Seishun Buta Yarou – Capítulo 4 – Vol 03 - Anime Center BR

Seishun Buta Yarou – Capítulo 4 – Vol 03

Capítulo 4

Uma Noite de Chuva Lava Tudo

Tradução: Moonlight Valley

Quando Sakuta acordou, havia um gato branco na sua frente. Hayate. Estava pulando nele e para fora dele. Crescendo forte.

Ele se sentou e olhou em volta. Ele conhecia esse lugar. Era a sala de estar dele. Ele devia estar dormindo no chão.

Seu cérebro finalmente começou a se mover e ele se lembrou de ter voltado para casa naquela manhã.

Ele olhou para o relógio. Eram seis da tarde. Ele estava desligado há doze horas. Mas ainda parecia um caco. Ainda com sono.

Seu cérebro lhe disse que ele precisava fazer o jantar, então Sakuta se levantou. Ele decidiu lavar o suor primeiro.

O banho morno era bom.

Quando saiu do banheiro, ele estava totalmente acordado. Ele voltou para a sala de cueca no momento em que Kaede saiu do quarto.

“Você está acordado!” ela disse.

“Bom dia, Kaede.”

“Você chama isso de manhã?!”

“A Futaba está no quarto dela?” O quarto dele era dela agora.

“Não, ela ainda não voltou.”

“Huh? Ela saiu?”

“Sim, logo depois que você voltou. Ela disse que queria fazer algumas compras.

“Compras?”

Eram cerca de seis da manhã quando ele chegou em casa. Quem foi às compras tão cedo? A única coisa aberta àquela hora era o mercado onde os chefs abasteciam.

Sakuta abriu a porta do quarto. Quarto de Rio.

“……”

Foi um pouco limpo demais. Nenhuma das coisas de Rio permaneceu, e ela provavelmente limpou além disso.

Ele tinha acabado de tomar banho, mas já estava suando de novo. “Aquela idiota!”

Deixando o impulso incandescente conduzi-lo, Sakuta se virou e correu em direção à porta. Ele a abriu e saiu. Mas ele logo diminuiu a velocidade até parar.

Ele percebeu que não sabia para onde estava indo.

Além disso, ele estava de cueca. Mesmo na era Cool Biz, o mundo não estava pronto. Ele estava pelo menos dez anos à frente da vanguarda. Ele teria que esperar até o início da era Dangerous Cool Biz.

Sakuta voltou para dentro e vestiu um short cargo. Enquanto vestia a camiseta, ele foi até o telefone.

Ele discou o número de uma amiga. O celular de Rio.

“……”

Tocou por um longo tempo, mas ela não atendeu. Eventualmente, foi para o correio de voz.

“Sou eu. Azusagawa. Onde você está? Não vai voltar? Se você ouvir isso, me ligue. É obrigatório.”

Ele desligou. A mensagem provavelmente foi inútil. Ele pegou o telefone novamente para entrar em contato com a outra Rio.

“……”

Mas quando estava prestes a discar, percebeu que não sabia o número do telefone residencial dela. Na escola primária, eles tinham diretórios de turmas com informações de contato de todos, mas ele não tinha visto nada parecido no ensino médio. E ele nunca precisou dessa informação antes.

“Kaede, preciso ir embora.”

“Agora mesmo?”

Ela parecia tão triste que ele deu um cafunézinho na cabeça dela.

“Desculpe.”

“N-não, não é sua culpa. Eu vou ficar bem.”

“Reaqueça um pouco de curry para o jantar.”

“Okay.”

“Provavelmente voltarei tarde. Não fique acordada.”

“Vou esperar o tempo que for preciso!” Kaede declarou.

Ele esfregou a cabeça dela novamente e saiu de casa.

Ele subiu na bicicleta e pedalou pela vizinhança. Ele foi primeiro para a estação Fujisawa. Ele considerou pegar um trem para Hon-Kugenuma, mas imaginou que seria apenas uma estação de distância e que a bicicleta o levaria à Rio mais rápido.

O vento em seu rosto tinha um calor estranho. E estava muito úmido. Ele tinha idade suficiente para descobrir o que isso significava.

Um tufão estava a caminho.

Sem diminuir a velocidade, Sakuta deu uma olhada no céu. Nuvens pesadas pairavam no alto. Formas estranhas se contorciam acima, como se estivessem vivas, fluindo para o norte.

“Não demorará…”

Assim que as palavras saíram de sua boca, uma enorme gota d’água atingiu sua testa. Uma segunda e uma terceira atingiram seu corpo e então o céu se abriu.

De repente, choveu tanto que o mundo ao seu redor parecia branco.

“Você só pode estar brincando!”

Sua camiseta já estava pesada e grudada nele.

Ele considerou voltar, mas ainda assim acabaria igualmente molhado.

“Isso é uma merda! Droga!”

Amaldiçoando em voz alta, ele pedalou com mais força.

◆₊◆₊◆

   Quando chegou à casa de Rio, até a cueca estava encharcada. Era nojento, mas ele não conseguia mais reclamar.

Ele apertou o botão do interfone.

Ele estava preocupado que os pais dela respondessem, mas era Rio.

“Azusagawa?” Sua voz veio do alto-falante.

“Como você sabia?”

“Câmera.”

“Tão alta tecnologia!”

“Não é nada incomum. Entre.”

