Capítulo 4

 

A notícia do novo Coelho Branco se espalhou lentamente pelo País das Maravilhas. Alguns tremiam de medo do novo adversário, outros agitavam a língua para Heart, que depositou sua confiança em uma força desconhecida, e alguns esperavam roubar a mesma posição roubada.

O ponto principal do boato, SoYoon, estava dormindo na casa do Coelho Branco anterior. Ela dormiu até o meio-dia e acordou com o terno amassado. Ela jogou o terno na cama e entrou no banheiro. Era pequeno, mas havia um lugar para tomar banho. SoYoon girou a alavanca do chuveiro. Água vermelha de ferrugem escorreu.

O País das Maravilhas tinha um tipo de área de banho público. Enquanto ela procurava em sua memória, a água ficou clara. Ela se lavou com a água que ainda cheirava a ferrugem. Estava frio, mas ela estava feliz por ter saído.

Não havia toalha, então ela se enxugou com a camisa e foi para o provador. Estava escrito sala dos funcionários em um cartaz pregado na porta. O interior estava cheio com as roupas do Coelho Branco anterior. Ela escolheu uma camiseta larga, calças cargo e um cardigã estilo unissex. Ela prendeu um cinto para evitar que as largas calças caíssem. Roupa íntimas e calças – SoYoon fez uma lista mental das coisas que precisava comprar.

Alguém bateu na porta.

Toc, toc. Bang, bang, bang. Bum, bum, bum, bum.

As fortes batidas fizeram a porta de vidro tremer. Lá fora, um homem resmungava aborrecido.

— Ah, qual é. Se a porta está aberta, pelo menos me diga que está aberta.

O homem abriu a porta e entrou. Era o lacaio de Heart, que havia escoltado SoYoon até a casa. Encontrando SoYoon no provador, ele fez uma careta para ela e exclamou: — Como pode ainda estar se vestindo quando ele já te chamou?! Se apresse!

— Me chamou?

A audição de SoYoon era excelente. Não havia como ela não ter ouvido alguém chamando por ela. Percebendo que ela não sabia do que ele estava falando, o homem começou a ficar com raiva.

— O celular! Eu dei para você! Aquele que o Coelho Branco anterior usava! Olhe! Está bem aqui!

O homem agarrou o item preto que SoYoon jogou na mesa. Era do tamanho de sua mão e parecia o receptor de um telefone fixo com um teclado conectado.

— Isso é um celular?

— Mas que-? Está desligado. Isso é raro, então você não devia saber…

— Esse pedaço de lixo?

O homem estava certo. Até mesmo os agentes do governo tinham celulares projetados de forma parecida. Mas SoYoon só tinha visto esses agentes em missões. Durante as missões, eles trocaram seus telefones por walkie-talkies, então essa era, na verdade, a primeira vez que ela estava vendo um celular.

O homem, vendo SoYoon tão confusa, sorriu como se entendesse algo. — Ah. Você está tentando afirmar seu poder aqui porque veio de Mundo Além? Sinto muito, mas não vou cair nessa.

Mundo Além. Era assim que os residentes do País das Maravilhas chamavam o mundo além de suas fronteiras. Era óbvio que ele estava tentando afirmar seu domínio usando um termo que só alguém que vivia no País das Maravilhas saberia.

— É você quem está tentando afirmar o domínio. Pare de fazer tempestade em copo d’água por algo que você veria em um museu e vá direto ao ponto.

Com o tom gelado de SoYoon, o homem calou a boca. Pareceu ser a coisa certa a fazer.

— O ponto.

— Heart está te chamando… — respondeu o homem. — Tem algo a ver com os negócios do Coelho Branco, e ele precisa que você saiba sobre eles.

SoYoon saiu usando a máscara preta e a espada do Coelho Branco anterior. — Mostre o caminho.

