Santuário em si. É lógico que eles não os deixariam permanecer na parte central. Olhando por outro ponto de vista, também é possível que a Alemanha simplesmente não confie o bastante na Academia para deixar para eles o trabalho de me rastrear.
Nesse caso, o fato de que apenas Rosenberg havia ficado para trás mostrava o quanto ele estava confiante. Aquele autômato que estava com ele era realmente “Lendário”, afinal de contas—
— Vamos voltar para a explicação. Nós temos dois objetivos. Resgatar o Shin e evitar uma guerra mundial.
— Você esqueceu o terceiro. Fazer tudo isso sem que nenhum de nós acabe sendo expulso da Academia.
— Claro. Por isso, o que fizermos a partir de agora precisa ser parte da intenção da Academia.
— Ah? Com isso você diz…
— Isso mesmo. Não importa o quanto tentemos dizer que fizemos tudo isso sob ordens do Diretor, nada disso importará se não fizermos com que ele aprove. Mas se colocarmos isso de outra forma—
— Entendo… se criarmos algum tipo de benefício que ele possa aceitar…
— Exatamente! Apenas precisamos criar uma situação em que ele não terá outra escolha a não ser aprovar tudo o que fizemos. O meu pai não vai deixar nenhum rancor pessoal afetar seu julgamento, afinal. Se ele determinar que o que fizemos trouxe algum tipo de benefício para ele, certamente ele se juntará ao nosso lado.
— Mas como faremos isso? Não vai ser o bastante apenas recuperar o Shin.
— Gerar um tipo de benefício não significa apenas agregar lucro a alguma coisa. Nós vamos encurralá-lo— vamos criar uma situação na qual ele não terá outra opção senão aceitar nossas ações para não acabar perdendo tudo.
— Espere. Nesse caso, isso é contraditório.
Loki havia habilmente interrompido.
— Se nossas ações se tornarem parte da intenção da Academia— se roubarmos o Shin como vontade da Academia, a reconciliação entre ela e a Alemanha seria desfeita. Uma fenda seria gerada entre as relações da Grã-Bretanha e da Alemanha e uma guerra explodiria sem qualquer dúvida. O que você vai fazer quanto a isso?
— O que devemos prestar mais atenção agora é se a Rússia vai decidir atacar ou não. Para obter a concessão da Rússia, a Alemanha precisa apenas se manter firme em sua posição. Em outras palavras
— …Separar a Academia da Grã-Bretanha?
— Es-espere um pouco. O que você quer dizer?
Charl havia interrompido a conversa. Ela não parecia adequada para toda essa trama, sendo tão honesta quanto era.
Raishin decidiu explicar no lugar de Alice ou Loki.
— A Shouko-san disse isso antes. Se a Alemanha e a Grã-Bretanha entrarem em um conflito público, a Rússia não temerá a Alemanha— mas ao contrário, se eles permanecerem em bons termos, a Rússia não poderá fazer algo absurdo por conta própria. Por essa razão…
— O inimigo do meu inimigo é meu amigo— bastaria separar a Academia da Grã-Bretanha enquanto indiretamente estes últimos mantêm boas relações com a Alemanha…
Loki mostrou uma expressão desconfiada.
— Seria realmente assim tão fácil? A relação entre a Grã-Bretanha e a Alemanha ainda não é tão boa devido ao incidente Grandville.
— Isso mesmo, e esse mesmo fator é o que nos coloca em vantagem.
Todos estavam muito confusos, exceto Alice. Eles não conseguiam entender as palavras dela.
— Vocês podem até chamar de disposição dos céus. Unificar a Alemanha e a Grã-Bretanha enquanto isolamos a Academia, deixando este lindo segredo escondido dentro deste lugar— bom, embora mais do que a metade de tudo isso seja minha culpa.
Apesar de zombar de si mesma, Alice ergueu sua bola de cristal, a qual estava refletindo um certo edifício.
— O lugar onde este segredo está escondido é bem aqui, nesta importante instalação de armazenamento mecânico— mais conhecida como [Armário].
Todas as pessoas presentes ficaram tensas. Era um lugar com profundo significado para Raishin.
— Se expusermos o segredo que está escondido lá dentro, podemos desfazer o mal-entendido entre a Grã-Bretanha e a Alemanha, bem como alcançar sua reconciliação. Assim a Academia não teria nenhuma outra escolha a não ser se mover como eu quiser— Vou explicar com mais detalhes depois, então vamos entrar nos detalhes de nossa estratégia principal. Para isso, precisaremos cumprir três papéis. O papel de infiltração do Armário para roubar o segredo, a equipe que irá distrair o inimigo enquanto isso estiver acontecendo, e nossa força principal que irá recuperar o Shin.
— A equipe de distração servirá de isca enquanto a força principal salva o Shin, certo?
— Charlotte… apesar de ser tão superior academicamente, sua forma de pensar é muito medíocre.
— O-o que você está dizendo!? É um pensamento razoável!
— Pensando razoavelmente sobre isso, resgatar o Shin vivo dessa forma seria impossível.
Mesmo que eles desviassem sua atenção, aqueles caras provavelmente não deixariam de vigiar o Shin. Ele provavelmente seria morto imediatamente caso eles sentissem que algo estava errado. Atrair Alice para fora de seu esconderijo também significaria que o valor de Shin deixaria de existir para eles.
— Nesse caso, devemos tentar enganá-los com o Yaegasumi? Se conseguirmos nos infiltrar enquanto eles estão sob uma ilusão perfeita—
Alice também não concordou com a proposta de Raishin.
— O Yaegasumi é fundamental aqui. Mas se usar magia nos arredores do santuário, você será notado imediatamente. A eficácia da sua magia seria reduzida ao menos pela metade se eles souberem que estão dentro de uma ilusão.
— Então o que vamos fazer?
— Usaremos uma magia que não apresenta problemas mesmo que seja descoberta. E não vamos resgatar o Shin.
Alguns pontos de interrogação haviam surgido acima das cabeças dos presentes. Alice parecia satisfeita com aquela reação.
— Vou explicar essa parte mais tarde também. Agora, sobre as forças inimigas— como você acabaram de ver, existem dois pelotões Katzbalger e cerca de dez Kreuzritter.
— Os Katzbalger são uma unidade de segurança de elite, certo? Os guardas comuns não estão lá?