O portão se abriu e Sakuta empurrou sua bicicleta para o jardim da frente. Ele não achava que algum dia se acostumaria com uma casa tão sofisticada. E pingar água por toda parte só o fez se sentir ainda mais empobrecido. Parecia que a casa iria rejeitá-lo imediatamente.

Enquanto estacionava a bicicleta, Rio colocou a cabeça para fora da porta. Em seu pijama fofo.

“E aí?”

“Futaba desapareceu.”

“Huh?”

“Ela estava lá quando voltei esta manhã. Aí eu desmaiei e quando acordei… ela pegou todas as suas coisas e desapareceu.”

“Só para ficar claro, não nos fundimos novamente.”

“Acho que não.” Não parecia provável. Elas precisariam de um motivo para isso. “Alguma ideia de onde ela iria?”

“Escola, talvez,” Rio disse. Ela não teve que pensar por muito tempo. Era como se ela soubesse a resposta. “Se a outro eu está tentando evitar você e nós, então… ela provavelmente está lá. Se eu estivesse procurando o último lugar onde não estivesse sozinha, seria para lá que eu iria.”

Havia uma convicção real em seus olhos. Ele não ousou duvidar dela.

“Entendi. Obrigado.”

Houve um enorme relâmpago e uma explosão ensurdecedora de trovão.

“Eep!”

Rio tapou os ouvidos com as mãos.

“Nunca ouvi você fazer esse barulho.”

“I-isso me pegou desprevenido!”

Antes que ela pudesse terminar sua desculpa, houve outro flash. O barulho foi quase instantâneo. Muito perto.

“Eep!”

“……”

“Não”, ela disse, olhando para ele.

“Se você estiver com medo, ligue para o Kunimi.”

“Não vai acontecer.”

“Apenas diga, ‘Estou com meeeedo’ e faça-o te dar um abraço.”

“Eu nunca.”

“Uma coisa leva a outra, então o que está feito está feito e ele terá que assumir a responsabilidade.”

“Ninguém ficaria feliz com esse acordo.”

“Bem, de qualquer forma, boa sorte com isso.”

Sakuta voltou para sua bicicleta.

“Estou indo.”

“Você vigia a casa. Uh… também, diga-me o número do seu telefone residencial.”

Rio voltou para dentro e rabiscou em um Post-it. Ele o pegou dela.

“Eu vou ligar se souber de alguma coisa. E…”

“Ela talvez venha aqui?” Rio disse, saltando na frente dele.

Ela parecia nervosa. Talvez pensando naquelas histórias sobre conhecer seu doppelgängere e morrer. Com duas Futabas Rios, não dava para ignorá-las, lenda urbana ou não. Ninguém sabia ao certo o que aconteceria se elas se encontrassem. E a hipótese da própria Rio tinha sido igualmente terrível.

“Se isso acontecer… tenha uma conversa racional.”

“Mesmo que eu pretenda…”

Ele sabia o que ela queria dizer. Não havia como saber o que a outra Rio poderia fazer. Dadas as suposições sobre o motivo de ela ter deixado a casa de Sakuta, certamente havia uma chance de as coisas ficarem feias. Se as duas não conseguirem se fundir novamente, apenas uma delas poderia continuar vivendo como Futaba Rio. Eles teriam que considerar a possibilidade de duas Rios brigarem por uma posição.

Preparando-se para o pior, Sakuta partiu. Tudo o que ele podia fazer agora era encontrar a Rio desaparecida o mais rápido possível.

◆₊◆₊◆

   Ele considerou voltar para a estação Fujisawa e pegar o Enoden para a escola, mas rapidamente abandonou a ideia.

Ele já estava encharcado há muito tempo, então entrar em um trem seria uma má ideia. Alguém teria que limpar a sujeira dele.

Além disso, ele estava preocupado com o vento. Estava ficando bem forte. Entre os ventos e a chuva, havia uma boa chance de os trens serem suspensos. E então ele ficaria preso.

Então ele saiu da casa de Rio e seguiu em direção a Enoshima.

Seguiu a estrada para o sul até a Rota 134.

Esta estrada corria ao longo da costa.

Isso o levaria até Shichirigahama. Um pouco mais de um quilômetro.

Havia um vento forte soprando do oceano. A superfície da água estava escura como breu e o habitual balanço suave da baía foi substituído pela agitação das ondas altas.

Ele estreitou os olhos, lutando contra a chuva horizontal até passar por Enoshima. Ele nem conseguia ver as lanternas que deveriam estar acesas nesta hora do dia, nesta época do ano. Talvez os tivessem guardado antes que a tempestade chegasse.

O vento golpeava seu corpo. Várias vezes quase o derrubou.

Era uma estrada movimentada, então foi ainda mais assustador, e os carros jogaram toneladas de água em sua direção.

“Ah, droga! Que merda!”

Ninguém estava ouvindo, mas o uivo do vento engoliu suas palavras mesmo assim.

“Eu odeio isso!”

Ele continuou gritando. Ele não diminuiu a velocidade. Ao ver Shichirigahama, ele começou a pisar nos pedais, indo ainda mais rápido.

“Você é um pé no saco, Futaba!”

 

 

◆₊◆₊◆

 

 

Ele via a praia de Shichirigahama todos os dias, mas agora parecia totalmente diferente. Sempre teve o tipo de ondas que os surfistas desejam, mas agora a vista faz você engolir em seco.

