Arco 3: Relaxamento
Capítulo 2
Outro dia com as novas residentes da Masmorra
Tradução: Tinky Winky
“Cara, isso foi cansativo. Lefi com certeza não gosta de pegar leve comigo, não é? Tipo, nossa. Por que ela sempre tem que levar tudo tão a sério…?”
Lyuu, a empregada, soltou um suspiro enquanto desabou em sua cama. Ela estava cansada. Na verdade, ela estava tão cansada que até se esqueceu de tirar o uniforme antes de tentar dormir.
No entanto, sua exaustão pareceu desaparecer rapidamente no momento em que ela plantou o rosto no colchão de seda embaixo dela. Era tão macio e fofo que quase parecia afastar suas queixas enquanto a envolvia em seu abraço gentil. As camas nos domínios de seu recém-descoberto Mestre eram simplesmente divinas. Todas as outras camas que ela já usou eram apenas tábuas de madeira de má qualidade em comparação. Dormir sobre elas sempre deixava suas articulações doendo todas as manhãs.
“Nossa. Você deveria ter mais cuidado. Seu uniforme vai acabar cheio de rugas se você continuar assim.”
“Certo…. Bom ponto.”
A cama era tão atraente que ela não conseguiu sair dela e tirar a roupa até que a outra empregada, Leila, a lembrou. E mesmo assim, suas ações carregavam consigo um pesado ar de relutância.
Havia muito pouco sob seu uniforme, então seu corpo foi exposto no momento em que o tirou. Ela era do lado mais esbelto, mas isso não era para ela dizer que parecia um homem ou uma criança. Sua figura era indubitavelmente feminina; ela tinha curvas em todos os lugares certos.
Lyuu e Leila se davam bem, apesar de pertencerem a raças diferentes. Isso, em parte, foi devido às suas heranças. Demônios, feras e demi-humanos se davam bem. Mas com isso dito, a disposição das espécies díspares de cooperar umas com as outras não era natural, nascida de uma influência externa. As raças viviam em ambientes diferentes e tinham costumes culturais diferentes. A única razão pela qual eles estavam tão dispostos a aceitar uns aos outros era porque os humanos discriminavam todos eles igualmente. Trataram todos como lixo. As nações humanas eram maiores e tendiam a ser mais poderosas, então as raças realmente não tinham escolha a não ser se dar bem, ou correriam o risco de serem derrubadas pelos humanos no meio do conflito.
Os elfos eram a única raça que os humanos não podiam antagonizar descuidadamente. Como habitantes da floresta, eles eram capazes de fazer uso dos “Segredos da Floresta”, que os humanos sabiam que poderiam causar danos incríveis. Para esse fim, elfos e humanos evitavam intencionalmente entrar no caminho uns dos outros; ambas as partes praticaram a não interferência. Todas as outras raças foram forçadas a enfrentar o desejo de conquista dos humanos. Ou seja, os humanos e as outras três raças não-elfas estiveram presos em uma série de escaramuças e guerras por centenas e centenas de anos.
No início, foi um impasse. Mas nos últimos anos, as marés da guerra começaram a mudar.
A favor dos humanos.
Individualmente falando, os humanos eram fracos. Um a um, os humanos eram menos temíveis em combate do que todas as outras raças, mas possuíam uma característica mortal que nenhuma das outras raças poderia superar: números. Eles sobrepujaram as outras raças não pela qualidade de seus guerreiros, mas sim pela quantidade. Todas as outras raças quase sempre se encontravam em desvantagem numérica de dez para um no campo de batalha.
E era por isso que os demônios, feras e demi-humanos tratavam uns aos outros com bondade. Eles perceberam que precisavam cooperar para lidar com a ameaça humana iminente.
“Ah, sim, acho que estou um pouco atrasado para perguntar, mas por que você decidiu ficar para trás de qualquer maneira?”
“Eu poderia jurar que já dei minha razão. Acho que disse que estava aqui porque queria pagar minha dívida…
— Sim, certo.
Lyuu, que estava no meio de colocar a camisola fofa presenteada a ela por seu mestre, interrompeu Leila enquanto revirava os olhos.
