O Soberano De Ossos
As estradas eram silenciosas, o entardecer tinha seu certo charme, sendo grande parte disso, graças ao pôr do sol de Avrath. O sol laranja ganhava tons rosados ao se pôr, deixando o céu com um aspecto vermelho, uma pintura formada por todas as vezes que as cores eram colocadas entre as nuvens de Jahän. Era o perfeito cenário para um romance, para um beijo apaixonado entre um par de amantes, para a morte de um guerreiro que buscou a paz em meio a fúria. Provável que até mesmo já tivesse carregado uma dessas histórias, mas este era o último dos pensamentos em que Zeliarsa conseguiu focar. A grisalha tombava sua cabeça para o lado, enquanto caminhava atrás de Elegor. Antes, quando era uma pilha de ossos que se mantinha em pé como um boneco de ventríloquo, o encarar por tempo demais lhe causava profundo desconforto. No entanto, naquela forma, a visão dele ficava menos agressiva aos olhos.
Ainda na caverna, ela havia insistido para que ele se vestisse, já que andar nu para a criatura parecia natural. As roupas não faltavam, já que a carnificina deixada pelo demônio, possibilitou que ele até mesmo pudesse escolher a cor. Zeliarsa sempre odiou a ideia de pilhar um cadáver. Estar com algo de um morto, a deixava desconfortável, mesmo assim, tomou os restos de alguns equipamentos, armas, e gômios que os infelizes que cruzaram seu caminho tinham em seus bolsos. Não era muito, mas conseguiria pagar ao menos uma refeição.
Já estavam caminhando em torno de duas a três horas, o silêncio fazia a elfa apertar seu novo arco de maneira mais firme. Arranhando a madeira que compunha a arma com a ponta de suas unhas. As visões ainda continuavam turvas em sua mente, mas a confirmação da verdade sobre elas a deixava inquieta, e gostando ou não, sentindo ainda desprezo por Elegor.
Ela agora era parte de algo maior do que si mesma, contra sua própria vontade.
— Quantas pessoas sabem? — Perguntou a elfa, repousando o arco roubado em suas costas.
— Do que exatamente? — O rapaz virou a cabeça para ela, encarando-a por cima do ombro.
— Você sabe do que estou falando, quantas pessoas sabem desse artefato? — Disse a elfa dando uma curta corrida para alcançar o loiro, andando agora ao seu lado.
— Os bafomios, os elfos, kitsunes… todos aqueles que tiveram o interesse de aprender sobre ele, era um conhecimento que não deveria ficar guardado.
Zeliarsa deu um tapa sobre sua própria testa, mordendo o lábio ao absorver aquela afirmação.
— Quais as chances que temos de conseguir de volta? Sendo somente você, fraco como está, e eu sendo uma plaqueta de cobre? — Perguntou a elfa mordendo o polegar, segurando toda a ansiedade que transpunha seu corpo.
— Quase nula, por isso, teremos de reunir mais aliados — Concluiu o rapaz, parando seu caminhar.
— E quem compraria essa maluquice? Tem ciência do que está prestes a fazer? Isso é considerado blasfêmia, heresia é punível com pena de morte! — Retrucou a elfa a ele, tomando coragem para o segurar pelo braço.
A sensação era como segurar um pedaço de aço, sua pele era fria, e quando falava, Zeliarsa não conseguia sentir o ar deixando a boca do rapaz. Seu peito também não levantava e baixava para inspirar e expirar. Mas de qualquer forma, o desespero por sua vida ainda era maior.
— Você teme pela minha vida? — Perguntou o rapaz de olhos vazios.
— Não, eu temo pela minha vida, se existe a menor chance de você morrer novamente eu não dou a foda — Disse a elfa o encarando.
— Eu te odeio, mais do que qualquer coisa nesse mundo eu gostaria de ter forças para matar você, mas, se o que você me mostrou é verdade, eu iria me odiar se ficasse parada deixando isso acontecer — Concluiu a elfa o soltando.
O rapaz ficou em silêncio, Zeliarsa segurava seu peito sentindo seu coração bater num palpitar descompassado, tentando conter o pavor ela lutava contra os impulsos para não tremer. Não cederia facilmente, mesmo que suas pernas estivessem bambas, ela se manteria de pé não importa o quanto fosse necessário.
— Então se você me quer ao seu lado, não esconda as informações de mim, pois estou cansada de me enforcar com meus próprios pensamentos e paranóias.
A criatura ficou em silêncio, estendendo sua mão a Zeliarsa, a cor pálida da pele do rapaz tinha uma certa vermelhidão quando de encontro ao sol, mas não parecia que iria bronzear, e sim acabar o ferindo de certa forma.
— Eu aceito esses termos — Disse o homem lhe oferecendo a mão.
— Então me conte, por que estamos caminhando na estrada há tanto tempo? — Disse a elfa agarrando aqueles dedos gélidos.
