Seishun Buta Yarou – Capítulo 4 – Vol 12 - Anime Center BR

Seishun Buta Yarou – Capítulo 4 – Vol 12

Capítulo 4

24 de dezembro

Quando a véspera de Natal chegou, Sakuta foi acordado por Nasuno pisando em seu rosto, passava um pouco das oito horas, um pouco mais tarde do que o habitual. Se tivesse aulas, certamente não teria chegado a tempo, mas sua última aula havia sido dois dias antes. Ele estava livre até o Ano Novo. Poderia ficar aconchegado em suas cobertas quentes, dormindo o quanto quisesse. Seria fácil ceder à tentação, já que também não tinha planos de trabalho. No entanto, ele tinha um bom motivo para se obrigar a sair de sua confortável cama.

“…Exatamente como no sonho.”

Ele olhou o relógio, que marcava 8:11, e saiu do quarto. Assim como no sonho, ele serviu ração seca para Nasuno. Depois, colocou uma fatia de pão na torradeira e fritou algumas salsichas na mesma frigideira que os ovos. Quando tudo estava pronto, ele e Nasuno comeram juntos

Lavou a louça, colocou a roupa para lavar e voltou para a sala de estar. Ao fazer isso, Kaede saiu cambaleando de seu quarto, ainda sonolenta.

“Bom dia, Sakuta.”

“Café da manhã?”

“Sim, por favor.”

Bocejando, ela se sentou à mesa de jantar. Ele colocou um prato com ovos e salsichas já preparados, torrada e uma caneca de panda cheia de chocolate quente na frente dela.

“Hm? Eu pedi chocolate quente?”

“Com certeza.” No sonho.

“É mesmo?”

Ela parecia incerta, mas começou a rasgar pedaços da torrada e mergulhá-los no chocolate quente. Logo, a única coisa em sua mente era o quão bom estava.

“Kaede, você vai almoçar com a Kano?”

“A gente falou sobre isso?”

“Falamos.”

Também no sonho. Na vida real, ela só havia mencionado que iam ver o show de Natal do Sweet Bullet. Sua amiga Kotomi Kano estaria com ela. À noite, ela não voltaria para Fujisawa, mas iria para a casa dos pais em Yokohama para o Natal. Ela não havia mencionado seus planos de almoço fora do sonho.

“Então você vai sair pouco depois das dez?”

“Sim. E você?”

“Pouco depois do meio-dia.” Enquanto conversavam, o alarme da lavadora tocou.

“Quando você chegar em casa, diga à mamãe e ao papai que eu vou passar lá no Ano Novo.”  disse ele, caminhando pelo corredor.

“Pode deixar.” Kaede respondeu com a boca cheia de torrada.

Ele estendeu a roupa lavada, aspirou a casa, se despediu de Kaede quando ela saiu, e então começou a se arrumar. Como havia dito, saiu por volta do meio-dia.

“Nasuno, cuide da casa.”

Nasuno parou de lavar o rosto e miou de volta. Sakuta foi para a Estação de Fujisawa, a dez minutos a pé de casa. No coração da cidade de Fujisawa, na província de Kanagawa, as linhas JR, Odakyu e Enoden se cruzavam ali.

Ele conhecia essa estação como a palma da mão, mas hoje… bem, ele já a tinha visto assim antes, em seu sonho. A multidão da véspera de Natal era exatamente como ele havia sonhado. Homens carregando pequenos sacos de presente. Mulheres bem arrumadas. Pessoas se encontrando na praça em frente à loja de eletrônicos. Todos pareciam nervosos e ansiosos. Sakuta estava no meio da multidão, esperando por Sara.

A multidão foi se dispersando gradualmente, conforme seus parceiros chegavam, um a um. Ele olhou o relógio. Marcava 12:29. Se o sonho fosse preciso, ela deveria chegar em breve.

Um momento depois, uma voz veio de trás dele.

“Cheguei.” Não era a voz que ele esperava.

Mas era uma voz que ele reconheceria em qualquer lugar. Confuso, ele se virou. Definitivamente era Mai, mas por que ela estava ali?

Ela usava um boné e seus cabelos estavam em dois rabos de cavalo pendurados na frente dos ombros. Além disso, os óculos falsos que ela usava quando queria se disfarçar. Sob a jaqueta acolchoada, ele viu um suéter e uma calça que lembrava jeans. Nos pés, tênis confortáveis para caminhar. Ela definitivamente estava vestida de forma casual.

“Por que você está aqui, Mai?”  a pergunta tinha que ser feita.

“Estou indo com você.” Ela agiu como se isso fosse óbvio, quando não era nada disso.

“Hã?”

“Eu disse que estou indo com você.”

“Eu ouvi, por isso disse “hã?”

“Estou indo com você.”

Ela não estava aceitando discussões. Estavam presos em um ciclo, sem saída. Mai já tinha decidido e estava deixando isso bem claro. Ela não estava buscando o consentimento de Sakuta, nem estava remotamente interessada em sua opinião sobre o assunto. Era simplesmente uma declaração. Não havia mais nada a discutir. O assunto estava decidido.

“Mai, quando conversamos sobre isso no telefone, você disse “tudo bem”.”

“E eu me preparei para ir.” Mai enfiou as mãos nos bolsos de sua jaqueta e fez uma pose de modelo. Esperando um elogio.

“Hum, você está super fofa de novo hoje.”

“Você nem está sendo sincero. Ela estendeu a mão e beliscou a bochecha dele.

Ele estava sendo sincero. Achava que ela estava fofa. Mas estava tão abalado que era difícil demonstrar outras emoções. Como ele deveria explicar essa reviravolta para Sara? Ele não fazia ideia.

“Hum… Sakuta-sensei?”

Ela chegou antes que ele pudesse pensar em qualquer coisa. Seus olhos se moveram noventa graus e encontraram a garota que ele realmente estava esperando. Ela havia parado a cerca de três metros de distância. Como ele havia sugerido, ela estava vestida de forma apropriada para o clima. Ela olhava de Sakuta para Mai, e depois para os dedos de Mai em sua bochecha. Sua expressão indicava que ela já havia superado a surpresa.

“Meu carro está estacionado ali.”  disse Mai, soltando a bochecha dele e caminhando em direção à saída sul.

“O que está acontecendo?”  sussurrou Sara.

“Desculpe. Eu também acabei de descobrir.”   ele conseguiu dizer. Isso não explicava muita coisa, mas ele estava sem palavras. Não estava escondendo nada e não havia mentido. Se Sara estava olhando para ele agora, sabia que ele realmente estava confuso.

“Vamos, Sakuta.” Mai já estava a dez metros de distância, apressada.

“Você vem comigo?”   ele perguntou.