“Eu sei que é isso que você está dizendo, mas eu não estou pedindo isso. Eu quero saber como você realmente se sente. Tenho certeza de que você tem outro motivo escondido em algum lugar, visto que você é um demônio ovelha com chifres, sabe?
Beastkin e demônios eram ambas as raças que continham uma série de diferentes sub-raças. Cada sub-raça foi dividida em clãs. Tanto os animais selvagens quanto os demônios tinham a tendência de anexar os nomes de seus clãs aos seus próprios nomes para diferenciar entre diferentes grupos dentro da mesma espécie.
Claro, a própria Lyuu não foi exceção às regras. O Gyroll em seu nome era na verdade o nome de seu clã.
Ela sabia que Leila era um demônio e, portanto, deveria ter um segundo nome para dar. Mas, apesar disso, ela se autodenominava Leila e nada mais. No que dizia respeito a Lyuu, sua falta de um nome de clã era uma indicação inoperante do fato de que ela era um demônio ovelha com chifres. Havia um único clã de ovelhas com chifres, então eles não precisavam de um identificador adicional.
Demônios ovelhas com chifres eram notórios por duas razões muito conhecidas. A primeira era que eram todas do sexo feminino, e a segunda era que todo o clã era formado por acadêmicos muito curiosos, ou estudiosos, como outros os chamavam. Esses estudiosos eram ridiculamente curiosos. Eles encontrariam algo para ficar obcecados e se envolveriam tanto em suas pesquisas que renunciariam ao descanso e à nutrição apenas para aprender um pouco mais.
Eles eram tão famosos entre os demônios que o conhecimento de suas excentricidades não apenas se espalhou para os animais, mas também se integrou ao seu senso comum.
Apesar disso, o benfeitor das empregadas parecia não saber.
“Bem, eu não estava mentindo, pelo menos. Eu efetivamente desisti da vida no momento em que me tornei uma escrava. Nosso Senhor me salvou de viver o resto dos meus dias como uma ferramenta miserável, e estou realmente grata por ele ter feito isso”, disse Leila, seus lábios curvados em um leve sorriso. “Mas o mais importante, você não o acha interessante? A maioria dos Lordes Demônios são violentos e bons para nada que não possuem até mesmo a capacidade de processar o pensamento lógico. Nosso Senhor, por outro lado, é claramente um intelectual capaz de raciocinar. Você não acha que esta é a oportunidade perfeita para descobrir o desconhecido? Para aprender mais sobre labirintos e talvez até a raça Lorde Demônio como um todo? Não seria um desperdício jogar fora essa chance maravilhosa? Esta excelente oportunidade?”
“U-uh… Claro…”
Lyuu não pôde deixar de assentir desajeitadamente. Ela sempre pensou em Leila como calma, composta e aparentemente despreocupada, então ela não pôde deixar de se surpreender com a explosão repentina e apaixonada da outra empregada. Simplesmente olhar para ela como ela era agora era o suficiente para abrir os olhos do lobo de guerra para o fato de que Leila realmente era um membro do clã das ovelhas com chifres.
“Então você já descobriu alguma coisa?”
“Não exatamente. Eu só descobri três fatos até agora. A primeira é que nosso Senhor possui uma habilidade misteriosa demais para eu definir ainda. Em segundo lugar, ele é uma pessoa bastante interessante de se observar devido à natureza de suas excentricidades. Finalmente, ele adora Lefi e Illuna, e não pararia por nada para garantir sua segurança.”
“Você sabe o que…? Eu acho que você está certa. Nosso mestre é meio estranho, não é?”
Se Lyuu tentasse resumir seu mestre em uma única palavra, ela sem dúvida escolheria a palavra “misteriosa”.
Seu mestre sempre produzia ferramentas do tipo que ela nunca tinha ouvido falar, muito menos visto, e as manipulava com a habilidade de um artesão experiente. Ele era capaz de lançar os feitiços mais devastadoramente poderosos como se não fosse nada além de brincadeira de criança. E, no entanto, ele de alguma forma não tinha bom senso. Muitas das coisas que ele não sabia eram fatos básicos que até a criança mais nova podia recitar.
Ainda assim, ele irradiava calor. Sua presença deixou seu coração à vontade, embora ela mal o conhecesse.