O homem se virou pra estrada, não estavam tão longe do limite do Lúmia, e tão pouco, da primeira vila após o rochedo côncavo. Ele estendeu a mão a frente, encarando o horizonte com indiferença.
— À frente, existe uma bifurcação, o rochedo côncavo que leva a Vila do rochedo côncavo e a queda de Sarmirfa, entre estes caminhos, uma caravana de traficantes de escravos se encontra, pois dois dos cavalos se perderam numa tempestade.
Ele se virou para a elfa devagar, os olhos já começavam a parecer menos vivos, e agora, ela percebera que as veias no pescoço do rapaz tinham um tom de profundo azul.
— Eu vou matá-los — Disse ele abrindo um sorriso.
— Mas por quê? Você se importa com as pessoas que estão acorrentadas? — Perguntou ela incrédula com aquela tomada de atitude.
— Não, mas eles possuem armas e equipamentos que nos serão úteis.
— Você sequer tem um plano? Porque lutar contra mercenários no meio da estrada não parece o melhor raciocínio possível, a minha aljava só tem cinco flechas e você mal sabe manusear uma espada pelo que pude perceber.
— Sim, eu tenho.
— Então não faça cerimônias, e me conte, o que tem em mente?
— Vamos esperar o cair da noite, eu irei pela frente, usando este corpo, enquanto você pode flanquear-los contornando seu acampamento.
— Emboscar emboscadores? — Zeliarsa deu um riso cínico — Não sabia que você tinha tendências suicidas.
— Certo, o que você planeja fazer entrando pela frente usando somente uma espada curta? Abraça-los? Existem lanças e montantes do outro lado, talvez até mesmo um arqueiro já que estou com um arco em mãos.
— Eu vou os assustar, é isso que vou fazer. — Disse o rapaz.
— Ah, bem, você é realmente bom nisso — Respondeu Zel.
A elfa encarou suas botas, começando a caminhar de um lado para o outro, estava pensativa, como aquilo poderia dar certo sem o mínimo de preparo para um combate? Isso não conseguia passar por sua cabeça sem que ela parasse para pensar duas ou três vezes melhor sobre aquela loucura.
— E depois que os assustar? Acha que eles vão entregar as armas e equipamentos de bom grado? Sem chance, vai ser um ataque desesperado.
— Eu pretendia tomar seus corpos, se eu fosse transmutando de um pra um, poderia lidar com a situação sem problemas.
— Pelos Deuses Elegor! — Exclamou a elfa jogando os braços para cima e tornando a encarar o rapaz impaciente — Você esteve dormindo por cem anos e pouco, você não sabe como as armas evoluíram, não é?!
Ela estendeu uma das mãos a ele com a palma aberta, do chão, recolheu uma pequena pedrinha que mal ocupava espaço ali, e então, forçando sua melhor didática, a elfa começou a falar.
— Esse é você, Elegor, essa pequena pedrinha assustadora, que esteve fora desse mundo por mais de cem anos, correto? — A elfa não esperou uma resposta, ela nunca precisou— De cem anos pra cá, as coisas mudam, eu não tenho certeza como as coisas funcionavam antes, mas assim como a tecnologia, a magia também avança.
Zeliarsa pegou a pedrinha com a outra mão, entoou uma voz escrachada numa imitação a profundidade da de Elegor, inflando as bochechas para satirizar a maneira que ele falava.
— Vejam só, eu sou o morto-vivo com poderes necromantes, temam a mim mortais! — Disse Zeliarsa balançando a pedrinha, seu dedo do meio da outra mão ficou de pé enquanto os outros quatro permaneciam fechados.
— E eu sou qualquer imbecil! Usando um feitiço simples conhecido como “desabilitar mortos-vivos” ou “proteção divina”, ou melhor eu sou um necromante com poderes de controlar mortos vivos! Toma esse monstrão!
O dedo do meio bateu na pedrinha a fazendo rolar no chão, Zeliarsa então a esmagou fazendo sons crocantes enquanto a pedra virava areia embaixo de sua sola.
— Resumindo, é arriscado demais você ir pela frente que nem um idiota, é um plano estúpido.
— Então, o que você sugere? — Disse o rapaz saindo da trilha para sentar-se no gramado raso próximo a ela.
— Bom, eu acho que vamos ter que fazer um reconhecimento da área primeiro, tipo de terreno, número de inimigos e pensarmos se algum deles é conjurador ou não — Respondeu a elfa sentando-se à frente dele com os braços repousando sobre as pernas cruzadas.
— Eles têm sete guardas, dois possuem espadas longas, dois besteiros, e mais três para contenção de gaiolas de equipamento variado, parte do grupo principal saiu para a operação de troca.
Zeliarsa ficou em silêncio, demorou alguns segundos para conseguir processar, e também digerir a tamanha certeza com que Elegor afirmava aquela frase.
