Prova Irrefutável

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Preparados para o pior, a coorte invocou suas armas e desceu lentamente pela larga estrada que levava ao fundo da pedreira. Desde que alcançaram as colinas das Montanhas Ocas até agora, não haviam encontrado nenhuma Criatura do Pesadelo… mas isso não era motivo para baixar a guarda.

Caminhando pelo antigo caminho, todos não podiam deixar de lançar olhares furtivos para o cadáver do gigantesco demônio de pedra, como se esperassem que ele voltasse à vida e os atacasse a qualquer momento.

Se viver na Costa Esquecida havia ensinado algo a ele, era sempre esperar pelo pior.

Algum tempo depois, Effie falou:

“Veja aquelas rachaduras profundas no chão da pedreira? Acho que essa coisa cavou por baixo. Então, cuidado por onde pisa.”

Lembrando-se de seu encontro com a Pedra Rolante, Sunny olhou para baixo com uma expressão amarga. Aquela criatura desajeitada era mais engraçada do que perigosa, mas apenas porque seus dentes eram muito inferiores ao Manto do Titereiro. Se algo com mais mordida emboscasse-os por baixo, quem saberia o que aconteceria?

Com um simples pensamento, Sunny invocou a Santa de Pedra e ordenou que ela se mantivesse por perto. O monstro taciturno encarou os altos picos das Montanhas Ocas por alguns momentos, como se sutilmente afetado pela visão deles. Então, ela baixou a cabeça e seguiu silenciosamente seu comando.

Após tensos e exaustivos trinta minutos descendo para o fundo do poço, a coorte finalmente chegou perto dos restos do gigantesco inseto de pedra. Parando cautelosamente a algumas dezenas de metros de distância, hesitaram, sem saber como prosseguir.

Finalmente, Nephis suspirou e caminhou em frente, aproximando-se do corpo despedaçado do demônio morto. Se era isso o que ele tinha sido… ou era.

Quando sua líder chegou perto o suficiente da carcaça para tocá-la com a mão, todos prenderam a respiração.

Alguns segundos se passaram e depois mais alguns. Nada saltou sobre a Estrela da Mudança debaixo das pedras. A criatura gigante não se moveu, nem mostrou sinais de voltar à vida. O demônio apenas jazia ali, seu corpo despedaçado e quebrado, aterrorizante mesmo na morte.

E de fato estava verdadeiramente, realmente morto.

Lançando um olhar para a indiferente Santa, Sunny soltou um suspiro de alívio.

Embora estivesse preparado para uma batalha difícil, ele esperava que desta vez eles pudessem evitá-la. Os membros da coorte ainda não haviam se recuperado totalmente da angustiante jornada no topo do colosso ambulante, então não estavam nas melhores condições.

Bem, pelo menos Sunny não estava, parcialmente porque ele recusou a oferta de Neph para curar seus ferimentos com sua chama purificadora. Eles estavam se curando rapidamente graças à Trama de Sangue e aos quase quinhentos fragmentos de sombra que ele havia acumulado, mas seu corpo ainda não estava totalmente recuperado.

Virando a cabeça, Nephis olhou para eles e disse:

“Aproximem-se.”

Encorajados por suas palavras, os membros da coorte finalmente deixaram o cuidado de lado e se aproximaram da criatura morta.

Claro, eles ainda estavam preparados para reagir instantaneamente caso algo inesperado acontecesse.

Os seis passaram alguns minutos estudando os restos mortais para determinar se a terrível criatura foi morta por um humano ou algo de sua própria espécie.

Sunny lançou um olhar para as altas montanhas e passou alguns segundos observando enquanto a névoa branca descia de seus picos, fluindo pelas encostas irregulares como uma cachoeira feita de nuvens.

‘…Que lindo.’

Com um suspiro, ele se afastou da parede de névoa que ainda estava a alguma distância do vale onde a pedreira estava situada e se concentrou no cadáver do demônio de pedra.

O que quer que o tenha matado não era algo que Sunny gostaria de enfrentar numa batalha. A carne da criatura era, de fato, feita de pedra. Isso não impediu os temíveis atacantes, no entanto. A carapaça da gigantesca abominação de granito estava despedaçada em muitos lugares e derretida em outros.

…Mas, principalmente, estava cortada e perfurada.

Além de algumas feridas enormes, havia numerosas menores, muitas parecendo que poderiam ter vindo de uma espada, um machado ou uma lança. E ainda assim, ele não tinha certeza. Sunny não era realmente especialista em tais coisas.

No entanto, ele era especialista em tudo relacionado à ganância e avareza.

Em vez de se concentrar na natureza dos danos causados à abominação gigante, Sunny contornou e encontrou seu abdômen, que estava especialmente danificado. Com um suspiro relutante, ele subiu no cadáver de pedra… e depois entrou nele.

Os outros membros da coorte encararam-no com expressões que variavam de surpresa a repulsa.

Alguns minutos depois, Sunny saiu do demônio morto e sacudiu a poeira de pedra de sua armadura e cabelo. Então, olhou para seus companheiros e franziu a testa.

“O quê?”

Kai olhou para ele com uma expressão complicada e então perguntou:

“Sunny? Ah, você quer nos dizer alguma coisa?”

Sunny assentiu e sorriu.

“Eu sei, na verdade. Essa coisa realmente foi morta por um humano.”

O encantador arqueiro arqueou uma sobrancelha e perguntou em tom duvidoso:

“Mesmo? Como você sabe?”

Sunny pulou para baixo e deu de ombros.

“Os Fragmentos de Alma estão faltando.”

Alguns momentos depois, uma expressão de compreensão apareceu no rosto de Kai.

De fato, a maioria das Criaturas do Pesadelo não tinha uso para os fragmentos de alma. Assim como os humanos, que absorviam diretamente a essência da alma após matar um de sua própria espécie, eles se alimentavam da própria morte, em vez de recuperar e esmagar os remanescentes de núcleos de alma quebrados.

…Se eles não fossem terrores bizarros como o Devorador de Almas, é claro. Mas as chances de encontrar outro desses aqui eram bastante baixas.

Era razoável supor que os fragmentos de alma foram removidos por humanos.

Sua descoberta era uma prova sólida de que realmente era a coorte do Primeiro Senhor que havia lutado e abatido a terrível criatura.

Eles realmente encontraram sinais da expedição perdida.

Mas havia outra prova para essa conclusão, esta irrefutável.

Nephis, que se afastou dos restos do demônio em algum momento, de repente os chamou.

Os membros da coorte se entreolharam e se aproximaram lentamente dela, tentando entender o que ela havia encontrado.

Estrela da Mudança estava perto de uma das pilhas de pedras que estavam espalhadas pelo chão ao redor do corpo da criatura morta, olhando para ela com uma expressão solene. A maioria delas veio de sua carapaça estilhaçada, enquanto algumas foram criadas porque o chão da pedreira foi quebrado e revolvido durante a feroz batalha.

Por que Nephis estava tão interessada nessa em particular?

Olhando mais de perto, Sunny percebeu de repente que esta pilha de pedras era diferente de todas as outras. Era mais baixa, aproximadamente oval, seu contorno muito perfeito para ser resultado de uma mera coincidência.

Parecia que cada pedra foi cuidadosamente colocada aqui por uma mão humana, talvez na esperança de tornar a pilha o mais ordenada e resistente possível.

De repente, um arrepio percorreu a espinha de Sunny. Ele finalmente percebeu o que estava olhando.

Isso não era realmente uma pilha de pedras.

Era um túmulo.

A Névoa

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Ficando ao redor do túmulo, os membros da coorte olhavam com expressões sombrias – exceto por Cassie, que se virou e encarou a encosta da montanha, como se tentasse esconder suas emoções.

Agora que sabiam o que estavam olhando, o humor de repente se tornou melancólico e solene. As pessoas encalhadas na Costa Esquecida estavam bem familiarizadas com a morte e a tragédia, mas encontrar esse túmulo solitário tão longe de qualquer lugar onde outro humano pudesse encontrá-lo, perdido sob o céu cinza alienígena do Reino dos Sonhos, ainda era uma revelação comovente.