— Eles não sabem que tipo de distúrbios podemos causar, e também não podem atrapalhar toda a Academia. Os guardas comuns estão fazendo seus trabalhos normais. Ao contrário, é provável que não apenas os guardas virão nos interceptar, mas também os professores.
Um clima pesado cobriu o lugar. Isso mesmo, todos eles estavam agindo contra a Academia.
— …Independente de quem aparecer, não importa.
Foi Loki que quebrou o silêncio.
— O único que quero destruir é o Rosenberg. Eu não tenho intenção de reclamar do seu plano, mas faça com que eu possa lutar contra ele.
— Essa é provavelmente a melhor formação de qualquer forma, mesmo que você não dissesse nada. Basta lembrar que o Roseberg não está acompanhado de um autômato comum. Não seria estranho que se tratasse de um lendário.
Loki não reagiu. No entanto, Frey olhou para o rosto do irmão mais novo, preocupada com ele.
— Ah sim, sobre a maldição da Charlotte— devo desfazê-la agora?
— Claro!
— É óbvio!
Raishin e Charl responderam ao mesmo tempo. Alice ergueu as mãos para tentar acalmá-los.
— Certo, certo. Então, vamos nos preparar de uma vez. Apenas para ter certeza, vou desenhar um círculo mágico de proteção neste local, então me deem cerca de dez minutos.
— Hmph… imprudentes.
Loki reclamou. Frey agarrou-se ao braço dele com força.
— Loki! Não diga isso!
— Ce-certo, mas afaste-se de mim!
Todos sorriram para um Loki incomumente em pânico.
Parte 3
Raishin se afastou da sala, entrando na profunda escuridão do canal subterrâneo.
Ele olhou para as sombras mais profundas. Aquela enorme cavidade estava logo adiante seguindo por aquele caminho.
Não faça nada idiota, Shin…
— Raishin.
Uma voz tímida chamou seu nome. Yaya se aproximou apressadamente dele, vindo do corredor.
— Perdoe-me, Yaya. Mais uma vez vou usar você para algo completamente alheio à Festa Noturna.
— O Raishin é sempre muito gentil, afinal. E pensar que você tentaria salvar alguém que desejou te matar várias vezes.
— Não posso fazer nada quanto a isso. Foi assim que as coisas acabaram acontecendo com o tempo.
— “Não posso fazer nada quanto a isso”— É assim que você pretende se desculpar cada vez que se envolver com uma mulher aleatória…!?
— Eu não disse isso! Não salte para essas conclusões!
Embora Raishin tivesse percebido que não havia realmente explicado nada a ela desta vez.
— Hum… eu sinto muito, por não dizer nada para você. Eu realmente queria que você ao menos soubesse que o noivado era uma mentira.
— …Você realmente é horrível, Raishin. Falando sobre um compromisso do nada… embora eu rapidamente tenha entendido que havia algum tipo de razão para isso.
Yaya sorriu alegremente. Por outro lado, Raishin tinha estreitado os olhos.
— Desculpe interromper o bom humor e tudo, mas se esse era o caso, então por que você tentou me estrangular?
— Mas… mas eu realmente não sabia.
— Olhe nos meus olhos quando diz isso. Bom… obrigado de qualquer forma.
Raishin moveu a mão para a cabeça de Yaya, acariciando-a suavemente.
Yaya estreitou os olhos como um gato, deixando-o fazer o que quisesse.
— …Desculpe-me por interromper o bom humor e tudo.
Os dois rapidamente olharam para trás surpresos. Charl estava atrás deles, de péssimo humor.
— A Alice terminou os preparativos para dissipar a maldição. Venha de uma vez, sua idiota! Estúpido!
— Pare de me insultar! Por que você está irritada mesmo!?
Charl e Raishin voltaram para a sala ainda discutindo. Yaya os seguiu por trás, espalhando uma aura escura ao redor do lugar.
E depois de um tempo, a dissipação da maldição de Charl terminou sem grandes problemas.
Não, embora isso realmente tenha causado alguns grandes problemas…
Raishin enxugou o rosto manchado com a manga enquanto caminhava pelo canal subterrâneo.
A operação já havia começado. Raishin estava em um grupo com Yaya e Alice.
Yaya virou a cabeça de mau humor.
— Você mereceu isso.
*Beicinho*
— Por que você diz isso? Não foi culpa minha!
— Fiquem quietos. Vocês dois são barulhentos mesmo neste tipo de situação.
Alice os repreendeu um pouco mais à frente no caminho, enquanto reduzia a voz. Mesmo que o Yaegasumi estivesse ativo, eles não podiam ter certeza de que não iriam acabar acionando algum tipo de sensor. Raishin e Yaya tentaram desesperadamente permanecer em silêncio.
O túnel subterrâneo ainda continuava. Era um caminho diferente daquele usado para chegar até a grande cavidade, uma rota que levava até a parte central da Academia. Depois de se moverem por cerca de cinco minutos, assim que Raishin estava começando a se preocupar com o quanto mais eles teriam que continuar andando—
De repente, a passagem subterrânea se abriu em um espaço completamente amplo.
Raishin pensou que eles tinham saído para aquela enorme cavidade, mas não era o caso. Eles estavam em um salão feito de pedra.
Era muito largo e alto, tão grande quanto o ginásio da Academia. O luar iluminava o local, permeado por um grande teto de vidro grosso. Aquilo era algum tipo armazém… ou um hangar?
— …Como esperávamos, alguém tinha que estar guardando este lugar.
Alice apontou para frente, com uma voz cheia de tensão.
Uma silhueta foi iluminada pela lua. Um físico robusto e um terno bem ajustado. Seu bigode grosso junto com aqueles olhos gentis, que pareciam estar constantemente desconfiados, eram característicos dele.
Yaya se preparou para lutar. Raishin fez uma pergunta a Alice enquanto uma gota de suor frio escorria por seu rosto.
— …E essa pessoa estar aqui também estava dentro das suas previsões?
— Impossível. Quem poderia ter previsto isso? Que esse monstro apareceria em pessoa.
A voz de Alice estava seca. E isso era de se esperar, porque a pessoa que estava parada ali era—
— Para onde vocês estão indo?
Não era outro senão o mago mais poderoso do século XIX e a pessoa mais influente da Academia Real de Maquinagem.
O Diretor, Edward Rutherford.