— Como você sabe disso? — Perguntou ela alçando uma das sobrancelhas.
— Do mesmo jeito que sei sobre o seu passado, sei sobre o passado deste corpo — Ele a respondeu com indiferença.
— Certo, vamos com calma — Disse a elfa o olhando com certa curiosidade — Como você está controlando esse corpo, eu pensava ser necromancia, mas eu não estou morta… ou estou?
— Não, você não está morta, eu não estou controlando o corpo deste homem, mas sim os ossos, o corpo é apenas um revestimento em torno disso, em breve ele irá se desfazer.
A elfa o encarou por alguns segundos, tateando seus próprios ombros com desgosto ao pensar no fato de que, seus ossos estavam sendo controlados por outra pessoa que não fosse ela mesma.
— É melhor eu não pensar muito nisso, ou vou acabar enlouquecendo — Disse a elfa tocando o próprio corpo com certo receio das palavras.
Enclausurado em seus próprios pensamentos, pedras e cobertor, Bahulo dormia tranquilamente em uma pequena fissura formada em uma das paredes da masmorra. O pequeno espaço era forrado com palha, lã e um manto grosso o suficiente para que não deixasse o frio o afetar. Seu mundo todo se encontrava ali, na sala que poderia chamar de lar, seus anos de estudos, velhos cajados, e seu manto de Korvo. Seu amado e sujo manto de Korvo. A pequena pira central aquecia o ambiente, “fogo de conforto”, ótima invenção élfica. não era barato, claro, mas se era o exército que pagava, não havia motivo para se preocupar. Como em todos os dias, antes de dormir, gostava de observar o fogo da pira queimando, escutando seus estalos falsos com um sorriso tranquilo. Conforme o tempo fora passando, as necessidades de deixar a masmorra em sua vida foram diminuindo. Tinha tudo que precisava ali, comida, medicamentos, uma cama e todos os livros que poderia pedir. Tudo isso com um extra, poder praticar sua arte em paz, sem que os olhares de julgamento e plebeus ignorantes ficassem em seu caminho, era o que alguns poderiam considerar “o emprego dos sonhos”. Mesmo assim, sua paz não podia ser garantida somente com aquele conforto, pois até na segurança da masmorra, algo lhe tirava de seu sossêgo. Batidas fortes em sua porta o fizeram despertar.
— Gnomo, abra a porta! — Disse Andlhiio com sua voz autoritária.
O pequeno se levantou um tanto confuso, não costumava receber visitas de oficiais em seu consultório, e tão pouco, em seus aposentos. Desprezo era algo cujo já havia se habituado, afinal, necromancia era considerada uma heresia, apesar de nunca ter sido deixada totalmente de ser praticada.
— Já vai, já vai… — Disse ele rolando para a ponta da fissura, para vestir suas pequenas botas já gastas e sujas de sangue.
Esfregando os olhos e bocejando, o loiro caminhou até a porta, onde se esticou para alcançar a maçaneta e a puxar para trás, ele olhou para cima, encarando o soldado armadurado com aquela cara amassada.
— Algum problema, senhor? — Perguntou o pequeno bocejando.
— Precisamos de você na outra sala, é uma questão de urgência — Disse o guarda com uma voz autoritária e ríspida.
O pequeno arregalou os olhos, uma dúvida começou a surgir no fundo de seus pensamentos, ele não questionou, afinal de contas, se precisavam de um “abutre” com urgência, é porque de certo a situação seria grave. Uma das condições para que continuasse vivo e operando, era seguir as ordens que lhes fossem dadas e auxiliar ao exército ou nobres quando lhe fosse ordenado. Ele fazia muito disso, trazer mortos de volta para cumprimentar seus parentes uma última vez, restaurar memórias, ou até mesmo restituir monstros para guardar as fortalezas. A única coisa que lhe incomodava, é que nunca lhe agradeceram pelo trabalho. Quando próximo ao corredor, sentiu um estranhamento imediato, dois lanceiros guardavam a porta de seu consultório, com aquela falta de expressão em seus rostos. Os brasões das armaduras o incomodavam, a alta patente destacada em volta do círculo dourado, era exibida com orgulho. Escoltado pelo jovem guarda, Bahulo continuou até o fim do corredor, e quando a porta se abriu sua garganta secou.
— Senhor, aqui está o necromante — Disse o jovem se curvando perante a figura à sua frente.
O silêncio na sala era imediato, tal como o tremor nos joelhos do abutre, próximo a sua mesa, lendo suas anotações por cima do ombro com uma das mãos apoiada na espada, estava a figura de autoridade máxima da guarda gominiana, Lhakias Vantramor. As ombreiras com cabeças de dragões incrustadas com joias encaravam o pequeno abutre, o grande sol desenhado em seu peito era como um brilho em meio a escuridão. Os olhos de duas cores deslizavam do papel até o pequeno que acabara de entrar, Bahulo gelou, conhecia a armadura dos cânticos. O olhar de fogo e ouro, o perfeito equilíbrio entre justiça e crueldade. Era a representação da vontade real em um único homem, a própria personificação da justiça.