Nenhum deles jamais conheceu os Sonhadores da primeira coorte, mas depois de viver à sombra de suas realizações lendárias e ouvir histórias de seus feitos por tanto tempo, parecia que este túmulo pertencia a um dos seus.

Por causa de como a realidade do Castelo Luminoso era sombria e tensa, era fácil esquecer que, neste mundo amaldiçoado, todos eles eram seres humanos companheiros. Mas diante do túmulo silencioso, a verdade era dura e cortante: era apenas eles contra a maré interminável de Criaturas do Pesadelo, e cada vida humana perdida diminuía a todos.

Sunny suspirou e notou que havia palavras esculpidas em uma das pedras colocadas em cima do túmulo. Levou um tempo para entender a inscrição, porque não estava escrita com as runas às quais ele se acostumou. Em vez disso, estava escrito em letras simples do idioma humano, que pareciam estranhas e alienígenas nesta terra abandonada.

Cortada na pedra por meios desconhecidos, uma única frase foi deixada para trás no túmulo, sem marcação.

“O pesadelo dela acabou”

Com o coração pesado, Sunny repetiu silenciosamente várias vezes. Era estranho o quanto de significado poderia ser expresso com tão poucas palavras. Eles ecoavam em sua mente e permaneciam lá, deixando uma marca profunda e triste.

‘… Descanse em paz, quem quer que você seja. Eu… eu espero que seus sonhos sejam doces e serenos agora.’

Com isso, ele se virou e cerrou os dentes.

Quando acabariam seus próprios pesadelos?

Os outros membros da coorte estavam lentamente voltando de seu devaneio repentino. Kai suspirou e olhou para Estrela da Mudança, seu rosto cheio de tristeza.

“Acho que… acho que é isso que estávamos procurando. O Primeiro Senhor e sua expedição definitivamente passaram por aqui. Mas e agora?”

Nephis lançou um último olhar ao túmulo e virou-se para encarar o encantador arqueiro.

“Deve haver uma entrada para uma mina antiga por aqui. Pelo que Cassie viu, foi para lá que eles foram.”

Sunny franziu a testa. Algo no que ela disse o deixou desconfortável. Mas por quê?

Virando a cabeça, ele olhou para Cassie, que ainda estava silenciosamente parada a alguns passos de distância, com a cabeça voltada para as montanhas. Parecia que a menina cega estava apreciando a vista da névoa branca que descia pela encosta da montanha, aproximando-se lentamente do vale.

Ela estava muito quieta todo esse tempo.

Com um pressentimento sombrio agarrando seu coração, Sunny fez um gesto para Nephis chamar a atenção dela. Estrela da Mudança franziu a testa e seguiu o olhar de Sunny, alterando levemente a expressão no rosto.

Aproximando-se da amiga, ela cuidadosamente colocou a mão no ombro da menina cega. Imediatamente, Cassie estremeceu e se virou, com o rosto pálido.

“… Cassie? Você viu algo?”

Havia uma expressão de terror no rosto da menina cega. Por alguns momentos, ela apenas respirou pesadamente, como se tentasse se controlar. Finalmente, ela falou, com a voz baixa, mas firme:

“A névoa… temos que entrar no subsolo antes que a névoa chegue. Se não, todos nós morreremos!”

Nephis não perdeu tempo questionando Cassie mais a fundo. Virando-se, ela gritou:

“Sunny, Night! Encontrem a entrada da mina, rápido!”

Um momento depois, Kai subiu ao ar e correu em direção ao gigante anfiteatro do lado oposto da pedreira. Sunny também não hesitou: sua sombra se desprendeu de seus pés e deslizou com uma velocidade surpreendente.

Apesar da urgência da situação, ele permaneceu calmo.

‘Então… acho que há um motivo pelo qual não encontramos uma única criatura viva neste lugar, afinal.’

Sunny esperava algo assim acontecer desde o momento em que entraram nas colinas das Montanhas Ocas. Mesmo antes de saber quão perigosos esses picos eram, ele já sabia que nenhuma terra em que o coral carmesim fosse incapaz de crescer poderia ser segura.

“Caster, Effie! Preparem-se para se mover assim que os batedores encontrarem algo!”

Lançando um olhar para a parede branca de névoa que já começava a se infiltrar no vale, Nephis hesitou por um momento e então invocou sua espada. Atrás dela, Cassie subiu ligeiramente acima do chão e desembainhou a Dançarina Silenciosa, segurando a elegante espada na mão esquerda.

Duas asas transparentes se transformaram em um borrão atrás dela.

Olhando para elas, Sunny suspirou e caminhou até ficar perto da Santa de Pedra. Sua mente estava ocupada percebendo o mundo através da sombra. Então, ele fechou os olhos para se concentrar em seus outros sentidos.

A sombra e Kai encontraram a entrada da mina quase simultaneamente. Um arco alto foi cortado diretamente no lado da montanha, com colunas falsas esculpidas na rocha ao redor. A boca do túnel era escura e ameaçadora.

Havia um caminho sinuoso que levava da mina à pedreira. Sunny não conseguia ver onde ele saía do labirinto de blocos de pedra, mas tinha certeza de que Kai veria do alto.

Abrindo os olhos, ele notou que a parede de névoa estava agora pairando acima deles, a meros segundos de cair na pedreira, e disse:

“Sigam-me!”

Com isso, ele correu na direção geral de onde a mina estava situada. Os outros correram atrás dele, exercendo a maior velocidade que conseguiram – exceto Caster, é claro.

A meio caminho da parede da pedreira, Kai pousou perto deles e fez um gesto para uma abertura quase invisível entre os degraus de pedra.

“Ali! Rápido!”

Eles entraram no caminho escondido e correram o mais rápido que puderam, logo se aproximando do túnel largo.

Na beira da escuridão, Sunny parou por um segundo e olhou para trás, para a parede de névoa que se aproximava rapidamente.

Enquanto olhava para a névoa leitosa, uma sensação fria e pesada de pavor agarrou seu coração de repente.

Sem perder mais tempo, ele se virou e mergulhou nas sombras.

Alguns momentos depois, a névoa envolveu a entrada do túnel e devorou o resto do mundo.

Aqueles Que Sobreviveram

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Deixando a boca do túnel e a névoa branca rodopiante para trás, o grupo avançou cautelosamente na escuridão. Enquanto caminhavam, eles invocaram as Memórias que produziam luz para iluminar o caminho.

O túnel que levava à mina era largo e espaçoso. Apesar do implacável fluxo do tempo, ele permaneceu em perfeitas condições — assim como a antiga muralha que cercava a Cidade Sombria. O chão era inclinado e descia, profundamente no ventre da montanha.

Sunny suspirou, descontente com a ideia de que eles teriam que viajar ainda mais nesta região mortal do Reino dos Sonhos. Quem sabia que horrores viviam na escuridão nas raízes das Montanhas Oco? A única coisa que o consolava era que, com alguma sorte, o grupo não teria que ir muito longe.

Eles só tinham que encontrar os restos da expedição condenada que desapareceu em algum lugar abaixo. Ele não se sentia totalmente confortável esperando que essas pessoas tivessem morrido mais cedo em vez de mais tarde, mas elas estavam mortas de qualquer maneira.

O que mais importava para Sunny era que ele e seus companheiros não seguissem o mesmo destino.

Caminhando na parte de trás do grupo, ele olhou para as cinco pessoas à sua frente.

Como o grupo da Estrela da Mudança se comparava ao do Primeiro Lorde? Eles eram mais fracos, mais fortes ou praticamente iguais?

Ele franziu a testa.

A respeito da própria Nephis, ele duvidava que o jovem que havia liderado um grupo de Adormecidos para conquistar o Castelo Luminoso pudesse ter sido mais poderoso ou determinado do que ela, pelo menos não no início. No entanto, ele teve muito mais tempo para acumular poder e recursos antes de se aventurar nas Montanhas Ocas para encontrar sua morte.

Quinze anos atrás, quando ele entrou no Reino dos Sonhos e ficou preso na Costa Esquecida, as coisas eram muito diferentes de agora. O clã da Chama Imortal ainda estava de pé, para começar. Na verdade, não fazia muito tempo desde que Broken Sword, o pai de Neph, se tornou o primeiro humano a conquistar o Terceiro Pesadelo e alcançar o posto de Santo.