“O-ok…” Sara estava claramente apenas sendo levada pela situação.

 

 

As mãos de Mai estavam no volante.

“……” Sakuta no banco do passageiro.

“……” Sara no banco de trás, sentada ereta como um poste.

“……”

O carro deixou a Estação de Fujisawa e seguiu em direção ao sul, para Enoshima, pela Rota 467. Isso os levaria, eventualmente, à estrada costeira. Parecia ser uma viagem agradável, mas ninguém dizia uma palavra. O único som era o ronronar suave do carro em movimento. Mai foi a primeira a quebrar o silêncio.

“Sakuta” ela disse.

“Hum?”  Ele olhou de lado e viu que seus olhos estavam fixos no carro à frente.

“Ela parece um pouco confusa. Talvez seja melhor você nos apresentar.”

Ele verificou o banco traseiro pelo espelho retrovisor. Sara estava sentada como um gato preso numa árvore. Desde que entrou no carro, não havia deixado suas costas tocarem o encosto.

“Hum, Mai…”

“O quê?”

“Eu também estou bastante confuso.”

“Por quê? Não é como se eu tivesse te pegado traindo.”

“Mas parece que sim.”

“Isso porque você não nos apresentou ainda. Isso realmente parecia ser a única maneira de aliviar a tensão.”

“Himeji”  ele disse, virando-se para olhá-la.

“S-sim?”  ela gaguejou, claramente nervosa com toda a situação.

“Acho que você já sabe, mas esta é minha namorada, Mai Sakurajima.”

“Claro que sei. Já vi seus programas de TV. A cena do show no novo filme dela me deu arrepios.”

Até o tom de sua voz era rígido, como se estivesse lendo um relatório escolar diante da classe.

“Obrigada” disse Mai, sorrindo calorosamente.

“E esta é Sara Himeji, uma das minhas alunas do cursinho.” Formalidades concluídas.

“Ela estuda em Minegahara, então é nossa kohai.”

O carro parou em um semáforo vermelho. Mai se virou e olhou diretamente nos olhos de Sara.

“Prazer em conhecê-la”  disse Mai.

“O-o prazer é todo meu!”  Sara piscava, ainda surpresa com o que estava acontecendo. Mai Sakurajima, em pessoa. Bem na frente dela, se movendo, falando. E o choque disso era mais que evidente.

“Posso te chamar de Sara?”

“S-sim, por favor.”

“Sinta-se à vontade para usar meu nome também. Sakurajima é tão longo….”

“Tá bom.”

“Cuidado, Himeji. Uma vez tentei dar um apelido a ela e quase fui morto.”

“Não foi, não.”

“Mas você ficou bem brava.”

“De jeito nenhum. Eu só estava disciplinando um kohai mal-educado.”

“Viu? Ela está furiosa.”

Ele se virou para falar diretamente com ela, mas Sara não respondeu. Sua boca estava meio aberta, apenas conseguindo esboçar um sorriso. Um sorriso constrangido. Ela não podia exatamente concordar com Sakuta com Mai ouvindo. Ou talvez estivesse chocada com o jeito brincalhão deles. Isso parecia provável. Ele entendeu o porquê.

Antes que ela se recuperasse, Mai perguntou:

“O Sakuta é um bom professor?”

“Meus alunos gostam mais de mim do que você imagina.”   Sakuta tentou responder.

“Não perguntei para você.” Mai o interrompeu.

“Ahh…” Ignorando a decepção dele, Mai olhou para o espelho, dizendo:

“E então?”

“Hm, os alunos gostam mais dele do que você imagina.” disse Sara.

“Sério?.” Mai perguntou, como se não acreditasse.

Se ele tentasse se meter aqui, ela provavelmente diria para ele ficar quieto. Sem querer que sua aluna visse isso, Sakuta preferiu ficar em silêncio.

“Sério. Não só eu. Os outros alunos dele,Yamada e Yoshiwa, também já pediram ajuda para ele.”

“Ajuda com o quê?”  Mai perguntou.

“Na maior parte, conselhos amorosos. Yamada perguntou como conseguir uma namorada.” Sara começou a rir no meio da frase, finalmente relaxando.

“Qual matéria você ensina mesmo, Sakuta?”   Mai perguntou.

“Eu preferiria ensinar matemática.”

Mas, por algum motivo, todas as perguntas que ele recebia eram sobre relacionamentos.

“Eu diria que você é o motivo pelo qual recebo essas perguntas, Mai.”

Se eles soubessem quem era sua namorada, qualquer um ficaria curioso. Matemática se tornaria uma preocupação secundária. Era algo natural.

“Não me culpe.”

O carro parou em outro semáforo. Assim que o carro parou, Mai esticou a mão e beliscou a bochecha de Sakuta de novo.

“Ai, ai! Ah, olha! Mai, o sinal abriu!”

Ele apontou para a luz verde à frente. Mai soltou sua bochecha e acelerou, seguindo o carro à frente.

“Vocês são sempre assim?”  perguntou Sara.

“Assim como?” Mai respondeu.

“Assim o quê?”  Sakuta perguntou, com um segundo de atraso.

“Tão em sintonia” disse Sara, sem encontrar uma expressão melhor.

“Normalmente somos ainda mais íntimos.”  disse Sakuta.

“Não torne isso estranho com sua aluna olhando.” respondeu Mai, sorrindo. E, apesar de suas palavras, ela não parecia inclinada a refutar o que ele disse.

Sara ficou em silêncio, ainda mais tímida do que antes. Não havia espaço para ela entre os dois, e isso a deixava em uma posição desconfortável. Mas enquanto ela hesitava, o carro acelerava. A estação do Monotrilho de Shonan passou à esquerda. Especificamente, a Estação Shonan Enoshima. À direita, havia a passagem para a Estação Enoden Enoshima. Um trem a caminho de Fujisawa passava por ali.

Sakuta sentia o olhar de Sara sobre ele. Tinha sido assim desde que entraram no carro. Ela buscava uma oportunidade para falar, esperando, mas não conseguia encontrar o momento certo. Sua tagarelice habitual tinha desaparecido completamente. O sinal ficou verde, e o carro seguiu ao longo da costa.

Ele olhou novamente para a escola e viu alguns alunos entrando.

“Os times ainda estão treinando durante o Natal?”

“Ah, isso me lembrou. Sakuta-sensei, você viu a Yoshiwa esta semana?”  Sara se inclinou para a frente, aproveitando o assunto.

“Eu a vi ontem, na aula de recuperação. Ela disse que chegaram às semifinais do vôlei de praia, mas foram eliminadas lá.”

No entanto, o time tinha vencido a disputa pelo terceiro lugar. Ficar em terceiro lugar no campeonato nacional era um grande feito.