— Boa noite, senhor Bahulo — Disse aquela imagem autoritária se aproximando.
O pequeno ficou estático, sua língua se enrolou em si própria e seus lábios travaram. Bahulo se prostrou aos pés do homem, baixando sua cabeça não por servidão ou respeito, mas por pavor.
— Eu não o mandei se ajoelhar — Disse a figura colocando uma das mãos nos trapos que envolviam o frágil corpo de Bahulo, o puxando de volta para ficar em pé.
— P-Perdão, senhor! — Disse o pequeno ainda de cabeça baixa.
— Se acalme, eu não vou lhe fazer mal, pelo contrário, venho a seu encontro para lhe pedir auxílio — Concluiu o homem, estendendo uma das mãos a Bahulo.
O pequeno arregalou os olhos por costume, quando o homem lhe estendeu a mão, o pequeno abutre recuou. Mantendo seu voto de submissão o mais integro que poderia, mesmo assim, o gigante a sua frente insistiu.
— Algo de errado, cavalheiro? — Perguntou Lhakias lhe apertando o ombro.
— Não senhor… apenas não posso macular sua imagem, se eu tocar em sua mão, estaria lhe trazendo más energias — Respondeu o necromante.
O homem lhe forçou a tomar-lhe a mão, a manopla da armadura ao encostar em Bahulo soltou um chiado, como se estivesse cozinhando a carne do pequeno.
— Não partilho desse pensamento atrasado.
Os homens olharam a cena com total calma e serenidade, já Andlhiio, espantado com aquilo, tinha seu queixo batendo em seus próprios pés de surpresa. Era como se tivesse entrado em profundo choque. O pequeno assustado ficou encarando sua mão, o homem à sua frente lhe deu um sorriso.
— Perdão o incomodar em sua noite de sono senhor, mas existem assuntos de extrema urgência que necessitam de sua experiência profissional— Disse o enorme homem se voltando a alguns lençóis dispostos ali.
Bahulo não era ingênuo, e tão pouco inexperiente, reconhecia o cheiro pútrido e formato por baixo dos lençóis, eram corpos, dois homens e uma mulher. O gigante a sua frente retirava sua manopla estendendo uma das mãos aos lençóis. E com um súbito puxão, as figuras se revelaram, dois homens sem cabeça, e uma mulher. Um guerreiro, um ladrão e uma sacerdotisa.
— Preciso que você avalie essa situação para mim— Disse Lhakias se virando ao pequeno.
Um choro baixo em meio a fina penumbra da noite, como um farol na tempestade, um resquício de inocência. Uma garotinha cujo devia ter entre seis a sete verões, abraçava a sua mãe. O rosto pálido junto ao fato de estar trêmula, eram indícios claros que estava doente, sua subnutrição evidente pelos ossos aparentes em seu corpo, assinava a sentença de que talvez, não durasse mais do que dois dias. Sua mãe, uma mulher baixa de longos cabelos escuros e tão magra quanto sua criança, tinha os olhos vermelhos e irritados. Ela cantarolava uma música de ninar em voz baixa, velando o sono de sua pequena que se agarrava fraca aos trapos que usavam. A voz ia ficando cada vez mais baixa, todas as vezes que a mulher se esforçava para prosseguir com uma estrofe. Os lábios rachados não conseguiam gerar bem saliva, sendo talvez o motivo, sua desidratação.
— Cale a boca, puta! — Uma voz grave exclama pra mulher enquanto algo metálico bateu contra as grades da jaula.
A mulher se calou, recolhendo o corpo e abraçando a criança de maneira mais forte, tentando a esconder em seu seio. Os grilhões em suas pernas a impediam de achar uma posição confortável. Em sua jaula, a única posição que poderia descansar precisaria que sua pequena lhe fosse tomada. E aquilo sim seria um destino pior que a morte. Então preferia sacrificar de sua coluna, para que não o tivesse que fazer com sua alma.
A mulher repousou os olhos, já não dormia a dois dias e seu corpo começava a cobrar, um último choro sem lágrimas, com uma tosse sôfrega que parecia querer explodir seus pulmões antes de finalmente, dormir. Tempo depois, a jaula era aberta, as barras de ferro pareciam gritar quando puxadas com tamanha brutalidade, um jato veio de encontro ao rosto da mulher, ela despertou. Estava molhada, agora respirando ofegante, com o coração parecendo que ia explodir. Ela tentou jogar os cabelos para trás, para conseguir enxergar. Mas mais rápido do que ela, fora o agressor.