O efeito do Yaegasumi ainda estava ativo ao redor deles. A ilusão perfeita que havia funcionado até mesmo contra o Wiseman Raikkonen.
No entanto, os olhos do Diretor estavam totalmente focados em Raishin.
— O que foi, Raishin-kun? Você se esqueceu que a Festa Noturna de hoje começou já faz algum tempo?
— …Eu sei, e é claro que irei comparecer. Quando eu terminar de cuidar de alguns assuntos menores primeiro.
— Que assuntos menores? Você não poderia estar falando sobre se infiltrar no Armário, certo?
— E se eu disser que essa era minha intenção, você me deixaria passar?
— Se você me dissesse que essa era sua intenção, então eu não seria mais capaz de ignorar suas brincadeiras.
Raishin foi atingido por uma energia mágica feroz quando os olhos do Diretor se abriram um pouco mais. Foi uma sensação intimidante o bastante para paralisar todo o seu corpo.
Raishin provavelmente não ficaria assim tão assustado mesmo se estivesse confrontando um dinossauro carnívoro, mas isso era diferente.
— …Não podemos fazer muito quanto a isso. Vamos forçar nossa passagem, Yaya!
— Sim!
— Você tem certeza? Se você virar seu autômato contra mim, vou tomar isso como uma ameaça direta contra a autoridade da Academia. Você está consciente de suas ações apesar de saber disso?
O Diretor questionou a determinação de Raishin com uma voz calma, enquanto olhava fixamente para ele.
— Você não tinha um objetivo claro? Você está planejando jogar fora sua futura luta contra o Magnus-kun?
— …Eu não tenho intenção de abrir mão disso.
— Então recue.
— Eu também não posso fazer isso.
— Como você vai desafiar o Magnus-kun depois de ser expulso da Academia? Alguma tentativa de assassinato aleatória? O Magnus-kun é um tesouro precioso para este estabelecimento. A Academia simplesmente irá protegê-lo com todos os nossos recursos.
— E eu não estou falando apenas dos guardas. Não apenas eu, mas os professores, os estudantes— toda a força desta Academia saltaria em defesa dele. Você realmente seria capaz de passar por tudo isso para chegar até ele?
——Isso seria impossível. A menos que ele pudesse derrotar Magnus com um único golpe, alguém acabaria vindo em seu auxílio se a batalha fosse prolongada.
Raishin moveu lentamente os olhos para Alice.
Alice apertou os lábios com força, olhando para baixo como se estivesse suportando alguma coisa.
Desde que haviam entrado naquele local, o Diretor não havia olhado uma vez sequer na direção de Alice.
E isso foi mais do que o suficiente para que Raishin tomasse sua decisão.
— …Você está superestimando isso, Diretor.
— Quem? O Magnus-kun? Nós mesmos?
— Não, você está me superestimando. Eu não sou inteligente o bastante para você tentar me persuadir. O julgamento que poderia me ajudar a considerar minhas vantagens e desvantagens— eu deixei isso para trás há muito tempo ainda dentro da barriga da minha mãe!
Yaya instantaneamente pegou impulso, saltando para frente em linha reta tal qual uma rajada de vento.
Era uma velocidade e força suficientes para quebrar o pescoço de uma pessoa na casa dos cinquenta anos com um único golpe, sem dar-lhe tempo para sentir medo.
O Diretor da Academia se esquivou de tal chute apenas movendo seu corpo ligeiramente para o lado.
— !?
Yaya ficou surpresa. Ela foi imediatamente repelida, voltando mais uma vez para o lado de Raishin.
Ela havia sentido uma misteriosa força de repulsão. Ela havia saltado como se alguém a tivesse chutado suas costas.
O Diretor continuou parado no lugar, completamente calmo. Diante dele, a luz de um círculo mágico podia ser vista.
Uma barreira defensiva improvisada. Certamente não era algo estranho de se ver, mas sua intensidade era completamente de outro nível. Se uma barreira criada por um mago competente poderia ser comparada a dureza de uma parede de madeira, a de agora era igual a de uma parede de trezentos milímetros de ferro e aço.
— Você faz alguma ideia do motivo pelo qual sou conhecido como o mago mais poderoso do século XIX?
— …Nenhuma ideia. Provavelmente porque você é insanamente poderoso.
— Nesse caso, o que me faz ser tão insanamente poderoso?
Raishin franziu a testa. O Diretor continuou falando desinteressadamente, como se estivesse lecionando em uma aula.
— Minha quantidade total de poder mágico? O controle perfeito das minhas habilidades? Minha afinidade com a magia? Ou talvez minha forma de aplicar a teoria? Meu conhecimento tático e estratégico? Ou talvez minha eficiência ao controlar um autômato?
— …Não seria por tudo isso?
— Entendo, certamente sou um mago habilidoso. No entanto, o que me fez uma pessoa assim tão poderosa foi obter isso, usar isso, e saber como manter isso escondido— meu poder político.
O Diretor moveu sua mão pelo ar. As linhas traçadas por seus dedos se transformaram em imagens que marcavam a posição por onde passavam, traçando um círculo mágico.
Um hexagrama específico preenchido com muitos padrões— algo que Raishin estava vendo pela primeira vez.
Um livro robusto começou a se projetar, emergindo de dentro daquele círculo mágico.
— Tenha cuidado, Raishin! Isso é um Grimório— Lemegeton!
Alice gritou com uma voz cheia de tensão. Raishin estava completamente dominado pelo poder mágico do Diretor.
— Leme… o que é isso?
— …Inacreditável. Você não sabe o que é isso, apesar de ser um estudante desta Academia?
Talvez tendo ouvido a conversa deles, o Diretor começou a falar com um sorriso tenso no rosto.
— Este é um livro mágico deixado por um colega mago para as gerações futuras. Um livro para conter a enorme coleção que ele reuniria de agora em diante. O livro do fim. A Enciclopédia. Os Trabalhos Completos do Legado. A Grande Compilação de Tabus— ele é conhecido por vários nomes diferentes, mas é apenas um catálogo de autômatos.
— Catálogo…?
— Infelizmente, alguns deles foram perdidos ao longo do tempo, e muitos outros foram roubados. Apesar disso, eu ainda posso manipular mais de cinquenta Demônios Lendários e os enviar até você quando eu quiser.