“Ela voltou super bronzeada!” Sara continuou.

“Ela disse que o tempo estava tão quente que a maioria dos times acabou jogando de biquíni.” explicou Sakuta, lembrando-se de como Juri tinha mencionado isso com um toque de vergonha, o rosto vermelho por motivos além do sol.

“Do que estão falando?”  Mai perguntou, percebendo que havia algo a mais naquela história.

“Yoshiwa está apaixonada por um garoto, mas esse garoto gosta de mim. Então, Sakuta-sensei deu alguns conselhos sobre como chamar a atenção dele.”

Sara respondeu, claramente se divertindo com a situação e animada para compartilhar um dos segredos de Sakuta com Mai. Ela parecia curiosa para ver no que isso iria dar. Mas antes que ela pudesse continuar…

“Se conheço Sakuta, ele deve ter dito para ela mostrar as marcas de bronzeado.” disse Mai, como se fosse algo óbvio.

“Uau! Acertou em cheio…”  Sara parecia surpresa.

Claramente, não esperava que Mai adivinhasse tão facilmente. Não era exatamente o tipo de resposta que alguém chegaria com um pensamento convencional.

“Você me conhece bem, Mai.” disse Sakuta, rindo.

“É exatamente o tipo de coisa que você diria. Mas cuidado com quem você fala essas coisas”  advertiu Mai.

“Vocês realmente são um casal…” Sara se recostou no assento, perdendo o ânimo. Um suspiro escapou de seus lábios.

“O que foi? Achou que ele estava inventando?  Mai sorriu, mantendo os olhos na estrada.

“Não, é só que… vocês são tão confortáveis um com o outro. O Sakuta-sensei não age assim na escola.”

“Ah, é?”

“Ele é todo atencioso com você.”

Sakuta olhou pelo espelho retrovisor e viu Sara fazendo um beicinho. Ela parecia mais infantil do que o normal, ou talvez estivesse apenas agindo de acordo com sua idade. Quando Sara percebeu que ele a observava, virou-se de propósito para o lado.

“Sakuta me adora” disse Mai alegremente. Não estava claro se ela tinha percebido o humor de Sara, mas Sakuta tinha certeza de que sim. Aquele sorriso era astuto. Ela estava escolhendo palavras intencionalmente para provocar a garota.

Sakuta não sabia como deveria reagir. Se houvesse uma resposta ideal, ele adoraria segui-la. Afinal, como se deve agir num encontro com uma aluna enquanto sua namorada está junto?

O carro continuou ao longo da praia de Yuigahama por um tempo e virou à esquerda, pouco antes do Rio Nameri. As placas de orientação indicavam o caminho para Kamakura. Eles estacionaram em um local próximo à Estação de Kamakura.

“Por aqui”, disse Mai, voltando pelo caminho de onde vieram.

“Para onde estamos indo, Mai?”

“Você vai ver.”

Ele não estava vendo muita coisa naquele momento. Estava totalmente perdido. Tudo o que sabia era que estavam se afastando da parte mais típica de Kamakura. Se distanciando da Rua Komachi, com todas as suas lojas charmosas para turistas, e também do Tsurugaoka Hachimangu, que era basicamente o símbolo de Kamakura.

“Não vamos por esse caminho com frequência”, disse Sara, olhando ao redor enquanto caminhava ao lado de Sakuta.

“Chegamos”, disse Mai, cerca de três minutos depois.

Ela parou em frente a uma loja simples, mas com aparência sofisticada. Era obviamente muito mais nova que os arredores históricos.

“Mai, você quer dizer…?”

Ele olhou para as letras na placa e viu “MONT BLANC”.

“Imaginei que seria um bom presente para Touko Kirishima. Mesmo que Sara possa ler a mente dela, você vai precisar dar um jeito nela, certo?”

“Ah! Distraia-a com um Mont Blanc, depois, pá!”

“Quão forte será o golpe?” perguntou Mai, espiando por trás de Sakuta. Sara estava se escondendo atrás dele.

“Hum…”, ela murmurou, imitando o gesto de um golpe. Era um golpe consideravelmente forte.

“Isso deve funcionar.” Parecia um tapa bem dado.

“Importa onde acertar?”

“Qualquer lugar serve.”

“Isso não deve ser muito difícil, então.”

“Conseguir o Mont Blanc pode ser o maior desafio.”

Já havia uma longa fila do lado de fora. E era 24 de dezembro. Véspera de Natal. Casais estavam por toda parte. Até mesmo em Kamakura.

Havia cerca de quinze casais à frente deles. Mesmo que cada um levasse apenas um minuto, isso significava uma espera de quinze minutos. E, com base no que Sakuta viu ao espiar pela janela, parecia que um minuto era uma estimativa otimista. Assim que um pedido era feito, eles preparavam o Mont Blanc como se fosse um sorvete expresso, e então finalizavam a compra. Isso poderia levar meia hora.

“Então é melhor você entrar na fila, Sakuta.”

“Enquanto você faz o quê?”

“Minha presença aqui não vai ajudar em nada. Nodoka me pediu para pegar aqueles biscoitos em formato de pomba e alguns Kurumicco. Vou pegar  Sara para fazer isso.”

“Hã?”

“Hã?!” A surpresa deles foi simultânea.

“Vamos.” Antes que pudessem reagir, Mai já estava se afastando.

“Hum, vejo você depois?”, perguntou Sara. Sem ter tempo de dar sua opinião, ela acabou correndo atrás de Mai.

“Espero que isso seja tranquilo…”, disse Sakuta, entrando na fila. Ele estava razoavelmente preocupado com a situação.

Suas preocupações estavam com Sara.

Ele não achava que Mai faria algo muito louco, mas essa situação já era bem fora do comum. Definitivamente não era um acontecimento cotidiano. Sara estava no meio de algo que só acontece uma vez na vida.

Nem Sakuta jamais imaginou que Mai apareceria. Ela literalmente não estava em seus sonhos.

Essa súbita onda de acontecimentos extraordinários era uma grande ruptura com os sonhos que ele havia tido. O sonho profético não era mais remotamente útil.

Se algo poderia ajudá-lo naquele momento, seria a capacidade de visão remota.

Ele imaginou que Sara não perceberia o que estava acontecendo.

Sozinha com Mai, ela não teria a chance de pensar em Sakuta. Certamente, não o suficiente para parar e espiá-lo.

Com os olhos no cardápio do Mont Blanc, ele enviou sua mente para longe. Seguindo o fio de conexão através da escuridão. Encontrando-a, alcançando sua mente, e se conectando.

Isso permitiria que ele visse o que não podia. O que Sara via de Mai enquanto a seguia. Mai estava caminhando pela estrada em direção a um santuário.