Sakuta se virou disso, derramando o que restava de suas forças no caminho para a escola.

“Ugh… Argh, vou vomitar…”

Cambaleante, ele estacionou a bicicleta do lado de fora dos portões fechados.

Então ele passou por cima deles e pisou no terreno de Minegahara.

Ninguém está aqui. O feriado Bon durava de 13 de agosto (hoje) a 16 de agosto. Os alunos não eram autorizados a frequentar a escola durante esse período. Ele pensou que poderiam ter um professor destacado, mas não conseguiu ver nenhuma evidência que apoiasse essa ideia.

As portas da frente também estavam fechadas.

“Se eu passei por tudo isso e ela não estiver aqui, vou chorar”, resmungou ele.

Ele deu a volta pelos fundos, fora das janelas do laboratório de ciências.

A outra Rio lhe contou sobre uma janela com o trinco quebrado. A segunda janela da parte de trás.

“Esta.”

Ele colocou a mão no vidro e puxou para o lado. Abriu direitinho.

Ele colocou o pé sobre o peitoril e subiu para dentro.

“Você está aqui, Futaba?”

Nenhuma resposta.

“Não?”

Ainda sem resposta.

Ele tirou os sapatos e as meias. Então tirou a camiseta e torceu na pia. Uma quantidade fascinante de água saiu dela. Sobrou seus shorts. Como não havia ninguém aqui, ele tirou a cueca também e torceu tudo. Foi como jogar um balde no ralo.

Ele não podia exatamente andar pelado pela escola, então vestiu novamente as roupas úmidas e nojentas. Foi horrível, mas ele não teve escolha.

O maior problema era que a Rio não estava no laboratório de ciências.

A outra Rio disse que estaria na escola, então Sakuta presumiu que ela estaria aqui.

Mas ela não estava.

Talvez ela não estivesse na escola.

Mas assim que o pensamento passou pela sua cabeça, seus olhos encontraram evidências do contrário. Havia um telefone na mesa do laboratório, perto do quadro-negro. Ele pegou, ligando a tela. Era da Rio.

Ela definitivamente veio aqui em algum momento. Se ela ainda estava aqui era outra questão.

Tentando não entrar em pânico, Sakuta foi procurá-la.

Mas para onde? Ele decidiu verificar as salas de aula do segundo ano para começar. Talvez ela estivesse em sua sala de aula.

No caminho para as escadas, ele passou pelas salas de aula do primeiro ano. A escola Minegahara coloca cada ano em um andar diferente. Os alunos do primeiro ano ficavam no térreo, os do segundo ano no segundo andar e os do terceiro ano no terceiro andar.

A porta da sala de aula 1-1 estava parcialmente aberta.

“……”

Esta tinha sido a sala deles no ano passado. Sakuta, Rio e Yuuma passaram tempo juntos lá.

Ele abriu a porta e entrou.

Alguém pulou.

Rio estava lá atrás, perto das janelas. Sentada em uma cadeira, com os braços em volta dos joelhos, olhando para ele em estado de choque.

“Azusagawa, por que…?”

“Ugh, isso foi um pesadelo!” ele disse, deixando-se cair em uma cadeira próxima. Ele escolheu um lugar longe dela, bem em frente ao pódio do professor. Este havia sido seu assento no terceiro mandato no ano passado. Isso lhe deu uma excelente visão do quadro-negro.

“……”

Ele podia sentir os olhos de Rio perfurando suas costas. Ela claramente estava irritada.

Ele fingiu não notar.

“Ontem… não, esta manhã. Eu esqueci de te contar uma coisa.”

“…O que?”

“Quer ver os fogos de artifício na próxima semana?”

“Huh?”

Isso claramente não era o que ela esperava. Ela deve ter pensado que ele iria gritar com ela.

“Os fogos de artifício de Enoshima! Nós fomos no ano passado, certo?”

“Eu sei disso, mas…”

Ela parecia quase irritada. Zangada com ele.

“Kunimi estará lá.”

“……”

“Estamos falando sobre fazer o que você sugeriu no ano passado e assistir da praia de Kugenuma.”

“Eu…”

“Você está dentro, certo?”

“…Não.”

“Você tem outros planos?”

“Eu vou desaparecer.”

Parecia que ela estava sufocando todas as emoções.

“Você não vai me ver novamente. Eu vou desaparecer.”

Calma e fria.

“O que diabos você está dizendo?” ele disse, mantendo a voz leve, ignorando toda aquela vibração.

“O mundo não precisa de duas Futabas Rios.”

A outra disse a mesma coisa. Elas eram a mesma pessoa, então isso fazia sentido. E esse fato foi um alívio. Ambos eram Rio.

“Se eu for embora, isso pode finalmente acabar.”

“Será que vai?”

“A outra eu parou de postar fotos desagradáveis, certo?”

“Sim, ela disse isso.”

“Ela está morando naquela grande casa vazia.”

“Yep.”

“Ela vai para a escola todos os dias, mantendo o Clube de Ciências ativo.”

“Às vezes ela sai para assistir ao treino do Kunimi.”

“Não há nada que a impeça de ser Futaba Rio.”

Ela estava preenchendo os fossos, encurralando-se em um canto. Fechando-se. Tentando se eliminar. Qual deve ser a sensação?