O livro, ainda flutuando no ar, abriu-se sozinho. Uma pálida luz fosforescente foi emitida por ele, iluminando o rosto do Diretor de baixo para cima.
— Vou apresentá-lo a um dos mais valiosos, para mostrar meu respeito por você.
Por um instante, um intenso poder mágico iluminou o salão.
Era um sonho ou a realidade? Uma escada elegante apareceu atrás do Diretor. Era como se este lugar sozinho tivesse se movido para outra dimensão. As paredes completamente brancas se estendiam indefinidamente, tal qual o tapete vermelho, que cobria os degraus da escada, se estendia ainda mais alto que o próprio teto. Um trono decorado por muitos tesouros havia se manifestado no topo daquela escadaria—
Após o último degrau, um trono decorado com tesouros de ouro e prata podia ser visto—
Uma deusa…!?
E uma linda Rainha estava sentada naquele trono.
Ela tinha seios abundantes, pele branca e uma cintura surpreendentemente esbelta. Os olhos em seu rosto perfeito brilhavam com uma luz que poderia consumir tudo neste mundo. Seu corpo estava coberto por um único vestido branco de seda fina, e vários anéis de ouro decoravam seus braços e pernas.
A garota no trono parecia mais uma divindade do que um autômato.
— É a primeira vez… que a vejo… a 29ª Grã-Duquesa Astaroth!
Alice sussurrou em um tom cheio de desespero e encantamento.
A Rainha se levantou, descendo calmamente as escadas. Os degraus desapareciam, transformando-se em partículas douradas um por um enquanto ela passava por eles.
O Diretor fez uma reverência respeitosa, dando as boas-vindas à Rainha.
— Agradeço sua visita. Rainha Ishtar.
— Já faz um tempo, Ed. Acho que estamos lidando com um adversário formidável desta vez, se você teve que me convocar em pessoa?
A Rainha moveu momentaneamente os olhos para Raishin. Ele foi atacado por uma premonição mortal naquele instante.
— Aquilo é apenas um pirralho. Você com certeza envelheceu, Ed.
— Ele certamente é muito jovem— mas ele também é alguém que poderia se transformar na maior das nossas ameaças no futuro.
— Entendido. Prepare seu poder mágico. Vou trazer meu exército aqui.
A Rainha estendeu a mão direita. O Diretor agarrou aquela mão com a palma esquerda, enviando seu poder mágico para ela.
Ainda permanecendo completamente graciosa, a Rainha apontou sua mão esquerda para Raishin.
Algo começou a sair daquela palma estendida.
Uma sombra negra. Uma névoa sinistra. Alguns rostos humanos angustiados começaram a emergir da parte que estava apontada na direção de Raishin. Era algo verdadeiramente desconhecido, mas se ele fosse tentar descrever, seria algo próximo a aparência que espíritos vingativos deveriam ter.
Um número incontável dessas coisas estava se aproximando de Raishin com uma velocidade feroz.
Raishin fez Yaya saltar para o lado oposto, enquanto ele saltou daquele lugar carregando Alice consigo. A parede do salão em que o grupo de espíritos vingativos caiu desmoronou, como se tivesse sido derretida.
Era impossível que a pedra pudesse se decompor, mas não havia nenhuma outra forma de explicar aquilo além de dizer que ela fora corroída. A parede parecia ter sido destruída tal qual um tomate esmagado, e então se dissolvido como uma cebola podre.
Raishin, Yaya e Alice estavam tremendo depois de testemunhar tal poder diante deles.
— Chamas Apodrecidas— Se deixar que elas te toquem, você vai virar um monte de carne podre em um instante!
— Você a ouviu! Não seja atingida por essas coisas a qualquer custo, Yaya!
Apesar de achar que era uma ordem absurda, Raishin havia dado a ordem para Yaya assim mesmo, ao mesmo tempo em que enviava seu poder mágico.
O próprio Raishin ergueu Alice em seus braços, correndo enquanto preparava seu poder mágico. Ele não estava usando a magia de Kongouriki. Em vez disso, ele estava interferindo com seu próprio Sistema de Circulação de Magia para fazer uso de uma técnica para melhorar suas habilidades físicas. Os ensinamentos de Griselda não haviam sido em vão, afinal. Mesmo em uma situação como essa, ainda havia coisas que ele poderia fazer.
A Rainha apontou seu braço para Yaya, convocando assim ainda mais espíritos vingativos.
— Uh!
Um dos espíritos conseguiu roçar a bochecha de Yaya. A pele naquela área inchou rapidamente, apodreceu e caiu.
No entanto, tinha sido apenas um arranhão. Yaya tentou acertar um chute na Rainha depois de saltar por trás dela.
Porém, o Diretor se moveu para protegê-la antes que isso acontecesse.
Sua barreira defensiva foi ativada. Yaya foi repelida e atirada para trás com força.
Ela não seria capaz de se mover no ar. Nessa posição— ela não seria capaz de se esquivar dos espíritos!
Raishin rapidamente agarrou o pano que cobria seu braço direito, tentando removê-lo. Naquele instante—
A intuição de Raishin antecipou sua própria morte.
Ele podia sentir o perigo atrás dele. Depois de virar a cabeça para olhar por cima do ombro, Raishin notou alguns rostos horríveis de espíritos, que deveriam ter desaparecido depois de atingirem a parede mais cedo, agora estavam vindo atrás dele.
Eles não haviam desaparecido! Ele não conseguiria evitá-los a tempo!
O tempo tinha desacelerado irritantemente para Raishin. Os espíritos se aproximavam dele de forma irritantemente lenta. Raishin segurou Alice com firmeza em seus braços, incapaz de fazer qualquer outra coisa.
No entanto, algo obstruiu seu campo de visão logo antes dele ser engolido pelos espíritos.
Uma luz branca radiante e deslumbrante. Um brilho de porcelana. Aquilo era… um escudo?
Um composto mecânico cheio de divisórias complexas. Um belo escudo brilhante parou no ar, protegendo Raishin do ataque.
Os espíritos vingativos que colidiram com o escudo desapareceram um após o outro. No entanto, o escudo continuou a brilhar, sem apodrecer.
— Usando a Princesa Obscenamente Brutal contra uma criança? Que imaturo você, Diretor.
Atrás de Raishin, alguém havia entrado no salão.