Será que o mundo seria diferente se o Primeiro Lorde conseguisse encontrar o caminho de volta e retornasse à realidade? Sim, provavelmente. Se a era do Feitiço do Pesadelo mostrou algo à humanidade, era que a história era frequentemente mudada por indivíduos, ao invés de eventos e correntes invisíveis. A influência que uma pessoa extraordinária poderia exercer na história em tempos de adversidade era difícil de negar.

De tudo que Sunny sabia sobre o Primeiro Lorde, um homem como ele poderia ter feito muito para melhorar a posição em que a humanidade se encontrava. Que pena que ele havia perecido neste inferno esquecido por Deus, a história de seus feitos incríveis conhecida apenas por um punhado de pessoas tão infelizes quanto ele.

Mas quantos jovens brilhantes como ele, mortos antes do tempo pelo Feitiço do Pesadelo, existiam?

No final, a história não era escrita pelos melhores, mas por aqueles que sobreviveram.

Olhando para as pessoas caminhando à sua frente, Sunny não pôde deixar de pensar:

‘Quantos de nós sobreviverão?’

Cada membro do grupo era incrivelmente forte. Assim como Nephis era pelo menos igual ao Primeiro Lorde, seus companheiros provavelmente também eram iguais a ele.

Por causa do comportamento descontraído e despreocupado de Effie, era fácil esquecer como ela era uma guerreira temível. A caçadora não havia sobrevivido três anos perseguindo monstros nas ruas amaldiçoadas da Cidade Sombria sozinha por acaso. Centenas e centenas de cruéis Criaturas do Pesadelo caíram por suas mãos.

Por mais que Sunny odiasse admitir, Caster também era uma verdadeira potência entre os Adormecidos. Sua incrível Habilidade de Aspecto, habilidade excepcional, inteligência fria e o vasto arsenal de Memórias herdadas faziam dele uma ameaça mortal para qualquer um tolo o suficiente para se tornar seu inimigo.

Kai não era um lutador tão feroz quanto os membros principais do grupo, mas sua capacidade de voar, juntamente com o domínio do arco e a flecha Ascendida que Sunny lhe vendera, também o tornavam uma verdadeira ameaça em batalha.

Cassie não era muito boa em combate, mas seu dom era, sem dúvida, mais importante do que qualquer Habilidade de Aspecto de combate poderia ser. Especialmente na Costa Esquecida, onde perigos inconcebíveis se escondiam sob cada pedra.

… E então havia o próprio Sunny.

Sunny era, talvez, o mais mortal de todos eles. Se quisesse, ele poderia ter matado cada membro do grupo duas vezes.

Com exceção do próprio Nephis, é claro.

Se os dois tivessem que se enfrentar em batalha, ele não considerava suas chances muito altas.

… Pelo menos por enquanto.

Conforme avançavam pela mina, mais túneis se ramificavam a partir do principal. O grupo fez algumas curvas, escolhendo o caminho que levava mais fundo no subsolo.

Logo, as paredes ao redor deles mudaram. Cada vez mais, estavam decoradas com entalhes de pedra intrincados que os habitantes da antiga cidade tanto amavam.

A princípio, esses entalhes eram estritamente decorativos e em grande parte sem sentido, formando belos padrões de linhas e imagens simples. Mas então, lentamente, algo neles mudou.

Sunny era, talvez, o único que prestava atenção aos entalhes. Devido à sua paixão por aprender a história desta antiga civilização, ele passou muito tempo fazendo o mesmo na Cidade Sombria, onde havia muitas coisas semelhantes.

Ele ainda planejava limpar o chão da biblioteca em ruínas dos escombros e estudar o vasto afresco que estava escondido embaixo – o projeto em que estava trabalhando antes dos eventos das últimas semanas tê-lo afastado.

No entanto, a condição dos entalhes na antiga cidade era em sua maioria terrível. O desastre desconhecido que havia dizimado seus habitantes, a passagem do tempo e as Criaturas do Pesadelo deixaram a maior parte deles em ruínas.

Aqui nesta mina remota, no entanto, os entalhes estavam preservados em perfeitas condições.

Quando Sunny finalmente viu o que estava representado neles, sua respiração acelerou.

As respostas para muitas perguntas que o atormentavam estavam ali, entalhadas nessas paredes.

Maldição Da Escuridão

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Representado nas antigas gravuras, uma bela terra era banhada pela luz do sol. Florestas exuberantes, rios cintilantes e campos de flores cercavam cidades humanas construídas em pedra. Pelo que Sunny podia perceber, esta era a Costa Esquecida antes que a misteriosa e aterrorizante maldição a transformasse no inferno desolado que era hoje.

No próximo mural, a bela terra repousava sob um céu cheio de estrelas. De repente, uma delas caiu no chão, causando uma onda de destruição que lavou as cidades humanas. Quando as pessoas se aproximaram do centro da cratera deixada pela estrela cadente…

Sunny quase tropeçou quando viu a próxima gravura. Nela, uma figura humana nua estava no fundo da cratera, envolta em luz. Os habitantes das cidades de pedra cercavam a figura radiante, vestidos com trajes e armaduras arcaicas.

A figura parecia bela e pura, como se não fosse tocada pelas imperfeições do mundo mundano. O que fez Sunny perder a compostura não foi sua beleza e nem o quão estranhamente familiar era a suave radiação emanada de sua pele, mas…

Seu rosto.

Nele, três olhos ardiam com uma luz pura e incandescente. Dois eram iguais aos de um humano, e o terceiro estava acima dos outros, bem no meio da testa da criatura.

… Assim como o terrível crânio que o colosso ambulante havia esmagado com seu martelo de pedra no meio de uma tempestade furiosa.

‘… O que isso significa? O que é essa coisa?’

Para o desânimo de Sunny, a próxima gravura estava bastante danificada. Ele não conseguiu discernir nada do que estava representado nela.

No entanto, a seguinte estava em quase perfeitas condições.

Nela, a figura radiante estava ajoelhada no chão, o peito perfurado pela lança do humano mais alto entre os habitantes da bela terra. O que fluía da terrível ferida, no entanto, não era sangue, mas um dilúvio interminável de pura escuridão.

‘Por quê… por que eles a atacaram? O que aconteceu?’

Sem resposta, Sunny caminhou adiante e logo chegou ao próximo mural. Ele viu a escuridão devorar os humanos reunidos ao redor da criatura mortalmente ferida e se espalhar. Logo, devorou a cratera deixada pela estrela caída também.

E então, devorou o mundo inteiro.

“… A maldição da escuridão que tudo consome”, ele sussurrou.

Finalmente, Sunny vislumbrou a origem do terrível desastre que destruiu esta terra e a transformou em um pesadelo infernal. Embora os detalhes ainda não estivessem claros, um dos mistérios que ele tentava resolver agora tinha uma resposta.

Mas a história contada pelas gravuras ainda não havia terminado. Caminhando mais para dentro da antiga mina, Sunny descobriu o que aconteceu em seguida.

Enquanto a escuridão se espalhava pelo mundo, alcançava os céus. As estrelas foram devoradas ou caíram, transformando o céu em um terrível abismo sem luz.

O vazio sem estrelas.

O sol nunca mais nasceu sobre a terra amaldiçoada, deixando os humanos tremendo de frio. Logo, criaturas horríveis vieram da escuridão para devorá-los. Os melhores e mais brilhantes da antiga civilização pegaram armas para defender suas cidades, e por um tempo, conseguiram resistir à maré de monstros.

…Mas então, os próprios humanos começaram a se transformar em horrores abomináveis.

Nesse momento, Sunny sentiu um calafrio percorrer sua espinha e não pôde evitar tremer.

Não porque ele foi afetado pelo trágico desastre que havia ocorrido a essas pessoas antigas.

Mas porque tudo parecia assustadoramente familiar.

Os detalhes podem não ter sido os mesmos, mas o resultado final era assustadoramente semelhante ao que estava acontecendo no mundo real agora.

Uma maldição que apareceu repentinamente e se espalhou pelo mundo inteiro. Os monstros horríveis que surgiram do nada para atacar assentamentos e devorar humanos. Os campeões que assumiram a responsabilidade de defender sua espécie das criaturas abomináveis. E o fato de que alguns humanos começaram a se transformar nessas criaturas.