“Os calouros do time de basquete acharam a outra Futaba fofa. Eles estavam todos entusiasmados com isso.”

“Mais uma razão. A outra eu é muito melhor em ser Futaba Rio do que eu.”

Outra peça se encaixou. Uma peça no quebra-cabeça do desespero.

“A outra eu faz parte deste mundo.”

Mais uma.

“Sua Futaba Rio tem uma vida feliz.”

O quebra-cabeça estava quase completo. Não, ele estava completo. Tudo o que restava…

“Se eu desaparecer, isso resolve tudo.”

… era jogar fora os pedaços que sobraram.

“Não é assim que você resolve provas”, disse Sakuta. Mantendo um tom de voz normal.

“Não cometi erros. Eu tiraria nota máxima.”

“Você cometeu um grande erro! Um fundamental!”

“Então…!” ela gritou. Houve um acidente. Ela ficou de pé. “Por que você me mostrou aquela foto?!”

“……”

Sakuta olhou para o telefone em sua mão. A tela de bloqueio foi configurada para a foto dele com Rio e Yuuma. Parecia barato colocar isso em palavras, mas aquela foto era a prova do intangível. Era um símbolo da amizade deles.

“Não há mais lugar para eu estar!” ela lamentou, com um tremor em sua voz. “Deveria ser eu naquela foto, mas não é! Que outro significado possível isso poderia ter?!”

Ele a ouviu fungar.

“Você não precisa mais de mim. Você ou o Kunimi. Vocês dois gostam mais dessa!”

É por isso que ela estava chorando, ele pensou. Chorando muito, como se ela tivesse perdido tudo.

“Você é um idiota!!”

De repente ela se virou para ele. Os olhos dela estavam definitivamente cravados nas costas dele. Ele podia sentir o olhar dela o apunhalando.

Mas apesar disso, ele riu.

“Não seja ridícula”, disse ele. “Não acredito que você disse isso agora, Futaba.”

“Disse o que?”

“Você sabe que sou um idiota! Você me diz isso o tempo todo.”

“… Só um idiota diria isso agora! Azusagawa…!”

Antes que ela pudesse dizer qualquer outra coisa, ele disse: “Então, nos vemos na praia de Kugenuma, no dia 19. Nos encontraremos às seis e meia.”

Como se eles estivessem apenas no laboratório de ciências. Como se ele estivesse apenas brincando com ela sobre sua paixão por Yuuma.

Rio ficou em silêncio.

“Isso é tudo que tenho a dizer”, disse Sakuta.

Ele colocou o telefone de volta no bolso e se levantou. Ele manteve os olhos no quadro-negro o tempo todo, sem nunca olhar para ela.

O resto era problema dela. Se ela não estendesse a mão para pegar a mão dele, ele não teria intenção de fazer mais nada. Ele não tinha o poder de tirar alguém da beira do desespero. Pensar que ele poderia seria apenas arrogância.

Portanto, não havia razão para ele ficar por aqui. Ele deu um passo em direção à porta.

Mas, ao fazer isso, sua visão ficou turva. Ele cambaleou. Ele mal teve tempo de perceber que era isso que significava estar “tonto” antes de desmaiar.

“Azusagawa?!” Rio gritou. Parecia distante.

Tudo ficou preto. Ele não conseguia ver nada. Ele teve um breve vislumbre do padrão no chão, ou talvez fosse apenas sujeira. Mas foi isso. Sua mente desligou completamente.

Ele estava balançando. Havia vibrações vindo de baixo, e às vezes ele era puxado para um lado ou para outro.

Ele podia ouvir alguém falando.

Ele tentou abrir os olhos.

Não é o teto habitual. Mas ele já tinha visto isso uma vez. E ele reconheceu as sirenes. Ele podia ouvir a chuva batendo nas janelas e o barulho dos limpadores de para-brisa.

“Você está acordado?” um homem perguntou, inclinando-se. Ele tinha trinta e poucos anos e usava um uniforme do SME (Serviço Médico Emergencial).

“Azusagawa.”

A voz do Rio, estava próxima. Ela parecia preocupada.

“Uh… eu desmaiei?”

Ele se lembrou de ter se sentido muito tonto. E então tudo ficou preto… e agora ele estava aqui.

“Você está desidratado. Você provavelmente desmaiou devido a um leve caso de insolação.

Essa palavra estava em toda a TV nesta época do ano. Ele nunca pensou que isso aconteceria com ele.

“Você está com alguma dor? Você pode ter se machucado quando desmaiou.”

O funcionário do SME estava mantendo as coisas simples.

“……”

Sakuta se verificou, mas nada doia realmente.

“Sem dor”, disse ele.

“Ela disse que você bateu a cabeça com muita força, então vamos dar uma olhada quando chegarmos ao hospital, só por segurança.”

“Okay.”

Melhor fazer o que lhe foi dito aqui.

Só um idiota entraria em colapso e depois insistiria que estava bem.

◆₊◆₊◆

   Demorou cerca de dez minutos para chegar ao hospital e então Sakuta foi levado para uma sala de exames bastante comum. Ele meio que esperava ver o tipo de pronto-socorro que aparece na TV, mas não teve essa sorte.

O médico que o examinou era jovem, com quase trinta anos.

“Vamos fazer uma tomografia computadorizada em sua cabeça, só para garantir”, disse ele.