— Mãe! Socorro! — exclamava a pequena de cabelos negros enquanto tentava alcançar sua mãe.
A mulher lançou o olhar para cima, um dos homens, carrancudo e de barba rala estava com um sorriso sádico vendo aquela situação. Ele segurava a pequena por um dos braços, a puxando para fora da jaula enquanto ria. O outro que o acompanhava, apenas o encarava rindo, apoiado em outra jaula onde repousava um idoso.
— Quieta pirralha! Se não ficar quieta vamos te dar de banquete pro nosso amigo urso — Disse ele tampando a boca da criança que se debatia em meio às lágrimas.
A mulher se estendeu desesperada a filha, a coleira em seu pescoço a forçou a voltar para trás. Os braços ainda se estendiam para a pequena, mesmo sendo inútil. Sua garganta era cortada devido o aço estar em um estado asqueroso, uma fina linha de sangue começa a escorrer e ela recua. Se puxasse demais, a coleira cortaria seu pescoço e morreria pelo sangramento. Sem forças para gritar, sem formas de lutar. Ela aceitou, engolindo em seco o próprio choro, ela sabia o que o homem queria, pois ele já sussurrava todas as noites o que iria fazer quando o grupo de negociação saísse. Toda santa noite. Ele dizia o que iria fazer com aquele sorriso nos lábios, sem descanso. Sem se cansar. Ela preferia a morte do que sua pequena machucada, então sem resistir mais, com as lágrimas se acumulando pelas laterais, a mulher disse quase sem voz:
— P-Por…favor… — Disse ela espaçadamente, estendendo os dedos finos e sujos a ele. — Faça o que quiser comigo, mas poupe ela.
— Parece que você vai se divertir hoje à noite hein, Rod — Disse o parceiro do bruto que agora, cuspia em cima do velho.
O bruto então sorriu, coçando algumas vezes sua barba rala enquanto lambia os lábios, ele segurou a cabeça da pequena batendo-a contra a jaula. A criança cai em espasmos, e então, desvanece, a mulher parou. Um zumbido infernal tomou conta de seus ouvidos enquanto as lágrimas lhe tomavam o rosto.
— Ops, parece que a baixinha vai ter uns sonhos bem pesados.
A mulher ficou estática, enquanto o homem chutava a criança pro lado com um chute em seu estômago. Logo, sua atenção predatória voltou-se a mãe, mordendo o lábio inferior, o bruto começava a puxar o cós de sua calça.
— Viu? Eu sou um doce, até a coloquei para dormir por você — Disse o homem com uma risada escrachada, olhando agora para seu parceiro.
Outros dentro das jaulas ali olhavam aterrorizados, alguns com indiferença, e um garoto magricela, de cabelos longos e negros sussurrou “Que os deuses tenham piedade de nós.”
— Os deuses não vão ligar se vocês vivem ou morrem, escravos de merda — Respondeu Rod, que chutou a jaula do rapaz que havia dito.
O bruto, escutando o comentário de seu companheiro, caiu em gargalhada enquanto esticou um dos braços para dentro da jaula, puxando a morena pelos cabelos.
— Isso mesmo! Agora olhem aqui o que vou fazer com ela seus desgraçados, isso aqui é o que todos vocês merecem!
As mãos calejadas e grosseiras se agarravam ao trapo que a mulher usava o rasgando, o homem baixou sua espada a jogando de lado, da mesma forma que deitava sua cabeça para trás. Outros olhares em meio à escuridão se fizeram presentes. Homens, mulheres e crianças, uns piores que os outros. A mulher não reagiu.
— Não se preocupe docinho, vou cuidar muito bem de vo… — A fala do maior fora interrompida.
Em um estalo sua voz sumira, o olhar de desespero de seu parceiro se fez presente junto a um grito do mesmo. O bruto não havia entendido, lentamente, olhou para o incômodo que começava a sentir em sua garganta, junto a uma sensação molhada e quente que agora começava a fluir por seu corpo. Uma flecha havia atravessado sua traqueia, sua carne estava exposta e o cabo da mesma ensanguentado. Rod correu para o auxílio de seu amigo, e então, outros gritos começaram a surgir. Uma bola de fogo engolfou as tendas a frente, junto a palavras desconexas: “Que porra é aquela?! Por que ele não cai?!”. O corpo do enorme homem caia sobre a mulher, a sujando com o sangue do agressor. E então, outra flecha, uma que pega no peito do rapaz que ainda ficava de pé, ele berrou ao sentir sua carne sendo perfurada.
— Merda! Socorro! SOCORRO! CLYDE!! — Disse um besteiro correndo para longe das tendas.