Uma elegante e brilhante espada branca repousava em um de seus ombros. Embora estivesse envolta por um violento redemoinho de energia mágica e sede assassina, ela estava vestindo um adorável vestido curto. Aquilo era realmente um desequilíbrio terrível para sua presença.
Griselda Weston— A Labirinto!
Os olhos do Diretor se abriram um pouco mais.
— O que é tudo isso? Você já deseja perder a proteção que acabou de receber da Academia assim tão depressa?
— Você realmente está me superestimando. Eu sou Griselda, da Família Weston—
Griselda apontou sua espada para ele, sorrindo.
— E O julgamento que poderia me ajudar a considerar minhas vantagens e desvantagens— eu deixei isso para trás há muito tempo ainda dentro da barriga da minha mãe!
Parte 4
Ao mesmo tempo, Loki estava desempenhando seu papel ao lado de Cherubim na cavidade subterrânea.
Komurasaki caminhava apressadamente ao seu lado. Suas twintails amarradas em ambos os lados de sua cabeça balançavam no ar, dando a impressão de que eram caudas de gatinhos.
— Hum? O que foi, onii-san?
— …Nada. Sua magia realmente está funcionando agora, certo?
Komurasaki fez beicinho, irritada.
— Está funcionando— o Raishin a ativou, afinal de contas!
— Hmph. É por isso que eu não— Acho que não há nada com o que se preocupar…
— No entanto, o efeito será anulado se você usar alguma outra magia, então tome cuidado. Especialmente com esse autômato que você tem aí.
Por outro lado, desde que não houvesse conflito com a Teoria da Dissonância da Atividade Mágica, ela não seria desfeita com facilidade. Era uma magia terrível, de fato. Ela não era apenas capaz de esconder um alvo, mas também de eliminar os sons de passos e a própria presença da pessoa. Ser capaz de controlar livremente o alcance do alvo ao lançar a magia também era algo incrivelmente poderoso.
Um único autômato não seria capaz de controlar uma magia como esta. Definitivamente também era necessário um controle preciso do mago. Em outras palavras, Raishin havia melhorado consideravelmente.
…Interessante.
Loki ficou surpreso com a forma como havia pensado sobre isso. Até recentemente, o crescimento de Raishin apenas o irritava. Desta vez, ele tinha conseguido manter-se completamente calmo.
Depois de descerem o penhasco, eles finalmente se aproximaram da parte central da cavidade.
Em pouco tempo, Loki finalmente pôde dar uma olhada na aparência da estrutura que lembrava um palácio à sua frente.
Eles estavam a menos de quatrocentos metros de distância. Já era possível ver os inimigos com seus próprios olhos. Dez Heimgardners enfileirados lado a lado com seus marionetistas estavam guardando o local. Rosenberg… não estava em nenhum lugar à vista.
— Pare. Posso sentir uma barreira à frente. Será perigoso se chegarmos mais perto—
— Então vamos começar daqui.
Loki apontou seu braço direito para Cherubim, entregando a ele seu poder mágico.
— Vamos destruir completamente os dez autômatos que podemos ver. Vá em frente, Cherubim.
[Estou pronto.]
Cherubim abriu suas asas depois de entender perfeitamente as intenções de Loki. Todas as pequenas lâminas carregadas em suas asas se ergueram ao mesmo tempo, descansando em uma postura de ataque no ar.
As pequenas adagas foram disparadas ao mesmo tempo em que o efeito do Yaegasumi de Komurasaki foi removido.
As doze adagas moveram-se como meteoritos em direção a cada um dos dez autômatos.
No entanto, uma sombra decidiu atacar Cherubim exatamente naquele momento.
Ela surgiu de cima, em algum ponto às suas costas. Cherubim não estava em posição para se defender dos ataques, mas… duas das pequenas adagas deslizaram para trás, bloqueando o ataque do inimigo.
Quem havia atacado era um autômato metálico.
Garras enormes substituíam as mãos em seus dois braços maciços. Talvez devido ao fato de ambos serem muito fortes, as duas adagas de Cherubim foram facilmente destruídas.
Atrás daquele autômato, um belo jovem de cabelos loiros caminhou para fora das sombras.
— Então você conseguiu me notar, [Imperador da Espada].
— …Essa fala é minha, Rosenberg.
Loki estava olhando cuidadosamente para o autômato do inimigo. Parecia um autômato comum à primeira vista. A força de seus braços, como ele tinha acabado de presenciar, não poderia ser menosprezada. Quanto a quaisquer outras características particulares dignas de nota— seria o manto que cobria seu corpo tal qual uma capa, uma espécie de armadura de escamas.
O autômato provavelmente era incapaz de formar palavras, de modo que ele emitia apenas uma espécie de chilro muito alto.
— …Que autômato antiquado. É alguma antiguidade?
Rosenberg sorriu despreocupado.
Loki voltou seu olhar para Komurasaki. Ela ainda estava escondida pelo efeito da magia Yaegasumi, mas dependendo da situação, ela provavelmente acabaria se tornando um incômodo.
— O que está acontecendo? Você está intimidado pelo meu autômato antigo?
Rosenberg lançou sua provocação. Loki ordenou seu próximo ataque, segurando sua raiva fervorosa.
Cherubim saltou para frente. Ele se moveu em direção ao inimigo enquanto estendia as lâminas em ambos os braços para a frente. O grande autômato de armadura tinha desaparecido de repente— reaparecendo acima de Cherubim.
Foi muito rápido! E ele estava voando!
O autômato abriu suas grandes asas. Aquelas placas de metal que cobriam seu corpo eram na verdade suas asas!
— Um humanoide voador. Uma harpia?
— Não é algo assim tão banal.
Rosenberg moveu um de seus braços. O autômato de grandes braços desceu rapidamente, combinando com esse movimento.
Parecia o ataque de um falcão. Suas garras trovejaram no ar, indo em direção a Cherubim. Apesar de conseguir desviar o primeiro ataque, a alta mobilidade do inimigo finalmente permitiu que ele capturasse Cherubim em suas garras depois de seguir rapidamente o movimento que este fez para se esquivar.
As garras do autômato haviam perfurado a placa peitoral de Cherubim.
Algumas rachaduras surgiram no corpo de Cherubim, como se o metal destas tivesse começado a derreter.
— Garras de fogo—
Loki deduziu instantaneamente. Eram garras aquecidas capazes de queimar qualquer tipo de material.
