Emily Watsken
Embora não pudesse ver Brone, sentir sua energia nervosa de perto. Além da linha de canhões, via dúzias correndo para fora da aldeia em nossa direção. Incluindo — minha mente lutava para racionalizar — duas árvores.
‘Não, precisam fugir!’ queria gritar. Não tinham ideia do que estava prestes a atingi-los, idiotas corajosos.
Depois de vários segundos tensos, as runas na base dos canhões começaram a brilhar.
“Equipe um, fogo!” ele gritou, a voz praticamente tremendo de emoção.
Fechei os olhos por conta da bola de fogo que os acertaria, mas nada aconteceu.
A mão que segurava meu cabelo se soltou e dei uma olhada por um olho meio aberto. Os magos olhavam para o canhão, confusos, enquanto os não adornados, cujo trabalho era apoiar a arma enquanto os conjuradores disparavam, fecharam os olhos e se inclinaram para trás.
Arrisquei olhar para ele, parecendo que dispararia raios dos olhos a qualquer momento.
“Equipe dois, fogo!”
Apesar de não ter desejo algum de ver a aldeia ser mergulhada em chamas, observei com atenção enquanto o próximo grupo de alacryanos ativava o canhão. As runas acenderam, depois efervesceram.
Ele voltou o olhar ao Gideon. “Todos, fogo!”
O resto dos magos ativou os canhões, mas depois de alguns segundos, ficou claro que nenhum funcionou.
‘Gideon, seu génio louco!’ Não pude deixar de sorrir, pensando que meu mentor de alguma forma desativou os canhões de sal de fogo para impedi-los de serem usados.
‘Não é de admirar que ele parecesse tão calmo’ pensei com culpa, percebendo que minha raiva contra ele fora infundada.
Brone deve ter chegado à mesma conclusão. O instilador tirou uma longa faca de prata da bota e apontou para o artífice. “Acorrentem aquele homem enquanto eu descubro o que ele…”
O rugido de uma explosão interrompeu o instilador ao disparar da primeira arma, e meu coração foi a mil.
Enterrei rosto no chão e coloquei as mãos sobre a cabeça quando a onda de choque bateu em mim, jogando em mim poeira e detritos. Ao meu redor, gritavam, e quando olhei para cima, vi uma cratera de fumaça onde a primeira equipe de canhoneiros esteve.
O canhão não tinha disparado, e sim explodido.
Percebendo o que estava prestes a acontecer, tentei me afastar do grupo mais próximo de soldados, que ainda olhavam assustados os destroços. Brone deu dois passos em direção à cratera, gritou e saltou para longe, caindo no chão e se encolhendo a fim de se proteger.
Um instante depois, o segundo canhão detonou, envolvendo três alacryanos que o operavam numa bola de fogo.
Agora, o resto dos soldados estava em pânico a sério, jogando os canhões e correndo para longe. A maioria, no entanto, foi lenta demais.
Quando os outros oito tubos explodiram ao mesmo tempo, a explosão foi o suficiente para me fazer ser jogada perto do chão, parando apenas quando minhas costas bateram em uma roda de carroça. A grande besta de mana presa a ela se virou para me encarar estupidamente e soltou um mugido baixo e sem medo.
Os gritos cessaram. Vários corpos foram espalhados pelo campo, mas não tantos quanto deveria. Outros, os soldados que não faziam parte dos pelotões de tiro, corriam para verificar os corpos.
Brone lutava para se levantar. A fumaça subia em pequenas linhas finas de seu uniforme, e o sangue escorria de sua orelha. Seus olhos rodavam a cena descontroladamente, e quando se fixaram em Gideon, ele mostrou os dentes e começou a marchar à sua direção, passando por um soldado sem adornos.
Usando a roda da carroça, me levantei e tropecei atrás dele. Tentei canalizar mana o bastante para um feitiço, porém não conseguia me concentrar além do zumbido aborrecido nos meus ouvidos. Em vez disso, agarrei a parte de trás do seu uniforme.
Ele virou e bateu na minha barriga, e quando mão dele me deixou, estava coberta de sangue. Demorou muito para perceber que era o meu sangue, pingando da adaga de prata.
Pressionei as mãos contra a crescente mancha vermelha na minha camisa enquanto caía de joelhos. Não doeu tanto quanto pensava, mas podia ter sido por causa da concussão que tinha certeza que tinha.
Ele me deu seu sorriso sarcástico característico, depois retomou sua marcha em direção a Gideon.
O velho inventor olhava para mim. ‘Ele fica tão estranho tentando levantar as sobrancelhas, já que não tem nenhuma.’ Ri, não pude evitar. Tudo de repente pareceu tão engraçado.
“Oleander” disse quando o alacryano se aproximou dele. “Eu sei que pedi, muito especificamente, que a minha assistente não fosse prejudicada. Era uma parte essencial do nosso acordo.”
Brone parou, a adaga apontada ao coração do meu mestre. “Seu filho da puta” sibilou. “Ela está morta, e você vai pro mesmo lugar que ela.”
“Acho que não, Oleander.” Uma rajada repentina de vento soprou ao nosso redor, fazendo as suas vestes baterem dramaticamente. “Receio que, com base nos termos de serviço, nosso contrato agora é nulo e sem efeito, e nossas buscas mútuas estão encerradas.”
“Pelos Vritra, você não cala a boca, porra?” gritou.
Sorriu, sereno. “Como você disse, sou especializado em ser terrivelmente frustrante a vocês.”
Mana surgiu ao redor de Brone, acendendo uma série de runas ao lado da adaga. Havia algo na maneira que a luz laranja ardente delas representava a tempestade de poeira que nos envolvia que era quase… bonito. “Estou feliz por ser eu quem vai livrar Dicathen de você.”
Se eu estivesse sã, ficaria surpresa com a capacidade de Gideon de permanecer normal mesmo diante da morte certa. “Alguma vez te incomodou que os seus soberanos não te tenham dado nenhuma maneira de se defender, Oleander?” perguntou.
Sem esperar por uma resposta, tirou algo do bolso interno das vestes e apontou para o alacryano. O dispositivo soltou um estrondo alto e uma nuvem de fumaça negra, fazendo ele cair para trás, um buraco de fumaça no peito.
Os homens gritaram à nossa volta. A fumaça do sal de fogo fez meus olhos arderem. Um zumbido agudo nos ouvidos surgiu junto de uma onda de frio do ferimento no meu estômago.
Gideon passou pelo corpo sem olhar para ele e se ajoelhou ao meu lado me inspecionando, parecendo preocupado. “Bem, senhorita Watsken, este é o fim glorioso que imaginou para nós?”