A dez minutos da casa do Coelho Branco anterior ficava a casa de Heart. A casa de Heart era uma mansão de quatro andares. Homens de terno circulavam pelo exterior, e SoYoon não conseguiu evitar a sensação de que estava assistindo a uma cena de um filme de máfia.

O homem a levou ao escritório de Heart. Ele estava sentado atrás de uma mesa lendo documentos quando SoYoon entrou. Ele sorriu.

— Percebi isso quando a corrida começou, mas você é arrogante ou só é estúpida?

Era a norma desse mundo ser confrontador no momento em que uma pessoa via outra?

SoYoon caiu no sofá sem responder. Heart se levantou.

— Eu não odeio pessoas arrogantes ou pessoas estúpidas. Mas…

O cabelo branco de SoYoon esvoaçou devido a um vento inesperado. Ao mesmo tempo, ela puxou a faca que havia escondido e apunhalou as costas do sofá. A perna de Heart – que estava mirando em sua cabeça – parou no ar quando a faca quase o atingiu. Então ele riu loucamente.

— Se acha que pode se safar sendo arrogante só por causa de suas excelentes habilidades, está muito enganado. Se me irritar, não vou me importar com o que aconteceu na corrida Caucus. Vou cortar seus braços e pernas e vendê-la para um bordel.

— Arrogante? Quem? — Questionando Heart, SoYoon reproduziu a conversa que teve com o homem que tentou atingi-la.

O celular. Ele tinha ligado para ela. O que havia de tão importante naquele pedaço de lixo inútil?

A máscara preta que subia até a borda de seu nariz não só bloqueava sua boca, mas a maior parte de seu rosto, de modo que a única expressão que alguém podia ver de SoYoon era a que ela revelava através de seus olhos.

Olhando nos olhos castanhos, Heart perdeu a motivação e baixou a perna. — O celular. Deixei uma mensagem para você vir de manhã cedo.

Heart voltou para sua mesa, pegou o objeto estranho e voltou para ela. Além de ser vermelho, não era diferente dos telefones vistos em museus.

— Isso é um celular?

— O quê? Nunca viu um celular antes? Não parece uma, mas você é uma caipira?

No País das Maravilhas, esse pedaço que eles chamam de celular representou um choque cultural para alguém acostumado com os smartphones finíssimos do mundo original de SoYoon. Ela escolheu ficar quieta.

A raiva de Heart se dissipou facilmente e ele começou a explicar como usar o celular. — Você pressiona esses botões para ligar para a pessoa que deseja. Se pressionar esse botão, você pode deixar uma mensagem. Esse celular é para quem não tem poderes, então pode usar outro se quiser…

— Não tenho poderes.

— Ah, tá bom. — Heart zombou da resposta de SoYoon.

SoYoon não reagiu.

Alguns momentos depois, os lábios de Heart caíram. — Sério?

Aqui, era a magia, não da ciência, que fazia o mundo girar. Nesse mundo, a maioria das pessoas nasciam com poderes mágicos. Mas, é claro, um saltador dimensional da Terra não teria tais poderes.

SoYoon hesitou por um momento. Ela poderia contar a ele a verdade sobre si mesma? Ele era amigo de Jung BoSang. Mesmo agora, Jung BoSang poderia ter informações sobre ela. Ela tomou uma decisão rapidamente.

— Nunca tive poderes desde que nasci. Sou um agente criado por experimentos.

Um experimento. Era o termo usado pelo centro de pesquisa do governo como desculpa pelas atrocidades que cometeram em humanos.

Sem poderes no nascimento. Um experimento. Um agente. As palavras se juntaram na mente de Heart para criar sua história: uma garota que nasceu sem poderes, arrastada para experimentos para se tornar uma agente. Não era necessariamente uma mentira, então SoYoon não achou que precisava acrescentar mais nada à história.

— Me ajude a encontrar uma pessoa que pode me libertar do feitiço localizador. E também alguém que é especialista em venenos.

O que precisava ser resolvido rapidamente não era o feitiço, mas sim o veneno. SoYoon e Heart chegaram à mesma conclusão.