Não era o mesmo que o Feitiço do Pesadelo se espalhando como uma praga pelo globo, as Criaturas do Pesadelo chegando pelos Portais, os Despertados se levantando para lutar contra eles, e os infelizes que falharam em seu Primeiro Pesadelo transformando-se em abominações monstruosas?

A única diferença era que a história da civilização da Costa Esquecida já havia terminado. Eventualmente, a maldição a destruiu. O povo de seu próprio mundo, no entanto, ainda tentava resistir a tal destino.

Mas seria possível derrotar o destino? Os habitantes da Costa Esquecida eram orgulhosos e poderosos. Eram capazes de construir cidades que duravam milhares de anos e lutavam contra os monstros mais aterradores em pé de igualdade. E ainda assim, no final, foram completamente destruídos e exterminados. Sua terra se tornou um deserto amaldiçoado.

O mundo real se transformaria em um inferno desolado como a Costa Esquecida também, um dia?

Com uma expressão sombria no rosto, Sunny se afastou da gravura em que estava olhando e seguiu em frente.

Havia mais algumas à frente.

Em uma delas, sete heróis se reuniram de diferentes partes da terra sombria. Sob sua proteção e orientação, as pessoas que viviam na escuridão migraram de suas cidades meio destruídas e chegaram à margem da vasta cratera. Lá, construíram um novo lar para si mesmos, cercado por um muro poderoso que nenhum monstro conseguia escalar ou violar.

Um dos heróis, um homem retratado com um martelo de pedreiro na mão, era responsável por construir o muro. Apesar de a parte da gravura retratando seu rosto estar danificada, era inconfundivelmente um dos sete fundadores da Legião Luz das Estrelas, o homem cuja estátua os havia levado através da Costa Esquecida.

Na penúltima gravura, o poderoso muro estava terminado e a cidade prosperava em meio à escuridão. Os sete heróis estavam a alguma distância, cercando…

Os olhos de Sunny se estreitaram.

Os sete heróis estavam cercando uma torre inimaginavelmente alta. Ela se erguia acima deles, conectando o céu e a terra como o eixo do mundo. Apesar de sua altura ciclópica, a torre ainda estava inacabada.

O Pináculo Carmesim. Só que ainda não era carmesim, já que não havia formações de coral amaldiçoadas cobrindo suas paredes.

Na última gravura, a torre estava completa e, no topo dela…

No topo dela, um novo sol brilhava intensamente, banhando a terra e o povo celebrando na luz mais uma vez.

A escuridão havia desaparecido.

Juramento Desafiador

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Sunny encarou a última gravura por alguns momentos e depois continuou caminhando.

As revelações que ele havia descoberto nas paredes da antiga mina lhe deram muito o que pensar. A verdade que ele vinha juntando há muito tempo estava finalmente mais completa do que fragmentada.

Então, algo realmente havia caído do céu e dado início à eventual destruição desta terra. Sunny suspeitava que esse era o caso há algum tempo, especialmente depois de testemunhar a cratera colossal de impacto situada entre a Cidade Sombria e o Túmulo Cinzento.

Às vezes, ele estava quase pronto para acreditar que realmente era resultado do Pássaro Ladrão Vil soltando o olho do Tecelão “no reino mortal abaixo”, como escrito na descrição da Memória de Linhagem que ele havia consumido.

O Pássaro Ladrão enlouqueceu depois de olhar o reflexo do desconhecido que estava aparentemente congelado para sempre nas profundezas da pupila do Tecelão. A loucura e corrupção que reinavam na Costa Esquecida eram semelhantes o suficiente para ele traçar um paralelo.

No entanto, agora ele sabia que havia sido um ser real que havia caído dos céus, envolto em luz e chamas. Uma figura bela que emanava um brilho radiante e tinha três olhos em seu terrível rosto perfeito.

Sunny não sabia o que levou os antigos humanos a atacá-lo, mas eles mataram a criatura – talvez conseguindo tal feito apenas porque já estava enfraquecida por sua queda dos céus e os eventos que a fizeram despencar.

Mas, ao fazê-lo, eles liberaram a enxurrada de escuridão e causaram a destruição de sua terra.

Sunny estava com a impressão de que a aniquilação da antiga civilização havia sido instantânea, mas, como se viu, os humanos continuaram a lutar contra a maldição por um longo tempo. Gerações, até – é por isso que os fundadores da Legião Luz das Estrelas foram descritos como nascidos na escuridão que tudo consumia.

Ele não sabia se os monstros que vieram para se banquetear com a carne humana estavam contidos no corpo do ser caído junto com o oceano de escuridão, ou se todos eram humanos corrompidos pela maldição – com aqueles presentes no momento da morte da criatura se tornando os mais aterrorizantes.

O que ele sabia, no entanto, era que a Legião Luz das Estrelas conseguiu repelir os monstros e construir uma fortaleza inexpugnável para os humanos sob sua proteção. Essa fortaleza mais tarde se tornaria a Cidade Sombria.

E então, os fundadores da Legião realizaram algo ainda mais inconcebível. Eles construíram o ciclópico Pináculo e de alguma forma o usaram para…

Para criar uma estrela artificial.

Sim, o sol que brilhava acima da Costa Esquecida não era real. Era, na verdade, uma criação humana.

‘…Falar sobre ambição.’

Era difícil não sentir admiração ao saber que esses sete loucos realmente conseguiram criar um sol. Eles fizeram um juramento desafiador para trazer luz à terra amaldiçoada e cumpriram-no com uma determinação e sinceridade aterrorizantes.

A história retratada nas antigas gravuras terminou com uma celebração. As forças do bem derrotaram a maldição da escuridão e trouxeram uma nova era de luz e prosperidade aos habitantes da antiga cidade.

…No entanto, não foi aí que a história terminou.

Algo aconteceu entre então e agora que causou a aniquilação da antiga civilização, a corrupção do Pináculo e o surgimento do Labirinto Carmesim.

Mas o quê?

Esse era um mistério para outro dia. Talvez ele pudesse encontrar a resposta na Cidade Sombria.

O que Sunny observou, no entanto, foi a diferença entre a sombria realidade mostrada nas gravuras e o estado atual da Costa Esquecida.

Sim, os murais antigos mostravam um mundo completamente desprovido de luz, mas era diferente do inferno que Sunny e os outros membros da coorte conheciam. As gravuras não mostravam a maldição da escuridão como um mar literal.

Sem sol e sem mar, não havia ciclo de marés que transformava a Costa Esquecida em um oceano de água negra todas as noites.

O mar escuro apareceu ao mesmo tempo que o Labirinto, então? Ou pelo menos como resultado do mesmo evento. Sunny tinha certeza de que os dois estavam conectados.

Mas ele não sabia qual significado essa informação escondia.

…A outra coisa que ele notou foi que, embora outros membros do grupo estivessem inicialmente indiferentes às antigas gravuras, em algum momento isso mudou.

Quando estavam passando pelo mural retratando o ser radiante com três olhos incandescentes, Nephis parou e olhou para ele por vários longos momentos.

Então, ela virou a cabeça, demorou-se por um segundo e continuou andando.

Sunny não perdeu esse detalhe. No entanto, ele não conseguia nem começar a adivinhar o que isso significava.

Algum tempo depois, eles entraram em uma ampla sala circular. No centro dela, um abismo escuro se abria nas profundezas das montanhas, descendo tanto que Sunny não conseguia nem mesmo ver o fundo.

Parecia o portão do Submundo.

Mil anos atrás, havia escadas e plataformas de madeira descendo pelo eixo principal da mina, bem como um sistema de cordas e roldanas para abaixar os mineiros e levantar recipientes cheios de minérios preciosos. Claro, tudo isso apodreceu e desmoronou há muito tempo.

Com um suspiro, Sunny olhou para Nephis e perguntou:

“Nós vamos descer, não é?”

Em vez de responder, ela simplesmente invocou a corda dourada e deu de ombros.

Ele balançou a cabeça.

“Espere. Pelo menos me dê algum tempo para investigar à frente e ver se há algo nos esperando no fundo dessa coisa.”