Sara a seguia, mantendo o mesmo ritmo.

Esse era o Wakamiya Oji, o caminho que atravessa o coração de Kamakura até o Tsurugaoka Hachimangu. Alguns metros à frente, ele avistou dois portões torii vermelhos sob o céu de inverno.

Mas Sara não estava olhando para isso.

Seu foco estava completamente em Mai, e somente nela.

“O que eu estou fazendo?”, pensava Sara.

“Eu deveria estar em Kamakura com Sakuta-sensei. Queria alugar um quimono na Komachi. Forçá-lo a dizer que eu estava bonita. Tirar fotos. Juntos. Comer dango. Olhar as joias de conchas cor-de-rosa. Fazer com que ele escolhesse algo. Me comprar um presente. Tomar chá no templo com o bambu. Pensei em todos esses planos, e agora estão arruinados.”

“E ele nem está me olhando. Porque ela está aqui.”

Uma onda de raiva. Ressentimento. Os olhos de Sara estavam cravados nas costas de Mai.

Mai não notou. Ou… notou e estava fingindo que não. Suas habilidades como atriz a haviam transformado em um nome conhecido. Vendo pelos olhos de Sara, Sakuta não tinha certeza. Ele apenas supôs que Mai sabia. Ela sabia antes mesmo de aparecer naquela manhã.

 

Ela tem tudo, Alta, Cabelos brilhantes, Rosto Perfeito, Pele impecável, Pernas longas,Cintura fina, Bonita… … e ela é legal.

Por que ela estaria com Sakuta-sensei?

Esse fluxo de pensamentos parecia ser todo sobre Mai, mas, de alguma forma, ele acabou envolvido. Mas a pergunta abrupta não o afetou. Ele já estava acostumado com isso. Receber esses olhares no campus ainda era uma ocorrência diária para ele.

“Sara, tem algum presente de Kamakura que você recomendaria?”

“Mm? Ah, eu adoro Kurumicco. A caixa e a embalagem são fofas também!”

“Eu trago esses com bastante frequência.”

‘Isso não é o que eu quero saber. Isso não é o que eu quero.’

“… Posso te fazer uma pergunta?”

“Pode fazer mais de uma!”

“Por que o Sakuta-sensei?”

‘Eu posso perguntar isso, né?’ Sara parou de andar.

Percebendo isso, Mai também parou e se virou para encará-la.

“Por que o quê?”

“Bem…”

“Vocês não estão exatamente no mesmo nível.”

“Eu não sou boa o suficiente para ele?”

“É o contrário, obviamente! Você poderia estar com algum ator charmoso ou ídolo popular!”

‘Eu sei que todos eles querem namorar você, Mai.’

“Você gostaria de estar com alguém assim, Sara?”

“Você não gostaria…?”

“Não é o que todo mundo quer?”

“Digamos que você está com eles. E aí?”

“Hã?”

“……”

“O que isso quer dizer?”

“Pra se gabar com suas amigas?” Mai já tinha a resposta.

‘Sim. Eu faria isso. Com certeza, eu quero dizer…’

“…… Isso é ruim?”

“Não. Quem não quer se gabar do namorado?”

“……”

Mais uma vez, Sara não sabia como responder.
Isso é normal?
Então por que ouvir isso parece…
Sem perceber, suas mãos estavam em seu peito.

“… tão horrível?”

“Talvez você seja a única contra essa ideia, Sara.”

Extremamente perspicaz. Para Sakuta, Mai tinha acertado em cheio.
Sara não conseguia colocar isso em palavras, mas a ideia de namorar dessa forma parecia errada para ela, e foi por isso que ela fez a pergunta. Estava expressando a dúvida em seu coração.

‘Isso não é verdade… eu acho…!’

Por dentro, Sara estava tentando se convencer, como se negações veementes pudessem trazê-la de volta à briga. Ela estava desesperadamente tentando proteger algo. E esse algo provavelmente era a versão de si mesma que passou a vida construindo.
Ela não podia admitir que seus valores centrais estavam errados.

Por isso as palavras de Mai não faziam sentido para ela. Não podia deixá-las a afetarem, não podia deixar que a desestabilizassem. Ela ainda não tinha obtido as respostas que queria e não estava pronta para desistir.

“… Isso não é verdade”, disse ela, finalmente conseguindo organizar suas palavras. Era fácil perceber que ela estava um pouco irritada, mas isso só a colocava ainda mais nas mãos de Mai.

Mai estava conduzindo Sara, provocando essa resposta emocional dela.
Sakuta desejava que ela pegasse leve com a garota. Sara ainda era apenas uma criança. Uma estudante do primeiro ano do ensino médio. Mas seu desejo não alcançou Mai. Àquela distância, ele não tinha como se comunicar.

“Por que você escolheu o Sakuta como seu professor?”

“Porque…” Sara tentou responder, mas não foi muito longe.

“Porque ele está namorando Mai Sakurajima, e isso parecia um desafio interessante?”

“……” A mente de Sara ficou completamente vazia. O choque foi tão forte que cada pensamento desapareceu.

“E então? Acha que tem uma chance?”

Incapaz de dizer uma palavra, Sara apenas encarou Mai, sem conseguir desviar o olhar.

‘Ela é realmente linda.’
Foi o primeiro pensamento que passou pela sua cabeça.

‘Se ele está namorando ela, por que ele olharia para mais alguém?’
Ela tinha sua resposta.

“Você sabe que não. É por isso que está perguntando.”

‘Então por que…?’

“Sim”, admitiu Mai.

‘Mas por que eu…?’

“Mas todos os outros em quem mirei caíram por mim. Mesmo que tivessem namorada!”

‘O que estou dizendo?’

“Mas esses garotos não estavam namorando comigo.” A atitude de Mai não vacilou. Ela era inabalável.

“……”

“E esses garotos não eram Sakuta.” Cada frase a tornava mais firme.

“…… Mas você nunca sabe!”

‘Chega. Pare com isso! Apenas pare de falar…’

“É justo. Sakuta é livre para fazer sua escolha.”

‘Já entendi! Pare, antes que eu deixe de ser quem sou!’

Os pensamentos de Sara eram agora gritos internos, ecoando dolorosamente. Se Mai pressionasse com mais uma palavra, Sara se quebraria, mas isso não aconteceu.

“Desculpa, isso não tem nada a ver.” Mai escolheu aquele momento para recuar.

“Você perguntou por que escolhi o Sakuta, certo?”

“Sim…” Sara conseguiu murmurar uma resposta, quase inaudível.

“Sakuta lida com todas as minhas besteiras enquanto resmunga de maneira apropriada. Nesse tipo de trabalho, estou sempre mudando os planos de última hora, e não podemos ser vistos juntos em público. O fato de ele agir assim é um alívio. Eu não preciso me estressar com isso.”