Sakuta foi levado para um andar diferente. Como o médico receitou, uma máquina enorme examinou sua cabeça e ele voltou para a primeira sala de exames.

“Vamos colocar uma intravenosa em você, só para garantir.”

Essa era uma frase um pouco preocupante para ouvir várias vezes, mas ele tinha que confiar no médico. Ele se deitou e deixou que espetassem seu braço. Um soro intravenoso foi colocado na cama e um tubo conectado a ele.

“Vou verificar quando terminar”, disse o médico e saiu apressado.

Talvez houvesse outros pacientes em pior estado.

Sakuta ficou imóvel, observando o soro gotejar. Ele logo adormeceu.

◆₊◆₊◆

   Quando ele acordou novamente, foi por causa de uma sensação estranha em sua bochecha. Uma pequena dor aguda, como se alguém o beliscasse.

Lutando contra a sonolência, Sakuta abriu os olhos.

“Bom dia”, disse uma linda garota, olhando mal-humorada para ele. Ela segurou sua bochecha com força. Foi por isso que doeu.

“……”

Ele lançou a ela um longo olhar.

“Por que o olhar demorado?”

“É que eu estou olhando uma senpai muito bonita.”

“Você vai ficar bem.”

Sakuta sentou-se. Ele não se sentia mais tonto. O soro estava vazio e o tubo havia sido retirado. Havia uma gaze colada no local onde a agulha estava.

“Então, Mai-san… isso é uma punição por alguma coisa?”

Ela ainda não tinha soltado sua bochecha.

“Por deixar Kaede preocupada e depois ter coragem de dormir tão tranquilamente.”

“Eu vejo. Isso faz sentido.”

Ele mereceu.

“Me desculpe.”

“Peça desculpas a ela. Ligue para ela agora.”

“Tudo bem”, disse ele, levantando-se.

Ele estava prestes a pegar o telefone dela emprestado, mas não tinha certeza se teria permissão para usar um celular em um hospital, então decidiu não fazê-lo.

Devem ter telefones públicos aqui em algum lugar.

“Então por que você está aqui, Mai-san?”

“Futaba me ligou.”

Ele já havia contatado Rio pelo telefone de Mai antes, então ela naturalmente tinha o número em seu histórico de chamadas.

“Está tudo bem para você estar aqui?”

Seu gerente havia dito a eles para evitarem contato tanto quanto possível. Ele não tinha ouvido nada sobre a mudança dessas ordens.

Esta era uma sala de exames, então era um tanto isolada, mas havia mais salas de exames neste corredor, e médicos e enfermeiras correndo para cima e para baixo. E todos eles tinham visto Mai. Um homem de jaleco branco pareceu particularmente surpreso, e uma enfermeira segurando registros médicos deu uma olhada dupla. Alguns membros mais jovens da equipe estavam claramente fazendo viagens desnecessárias apenas para dar uma espiada nela.

“Isso não é o que você deveria dizer a uma namorada preocupada quando ela vem correndo”, disse Mai, se levantando do banco.

“Desculpe. Não queria preocupar você.”

“Tente novamente.”

“Engh.”

“De novo.”

Ela estava ficando mais irritada a cada momento. Isso continuaria até que ele dissesse exatamente o que ela queria ouvir. Se ele não desistisse logo, ela pisotearia seu pé.

“Eu realmente odiaria se isso levasse você a perder o emprego”, disse ele, evitando deliberadamente a resposta certa.

“Olha, eu gosto do meu trabalho. É divertido e quero continuar fazendo isso”, disse ela, de mau humor. Ela parou e lançou-lhe um olhar de expectativa. Ele sabia o que aquele olhar significava. Ele sabia, mas queria ouvir isso dela.

“Mas?” ele perguntou inexpressivamente.

“Você sabe.”

“Eu não tenho a menor ideia!”

Mai franziu os lábios. Então ela desistiu e disse isso.

“Trabalho é trabalho e é importante, mas se você ficar doente, quero estar ao seu lado e, quando tiver um dia de folga, quero sair em encontros.”

Ela parecia mal-humorada, furiosa porque ele a forçou a soletrar.

“Você me ajudou a voltar ao trabalho, mas se isso significa que não posso ver você, não há nenhum ponto nisso.”

A força com que isso aconteceu estava além do alcance de palavras como fofo ou feliz.

“Mai-san.”

“O-o quê?”

“Posso te dar um abraço?”

“Por que?”

Ela deu um passo para trás, em guarda.

“Quero comunicar a alegria que estou sentindo.”

Mai pensou sobre isso. Então ela disse: “Só três segundos”, com um sorriso um tanto rígido.

“Aw, acho que vou precisar de pelo menos um minuto inteiro.”

“Um abraço tão longo definitivamente me deixaria grávida… Eep!”

Ele jogou os braços ao redor dela antes que ela pudesse terminar. Mãos cruzadas atrás das costas. Saboreando seu calor, suavidade e perfume.

Mai colocou as mãos no peito dele, abaixando a cabeça.

“São três segundos.”

“Posso obter uma extensão?”

“Você tem outras prioridades!”

Ele precisava ligar para Kaede. E então agradeçer à Rio. Ela chamou uma ambulância e foi até o hospital com ele.

“Depois que eu cuidar dessas coisas, podemos continuar?”

“Você já teve dez segundos completos, então não.”

“Aww.”

“Isso é o que você ganha por não cumprir sua palavra.” Ele a soltou imediatamente.