Com isso, ele enviou sua sombra pela parede do eixo interminável. A sombra não estava muito entusiasmada com a perspectiva de deslizar até as profundezas do poço assustador, no entanto. Lançando um olhar ressentido a Sunny, ela suspirou e mergulhou com visível relutância.

Alguns minutos depois, a sombra alcançou até onde o alcance do Controle das Sombras permitia. Ainda não estava no fundo da mina, mas pelo menos não havia horrores primordiais à vista.

Sunny invocou a Asa Sombria e acenou para os membros da coorte.

“Podemos prosseguir. Estejam prontos, porém. Quem sabe o que pode acontecer?”

Limite Do Submundo

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De pé à beira do poço sem fundo, Sunny suspirou e invocou o Espinho Espreitador. Em seguida, ordenou que a Asa Sombria ganhasse vida e deu um passo para o vazio.

As asas de libélula de sua capa encantada eram muito frágeis para confiar nelas sozinhas em uma situação que apresentava riscos desconhecidos. Era melhor ter um plano de backup à mão.

Deslizando suavemente para baixo, ele desceu em linha reta por alguns momentos, depois fez uma curva e olhou para os outros membros do grupo.

A corda dourada havia sido jogada na escuridão. Nephis, Effie e Caster já estavam descendo, enquanto Kai pairava perto deles, pronto para sacar seu arco caso algo atacasse a coorte. Cassie estava ao lado dele, segurando a Dançarina Silenciosa em sua mão.

O elegante florete servia como seu guia e apoio, permitindo que a menina cega fizesse melhor uso das asas transparentes. Com isso, ela conseguia se mover com rapidez considerável ou ficar parada em um lugar sem nenhuma superfície sob seus pés.

‘Útil.’

Assim, a coorte desceu até o fundo da antiga mina. Sunny descia em espiral larga, às vezes perto o suficiente da parede do poço para tocá-la com a mão. Ele estava um pouco à frente do resto do grupo.

Quando a distância entre eles aumentava demais, ele enfiava a adaga em uma rachadura na pedra e esperava pelos outros, preso à parede vertical como um estranho inseto.

Sua sombra se movia cada vez mais para baixo, explorando a escuridão abaixo.

Apesar da tensão que permeava o ar, no final, nada atacou o grupo de humanos em descida. Eles descobriram o motivo dessa trégua inesperada no fundo da mina.

Sunny foi o primeiro a pisar em terra firme. Com os outros membros da coorte ainda a algumas dezenas de metros de distância, por algum tempo, ele ficou na escuridão completa.

Assim que deu um passo, algo estalou sob seu pé. Olhando para baixo, Sunny viu um pedaço de osso pálido.

A poucos metros dele, os restos de uma criatura esquelética gigante jaziam quebrados no chão. Parecia uma cobra com centenas de pequenas garras crescendo em sua barriga e uma boca redonda aterrorizante. Olhando para cima, ele julgou que o comprimento da abominação morta era suficiente para se enrolar em torno de todo o eixo da mina pelo menos várias vezes.

Enquanto Sunny pensava, os outros membros da coorte se aproximavam do chão. A luz de suas lanternas Memórias caía sobre ele, depois brilhava ainda mais, revelando os restos do colossal verme ósseo.

Exposta por essa luz, uma sombra ágil deslizou na pedra e se prendeu aos pés de Sunny.

Nephis foi a primeira a pular. Olhando para a repulsiva Criatura do Pesadelo, ela estendeu uma mão e perguntou:

“Sunny?”

Ele balançou a cabeça.

“Está morto. Nada está se mexendo por aqui.”

Logo, todos estavam no chão. Reunindo-se ao redor do verme gigante, todos tiveram o mesmo pensamento:

‘Lutar contra essa coisa na parede vertical do poço teria sido um verdadeiro pesadelo.’

Sunny não sabia como os membros da expedição perdida haviam conseguido derrotar a criatura aterrorizante, mas estava agradecido a eles. Ele não gostaria de testar a durabilidade da Asa Sombria se essa coisa de repente avançasse sobre ele no escuro.

Havia agora uma pergunta perturbadora em sua mente, no entanto.

Se a coorte do Primeiro Senhor era forte e capaz o suficiente para matar a abominação de pedra que costumava guardar a pedreira e o verme que vivia no poço da mina…

Então que tipo de horror os matou no final?

Com uma expressão sombria no rosto, Sunny se afastou da criatura morta e caminhou para a escuridão.

Não muito longe do cadáver do verme abominável, eles tropeçaram em um acampamento abandonado.

Uma fogueira improvisada foi construída no chão de pedra, com cinco pedras grandes ao redor para os humanos se sentarem. Um pouco mais adiante, uma barricada baixa foi construída a partir dos escombros, protegendo o acampamento de visitantes indesejados.

A expedição perdida definitivamente estivera aqui.

Como já haviam caminhado, escalado e corrido na maior parte do dia, a coorte decidiu se estabelecer para a noite e continuar a busca amanhã.

Em breve, o brilho alaranjado de uma fogueira afugentou a escuridão.

Era um pouco estranho relaxar e cozinhar comida no mesmo lugar onde o Primeiro Senhor e seus companheiros descansaram e prepararam as deles tantos anos atrás. Sunny sentiu como se estivesse tocando a história.

Ou melhor, fazendo-a.

No entanto, ele não teve muito tempo para pensamentos vazios.

Se o que Nephis havia dito no início desta expedição fosse verdade, amanhã… amanhã seria sua hora de brilhar.

No dia seguinte, a coorte se aventurou mais adentro dos túneis da antiga mina. Ninguém sabia dizer exatamente o quão profundos estavam no subsolo, mas a sensação de inúmeras toneladas de pedra pairando sobre suas cabeças, prontas para desabar e enterrá-los sob seu terrível peso, não era agradável.

Estavam no ventre das montanhas agora.

Após várias horas caminhando por túneis estreitos, Sunny sentiu de repente uma brisa suave tocar suas bochechas. Alguns minutos depois, um sussurro distante chegou aos seus ouvidos.

Quanto mais se aprofundavam na escuridão, mais alto ficava esse sussurro, até finalmente se transformar em um murmúrio facilmente discernível de água corrente.

Logo, eles chegaram à margem escura de um largo rio subterrâneo.

A água corrente era negra como tinta, mas não da maneira que as ondas do mar amaldiçoado haviam sido. Também não havia cheiro de sal no ar. Fiapos de névoa subiam acima da superfície do rio subterrâneo, girando na escuridão silenciosa.

Parecia um limite do Submundo.

Havia um pilar de pedra construído na margem, e amarrado a ele, um belo barco feito de madeira pálida balançava suavemente na fria superfície negra do rio escuro.

Olhando para o elegante barco, Sunny suspirou.

Era hora de mostrar seu valor.

Invisível

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Este foi o último segredo sobre o destino da expedição perdida que Cassie obteve de suas visões. Mas mesmo assim, o conhecimento que ela recebeu estava fragmentado e incompleto.

Tudo o que ela podia dizer aos membros da coorte era que, uma vez que atravessassem o rio escuro e até chegarem ao próximo limite, eles teriam que manter os olhos fechados a qualquer custo, não importa o que acontecesse. Nenhuma coisa viva poderia ver o que estava além dessas águas frias e permanecer… inteira.

Pelo menos era isso que ela dizia.

Cassie realmente não sabia o que aconteceria se alguém não seguisse essa regra, mas disse que nunca havia sentido tanto terror quanto no breve momento antes de a visão mostrando o destino da expedição perdida se despedaçar e tudo ficar escuro.

Isso dizia muito, considerando os tipos de horrores que a garota cega via em suas visões rotineiramente.

…De qualquer forma, era aí que Sunny entrava.

Embora olhar através dos olhos da sombra ainda fosse muito perigoso, ele poderia guiar a coorte até o destino com a ajuda de sua habilidade de sentir o espaço através das formas das sombras que o habitavam.

Pelo menos em teoria.

Parados na margem do rio escuro, seis humanos amarraram a corda dourada em volta de suas cinturas. Quando todos estavam prontos, Nephis pegou seis tiras de tecido e um bloco de cera. Acendendo uma pequena chama branca em sua palma, ela suspirou e se virou para Effie.

“Você é a primeira.”

A caçadora fez uma expressão complicada, mas depois se aproximou obedientemente de sua líder.