Era algo similar a habilidade de Cherubim, mas— comparado a essa temperatura, o ataque de Cherubim ainda era mais poderoso.
Depois de evitar outro ataque, Cherubim saltou e girou no ar, mudando seu corpo para a forma de uma grande espada.
A corrente de vapor quente altamente pressurizado, produzida pela lâmina da espada, acelerou instantaneamente o corpo de Cherubim.
A grande espada colidiu com o humanoide alado. Após o impacto, uma rajada de vapor quente saiu da lâmina da espada. Esse mesmo calor, concentrado na superfície do corpo do inimigo, atingiu momentaneamente uma temperatura de milhares de graus. Com este ataque, não importa que tipo de metal fosse, queimá-lo seria possível. Cherubim—
…Não conseguiu cortar o autômato humanoide ao meio.
Mesmo Loki não teve escolha senão arregalar os olhos. O autômato havia resistido a este ataque!
Cherubim não podia cortá-lo. Loki imediatamente fez com que Cherubim se afastasse.
Ele havia retornado à sua forma de anjo mecânico mais uma vez. Cherubim também parecia estar surpreso de algum modo.
Rosenberg começou a rir com vontade.
— …O que é assim tão engraçado?
— O fato de eu ter conseguido deixar você com essa expressão. Como isso poderia não ser simplesmente divertido?
Loki examinou novamente o autômato do inimigo.
Ele podia executar ataques de calor, ao mesmo tempo em que possuía completa resistência a eles. Entre os autômatos lendários, haviam apenas alguns poucos capazes de controlar o fogo. Hræsvelgr veio a sua mente, mas também—
— O demônio que revive das cinzas…!
— Esplêndido. O seu calor descuidado invocou a Fênix!
O humanoide alado então explodiu em chamas.
Loki sentiu as ondas colossais de poder mágico. Era totalmente impossível que aquela fosse uma quantidade que Rosenberg pudesse lhe enviar assim tão depressa. Seria mais lógico supor que os milhares de graus que Loki concedeu a ele foram convertidos em poder mágico pelo inimigo.
O humanoide alado mudou sua aparência. Uma transformação mecânica tal qual a de Cherubim.
Os dois ombros se desconectaram do corpo, ambos movendo-se até se posicionarem abaixo da cintura. O enorme bico que emergiu do centro do tronco se fundiu com o crânio, ao mesmo tempo em que um par de pernas se projetava do espaço vazio de seu abdômen anterior.
Ao fim da sequência de transformação, o humanoide alado tinha se transformado em um enorme pássaro.
O que antes eram seus enormes braços agora cumpriam a função de patas e garras. Desse modo, eles agora eram uma arma ainda mais poderosa— uma vez que ambos foram projetados de modo a usar aquelas garras da forma mais vantajosa possível.
Suor frio escorreu pelas costas de Loki. O inimigo dessa vez não poderia ser uma combinação pior para ele. Não apenas a Fênix era capaz de produzir seu próprio fogo, mas qualquer ataque de fogo que ela recebesse também acabaria sendo convertido em poder mágico. Essa era a razão pela qual ela era conhecida por ser imortal.
— Vá, Fênix.
Soltando um grito agudo que ressoou por todo o local, a Fênix levantou voo.
Foi assustadoramente rápido. Tal qual um meteorito.
Parecia ser o mesmo princípio usado por Cherubim. Ela estava usando a reação causada por sua propulsão a jato para ganhar ainda mais poder em seu ataque.
As longas chamas que a Fênix carregava no ar pareciam fazer parte de uma cauda. Era exatamente como a Ave de Fogo das lendas.
O pássaro mergulhou na direção de Cherubim. Loki havia enviado seu poder mágico de imediato, fazendo Cherubim voar.
Um jogo de perseguição em alta velocidade havia começado. Semelhante a uma luta entre dois pássaros. O choque entre lâminas, garras e bico causavam faíscas por todos os lados, a medida em que os dois autômatos mudavam de posição e voltavam a se chocar após baterem suas asas mais uma vez.
Entretanto, quem tinha a vantagem era o inimigo. A Fênix continuava a se esquivar dos ataques de Cherubim, reduzindo a força destes com sua corrente de ar quente pressurizado. Loki também poderia usar a mesma técnica para amortecer os ataques de seu adversário, mas usar o mesmo ar quente apenas converteria o ataque de volta para poder mágico da Fênix.
A passagem do tempo apenas ajudava a aumentar a vantagem do inimigo.
As garras da Fênix finalmente perfuraram o corpo de Cherubim, e seu bico abriu um buraco no peito dele. Acima disso—
— Cuidado, onii-san!
Loki saltou para o lado instintivamente depois de ouvir a voz de Komurasaki.
O lugar onde ele estava até alguns segundos atrás foi completamente coberto por um relâmpago lançado pelas mãos de um dos Heimgardners.
Quatro autômatos guardas apareceram juntos. Ele havia mobilizado quase metade de suas forças para aquele local.
Ainda distraído pelos guardas, Loki acabou atingido diretamente na cabeça por um chute poderoso.
Seu campo de visão tremeu. Loki olhou para cima, incapaz de acreditar no que tinha acabado de acontecer, enquanto rolava pelo chão feito de liga mágica.
A Fênix deveria estar ocupada com o Cherubim. O que diabos me chutou…?
Ele então percebeu.
— Você… não me diga…!
— Isso mesmo— eu transformei a mim mesmo em um Maschinensoldat!
Rosenberg tinha um grande sorriso no rosto, enquanto permanecia parado em pleno ar.
Parte 5
— Mestra… por que você está aqui…?
Raishin murmurou intrigado. Griselda relaxou sua expressão antes de responder—
— Seu… pupilo miserável!
Griselda havia desferido um golpe de espada diretamente no flanco de Raishin.
Ele foi atirado no ar, quase atingindo o teto. Se ele não tivesse largado Alice momentos antes, ela também acabaria seriamente ferida.
Raishin começou a reclamar depois de cair.
— O que diabos você está fazendo!? Eu teria morrido agora mesmo se eu não tivesse ativado o Kougouriki alguns segundos antes!
— Você está planejando desperdiçar sua vida em um lugar como este!?
— Eu quase fui morto por você agora mesmo!
— Calado! Você supostamente tem um inimigo para derrotar!