Mai estava apenas compartilhando.

“É por isso?” Sara parecia perdida. Ela provavelmente teria mais a dizer, muito mais. Isso mal arranhava a superfície.

“Além disso, ele sempre me elogia pela minha comida. Cozinhar com ele é uma alegria, e eu adoro quando comemos juntos, só nós dois.”

“……”

A mente de Sara estava se enchendo de pontos de interrogação. Ela não fazia ideia do que estava ouvindo.

“Ele é ótimo em dizer ‘eu te amo’. Às vezes, poderia diminuir um pouco a frequência, no entanto.” Mai riu, claramente se lembrando de algum momento específico.

‘Eu não entendo. De jeito nenhum.’

Mai captou o olhar confuso de Sara.

“Tenho muitos outros motivos. Eu poderia falar sobre eles o dia todo. Como ele sempre diz ‘obrigado’ e ‘desculpa’, como ele tem amigos que vêm ajudá-lo, como ele se importa com eles. Como ele é ótimo cuidando da irmã ou brincando com o gato. E como ele se preocupa com seus alunos.”

“Você está falando de mim?”

“Você já deu uma olhada na mente dele, não é? Ele não pensou em mais ninguém além de você o dia todo. E está me deixando de lado totalmente.”

“……”

‘É isso! Ele tem se preocupado. Sakuta-sensei se preocupa comigo…’

“Ele é uma daquelas pessoas que se dedica a ajudar os outros. O tempo todo, ele insiste que está fazendo isso para o próprio benefício. O jeito como ele distorce as coisas… bem, isso me frustra às vezes. Mas não consigo odiar isso.”

O sorriso de Mai irradiava calor, e seu olhar era cheio de carinho.

‘Mas eu não quero que ele se preocupe. Eu quero…’

“Essa explicação ajuda?”

“……”

Sara não disse sim. Ainda estava confusa. Ainda se sentia perdida.

“É difícil colocar emoções como essas em palavras. Mas por que estou namorando ele? Essa resposta é fácil.”

Sara levantou o olhar. Os olhos fixos em Mai, esperando que essa fosse a resposta de que ela precisava.

“… Por que seria?” ela perguntou.

Toda a postura de Mai se suavizou. Seus olhos estavam tão ternos.

Não havia hesitação, nem rodeios. Como ela havia dito, essa era fácil. Ela sabia a resposta o tempo todo, e provavelmente era a mesma que Sakuta daria.

“Eu estou namorando Sakuta para que possamos ser felizes juntos.” Mai falou as palavras lentamente, saboreando cada uma. Quando terminou, ela sorriu. E então:

“Ele é o único que me faz sentir assim. Talvez seja por isso que escolhi Sakuta.”

Ela disse isso quase como se a ideia tivesse acabado de ocorrer a ela. Como se fosse um sentimento nebuloso que acabara de se cristalizar.

“……”

Sara estava sem palavras. Essas palavras e emoções não eram nada do que ela havia imaginado. As palavras de Mai carregavam uma profundidade de calor além da experiência de Sara.

‘O que… é isso?’ Aquele calor a envolvia.

‘Eu nunca senti…’ … e a engolia.

… nada como isso.’ Ela estava se afogando naquele calor.

‘Nada como isso.’ Mai deu-lhe um sorriso gentil. Um sorriso que mostrava o quanto ela estava feliz.

“……” Sara estava atônita. Suas emoções estavam sem forma.

‘Eu não posso.’ Silenciosamente, no fundo… algo mudou.

‘Não há como.’

“Se você não acredita, veja por si mesma.”

“……Hã?”

“Olhe dentro de mim.” Mai estendeu a mão, como se quisesse apertar a de Sara.

“Faça isso e você vai experimentar tudo em primeira mão.”

‘O que está acontecendo agora?’ Os dedos de Sara tremiam. Sem dúvida, ela estava incerta.

‘O que eu faço?’ Procurando por respostas.

Mas ninguém oferecia nenhuma.

Ela precisava encontrar sua própria resposta.
Se alguém mais lhe desse uma, seria apenas a resposta daquela pessoa.

Mai se aproximou, estendendo a mão em direção à de Sara.

‘Não…’ Suas mãos estavam a três polegadas de distância.

‘Não!’ Duas polegadas.

‘Eu disse não!’ Uma.

‘Não…!’ Quase tocando.

“Não…!” Sara gritou, puxando a mão de volta. Ela a segurou com a outra, como se estivesse protegendo algo precioso.

‘Eu não quero saber!’

A rejeição violenta de Sara ecoou na mente de Sakuta. As farpas de seu desabafo perfuraram o coração dele.

‘Eu não posso vencer! Não há como eu derrotá-la!’

Como se alguém tivesse desligado abruptamente o telefone, a visão desapareceu, e os sons se foram com ela.

Ele tentou de novo, mas não adiantava.

Não conseguia se conectar a Sara. Não sabia onde ela estava ou o que estava fazendo. Não conseguia mais rastrear seus pensamentos.

“Ok, próximo… desculpe pela espera.”

Uma atendente com um menu de Mont Blanc olhava para Sakuta. E o sorriso dela ajudou a trazê-lo de volta à realidade.

Atrás do balcão, os Mont Blancs recém-preparados que Sakuta havia pedido estavam sendo cuidadosamente colocados em uma caixa de presente. Ele já havia pago e estava esperando que terminassem quando um membro da equipe chamou hesitante:

“Hum, com licença, tem algum Azusagawa presente?” Estavam segurando um telefone em uma das mãos.

“Sou eu”, respondeu Sakuta, confuso e um pouco nervoso. O que poderia ser?

“Alguém ligou para a loja procurando por você”, disseram. Aquilo era, naturalmente, algo sem precedentes, e eles não sabiam como lidar com a situação.

“Oh, desculpe! Esqueci meu telefone hoje”, Sakuta explicou, inventando uma desculpa para evitar complicações. Pegou o telefone, um modelo antigo, e o levou ao ouvido.

“Alô?” ele perguntou.

“Sakuta?” Ele reconheceu a voz na hora.

“Mai? O que houve?”

“Desculpa. Perdi a Sara.”

“Hã?”

“Eu estava pagando pelos nossos souvenirs e, quando percebi, ela tinha sumido. Procurei nos arredores, mas não consegui encontrá-la.” Mai falava mais rápido do que o habitual, preocupada.

“Onde você está?”

“Na loja de biscoitos de pomba.”

Essa loja ficava na Wakamiya Oji, entre o local onde ele estava e o Templo Tsurugaoka Hachimangu. Ele poderia chegar lá em dez minutos.

“Então espere aí, estou indo.”