O que aconteceu em seguida parecia simultaneamente íntimo e perturbador. Usando suas chamas para derreter a cera, Estrela da Mudança gentilmente pegou o rosto de Effie em suas mãos e, depois que a caçadora fechou os olhos bem apertados, selou-os com a cera derretida. Em seguida, ela amarrou a tira de tecido em volta da cabeça de Effie para mantê-la no lugar.

Um após o outro, cada membro da coorte passou pelo mesmo procedimento. Quando chegou a vez de Sunny, ele se moveu levemente quando as mãos frias de Neph tocaram suas bochechas.

Alguns momentos depois, ele estava cego.

‘Isso é… é assim que Cassie vive?’

Ordenando que sua sombra não visse nada, Sunny ficou na escuridão total. No entanto, ele ainda estava em uma situação melhor que a garota cega. Seu Sentido das Sombras ainda funcionava, pelo menos.

Com sua ajuda, Sunny conseguia mais ou menos saber o que estava onde. Essa forma de percepção era muito diferente da visão, mas poderia servir ao mesmo propósito em um aperto, embora de forma muito precária. Se as condições fossem adequadas.

Felizmente, ele havia praticado a navegação pelo mundo com a ajuda apenas do Sentido das Sombras no passado. Foi assim que ele derrotou a estranha criatura basilisco na Cidade Sombria, entre outras coisas.

Guiando o grupo de humanos cambaleantes até o elegante barco, ele os ajudou a embarcar e desamarrou a corda que o prendia no lugar. Em seguida, Sunny encontrou o remo e puxou-o, impulsionando o barco pelo rio escuro.

Logo, a névoa fria envolveu tudo ao redor.

Quanto mais fundo na névoa eles navegavam, mais parecia que estavam deixando um mundo para trás e entrando em outro.

Um mundo muito mais escuro, muito mais antigo e muito mais aterrorizante.

Ninguém se sentiu compelido a falar, então o silêncio foi quebrado apenas pelo murmúrio das águas correntes e o rangido do remo de madeira.

‘Isso não é tão ruim. É. Não estou com medo, de jeito nenhum.’

Acalmando-se com esses pensamentos tolos, Sunny continuou a guiar o barco.

No entanto, uma coisa o fazia tremer.

Cercado pela névoa e tendo que manter os olhos fechados, Sunny não pôde deixar de se lembrar do encontro angustiante com o ser que apareceu em um véu de neblina e tentou atraí-lo para olhá-lo usando uma voz roubada.

…Foi daqui que veio?

Depois de algum tempo – ele não conseguia dizer quanto, não importa o quanto tentasse – Sunny de repente percebeu uma massa sólida à distância. Essa era a margem oposta do rio escuro.

Logo, eles estavam se aproximando.

Quando a parte inferior do barco raspou na pedra, Sunny saltou para o cais e amarrou a corda ao redor do pilar de pedra. Em seguida, ele ajudou os outros a desembarcar.

Virando a cabeça, ele sentiu outra forma balançar na superfície da água. Havia um segundo barco ali, presumivelmente aquele que o Primeiro Senhor e seus companheiros usaram para atravessar.

Mas, ao contrário de Nephis e seu grupo, não havia um oráculo entre eles. Ninguém os havia avisado para manter os olhos fechados.

Talvez tenha sido essa a razão pela qual nenhum deles havia retornado.

Virando as costas para o rio com uma forte sensação de inquietação, Sunny enfrentou a boca do túnel que levava mais para o subsolo. Soltando um suspiro ressentido, ele deu uma leve puxada na corda dourada e deu um passo à frente.

Os outros membros do grupo não tiveram escolha senão segui-lo.

Alguns segundos depois, eles desapareceram no túnel, deixando para trás a margem do rio silencioso.

Assim que Sunny entrou no túnel, sentiu calafrios percorrendo sua espinha. Embora ele não pudesse ver nada sobre isso, ele percebeu que era diferente dos túneis que haviam atravessado antes.

Este ainda parecia ter sido cortado através da carne das montanhas por alguém – ou algo – ao invés de ter sido formado por um processo natural. No entanto, seus criadores eram inconfundivelmente diferentes dos humanos que haviam criado a mina e a pedreira do lado de fora.

Tudo nisso era mais pronunciado, mais habilidoso. As sombras que habitavam o túnel também eram diferentes.

Elas eram muito mais profundas, muito mais escuras. E muito, muito mais… antigas.

Em breve, o túnel se transformou em um labirinto de passagens largas, todas preenchidas apenas por névoa e silêncio.

‘Outro labirinto. Claro que é um labirinto. Tudo neste maldito lugar tem que ser um labirinto…’

Antes que Sunny pudesse terminar o pensamento, no entanto, ele de repente congelou, paralisado pelo medo.

Porque bem à frente deles, ele sentiu a presença de uma sombra que era diferente de todas as outras.

…Uma sombra humana.

Sem Mestre

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A sombra humana estava solitária na névoa, estranhamente distante e imóvel. Enquanto Sunny puxava a corda dourada para ordenar que seus companheiros parassem, ela se movia ligeiramente e se virava, ficando imóvel novamente.

Sunny sentiu um frio e terrível sentimento se instalar em seu coração.

A possibilidade de encontrar outro humano neste lugar sombrio e aterrorizante já era perturbadora o suficiente. Ele não considerou nem por um segundo que um dos membros da expedição perdida pudesse ter sobrevivido aqui embaixo, na escuridão, por todos esses anos. Não a menos que não fossem mais humanos.

Mas mesmo isso não era a causa do frio e do medo que sentia.

O verdadeiro motivo não tinha nada a ver com a lógica e tudo a ver com seu Aspecto único. Por causa disso, Sunny sentiu que havia algo terrivelmente, completamente errado com a sombra.

A sensação que ele tinha dela era de estranheza e completa anormalidade. No entanto, não parecia ser perigosa ou hostil. Em vez disso, parecia perdida, vazia e… sofrida. A sombra estava cheia de tristeza e angústia que ele não conseguia descrever com palavras.

Sunny não era muito empático quando se tratava de humanos, mas, estranhamente, não podia deixar de compartilhar o sofrimento desta sombra solitária. Talvez porque, de certa forma, eles fossem parentes.

Enquanto observava a sombra, sem saber o que fazer, ela deu alguns passos em uma direção aleatória e parou hesitante, demorando-se ali sem se mover. Depois, voltou e congelou mais uma vez.

Parecia que a sombra estava perdida.

Alguns momentos depois, Sunny finalmente entendeu a natureza do profundo sentimento de anormalidade que sentia na sombra solitária. Quando entendeu, um calafrio percorreu todo o seu corpo.

A razão pela qual esta sombra era tão estranha e assustadora era porque ela não estava conectada a ninguém. Não havia nenhum humano projetando-a. Não mais, pelo menos.

O humano ao qual a sombra pertenceu um dia havia desaparecido, cortado da existência por algum poder desconhecido. Sunny também não conseguia sentir ossos por perto. Era como se o humano não tivesse sido morto, mas simplesmente… apagado.

Enquanto a sombra continuava a vagar sem rumo na névoa por toda a eternidade.

‘Que destino terrível…’

Mas a questão permanecia… o que ele deveria fazer agora? A sombra estava em seu caminho. Sunny tinha que passar por ela ou voltar atrás e tentar encontrar outro caminho através do labirinto.

Mas que ameaça essa coisa lamentável poderia representar? Era apenas uma sombra, afinal. A sua própria sombra não poderia prejudicar uma mosca, não importa o quanto tentasse. Essa tinha que ser a mesma.

Com um suspiro profundo, Sunny caminhou lentamente para frente. A cada passo que dava, ele podia sentir melhor a sombra solitária.

…Em algum momento, ela também sentiu sua presença.

Virando-se para encarar Sunny, a sombra hesitou por alguns instantes e, em seguida, deslizou cautelosamente para mais perto. Ele podia sentir um turbilhão de emoções abafadas irradiando dela: surpresa, esperança… e então, desespero súbito.

Ao perceber que ele não era seu mestre há muito perdido, a sombra congelou. Seus ombros caíram.

Sentindo o profundo poço de solidão, angústia e tristeza diante dele, Sunny inclinou a cabeça para o lado.