As pernas dele subitamente pararam de se mover. Ele ajoelhou, em meio ao fogo, um jovem magricela com a pele derretida começava a caminhar. Rod estava confuso, o que merda estava acontecendo?! Onde estava o feiticeiro encarregado?! Aquela imagem grotesca e bizarra se aproximava de seu colega, Rod só conseguia assistir de cabeça erguida, respirando forçadamente até outra flecha atravessar seu crânio, esmagando os olhos durante a penetração dos ossos. O homem rendido começava a se contorcer em dor, e logo, sua garganta era cortada por Elegor, utilizando a espada quase sem manejo. Um quarto que estava escondido dentro das barracas, empurrou uma das jaulas em cima do rapaz demoníaco e então saiu correndo na outra direção.
— VOCÊ NÃO VAI ME PEGAR DEMÔNIO! — Exclamou o pequeno que saira correndo, enquanto Elegor se levantava do chão.
A correria não durou mais do que alguns momentos, uma flecha atravessou o tornozelo do rapaz o fazendo gritar em agonia. Ele caiu no chão ralando o rosto em pedras pontiagudas, e enquanto segurava sua perna urrando com a dor, contendo seu pranto com lágrimas sôfregas, ele estendeu uma das mãos ensaguentadas a Elegor. Sua carne já estava consumida, sua pele derretia lentamente e parte dos ossos de seu corpo já começavam a aparecer. Mas ele não parecia se importar. Os chifres e presas diabólicas estavam saltados, os olhos, não estavam vazios dessa vez. Não mais, tinham fúria.
— Bom trabalho Zeliarsa — Disse a criatura caminhando até o homem que se debatia.
Em meio as árvores, uma voz doce e serena se fez presente, acompanhada de passos leves.
— De nada — Disse a elfa saindo de dentro da floresta.
O homem encarou o profundo vazio das órbitas de Elegor, e então exclamou com sua voz mais estridente e imponente.
— Te afastes criatura! Ou te banirei para sempre deste reino! — Exclamava o homem desenhando algo no ar.
— Não, você não vai… primeiro, você não é conjurador, o cara que saiu pra mijar a pouco tempo e teve a garganta cortada dentro da mata era — Disse Zeliarsa abrindo um sorriso cínico — Fora que, pra você sequer lançar uma magia, precisaria de um condutor não?
A elfa iria o ironizar, não que estivesse gostando da carnificina, nem que tivesse proveito, mas já era de sua personalidade, iria o fazer, até reparar bem no local que estavam. O sorriso cínico da elfa murchou, ela encarava as pessoas enjauladas pasma. Estavam como animais em uma feira, cabeças humanas em espetos fora do acampamento como sinais de aviso, mulheres com os corpos à mostra, e idosos com roxos que pareciam até que suas carnes estavam apodrecendo. E então, seus olhos pararam naquela cena. A criança já no chão.
— Não, não, não, eles não podem ter feito isso com uma criança… — Disse Zeliarsa correndo em direção a pequena.
Quando próxima ao corpo, a elfa se atirou no chão, começando a tatear a pequena, a pegando em seus braços. O hematoma em sua cabeça jorrava sangue. Já não reagia e tão pouco respirava. Zeliarsa sentiu um aperto no peito, uma ausência de ânimo, um vazio enquanto velava o corpo da criança. Logo, um calor se fez presente, se arrastando até Zeliarsa, a mãe moribunda tocava a pequena.
— M-minha… prin…cesinha — Disse a mulher, com uma voz trêmula e chorosa.
Como um predador, ela tomou o corpo da criança das mãos de Zeliarsa, a elfa parou, se virando a Elegor que encarava a cena apático. O homem no chão olhava aquilo confuso, aproveitando a guarda baixa do loiro para tentar buscar uma lâmina caída no chão. Zeliarsa se levantou, caminhando em direção ao homem com um olhar furioso, como se sua raiva transbordasse para fora dos olhos.
— Onde estão as chaves das gaiolas?! — Exclamou a elfa pegando o homem pelo pescoço e lhe desferindo um soco.
O sangue da elfa fervia, e Elegor apenas assistia sem mover um só dedo.
— E-Eu não sei! Eu não cuido disso! — Respondeu o rapaz tentando cobrir o rosto.
— Escuta aqui seu merda, acredite ou não, mas eu sou bem mais razoável, que o meu amigo esqueleto aqui do lado — Exclamou Zeliarsa em fúria, enquanto trazia a lâmina do próprio homem contra o pescoço do mesmo.
— Mesmo assim, eu quero muito cortar o seu pau fora, e fazer você comer ele — Disse a elfa tremendo em fúria, colocando um de seus joelhos sobre a virilha do homem começando a apertar enquanto pressionava a espada — Então, se você não me contar onde estão as merdas das chaves, eu juro que vou deixar o esqueleto cuidar de você, e se eu já quero te foder dessa forma, imagine o que ele não quer fazer…
Elegor virou sua cabeça lentamente até a mãe, a mulher acariciava os cabelos da filha com suas mãos ossudas e trêmulas, ninando a mesma compulsivamente. O homem urrava de dor enquanto tentava balbuciar palavras e apontar direções. O fogo começou a se alastrar, a banha estocada começava a vazar e inflamar o local. Provável que em pouco tempo tudo fosse apenas cinzas. Uma tosse escrachada, uma risada. Em meio aos gemidos de dor do soldado, um pigarro acompanhado de uma voz trêmula chamou a atenção de Elegor e Zeliarsa.