“Desculpa!”

“Nós vamos encontrá-la.”

Sakuta desligou e pediu permissão para usar o telefone novamente. Discou o número que havia memorizado recentemente: o celular de Sara.

Sem resposta na primeira tentativa. Nem na segunda. Na terceira, ela atendeu, mas não falou nada. Ele podia ouvir sua respiração e os ruídos ao redor.

“Himeji? Sou eu.”

Antes que pudesse terminar a frase, ela desligou. Ele ouviu um suspiro. Tentou mais uma vez, mas dessa vez a chamada foi diretamente para a mensagem automática:

“Não posso atender no momento.”

Parecia inútil insistir.

Sakuta agradeceu ao funcionário e devolveu o telefone. “Desculpe, eu volto mais tarde para pegar os Mont Blancs. Vocês poderiam guardá-los por enquanto?”

“Hum, claro… podemos, mas se você demorar muito…”

Ele sabia por que eles estavam hesitantes. Os doces estragavam rápido. Lembrou-se que essa loja era uma filial daquela que Touko havia o levado, e seus Mont Blancs também só duravam cerca de duas horas.

“Eu volto logo”, disse ele, saindo da loja sem nada nas mãos.

 

Kamakura, na véspera de Natal, estava lotada por todos os lados, mesmo em uma avenida grande como Wakamiya Oji. Quanto mais avançava, mais densa a multidão se tornava. Era difícil até andar em linha reta, quanto mais procurar alguém.

Ele manteve os olhos atentos enquanto seguia em direção à loja onde Mai estava esperando, mas não avistou Sara. Com a quantidade de pessoas ali, era praticamente impossível ver mais de alguns metros à frente.

Quando chegou ao destino, a loja de biscoitos de pomba, uma construção de paredes brancas com cortinas antigas sobre as portas, Mai já o aguardava e correu até ele, ainda se desculpando.

“Eu acho que a pressionei demais”, disse, parecendo genuinamente arrependida.

“Você sabe onde tem lojas que alugam kimonos?”

“Tem várias na Komachi”, disse ela, pegando o celular e verificando o mapa.

“Olha, aqui.” Ela mostrou o mapa, com vários pontos marcados.

“Eu vou checar essas lojas. Mai, veja as lojas de dango e qualquer lugar que venda joias de concha rosa.”

“Entendido.”

“Vamos nos encontrar aqui quando terminarmos.” Mai apenas assentiu, sem perguntar por quê.

Depois de olhar o mapa, Sakuta já tinha uma ideia geral de onde estavam as lojas e começou a verificar cada uma delas. A rua Komachi estava cheia de lojas, com muitas famílias e casais por todo lado. Em alguns momentos, o fluxo de pessoas diminuía tanto que ele mal conseguia se mover.

Mesmo quando conseguiu chegar a algumas lojas, não encontrou sinal de Sara. Sendo véspera de Natal, a maioria das lojas tinha filas de casais esperando para trocar de roupa.

Na terceira loja, ele finalmente conseguiu uma pista.

Os funcionários lembravam-se de uma garota que correspondia à descrição de Sara. Ela havia terminado de trocar de roupa e saído da loja apenas cinco minutos antes.

Sakuta agradeceu e saiu rapidamente para a rua.

Olhou para ambos os lados, mas não viu sinal dela. Com a multidão tão densa, era difícil ver mais do que alguns metros adiante.

Ele voltou para a loja de biscoitos, checando as lojas no caminho. Quando chegou, encontrou Mai vindo da direção oposta.

Ela balançou a cabeça. “Alguma sorte do seu lado?” ela perguntou.

“Ela alugou um kimono.”

“Então ela ainda está por aqui.”

“Provavelmente.”

Quais outras pistas ele tinha? Ele se lembrou de algo que havia captado nos pensamentos de Sara.

“Mai, você conhece algum templo com bambus?”

“Hokokuji?”

“Onde fica?”

“É uma caminhada longa. E estamos carregando várias coisas. Melhor irmos de carro.” Ela mostrou a sacola de presentes, depois começou a caminhar em direção ao carro.

“Mai, deixa eu carregar isso”, disse Sakuta, pegando a maior sacola dela.

Dentro da sacola amarela e branca havia uma lata maior, com o desenho de uma pomba.

“Leve isso para sua família no Ano Novo.”

“Você não vai?”

“Claro que vou. Tenho que desejar um feliz Ano Novo para eles.”

Sem mais conversa, os dois se apressaram em direção ao carro.

A viagem até o carro levou dez minutos, e o trajeto até o templo levou o mesmo tempo. O estacionamento próximo à entrada estava lotado.

“Isso parece cheio… Sakuta, desça e vá a pé na frente.” Checando se não havia ninguém os seguindo, ele abriu a porta e saltou.

O ar já parecia diferente. Eles estavam longe da agitação de Wakamiya Oji e da Rua Komachi. Quando ele chutou uma pedrinha ao longo do asfalto, o som ecoou alto demais.

Ele apressou-se através dos portões, entrando no terreno do templo. Lá dentro, o silêncio só se tornava mais palpável. Sentindo o peso da quietude, ele avançou, avistando o bosque de bambu adiante. O verde brilhante destacava-se mesmo no frio do inverno, cheio de vida. Isso fez com que seus olhos se voltassem para o alto. A luz do sol filtrava-se entre as folhas de bambu, fazendo com que o lugar inteiro cintilasse, como se ele estivesse olhando para cima debaixo d’água. Era mágico, quase como se ele tivesse escapado deste mundo.

Em um caminho estreito, ladeado e coberto por bambus, ele encontrou alguém também olhando para cima. Ela vestia um quimono, e, junto com o ambiente ao redor, formava uma cena impressionante.

Ele quase não a reconheceu. Levou um momento para perceber quem era. O quimono era branco com flores vermelhas, e seu cabelo estava preso para combinar. Mas era quem ele estava procurando.

“Até no Natal, o bambu é incrível,” ele disse. Era uma árvore de Natal pouco convencional.

Sara se virou, com seus enfeites de cabelo balançando. “Sakuta-sensei! Por que…?”

“Se você quer que eu te encontre, deveria ter escolhido um lugar mais fácil.” Se ele não tivesse trapaceado, provavelmente não teria conseguido. Encontrá-la teria sido impossível.

Ele deu alguns passos em direção a ela.

“Não…!” Três passos adiante, uma onda de pânico a atingiu, e ela se virou para correr.

“Vestida assim…” Antes que ele pudesse terminar, a barra de seu quimono prendeu no caminho de pedra, e ela caiu de joelhos, como uma criança pequena.

“Ai…” Em um segundo, ele estava ao lado dela.

“Você está bem?” perguntou, ajudando-a a se levantar.