Então, seguindo um impulso, ele estendeu a mão para a sombra:

‘Aqui… pegue minha mão. Você não precisa mais estar sozinho.’

A sombra tremeu, como se ouvisse seu convite silencioso. Depois, ela demorou por alguns momentos e se aproximou dele com incerteza. Finalmente, ela levantou a mão e, hesitante, colocou-a na mão de sua própria sombra.

Um momento depois, ela desapareceu.

Sunny suspirou.

[A sua sombra fica mais forte.]

Mergulhando no Mar da Alma, ele caminhou ao longo das fileiras de sombras silenciosas em pé na superfície da água tranquila. E lá, como ele esperava, viu uma nova.

Uma sombra de uma jovem graciosa estava entre eles, tão imóvel e quieta quanto o resto. Sua angústia, tristeza e solidão se foram. A sombra parecia estar finalmente em paz.

Sunny olhou para ela por alguns momentos, com o coração pesado. Finalmente, ele disse:

“Bem-vinda. Descanse agora. Seu… seu pesadelo acabou.”

Com isso, ele deixou o mar silencioso e suspirou novamente.

Parado na escuridão com os olhos bem fechados, Sunny permaneceu imóvel por algum tempo.

Então, puxou a corda dourada e conduziu o grupo para mais adentro da névoa.

Sunny não sabia quanto tempo eles vagaram pelo labirinto escuro. Mais de uma vez, ele havia acabado em um beco sem saída e teve que procurar outro caminho. Era difícil não perder a conta de todas as voltas dos túneis sinuosos, mas ele de alguma forma conseguiu se manter no caminho certo.

No caminho, ele encontrou mais três sombras. Cada uma delas era como a primeira, perdida e solitária.

E assim como a primeira, elas eventualmente pegaram sua mão e foram absorvidas em seu Mar da Alma. As quatro – uma jovem mulher e três homens – agora ficavam juntas em silêncio, unidas mais uma vez, mesmo que seus mestres já tivessem partido há muito tempo.

…Vê-los juntos deu a Sunny um pequeno consolo, não importa quão equivocado fosse.

Havia cinco pedras dispostas ao redor da fogueira no acampamento deixado pela expedição perdida, sugerindo que cinco pessoas haviam descido na antiga mina. Quatro delas pereceram eventualmente neste lugar escuro e arrepiante.

Mas, não importava o quanto Sunny procurasse, ele não conseguia encontrar a quinta sombra.

O próprio Primeiro Senhor não estava aqui.

Será que ele de alguma forma conseguiu sobreviver e sair do labirinto de névoa?

Em algum momento, Sunny sentiu alguém puxar a corda dourada. Virando-se, ele andou alguns passos para trás e parou perto de Cassie. Sentindo sua aproximação, a garota cega levantou a mão e apontou para um dos túneis.

Entendendo o que ela queria dizer, Sunny conduziu o grupo naquela direção.

Logo, o som da água correndo chegou aos seus ouvidos.

Algum tempo depois, chegaram à margem de outro rio subterrâneo.

Eles haviam alcançado a segunda fronteira.

O Primeiro Senhor

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Por um momento, Sunny temeu que eles estivessem andando em círculos todo esse tempo e agora voltassem exatamente para onde haviam começado. Mas então, ele se acalmou e percebeu que este rio, embora tão sinistro quanto o que haviam cruzado de barco, era bastante diferente.

Ele não conseguia explicar exatamente, mas não tinha a mesma sensação. Além disso, não havia um cais com dois barcos amarrados a pilares de pedra em lugar algum à vista… ou melhor, ao alcance do sentido.

Em vez disso, havia uma ponte.

Sunny podia sentir a sombra dela caindo sobre a água fria, sólida e firme como a pedra de que foi construída. A ponte se arqueava sobre o rio, levando para longe no horizonte.

Sem querer passar mais um minuto no terrível labirinto que nenhuma criatura viva poderia ver se esperasse continuar viva, Sunny guiou o grupo em direção à ponte.

Se Cassie estivesse certa, eles estariam seguros após cruzar o segundo rio. Sunny certamente esperava que fosse verdade, porque a longa jornada em que ele teve que desempenhar o papel de guia para cinco pessoas cegas tinha sido nada menos do que exaustiva.

Depois de passar sete… ou seriam oito agora?… meses na Costa Esquecida, Sunny achava que possuía uma alta tolerância ao terror. Mas esse último desafio testou os limites de sua resistência mental.

Andar por aquele lugar escuro com sua visão tirada…

Foi um milagre que Cassie de alguma forma conseguiu permanecer sã.

Ele se tensou quando entraram na ponte, esperando que algo terrível acontecesse no último momento. Mas o silêncio não foi quebrado por nada além do som da água correndo, de seus passos e da respiração trabalhosa.

O grupo caminhou na ponte, deixando o labirinto escuro para trás. Logo, eles podiam sentir a névoa ao redor deles ficar mais fina.

E, em algum momento, ela desapareceu.

Eles atravessaram o rio sem problemas e voltaram a pisar em terra firme novamente.

Dando mais alguns passos, Sunny parou e finalmente se permitiu tremer. Então, ele abriu a boca e disse com voz rouca:

“Passamos?”

Embora Cassie não tivesse dito nada sobre a necessidade de permanecer em silêncio, cada um deles evitou falar inconscientemente desde que entraram na névoa. Por causa disso, o som da própria voz assustou Sunny um pouco.

Alguns momentos depois, Cassie respondeu hesitante:

“Eu… eu acho que sim?”

Sem perder mais tempo, Sunny desamarrou o pano que cobria seus olhos e removeu a cera deles. Em seguida, abriu-os cuidadosamente e olhou em volta.

Eles estavam de pé em uma praia de pedra dentro de uma vasta caverna, por onde o rio subterrâneo fluía sem obstáculos. A alguma distância deles, a parede da caverna descia, com a boca de um amplo túnel visível nela.

Ao seu lado, outros membros do grupo estavam removendo as tiras de pano. Sunny podia ouvir os suspiros de alívio vindos deles.

No entanto, sua atenção foi imediatamente atraída para Nephis, que já havia aberto seus calmos olhos cinzentos e estava olhando para algo atrás dele.

Virando-se, Sunny seguiu o olhar dela… e congelou.

A poucos metros deles, na margem do rio escuro, ele viu um esqueleto humano. Estava sentado nas pedras frias, com as costas eretas, olhando para a água.

Diferente dos mortos-vivos ferozes das catacumbas da Cidade Sombria, este era tranquilo e intocado pela corrupção da Costa Esquecida.

…Este era o lugar onde o Primeiro Senhor do Castelo Luminoso havia morrido.

O jovem que os membros do grupo conheciam apenas por seu título havia morrido às margens do frio rio subterrâneo, a poucos metros da ponte que ele havia usado para escapar do terrível lugar que, segundo Cassie, nenhum ser vivo deveria ter sido capaz de escapar.

De alguma forma, ele sobreviveu mesmo sem saber que qualquer pessoa que entrasse na névoa deveria manter os olhos fechados o tempo todo. Mas, no final, as feridas que ele recebeu ali — ou talvez mais adiante — acabaram sendo graves demais.

Antes que os últimos resquícios de vida o abandonassem, o jovem — o Primeiro Senhor que havia arrebatado o Castelo Luminoso das Criaturas do Pesadelo, criado um lugar seguro para os humanos enviados à Costa Esquecida viverem e liderado uma expedição para encontrar uma saída desse lugar amaldiçoado — sentou-se e olhou na direção do nebuloso e sombrio labirinto.

…O lugar onde seus amigos e companheiros haviam morrido, deixando-o sozinho na escuridão deste submundo abandonado.

Olhando para o esqueleto que repousava tranquilamente na margem do rio, Sunny não pôde deixar de sentir um profundo sentimento de admiração… e tristeza.

Ele nunca havia conhecido esse jovem, mas de alguma forma, parecia que se conheciam muito bem.

Tudo o que os humanos tinham na Costa Esquecida era graças à sua coragem, poder e habilidade.

…Que pena que ele morreu aqui, neste lugar solitário, sem ninguém para compartilhar seus últimos momentos e contar a história de seus últimos feitos.