— Meu senhor… — Disse um velho, um dos idosos ali, segurando de maneira frágil em uma das barras de aço. — Meu senhor, as chaves estão no bolso do homem cujo segurava Tranita — Disse o velho apontando ao cadáver do bruto.
Zeliarsa parou a tortura, encarando o cadáver por alguns segundos até resolver se levantar e agir, Elegor encarou a figura do velho por alguns momentos, enquanto sua mão se agarrava ao traficante de escravos no chão. Os ossos apertavam o pescoço do porco, como se o quisessem lhe partir. Zeliarsa pilhou o corpo de maneira ágil, deslizando os dedos pelas extremidades, até encontrar as chaves, quando o fez assobiou a Elegor. A figura assentiu com a cabeça sem expressão.
— Meu senhor, acho que você não se recorda de mim — Disse o frágil idoso encarando Elegor.
— Deve haver um engano senhor, eu nunca esqueço de um rosto amigo — Respondeu o esqueleto, finalizando o soldado, cravando suas unhas longas na carne do pescoço.
O velho balançou a cabeça negativamente, abrindo um sorriso cínico numa expressão singela. Sua barba branca e longa tinha sujeira e fios enrolados, e os longos cabelos cinzas já tomavam-lhe as costas quase que por completo.
— Não há engano algum meu senhor, eu esperei por seu retorno, ansiosamente, muitos esqueceram, mas eu não, eu sei do teu propósito.
Zeliarsa balançou as orelhas ao escutar aquilo, parou por alguns instantes ao escutar aquelas palavras, mas as ignorou, seu foco era abrir as jaulas.
— Anos atrás, você trouxe a palavra até nós, unindo as nações, congregando entre os povos, levando a palavra àqueles que não acreditavam — O velho fez uma pausa, uma tosse seca lhe escapou — Eu era apenas um menino, minha vila passava fome, e tua passeata trouxe comida a nós, trouxe fartura e também união, seu povo nos acolheu quando a coroa nos excluiu como ratos!
— É verdade que o fiz, velho, mas se for verdade, você não teria vivido tanto, nenhum humano vive tanto — Respondeu Elegor.
Zeliarsa parou em frente a jaula do velho, pensou em perguntar algo, questionar, mas percebeu que se questionasse, talvez perdesse as explicações que lhe seriam dadas. As imagens em sua cabeça, as visões de fome, guerra, corrupção. Tudo que havia lhe feito concordar com aquela ideia estúpida. A jaula do velho foi aberta, assim como a de outros escravos, que se arrastavam para fora do aço como recém-nascidos.
— Não um normal… não um que não fosse destinado a viver esse momento — O velho começou a se aproximar devagar, rasgando os trapos que usava ficando nu.
Seu corpo frágil e pálido tinha um brilho dourado e esverdeado, seus olhos começavam a se tornar um profundo preto, e formas geométricas lhe começavam a tomar às costas formando um símbolo.
— Meu senhor… fui encarregado pelos próprios deuses de lhe servir, usar o presente que me foi dado, o dom da criação para que tua vontade fosse concluída.
O velho parou, se curvando em frente a Elegor que o encarava inexpressivo, e então, estendeu uma das mãos em direção a ele devagar.
— Eu, Tobias Joman, ofereço meu coração e vontade a meu senhor, Elegor Demirani, para que possa cumprir com seu propósito, salvar a humanidade dela mesma.
Zeliarsa estava estática, arrepiada dos pés à cabeça, alguns escravos que não pertenciam aquelas terras, começavam a se aproximar. A curiosidade de Zeliarsa a fez se juntar a Elegor, observando aquela cena com um certo receio.
— Elegor… o que ele está fazendo? — Perguntou a elfa com uma voz assustada.
— Seguindo o plano de um deus, provavelmente… um que esteja a meu favor — Respondeu Elegor, virando sua cabeça a mãe, que agora, beijava a cabeça de sua filha, e se aproximava dos demais se arrastando.
— E o que vamos fazer com eles? Os libertar? Os levar conosco? Alguns nem falam nossa língua e outros nem conseguem andar — Disse Zeliarsa receosa, deixar aquela gente morrer não era uma opção, mas a forma de não deixar isso acontecer não vinha em sua mente.
— Eu os quero livres, vou lhes dar uma escolha, Zeliarsa.
Elegor apontou um dedo para o velho, e disse com serenidade.
— Me faça um Língua-Vrath.