***

E então, SoYoon foi apresentada ao homem parado na frente dela agora.

Duke. Um nativo do País das Maravilhas. Ele era um gênio quando se tratava de conhecimento de poções. Incrivelmente magro, com braços e pernas grotescamente longos e esguias, ele a lembrava do ceifador.

— Você é o novo Coelho Branco, não é? Você parece mais jovem do que eu imaginava. Quantos anos você tem? Quinze? Menos? Eu tenho vinte. O mesmo que Heart.

— Dezessete.

Envergonhada pelo fato de estar no corpo de uma adolescente com a mente de uma pessoa de trinta e dois anos, ela ergueu a cabeça. Mas havia algo que ela ganhou com essa troca – a idade de Heart.

— Você é muito jovem. Vai ficar bem? A tarefa do Coelho Branco não vai ser fácil. Não se preocupe. Não estou atrás da posição de Coelho Branco. Só estou preocupado, como um adulto mais velho, se alguém tão jovem estará à altura da tarefa. Aqui, beba. É um chá preto que ganhei de presente. Conheço muitas pessoas fora do País das Maravilhas, então recebo muitos presentes. Se quiser, posso pedir às pessoas que conheço que a mandem para um lugar seguro.

Duke disse isso em um tom lento e suave, mas devido à maneira monótona de sua voz, SoYoon se sentiu entediada. Ela olhou para a xícara de chá que Duke lhe dera. O interior da xícara branca parecia simples, mas havia um aroma agradável vindo do chá de dentro.

— O que você gostaria para acompanhar o chá? Bolo de libra, biscoito de amêndoas, biscoito de limão…?

— Antídoto.

SoYoon interrompeu o tom monótono de Duke com um pedido direto. Seus olhos amarelos piscaram, parecendo perplexos, e ele sorriu.

— Você deve estar ocupada. Espere um minuto. Tenho que trazer a seringa. Preciso tirar um pouco do seu sangue para testar a reação de neutralização.

— Não precisa.

SoYoon puxou sua faca e cortou seu dedo. Gotas de sangue se formaram na ponta de seus dedos pálidos. Antes que o sangue caísse no chão, Duke rapidamente agarrou um copo para pegá-lo. Então ele a repreendeu: — Isso é perigoso. Nunca mais faça isso.

Duke pegou o copo e entrou em uma sala. Depois de algum tempo, voltou segurando uma pequena garrafa. Dentro da garrafa havia um líquido rosa escuro que a lembrava de xarope de gripe para crianças.

— Quanto custa?

— 100 mil canções de natal. É melhor tomar antes de comer, mas como pode causar danos ao estômago, se não estiver com pressa, recomendo tomar depois de uma refeição. Você já comeu? Hm, se estiver tudo bem para você, gostaria de comer comigo?

Depois de receber o antídoto de Duke e pagar as 100 mil canções de natal, SoYoon se levantou. Duke resmungou embaraçado e também se levantou.

— Desculpa. Eu sou muito falador, não sou? Já faz um tempo que não recebo visitas… Você nem mesmo tocou no chá… Você gosta de café em vez de chá? Ou você pode pelo menos tirar sua máscara…?

Duke caiu, murchando. Era difícil acreditar que ele tinha a mesma idade de Heart, porque parecia bem ingênuo. SoYoon respondeu quando começou a sair: — Posso não odiar chá preto, mas não gosto de chá preto com sonífero.

Era verdade. Duke era um pedófilo necrófilo. Ele gostava especialmente de cadáveres de meninos e meninas adolescentes. Ele preferia usar tranquilizantes ou pílulas para dormir para pegá-los desprevenidos. Esse também foi o motivo pelo qual SoYoon se cortou quando ele tentou tirar seu sangue.

Depois que SoYoon saiu, Duke imaginou seus olhos brilhantes sob o cabelo branco e sorriu.

— Foi um prazer.

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