“…Eu sujei o quimono.” Ela limpava os joelhos, sem demonstrar muito ânimo.

“Estou perguntando de você.”

Sara tinha caído com força, e suas mãos estavam definitivamente vermelhas. Felizmente, o arranhão não era grave o suficiente para sangrar. Ele ajudou a tirar a sujeira.

“Por que…?” Essa provavelmente era uma pergunta bem diferente da primeira.

“Quando minha aluna se perde, eu tento encontrá-la.” Ciente da diferença, ele escolheu responder à primeira pergunta.

“Não quero dizer isso…”

Por que ele não estava bravo por ela ter desaparecido? Por que não exigiu uma explicação? Era isso que o segundo “por que” de Sara significava. Mas Sakuta não via sentido em discutir isso. Saber a resposta não resolveria a situação para ela. Em vez disso, ele disse o que precisava ser dito.

“Precisamos pensar em um plano.”

“Para o quê…?” Sara definitivamente não estava acompanhando seu raciocínio.

“Himeji, você precisa de uma boa desculpa para dar uma cabeçada em Touko Kirishima.” Esse era o verdadeiro objetivo ali. Mas o rosto dela murchou.

“Eu disse que não precisava ser na cabeça…” murmurou, desviando o olhar, com pouca confiança.

“Então por que me acertou lá?” Eles já tinham batido as cabeças uma vez, antes de ela se tornar sua aluna.

“Foi quando você começou a ler minha mente, certo?”

“Eu não quis acertar tão forte! Nem acredito que você ainda lembra disso.”

“Você tem uma cabeça bem dura. É memorável.”

“Isso é a última coisa que eu queria ouvir…” A voz de Sara foi ficando mais baixa.

“Que tal esse plano? Eu abro a caixa de Mont Blanc e ofereço a Touko Kirishima. Enquanto ela olha para dentro, você dá a cabeçada.”

“…Hum, Sensei.”

“Deixo a parte da cabeçada por sua conta.”

“…Eu não consigo.”

“Não? Justo, vamos pensar em um plano B.” Uma brisa passou pelo bosque, fazendo as folhas de bambu farfalharem.

“Não, quero dizer,” ela falou rapidamente, interrompendo-o, “eu não consigo mais.”

“…”

“Eu não vejo nada.” Sua voz era um sussurro.

“Eu não ouço uma palavra.” Sara abaixou a cabeça, desolada.

“Eu não sei mais o que você está pensando. Não ouço Yamada ou Yoshiwa, ou qualquer outra pessoa. Isso me assustou tanto que eu fugi. Sinto muito…”

“Devemos tentar bater as cabeças de novo?” Ele ofereceu sua testa, mas Sara não reagiu. Com os olhos fixos no chão, ela gentilmente encostou sua cabeça no peito dele, como um gato se esfregando.

“Por que… por que não consigo mais ouvi-los…?” Duas, três vezes, ela o empurrou levemente. A segunda foi mais forte, a terceira, ainda mais. “Por que…?!”

Sara já sabia a resposta. Ela a tinha entendido enquanto conversava com Mai. Como se sentia. O que realmente desejava. Antes que pudesse empurrá-lo novamente, Sakuta colocou a mão em sua testa, como se estivesse medindo sua temperatura.

“Me solta!”

“Se você continuar batendo a cabeça, vai perder todas as suas células cerebrais.”

“Ainda assim…”

“Parabéns.”

“Não comemore!” A voz de Sara subiu a um tom agudo.

“Curar a Síndrome da Adolescência é uma coisa boa,” Sakuta disse, em um tom muito mais normal.

“Não é! Como vou te ajudar agora?!”

“Não se preocupe com isso.”

“Eu queria te ajudar, Sakuta-sensei! Eu queria que fosse graças a mim! Agora não faz mais sentido eu estar aqui!”

“Já sou grato por você ter escolhido ser minha aluna.”

“Eu não quero ser apenas uma aluna!!”

Sara não estava mais fugindo de seus sentimentos. Ela estava se abrindo. E foi por isso que aquilo atingiu Sakuta tão forte. Parecia que uma mão apertava seu coração, porque sua resposta já estava decidida.

“Honestamente, é um alívio.”

“……”

“Fico feliz por não ter que usar sua Síndrome da Adolescência.”

Ele falava com toda sinceridade. Isso o incomodava desde que fizeram aqueles planos. Sara provavelmente sabia disso. E Mai quase certamente tinha percebido também, o que explicava por que ela se juntou a eles.

“Então, estou feliz que você esteja curada.”

“Por que…?”

“Eu estou falando sério quando digo: obrigado.”

“Você sabe o que eu fiz com a minha Síndrome da Adolescência! Eu estava espionando todos! Brincando com as emoções deles, e você sabe por que eu estava atrás de você! Como pode simplesmente ser legal comigo?!”

“Bem, é o tipo de pessoa que eu quero ser.”

“Você deveria estar bravo! Ou pelo menos chateado! Agora eu não sei o que fazer! Você não é justo, Sakuta-sensei. Nada disso é justo.”

“Adultos não são realmente justos. Não na minha experiência.”

“Agora você está agindo como se eu fosse uma criança! Temos apenas três anos de diferença!”

“Eu sou três anos inteiros mais maduro que você, Himeji.”

“…Não é justo.”

A cabeça de Sara permaneceu abaixada, e ela fungou uma vez, como se estivesse tentando conter as lágrimas. Ela fez isso repetidamente, seus ombros tremendo. Mas, com o tempo, ela se acalmou.

“Sakuta-sensei,” disse Sara, sua voz embargada.

“O que foi? Ainda não terminou de reclamar de mim?”

“Eu nunca vou parar de fazer isso.”

Por fim, ela levantou a cabeça. Seus olhos ainda estavam molhados de lágrimas, mas ela encontrou o olhar de Sakuta e o sustentou. Havia um brilho determinado em seus olhos.

“Eu queria ter conseguido me apaixonar por você de verdade.”

“O manual de ensino diz que não devemos nos envolver romanticamente com os alunos.”

“Neste caso…” Sara enxugou os olhos com os dedos. Então forçou um sorriso.

“Se eu passar na minha faculdade dos sonhos, vou te pedir de novo.”

Ela estava marcando um compromisso para dali a dois anos. Era o mesmo conselho que Sakuta havia dado a Toranosuke. Ele não esperava que isso voltasse para assombrá-lo.

“Brilhante ideia,” ele disse. Ele só tinha a si mesmo para culpar.

“E por quanto tempo vocês vão ficar abraçados?”

Ele se virou ao ouvir essa voz e encontrou Mai segurando suas chaves, com uma expressão de reprovação.