Raishin ficou sem palavras. Isso mesmo, o inimigo que ele queria derrotar não era o Diretor da Academia.
— …Eu vou derrotá-lo. Mas eu também vou ajudar a Alice.
— Idiota. Eu já sei muito bem disso. O fato de que você é um imbecil.
— Então por que você me atirou no ar!? Com o que você está brava!?
— Por que você não pediu a minha ajuda!?
— !
Uma das sobrancelhas do Diretor se moveu ligeiramente. Ele começou a acariciar seu livro de magia, Lemegeton, com os dedos.
— Não posso ignorar o que acabei de ouvir. Você realmente planeja se opor a mim— a toda a Academia?
— De forma alguma. No entanto, eu também não sou tolerante o bastante para ficar parada sem fazer nada enquanto vejo alguém tentar assassinar o meu pupilo.
Os dois magos trocaram olhares. O ar no salão começou a tremer, como se estivesse com medo de alguma coisa. Yaya tentava suportar a pressão de testemunhar aquela devastadora colisão de poderes entre dois indivíduos poderosos. Qualquer distração, por menor que fosse, provavelmente acabaria prejudicando seu espírito de luta.
Griselda havia se movido até ficar diante de Raishin, como se o cobrisse com seu próprio corpo.
— Vá em frente, seu pupilo idiota. Eu vou ganhar algum tempo para você.
— Você vai ganhar algum tempo— você está dizendo que não vai vencer? Você não é uma Wiseman?
— …Você parece estar entendendo isso errado. Wiseman é apenas o título concedido ao maior talento de uma geração. Eu consegui dominar apenas uma Festa Noturna— enquanto aquele homem conseguiu dominar todo o século XIX.
Griselda riu sarcasticamente de si mesma depois de olhar para o Diretor.
— Vou criar uma oportunidade para você. Observe atentamente e corra.
— Mas…
— Não se preocupe. Eu tenho isso comigo agora.
Griselda largou a espada. A lâmina se dispersou em várias peças no ar, mudando sua silhueta para a de um autômato mecânico.
Yaya levou a mão até a boca com surpresa.
— Raishin! Isso… é menor, mas é igual ao Cherubim!
Eles certamente se pareciam. Cherubim era tão alto quanto um homem adulto, mas esse tinha a altura de uma garotinha, e a ênfase em sua cintura fina indicava que se tratava de uma mulher. A armadura dela estava repleta de gravuras detalhadas, suficientemente dignas de admiração. Se Cherubim podia ser visto como um tipo de material industrial, este autômato parecia muito mais uma peça de artesanato.
Ao contrário das asas de Cherubim, que mais pareciam [guarda mãos], este autômato tinha lâminas que pareciam asas em suas costas. O equilíbrio de seus membros era humano, muito mais refinado que o de Cherubim.
O escudo também se transformou ao mesmo tempo. Tinha um design semelhante ao do autômato espada, mas com uma silhueta mais refinada. As seis placas de metal que compunham a parte do escudo assumiram o papel de cobrir sua cintura como uma saia.
Os dois autômatos eram surpreendentemente semelhantes, mas ao mesmo tempo surpreendentemente diferentes.
— O que são essas coisas…?
— Réplicas de servos. Aparentemente, eles são os modelos Michael e Raphael.
— Esses nomes… então eles realmente são do mesmo modelo que o Cherubim— na verdade, onde você os conseguiu?
— Essa professora que eu conheço disse que queria fazer um test drive com eles. São apenas coisas emprestadas e improvisadas, mas certamente serão o bastante para ganhar algum tempo para você.
[Como ousa nos chamar de coisas improvisadas?]
O autômato da espada havia emitido uma voz completamente fluída de seu corpo. Raishin ficou surpreso.
— Eles falam!
Os dois autômatos levaram as mãos ao rosto em um gesto zombeteiro.
[Com o que esse garoto idiota está surpreso?]
[Cuidado com suas palavras, onee-sama. A verdade apenas vai machucar ainda mais esse idiota.]
— E ainda por cima são debochadas! Elas são completamente diferentes do Cherubim!
— Entendo, são excelentes autômatos, Senhorita Weston.
O Diretor expressou sua admiração— e começou a rir.
— Mas esses bonecos serão dignos o bastante para enfrentar minha deusa?
— Vamos testá-los.
O poder mágico emergiu de repente do corpo de Griselda. Os dois autômatos reagiram muito rapidamente.
Ambos saltaram para o lado, aproximando-se do Diretor e da Rainha, cada uma delas indo em uma direção.
Os olhos de Alice se arregalaram com surpresa. Raishin também ficou sem palavras.
Os movimentos das duas bonecas eram muito suaves. Elas também não faziam barulho a medida em que o ar quente era liberado, ao contrário de Cherubim. O controle natural dos vetores de cada uma de suas ações parecia muito com os movimentos de—
— Fragarach— Impossível! Não há como alguém implementar uma rotina de pensamentos capaz de controlar essa magia sem usar um módulo de cérebro humano…!
Diante da surpresa Alice, os dois autômatos haviam se movido exatamente igual a Shin.
Elas se esquivaram dos espíritos vingativos da Rainha com movimentos em ziguezague com zero inércia, cobrindo o espaço entre elas e o Diretor em um piscar de olhos. O autômato espada puxou a lâmina em suas costas, tentando cortar a Rainha.
— Eu não vou deixar!
O Diretor se moveu para protegê-la mais uma vez, usando a luz de um círculo mágico.
Um som agudo sacudiu o ar, no momento em que a lâmina e a barreira mágica colidiram.
— Ed, seu poder mágico.
— Ao seu comando!
O Diretor enviou seu poder mágico para a Rainha após segurar novamente sua mão.
A Rainha, sem apontar para o autômato espada, enviou grupos de espíritos vingativos na direção de Griselda. No entanto, o autômato escudo reagiu desta vez, bloqueando a linha de fogo em apenas um instante, literalmente se transformando em um escudo e assim protegendo sua mestra.
Um forte impacto. O escudo resistiu ao golpe direto dos espíritos sem sofrer qualquer tipo de dano.
Griselda sorriu alegremente.
— Isso é muito melhor do que eu imaginava. Eu me pergunto se— eu também posso usá-las dessa forma?
Griselda subiu aos céus sem saltar. Raishin, Yaya e Alice assistiram sem palavras o desdobrar da situação diante deles.