“Tarde demais agora”, ela disse e cutucou-o na testa.

Ele deu a ela um olhar suplicante.

“Olhos de peixe morto não vão te ajudar aqui.”

“Estes são olhos de cachorrinho abandonado!”

“Prossiga. Se o médico voltar, eu falo com ele.”

“Obrigado.” Ele deixou Mai na sala de exames e desceu o corredor. “Tenho que ligar para Kaede primeiro…”

◆₊◆₊◆

   Os telefones públicos ficavam próximos a uma loja apagada e a quatro máquinas de venda automática. Os telefones eram do velho tipo verde.

Ele colocou uma moeda de dez ienes e discou o número do apartamento. A máquina eletrônica atendeu.

“Kaede, sou eu. Você ainda está acordada?”

“Você está bem?!” Kaede gritou alguns segundos depois.

“Estou bem.”

“Estou tão feliz… Você não está morto…”

“Não me considere morto tão rápido. Tenho alguns papéis para cuidar, então vou demorar um pouco antes de voltar para casa.”

Ele checou o relógio na parede e já passava das dez. Ele deveria estar em casa antes do fim do dia, pelo menos.

“Você pode ir em frente e dormir.”

“Vou esperar!”

“Okay. Mas não se force.”

Ele percebeu que ela não iria ouvir, então ele deixou por isso mesmo.

“Kaede.”

“O que?”

“Desculpe por ter preocupado você.”

“Eu sou sua irmã. É meu trabalho me preocupar com você.”

“Então obrigado por ser minha irmã.”

“T-tudo bem! Vou continuar fazendo o meu melhor!”

“Vejo você depois.”

Ele desligou o telefone e percebeu que estava muito silencioso ao seu redor. Esse silêncio foi quebrado pelo barulho de um elevador. Os elevadores passavam logo depois das máquinas de venda automática.

A porta se abriu e uma garota saiu.

“Ah”, ele disse. Porque ele sabia o nome dela.

“Huh?” Ela pareceu igualmente surpresa ao vê-lo.

Uma menina mais nova, de pijama e chinelos, um estilo bem para dentro de casa – Shouko Makinohara.

“Er, hum… por que você está aqui, Sakuta-san?” ela perguntou, olhando para todos os lugares, menos para ele.

Definitivamente parecia que ele tinha visto algo que não deveria.

“Eu desmaiei com uma insolação e fui trazido para cá em uma ambulância.”

“V-você está bem?”

“Meus sintomas eram bem leves, então eles me deram uma intravenosa e encerraram o dia. Sinto-me melhor que o normal.”

“Certifique-se de obter líquidos suficientes!” ela disse, finalmente olhando nos olhos dele. “E eletrólitos suficientes.”

“Bom conselho.”

“……”

“……”

A conversa acabou.

“Uh, e você?” ele perguntou. Considerando que eles se encontraram aqui no hospital, a pergunta era inevitável. Não perguntar seria evidente e… ele estava curioso.

“Eu peguei um resfriado”, disse Shouko com firmeza.

“Oh?” Sakuta se aproximou e colocou a mão na testa. “Sem febre, pelo menos.”

“C-certo.”

“E sua voz parece normal. Sem tosse?”

“……”

“E seu nariz não parece entupido.”

Isso não a deixou com muita coisa.

“Desculpa, isso foi mentira”, ela admitiu.

Ele sabia disso desde o início. Ela estava de pijama e chinelos. Eram dez da noite e os pacientes ambulatoriais não estariam por aí. Se ela não tivesse sido levada às pressas para cá como ele, então ela deveria ficar aqui.

“…Há algo errado com você?”

Ele hesitou em perguntar. Mas ela parecia tão perdida que ele decidiu que seria melhor.

“Oh…” ela começou, depois ficou em silêncio.

“Se você não quiser falar sobre isso, não vou perguntar.”

“Não, acho que você deveria saber”, disse Shouko, olhando para cima.

Ela já havia se decidido.

◆₊◆₊◆

   Eles se sentaram em um banco perto das máquinas de venda automática. Shouko falou devagar, com a voz calma enquanto contava a ele sobre sua doença.

Ele imediatamente esqueceu o nome exato e não tinha a menor ideia de quais eram os kanji, mas percebeu que era um problema cardíaco.

Um problema particularmente complicado e que piorava à medida que Shouko ficava mais velha. Havia vários dispositivos que poderiam prolongar sua vida, mas a única cura real era um transplante. Havia muito menos órgãos disponíveis para crianças, então as chances de ela encontrar um doador eram muito baixas. E se alguém aparecesse, isso significava que outra pessoa havia passado por uma terrível tragédia, então não eram boas notícias.

Ela ficou esperando por um doador, mas se sentindo culpada porque tinha vontade de que algo ruim acontecesse com outra pessoa.

“O que acontece se você não conseguir um transplante?”

“Quando descobrimos isso, os médicos disseram que eu teria sorte se vivesse o suficiente para me formar no ensino fundamental.”

Shouko parecia estranhamente calma sobre isso. Ela quase pareceu aliviada. Sakuta não tinha certeza do que pensar disso.

Mas ele entendeu uma coisa.

“Isso explica tudo.”

“Sakuta?”

“Eu finalmente entendi.”

“Entendeu o que?”