“Você tem tudo, Mai! Me deixe ficar com o Sakuta-sensei por um minuto. Eu sou mais jovem, você pode me ceder um pouco.”

Sara definitivamente não estava se segurando dessa vez. Parecia que um grande peso havia sido tirado de seus ombros.

“Sakuta me pertence,” disse Mai, firmemente. Ela voltou pelo caminho de onde tinha vindo. Mas, alguns passos depois, ela se virou novamente para Sakuta e Sara.

“Vocês ainda precisam ir para a faculdade e encontrar Touko Kirishima, certo?”

“Ah, é verdade. Acho que sim.”

Esse era o objetivo do dia. Ele não podia mais ler a mente de Sara, mas ainda havia coisas que precisava saber.

Eles devolveram o quimono de Sara à loja, pegaram os Mont Blancs e deixaram Kamakura para trás. Já estavam dirigindo há quinze minutos. Era quase quatro horas, mas o campus ainda estava fora de vista.

“Não parece que vamos chegar a tempo.”

“Desculpa! Se eu não tivesse…” Sara se encolheu no banco de trás.

“Himeji, pode procurar Touko Kirishima no seu celular?” Disse Sakuta, tentando evitar que ela se preocupasse ainda mais. Em vez disso, deu a ela uma tarefa. Melhor do que ficar ali sem fazer nada.

“Tá bom!” Ela respondeu, sorrindo enquanto puxava o celular. Um momento depois, ele ouviu um suspiro agudo.

“O que foi?”

“Já começou.” Enquanto falava, uma música começou a tocar dos alto-falantes do celular. Era uma música natalina agradável, com muitos sinos. Sara levantou o telefone para que Sakuta pudesse ver.

Mostrava algum tipo de jardim. Uma pequena ponte sobre um lago. Ao longe, na ponte, uma pessoa vestida de Mamãe Noel de minissaia, de costas para a câmera. Apenas o contorno dela era realmente visível.

“Esse é o jardim do campus.”

Ele e Mai eram alunos lá, então foi fácil identificar. Aquilo ficava bem no centro do prédio principal em forma de C. A vista das janelas da sala de aula dava exatamente para aquele ponto.

O GPS mostrava que ainda faltava pouco mais de um quilômetro para chegarem à escola. Menos de cinco minutos. Mas a música natalina no celular de Sara parecia improvável de durar tanto. A maioria das músicas durava de três a cinco minutos.

Através do para-brisa, ele podia ver a Linha Keikyu. A estação de Kanazawa-hakkei estava logo à frente. As ruas e vistas perto da faculdade.

“Chegando ao seu destino”, anunciou o GPS. Ele já podia ver os portões principais, então a notificação era desnecessária. Mai parou bem em frente.

“Vai na frente.”

“Ah, estou indo!” Sara pulou do carro logo atrás dele. Eles passaram pelos portões principais do campus.

A música natalina no celular de Sara já não estava mais tocando, mas Sakuta seguiu em direção ao jardim, tomando cuidado para não destruir os Mont Blancs que carregava. Sara o seguiu logo atrás.

“Sakuta-sensei, a transmissão ao vivo acabou!”

“Então podemos ir diretamente até ela.” Ele não queria acidentalmente aparecer na transmissão e ter seu rosto exibido para o mundo todo.

Eles atravessaram o prédio, desceram o corredor e saíram pela porta dos fundos. O olhar de Sakuta imediatamente foi para o lago no centro e a ponte sobre ele. A Mamãe Noel de minissaia estava caminhando em sua direção.

Touko os avistou logo.

“Vocês estão atrasados! Acabou.”

“Você devia ter esperado! Eu trouxe uns doces e tudo mais.” Ele entregou a caixa de Mont Blancs.

“……”

“Não é veneno, eu juro. Mas vai estragar logo.”

“Então é melhor eu comer agora.” Touko abriu a caixa. O Mont Blanc que ela tirou estava em um copo de papel, como sorvete. Ela deu uma colherada.

“Estava bom. Um ótimo presente de Natal. Obrigada.” Com isso, ela passou direto por Sakuta.

“Nene Iwamizawa, certo?” Ele lançou a pergunta às costas dela. Essa era uma das coisas que ele queria confirmar.

“……”

Ela não respondeu, mas reagiu. Touko parou no meio do caminho.

“Internacionalista, terceiro ano. Ganhou o prêmio principal no concurso de beleza no ano passado. Nascida em 30 de março em Hokkaido. E tem 1,60m.”

Nada disso fez com que ela se virasse. Ela manteve as costas viradas para ele.

“Eu sou Touko Kirishima,” disse ela em voz baixa, mas firme. Essa foi, talvez, a coisa mais emocional que ele já ouvira dela.

A tensão era palpável, como uma faca pressionada contra sua garganta. Ele não sabia por quê, mas claramente havia algo mais profundo acontecendo, algo que a estava incomodando.

“Hum, Sakuta-sensei…?” Sara perguntou ao seu lado.

“O quê?”

“Com quem você está falando…?”

Ela parecia assustada. Touko passou direto por ela. Sara deveria ter visto isso, mas não reagiu. Apenas olhou fixamente para Sakuta, com uma expressão preocupada. Ela não conseguia ver Touko. Não podia percebê-la.

Touko desapareceu no prédio da escola.

“……Ela ainda está aqui?” Sara perguntou, olhando ao redor.

“Ela já foi.”

“Mas ela estava aqui?”

“Sim.”

“Mas eu não vi ninguém. Eu conseguia vê-la quando estava conectada a você, mas…”

“Provavelmente é por isso.”

“Hã?”

“Você via o que eu via.”

Ele só entendeu porque já havia experimentado a visão remota. Ele estava compartilhando a visão de Sara. E a audição. Todos os sentidos dela. Ele via o que ela via, ouvia o que ela ouvia e sentia o que ela sentia. Então, quando ele viu Touko, Sara também viu. Mas com os próprios olhos, ela não conseguia ver nada.

“Então… de qualquer jeito, eu não teria ajudado.”

Sara entendeu rapidamente e seus ombros caíram. “Que desastre,” ela disse com um sorriso triste.

“Melhor do que se empolgar e errar na hora H,” apontou Sakuta.

Ela fez uma careta para ele, mas logo a resignação tomou conta.

“Eu acho,” ela admitiu, assentindo.

“Eu realmente não fiz nada.” Falou com sinceridade.

“É véspera de Natal, e nada de bom aconteceu.”

“Bem, então vamos ter que comprar um bolo pra você no caminho de volta.”

“Sério? Isso serve!”

Sara bateu palmas, encantada. Isso obviamente era uma tentativa de agradá-lo. Esse lado dela não mudaria tão cedo. Mas… essa era a essência de quem Sara era.

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