O movimento de Griselda tinha sido o mesmo de Shin— um movimento que fazia uso da magia do circuito Fragarach.
Griselda voou por cima do Diretor, tomando vantagem do ponto cego criado pelo escudo. O autômato espada já havia voltado a se transformar a essa hora, lançando-se na direção da mão de Griselda na forma de uma espada elegante.
Uma luz vermelha começou a se espalhar das costas de Griselda.
A vaporização de seu sangue deu origem a uma quantidade explosiva de poder mágico. A energia condensada em um fio que passava por todo o seu braço direito até a espada em sua mão, assim retirando o poder de seu circuito mágico ao limite.
De repente, ela acelerou a uma velocidade tremenda. Griselda desceu tal qual um meteorito, preparando um golpe com sua espada.
O Diretor conseguiu se defender do ataque ao criar uma barreira mágica acima dele, no entanto, ele não foi capaz de impedir o impacto!
O chão abaixo deles afundou junto com o som de uma explosão.
O sólido piso de pedra desabou, criando uma cratera. Muitas rachaduras surgiram pelas paredes do salão, enquanto o vidro no teto se despedaçou. O vidro parecia ser extremamente grosso, pois caiu do teto como imensos pedaços de um iceberg. Raishin tentou desesperadamente evitá-los, ao mesmo tempo em que cobria Alice com seu próprio corpo.
Griselda sorria claramente através da cortina de poeira que cobria o local. Ela era a imagem viva de uma deusa feroz.
— Não acredito… se capaz de ativar… o Fragarach em si mesma… sendo que ela apenas começou a aprender como controlá-lo!
A voz de Alice estava tremendo. Raishin, por sua vez, tinha mais uma vez reconhecido as habilidades de sua mestra.
Griselda era alguém a ser temida, juntamente daqueles brilhantes anjos mecânicos.
Roubando os designs da D-Works e instalando o circuito mágico alemão, criando assim um autômato híbrido— pensando racionalmente sobre isso, não tinha sido nada além que a combinação de duas partes aleatórias.
Cherubim tinha a peculiaridade de ser capaz de cortar qualquer tipo de substância fazendo uso de temperaturas altamente concentradas.
Os Mashinensoldat tinham a habilidade característica de usar tanto o poder mágico do mago quanto o do próprio autômato.
Esses dois autômatos não possuíam nenhuma dessas peculiaridades. Entretanto, Griselda tinha aquela quantidade quase inesgotável de poder mágico junto com o Fio de Ariadne. Enquanto permanecessem com ela, os dois autômatos permaneceriam como a espada e o escudo absolutos.
Shin havia dito isso. Que o circuito Fragarach era originalmente uma espada divina que retornaria à mão de seu usuário depois de derrotar o inimigo por conta própria— nem uma única armadura poderia detê-lo.
Quem poderia pensar que, ironicamente, alguns autômatos dignos deste nome seriam completos plágios dessas técnicas.
O poder de Griselda era certamente devastador, mas—
O mesmo podia ser dito de seu oponente.
Uma imensa quantidade de poder mágico surgiu de baixo do chão que havia desmoronado.
— Esplêndido, Senhorita Weston.
A voz do Diretor ecoou pelo salão empoeirado.
Ele havia voltado para a superfície junto com a Rainha. Ele estava fazendo seus corpos flutuarem por meio de telecinese.
— …Embora eu tivesse certeza que tinha te pegado com aquele golpe. Acho que a sua reputação como o mago mais poderoso do século XIX não é mentira, afinal.
Griselda sorria amargamente. Assim como o Diretor. Ele passou a mão pela barba, surpreso, depois de olhar para a cratera criada no chão abaixo dele.
— É difícil acreditar que você conseguiu destruir este local reforçado magicamente dessa for—
Griselda lançou a espada, sem deixar que ele terminasse a frase.
A espada avançou em linha reta, mirando o pescoço da Rainha. Interferindo nisso, o Diretor bloqueou o ataque com sua barreira mágica— Griselda usou esse exato momento, quando o embate entre aquelas duas forças começou, para gritar para Raishin.
— Saia daqui seu pupilo idiota! Se você deixar essa oportunidade passar, você nunca mais vai conseguir passar por este homem!
Uma Wiseman tinha claramente dito essas palavras. O Diretor era forte assim.
Raishin tomou sua decisão. Depois de pegar rapidamente Alice em seus braços, ele cruzou a grande cratera com Yaya.
— Mu— Tudo bem, Ed? O pirralho está fugindo.
— Não importa. Vá, Raishin-kun.
Raishin parou depois de ouvir aquelas palavras inesperadas.
— Fazer uso até mesmo de uma Wiseman para enganar outras pessoas— que talento esplêndido. Você, que já foi ridicularizado como [Penúltimo], está tão poderoso agora. Gostaria de lhe dar um presente como recompensa por todos os seus esforços.
O Diretor estava mostrando a Raishin seu habitual sorriso gentil, o mesmo que ele usava com todos os seus alunos.
— Aproveite sua chance única na vida. Ninguém irá te interromper.
Uma oportunidade. Uma chance única na vida. Não podia ser—
Raishin começou a correr ainda mais depressa, ultrapassando Yaya quando atravessaram a passagem estreita diante deles.
O fim da passagem desembocava em um corredor exatamente igual ao anterior.
Tanto seu espaço como, claro, os vidros no teto eram os mesmos. No entanto, algo que o salão anterior não tinha estava parado no centro daquele novo local. Algo com a forma de uma baleia— um rígido navio alado.
— Um barco… eu acho?
Yaya inclinou a cabeça. Raishin estava surpreso.
— Uma versão reduzida do Daedalus…!? O que uma coisa como essa está fazendo dentro da Academia…!?
Raishin havia notado a presença dela no momento em que tentou fazer uma pergunta a Alice.
— Você é um inimigo do meu mestre?
Uma pergunta formal, desprovida de qualquer tipo de emoção. Uma garota com um véu sobre seu rosto, parada no topo do navio de guerra.
— Hotaru… se você está aqui, então…
— Aqui, Penúltimo.
Uma voz surgiu no ar, confirmando as dúvidas de Raishin.
Uma máscara de metal brilhando sob a luz do luar, cobrindo um par de olhos completamente vermelhos preenchidos com poder mágico.
— Magnus…!
O assassino de sua irmã estava naquele local.