“Quando estávamos conversando sobre Hayate, você disse que se dissesse aos seus pais que queria um gato, você tinha certeza de que eles deixariam você ter um.”

Sem um transplante, ela poderia viver apenas até os quatorze ou quinze anos. Nenhum pai ignoraria um pedido nessas circunstâncias. Eles iriam querer fazer tudo o que pudessem por ela. Eles comprariam para Shouko qualquer coisa que ela pedisse e a deixariam fazer o que quisesse.

“Meus pais são muito legais comigo.”

“……”

“Tão legais que não importa o que eu peça, eles sempre dizem sim. E estou feliz por isso, mas… às vezes também torna as coisas difíceis.”

“Mm.”

Sakuta fez um barulho para mostrar que estava ouvindo, mas achou melhor não interromper. Seria um erro fingir que entendia como Shouko ou seus pais se sentiam.

“Cada vez que mamãe diz ‘Sim’ sobre alguma coisa, sei que ela está dizendo ‘Desculpe’ em algum lugar que não consigo ouvir. Como se fosse culpa dela eu ter nascido com essa condição.”

“Mm…”

“É por isso que… ainda não perguntei a eles sobre Hayate.”

Ele olhou de lado. Uma sombra cruzou o rosto dela. E ele sabia exatamente por quê.

Então Sakuta estendeu a mão sem palavras e puxou sua bochecha.

“Por que você fez isso?!” ela gritou, completamente pega fora de guarda.

“Isso é por culpar sua mãe.”

“Huh?”

“Se você fica tão triste toda vez que pede algo a ela, é claro que ela vai querer pedir desculpas.”

“…Mas—,” Shouko começou.

Antes que ela pudesse terminar, ele puxou sua outra bochecha.

“Sh-Shakuta?!”

Provavelmente era para sair como “Sakuta”.

“Makinohara, enquanto você sentir pena de estar doente, as coisas não vão mudar. Tenho certeza de que seus pais sabem que você se sente culpada por isso. A coisa mais difícil para os dois é saber que eles estão fazendo você sentir que precisa se arrepender. Já é ruim o suficiente que sua mãe sinta que é culpa dela você ter nascido assim, certo?”

“Bem… acho que você está certo”, disse Shouko. “Mas o que mais posso…?”

“O que você realmente pensa dos seus pais? Além de lamentar por deixá-los tristes o tempo todo.”

“Eu amo os dois. Bastante.”

Shouko não precisou pensar nisso. Então esses devem ter sido seus sentimentos genuínos.

“Você disse isso a eles?”

“…Não.”

“Eu ficaria muito mais feliz em ouvir ‘Eu te amo’ do que ‘Me desculpe’, pessoalmente. Isso realmente faria o meu dia.”

“Oh…”

Shouko finalmente pareceu entender o que ele estava dizendo.

“Uma vez, alguém me disse que suas três frases favoritas de ouvir são ‘Obrigado’, ‘Bom trabalho’ e ‘Eu te amo’.”

Sakuta soltou sua bochecha e Shouko se levantou.

“Eu…”

Ela fez uma pausa e o elevador apitou. Um casal de quase trinta anos desceu. A reação deles quando avistaram Shouko deixou claro quem eles eram.

Eles vieram procurar quando ela não voltou.

“Mãe, Pai”, disse ela, correndo.

“Ah, Shouko! Se você correr assim…”, sua mãe se preocupou.

Mas Shouko simplesmente se jogou nos braços de sua mãe.

“Oh querida. Qual é o problema?”

Por mais surpresa que estivesse, sua mãe ainda a abraçou de volta.

“Mãe, Pai, obrigada por tudo.”

“De onde veio isso?”

Seus pais se entreolharam.

“Eu amo vocês dois. Eu amo vocês muito.”

“Bem, nós dois amamos você também.”

Seu pai estendeu a mão e esfregou sua cabeça.

“Isso mesmo.”

“Estou feliz que vocês sejam minha mãe e meu pai.”

Nos braços de sua mãe, Shouko olhou para cima com um sorriso como uma flor desabrochando.

“Shouko…”

A voz de sua mãe estava embargada e havia lágrimas brilhando em seus olhos. Seu pai desviou o olhar, enxugando os olhos. Houve um verdadeiro calor no momento. Todos ali se importavam uns com os outros.

“Eu tenho um favor para pedir.”

“O que foi, Shouko?”

“Eu quero um gato.”

Ela perguntou com um sorriso brilhante. E seus pais responderam na mesma moeda.

“Okay! Vamos fazer isso.”

◆₊◆₊◆

   Depois que Shouko voltou para seu quarto com seus pais, de mãos dadas, uma voz o chamou atrás dele. “Azusagawa.”

Ele se virou para encontrar Rio parada ali.

“Você já está acordado?”

“Bem, mesmo se eu desmaiar de novo, já estou no hospital, então…”

“Você é um paciente horrível.”

Rio suspirou, mas conseguiu dar um meio sorriso.

“Não se esqueça que sou um péssimo amigo!”

“Sério. Que truque barato de usar.” Ela fez uma careta para ele. “Eu não poderia simplesmente deixar você lá deitado, poderia?”

“Bem, parece que foi um colapso que valeu a pena.”

Sakuta sentou-se no banco perto das máquinas de venda automática. Rio se juntou a ele, deixando espaço suficiente entre eles para outras duas pessoas. “Obrigado por ligar para a Mai-san.”