O velho assentiu, baixou sua cabeça e tomou as correntes que antes o prendiam em mãos, seus olhos tomados por um brilho profundo, reluziam a figura de algo, e então, as correntes começavam a se moldar. O aço se reestruturava em madeira, tomando o aspecto de uma caixinha de música com respiradouros e um espaço para a boca. Quando a metamorfose parou, o velho estendeu as mãos a Elegor com a pequena caixinha em mãos.
— Como ordenado, meu senhor.
— Levante-se e a use, Tobias, você irá transmitir minha mensagem a essa gente, minha voz não sai de minha boca — Disse Elegor ao velho.
Sem rejeitar a ordem, o velho levantou e vestiu a caixinha tal qual uma mordaça, agora, o ancião parecia ter no rosto uma focinheira. Ele se juntou ao lado de Elegor, e o esqueleto ficara inanimado. Os olhos de Tobias se tornaram um profundo preto. E o corpo do jovem loiro começava a chorar lágrimas de sangue.
— A todos aqueles que não possuem uma terra à qual pertencem, aqueles que foram humilhados e tudo lhes foi tomado, para quem perdeu seus filhos, pais e queridos.
O velho se aproximou com movimentos trêmulos, como uma marionete que tinha dificuldades em não cair.
— Eu me chamo Elegor Demirani, tomei o corpo deste homem para mandar essa mensagem a vocês, para que escutem com atenção a proposta que lhes tenho a oferecer — O velho tomou a espada do corpo do jovem próximo, e então, começou a caminhar até a mãe.
— Os deuses lhes odeiam, odeiam a todos, não estão a favor de vocês nem de ninguém. Quantas noites vocês choraram em suas jaulas pedindo por clemência?! Quantas vidas foram tomadas em sua frente por que um homem simplesmente desejou?! Isso é justiça para vocês?!
O velho levantou a espada a mulher, que não esboçou reação a não ser o encarar com os olhos tão vazios quanto os dele
— Quem decidiu que vocês seriam escravos?! Quem decidiu que nós teríamos que sofrer por termos nascido assim?! Por sermos diferentes nossa liberdade nos foi tomada, por sermos elfos, demônios, e até mesmo humanos diferentes do que estão nessa terra, temos que sofrer?!
Ele virou a espada a mulher, a segurando pela lâmina, e lhe estendendo o cabo, alguns escravos demonstravam fogo no olhar, outros interesse e alguns, choravam.
— Já basta! Já basta dos deuses decidirem por nós, por homens decidirem por nós, por uma coroa dizer o que somos e por isso não podermos reagir, já basta!
A mulher tomou a espada, fraca, a segurando pelo cabo e cravando a lâmina na terra para se levantar. Zeliarsa estava em silêncio, sua cabeça estava baixa, pois apesar de odiar Elegor, ela entendia bem o que era ser diferente, afinal, ela era uma Jahän.
— Essa noite eu lhes dou uma escolha! Essa noite eu lhes dou a oportunidade de lutarem de volta, de conquistarem tudo que lhes foi tomado, de fazer com que suas vidas tenham um valor!
Os cabelos negros da mulher lhe cobriam o rosto, porém, mesmo que seus longos fios escuros atrapalhassem de ver seu semblante. O ódio em seu olhar era presente.
— NÃO DEIXEM QUE OS DEUSES DECIDAM POR VOCÊS, NEM QUE OS HOMENS LHES DITEM SUAS VIDAS, POIS A LIBERDADE NÃO ESTÁ SÓ NA CARNE, MAS NO ESPÍRITO!
A mulher se ajoelhou em frente a Elegor, como uma verdadeira cavaleira, baixou sua testa a espada e disse com sua voz chorosa repleta de ódio.
— Você…. Tem… meu ódio — Disse a mulher levantando a cabeça para a figura.
— ENTÃO EU LHES DIGO, SIGAM A MINHA PALAVRA, SIGAM AOS MEUS PASSOS E LOGO, SEREMOS LIVRES! — Disse o velho parando de falar, seu corpo parou de tremer subitamente e então, ele ajoelhou.
Alguns escravos, se aproximavam devagar, fazendo reverências, se ajoelhando perante Elegor e Zeliarsa, a mulher à frente encarava Elegor. Ainda chorando, ela reuniu toda a força que tinha e então gritou em fúria.
— NOS LEVE PARA A LUTA, SENHOR, NOS DEIXE MASSACRAR O OPRESSOR, E NOS FAÇA BANHARNOS EM SEU SANGUE — Ela aumentou o tom, e então se agarrou as pernas de Elegor — POR FAVOR, NOSSO SOBERANO DE OSSOS, NOS GUIE A LIBERDADE.
Elegor olhou para baixo, para os que desesperados se colocavam a seus pés jurando amor, lealdade e confiança e disse:
— Então, jurem lealdade a mim.