E foi precisamente por isso que ela pensou que a maneira mais precisa de descrevê-lo era rotulá-lo como uma anomalia cheia de mistério.
Lyuu teve que admitir que ela adoraria trabalhar para ele mesmo que ele não fosse tão caloroso e reconfortante. Ela não foi gritada aqui. E embora ela fosse tecnicamente uma empregada, ela não se sentia tão restrita quanto uma empregada deveria ser. A loba de guerra tinha mais ou menos permissão para fazer o que quisesse. Ela era frequentemente forçada a brincar com as pessoas, mas ela sempre acabava gostando no final, então ela não se importava particularmente. Sua única reclamação, se ela realmente tivesse que citar uma, era que um certo indivíduo imaturo não parava de forçá-la a revanches porque esse indivíduo odiava perder.
Além disso, esse único demérito foi efetivamente tornado irrelevante em face das deliciosas refeições que ela se via tendo no dia a dia, a confortável fonte termal em que ela podia entrar quando quisesse e a cama sobrenatural que a esperava todas as noites. Lyuu honestamente achava que seu ambiente de trabalho era o melhor que havia. Ela não conseguia nem começar a imaginar nada superando isso, especialmente porque havia um Fenrir por perto. A loba estava um pouco triste por ela não o ter visto com muita frequência ultimamente, mas, novamente, todos os outros benefícios fizeram com que ela não se importasse particularmente.
Ela tinha certeza de que seus amigos em casa acabariam rangendo os dentes de inveja se ela lhes contasse sobre suas circunstâncias.
“Eu não acho que o Mestre realmente se importaria, sabe? Você pode muito bem sair e contar a ele.
“Não discordo. No entanto, desejo observar nosso Senhor e seu labirinto em seus estados mais naturais. Acredito que seria muito menos difícil para mim realizar observações imparciais sem o consentimento dele do que a alternativa.”
“Sim, acho que você está certa.” Lyu assentiu. “Ele pode ficar consciente disso e agir um pouco diferente ao seu redor se souber que você o está observando.”
“Ok, isso é o suficiente sobre mim. Por que não falamos sobre você em vez disso?” perguntou Leila. “Lembro-me de ouvir algo sobre o clã Gyroll, que por acaso lidera a subespécie de lobos de guerra como um todo. A filha do pobre chefe fugiu de casa recentemente. Eu não suponho que você vá—”
“Uwaaaahhh!?”
Lyuu começou a agitar os braços freneticamente por puro pânico enquanto cortava a outra garota na tentativa de impedi-la de dizer mais alguma coisa.
“C-Como você sabia!? E-espere, quero dizer, uhm…”
Mas ela falhou espetacularmente e acabou confirmando as suspeitas da outra empregada por conta própria.
“Não se preocupe, eu não sou do tipo que fala. No entanto, não posso garantir que não cometerei um pequeno erro ou dois se você contar a outra pessoa meu segredo.
“E-eu prometo que não vou contar a ninguém, então certifique-se de não dizer nada sobre mim também, ok!?”
Embora Leila estivesse perfeitamente satisfeita, tendo alcançado seu objetivo, ela não pôde deixar de questionar os motivos de sua colega empregada.
“Você parece bastante interessada em manter sua identidade em segredo, mas… por quê? Há algum demérito em deixar nosso Senhor saber?”
“E-eu quero dizer… não é apenas, você sabe, constrangedor? Quer dizer, eu não sou exatamente o que as pessoas imaginam quando você pensa em ‘filha de um chefe’”.
Leila deu um sorriso irônico enquanto observava Lyuu se mexendo na tentativa de esconder seu constrangimento.
“Do que você está falando, Lyuu? Você é muito fofa.”
“S-Sério? Eu não sei, eu realmente não acho que eu sou…”
“Sim, agora por que não vamos para a cama? Eu sei que não somos obrigadas a acordar cedo, mas acho que ainda devemos fazer o nosso melhor para sair da cama antes de nosso Senhor.”
Leila estendeu a mão para o abajur ao lado da cama e o desligou.
“Ugh… eu sinto que você me enganou totalmente, mas tudo bem. Boa noite, Leila.
“Boa noite, Lyu.”