“Você deveria estar grato.”

“É por isso que estou agradecendo.”

“Não por mim. Por Sakurajima.”

“… Ela estava tão preocupada?”

Ele não teve essa impressão falando com ela, mas ela correu até aqui. Talvez ela estivesse mais assustada do que ele pensava.

“Quando ela chegou aqui, ela não parava de segurar sua mão enquanto você dormia.”

“Você tirou uma foto?”

“Claro que não.”

“Aww, eu teria matado para ver isso.”

“Você é realmente um idiota.”

Sua risada ecoou pelo corredor silencioso.

“……”

“……”

Quando a conversa cessou, o silêncio do hospital noturno ficou ainda mais pronunciado. O zumbido das máquinas de venda automática pouco contribuiu para aliviar isso.

Rio esticou as pernas, olhando para os dedos dos pés. Procurando as palavras certas.

“Azusagawa, eu…”

“Não quero ouvir mais besteiras sobre como você não é necessário ou como seu desaparecimento resolve tudo, ou como você está apenas com medo e não sabe o que fazer.”

“……”

Houve um longo silêncio. Ele deve ter adivinhado certo.

“Tudo bem se você não gosta de si mesma.”

Sua voz vagou pelo corredor silencioso.

“……”

“Eu costumo ser um cara do tipo ‘para o inferno com isso’, pessoalmente.”

“Isso soa como você,” Rio disse, suspirando suavemente. “Qualquer outra pessoa me diria que eu deveria trabalhar para encontrar coisas que gostassem em mim ou começaria a me contar todas as coisas que gostam em mim.”

“Cara, tentar dar um toque positivo em tudo fica cansativo. Pessoas que se amam podem ir para o inferno.”

Não há como se forçar a gostar do que você odeia. Tentar forçar a questão só gera atrito ou pressão. O tiro sai pela culatra. Se você vai apenas sofrer, desistir da positividade é uma tática perfeitamente viável. Dois anos atrás, Sakuta descobriu o quão útil isso poderia ser. Os problemas de Kaede lhe ensinaram isso. Lutar nem sempre era a resposta certa. E tudo bem.

“Você é o pior, Azusagawa. Mas… isso é um conforto, às vezes.”

Rio parecia relaxada, como se tivesse tirado um peso dos ombros.

“Realmente é”, disse ela.

Quando suas emoções ficam tensas, não demora muito para quebrar o fio. É importante dar a elas alguma folga às vezes. Isso torna tudo muito mais fácil. Quando as coisas relaxam, de repente pode ficar muito mais fácil ganhar uma nova perspectiva sobre o mundo ao seu redor, como a Rio foi agora.

Rio tendia a engarrafar tudo por dentro, então ela precisava desabafar às vezes. Para encontrar uma maneira de deixar ir.

Essa pressão extra parecia ter desaparecido agora, pensou Sakuta.

“Hum, Azusagawa…” ela disse relutantemente, após um longo silêncio.

“Mm?”

“…Os fogos de artifício.”

“Ah.”

“Posso mesmo ir?”

“De jeito nenhum.”

“……”

“Não se você colocar desse jeito.”

Rio soltou um suspiro longo e pensativo.

Mas ela levou apenas alguns segundos para descobrir.

“Eu… eu quero ver os fogos de artifício”, disse ela, estranhamente nervosa.

Ela nem sempre deixava transparecer seus verdadeiros sentimentos, e isso era estranho para ela.

“Não sou eu a quem você deveria pedir.”

Ele jogou uma moeda de dez ienes na direção dela. Ele traçou um arco suave e ela colocou as mãos em concha, pegando-a. Ela olhou em direção aos telefones públicos.

Rio se levantou e foi até eles.

Ela pegou o fone, inseriu a moeda e discou um número. Ele podia ouvi-lo tocando por cima do ombro.

A respiração dela parecia tensa.

Ele ouviu a chamada ser completada.

Rio respirou fundo.

“Eu… eu me encontrei com o Azusagawa. E… eu tenho um favor a pedir.”

Ela fez uma pausa, respirou fundo novamente e depois deixou escapar seus sentimentos.

“Eu também quero ver os fogos de artifício.”

Nenhuma palavra se seguiu. A respiração e a presença dela desapareceram. Houve um barulho. Sakuta se virou silenciosamente.

Diante dele havia um telefone público verde. O receptor pendurado. Ninguém em nenhuma direção — apenas o longo corredor. Até onde seus olhos podiam ver, não havia ninguém aqui além dele.

Ele se levantou, pegou o fone e levou-o ao ouvido.

“Alôôôô?” ele disse, um pouco brincalhão.

“Volte para sua sala de exames, Azusagawa. Você está deixando a Sakurajima esperando.”

“Agora posso finalmente flertar o quanto quiser!”

“Vou fingir que não ouvi isso.”

“Estou feliz em compartilhar.”

“Sobre os fogos de artifício”, disse Rio, mudando de assunto à força. “É melhor você não se atrasar.”

“Você pode se atrasar um pouco se quiser, Futaba. Eu sei que colocar aquele yukata vai demorar um pouco.”

“Eu realmente tenho que usar aquela coisa?”

“Não adianta ver fogos de artifício se você não tem uma garota de yukata com você.”

“Okay… bem, eu prometi.”

Ela parecia estar ansiosa por isso.

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