O esqueleto estava estranhamente bem preservado. Estava sentado com as pernas cruzadas, as costas retas, as mãos repousando nos quadris, como se estivesse meditando. O crânio do Primeiro Senhor olhava o rio com as câmaras escuras de seus olhos vazios, estranhamente calmo e em paz.

O que Sunny notou, no entanto, não foi a brancura do osso nem o sorriso eterno do crânio nu, mas uma fina tira de metal leve repousando nele como uma coroa humilde.

Havia uma única pedra preciosa brilhante na faixa de metal, colocada bem acima do meio da testa do crânio.

Depois que os seis se reuniram em torno dos restos mortais do Primeiro Senhor e ficaram ali em silêncio por um tempo para expressar seu respeito por esse ser humano extraordinário, Nephis suspirou e se aproximou do esqueleto.

Com delicadeza, ela pegou a tira de metal e a removeu da cabeça do Primeiro Senhor.

…Um momento depois, a faixa de repente se quebrou em inúmeras faíscas de luz, que então desapareceram, absorvidas em seu núcleo de alma.

Os olhos de Sunny se arregalaram.

A coroa do Primeiro Senhor… era uma Memória.

Fragmento Do Alvorecer

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À medida que a última faísca de luz desaparecia, Nephis inclinou a cabeça para o lado e permaneceu em silêncio por alguns momentos. Então, ela baixou o olhar e disse, dirigindo-se ao Primeiro Senhor:

“Obrigada.”

Ela hesitou, como se quisesse dizer mais alguma coisa, mas acabou apenas dando um passo para trás.

Kai, no entanto, não foi tão reservado. Inclinando-se profundamente, ele permaneceu de cabeça baixa por um tempo, depois endireitou as costas, olhou para o esqueleto e expressou algo que alguns deles devem ter pensado:

“Obrigado. Nós vamos… nós vamos terminar o que você começou.”

Suas palavras ecoaram acima da água fria, desaparecendo eventualmente na escuridão. Um pesado silêncio se instalou sobre a margem do rio subterrâneo.

Alguns segundos depois, o arqueiro encantador virou-se para o resto deles e perguntou com incerteza:

“Eu acho… devemos enterrá-lo?”

Os membros do coorte se olharam. Antes que alguém pudesse expressar sua opinião, porém, Sunny de repente falou:

“Não. Deixe-o como está. Ele queria estar mais perto de seus amigos quando morresse, então… apenas não o toque.”

Com isso, ele virou a cabeça e desviou o olhar.

Como o Primeiro Senhor morreu fora do terrível labirinto, sua sombra também se foi. Agora era apenas muda e vazia, como a maioria das sombras lançadas por objetos inanimados. Ele não havia compartilhado o destino angustiante de seus companheiros, o que significava que Sunny não podia ajudá-lo a se reunir com eles… nem que fosse um pouco.

Eles também não podiam levar os restos mortais do Primeiro Senhor de volta para fora, para enterrá-lo perto da garota que havia morrido na pedreira.

Era melhor apenas deixá-lo em paz.

‘Esqueça isso. Pense em outra coisa.’

Sunny tinha outros assuntos para considerar, de qualquer maneira.

Aquela estranha Memória que Nephis havia absorvido… ele nunca tinha ouvido falar de uma Memória que pudesse existir fora da alma de alguém. Será que o Primeiro Senhor de alguma forma renunciou à posse dela, ou era essa uma qualidade que todas as Memórias do Fragmento possuíam?

E era, sem dúvida, outra Memória de Fragmento — assim como a lança de Effie e sua própria espada inabalável. Essa Memória era a razão pela qual a Estrela da Mudança havia se aventurado nesta expedição, para começar. A coisa que deveria dar a ela uma chance de derrotar Gunlaug.

Sunny encarou Nephis e disse:

“Aquela tiara… como se chama? Não, na verdade, deixe-me adivinhar. Fragmento do Alvorecer? Fragmento do Crepúsculo?”

Neph olhou para ele e não respondeu. Seu rosto de marfim estava calmo e inexorável.

Sunny sorriu.

“…Cheia de segredos, não é?”

Um indício de uma emoção profunda e aguda apareceu em seus frios olhos cinzentos. Alguns momentos depois, ela disse:

“Não foi você quem deixou claro que não quer ser um verdadeiro membro deste coorte? Você escolheu ser uma lâmina contratada… não foi? Por que eu deveria compartilhar meus segredos com você?”

Sunny ficou em silêncio por um tempo e depois suspirou.

“Bem… justo. Eu fiz isso e você não tem motivo para compartilhar nada comigo.”

De repente, Nephis sorriu.

“Você pode mudar de ideia, você sabe. Se o fizer, eu naturalmente lhe contarei tudo.”

Ele a encarou por um tempo e então balançou a cabeça.

“Não, não é necessário. Responda-me uma pergunta, porém. Como exatamente isso deverá nos ajudar a derrotar Gunlaug?”

A Estrela da Mudança hesitou por um momento e simplesmente deu de ombros.

“Veja por si mesmo.”

Um momento depois, a tiara deixada pelo Primeiro Senhor se teceu a partir de faíscas de luz em sua testa. A brilhante pedra preciosa em seu centro cintilava suavemente.

E então, algo no mundo ao redor de Sunny mudou.

‘O quê…’

Ele piscou algumas vezes e, lentamente, baixou o olhar para o tecido do Manto do Titereiro.

Ou melhor, no encantamento tecido abaixo dele.

O que ele viu deixou Sunny sem fôlego.

As cinco brasas brilhantes que serviam como núcleos para o complicado padrão de cordões etéreos que permeavam a Memória de repente brilharam mais forte.

Muito, muito mais forte.

Na verdade, seu brilho agora era quase tão intenso quanto os de dentro da armadura de ônix preto que ele havia comprado no Mercado de Memórias. O que era… o que era…

Uma Memória Ascendida.

‘Que diabos?’

Puxando o fio amarrado em volta do pescoço, Sunny tirou a Flor de Sangue de baixo de sua armadura e encarou-a, perplexo. As duas brasas dentro do pingente intricado também haviam se tornado muito mais brilhantes.

Sem saber que Sunny tinha a habilidade de olhar dentro do tecido interno das Memórias, Nephis explicou:

“O Fragmento do Alvorecer possui um único, mas também singularmente poderoso encantamento. Ele fortalece todas as Memórias ao seu redor. A área de efeito do encantamento é muito grande… mas o aprimoramento que ele proporciona é ainda maior.”

‘…Sério?’

Olhando suas Memórias, Sunny sentiu como se estivesse à beira de ficar pasmo. Singular era a palavra certa para descrever o efeito do Fragmento do Alvorecer. Ele nunca tinha ouvido falar de uma Memória capaz de aumentar o poder de outra quase uma categoria inteira…

‘Espere, ela disse… todas as Memórias?’

Todas as Memórias… todas… em um raio muito grande?

‘Impossível!’

Com essa coroa em sua cabeça, Nephis não só seria capaz de enfrentar Gunlaug, como também tornaria cada um de seus seguidores muito mais perigosos. Ela se tornaria uma general perfeita para um pequeno exército de Despertos.

… Mas não havia algo errado com aquela afirmação?

Sunny franziu a testa.

‘Todas as Memórias… espera. Todas?’

Lançando um olhar para a Estrela da Mudança, ele perguntou:

“Então isso torna cada Memória ao seu redor muito mais poderosa?”

Nephis assentiu em silêncio.

A expressão de preocupação de Sunny aprofundou-se.

“Então você não vê um problema aqui? Isso não vai fortalecer também aquela maldita armadura dourada de Gunlaug? Como exatamente isso te dá uma chance contra ele, então?”

Ela hesitou por alguns momentos e depois sorriu levemente.

“Não fortaleceria, não é? Mas, ei… você quer que eu te conte outro segredo?”

Sunny a encarou sem dizer nada. Ele sabia que era melhor não se envolver em uma armadilha tão desajeitada.

Só que, como se viu, não havia armadilha. Nephis apenas esperou um pouco e continuou:

“Isso me ajudará porque a armadura dourada que Gunlaug veste não é uma Memória.”

Antes que ele pudesse dizer algo, ela acrescentou:

“Na verdade, é um Eco.”