Capítulo 10
Um dia, com sentimentos honestos. (Parte 2)
A razão de seu peito doer era por estar correndo.
Sinceramente, ela poderia estar chegando ao seu limite.
Não, Mary ainda podia se esforçar um pouco mais, se precisasse. No entanto, o rosto de Shihoru estava todo contorcido, e ela arfava de forma estranha. Tsuga, que estava à frente, também parecia exausto. Ele havia tropeçado várias vezes e quase caído para frente. A única razão de não ter caído era porque Haruhiro o ajudou em todas essas vezes.
— Wyvern vindo! Todos, para a esquerda! — Haruhiro gritou.
Eventualmente, Haruhiro começou a dar ordens precisas. Todos estavam completamente exaustos, a atenção dispersa, e a capacidade de tomar decisões reduzida. Haruhiro percebeu isso. Se apenas seguissem instruções, Shihoru e Tsuga ainda poderiam se virar de alguma forma. Mas não demoraria muito até que nem isso fosse mais possível.
Não dá mais. Cheguei ao meu limite. Essas palavras estavam na ponta da língua de Mary. Mas ela não conseguia dizê-las. Haruhiro estava fazendo o que sempre fazia, lutando desesperadamente. O peso claramente recaía mais sobre Haruhiro, e ele devia estar sofrendo o dobro de qualquer um. Mary não podia dizer que estava no fim.
— Setora, não podemos correr mais! — ele gritou.
Oh, é por isso. Haruhiro havia falado por eles. Ele estava atento à condição de todos, então, mesmo que pudesse continuar correndo, sabia que estavam à beira do colapso. Não importava o resultado, ele tomava a decisão, pronto para assumir toda a responsabilidade. Haruhiro era assim. Certamente ele não se sentia bem fazendo isso, e era um fardo evidente, mas ele não tentava se livrar dele.
Mary tinha ouvido falar sobre Manato, o sacerdote. Sobre ele e Moguzo. Talvez Ranta os tivesse traído.
Mesmo após perder companheiros, Haruhiro conseguiu permanecer como líder. Através de provações e tribulações, ele seguia em frente.
Haru, você tem ideia do quão incrível isso é?
Quando penso na sua dor, meu coração poderia facilmente ser partido ao meio. Só de imaginar a solidão que você deve sentir, meu corpo inteiro parece congelar.
Quero te abraçar forte e te aquecer, mas tudo bem. Tenho certeza de que você me afastaria.
Você diria: “Não precisa fazer isso. Estou bem. Somos companheiros, mas apenas companheiros.”
Queria poder te abraçar, enquanto ainda permanecemos preciosos e insubstituíveis como companheiros.
— Mesmo se lutarmos, as chances de vencer são mínimas! — argumentou Setora, parando. — Até mesmo afastá-lo seria improvável!
— Vamos conseguir! — Haruhiro ergueu a voz, sacando seu estilete. — Eu e Enba enfrentaremos quando ele vier! Mary, Tsuga-san, fiquem prontos para nos curar a qualquer momento! Shihoru, espalhe o Dark por todo o lugar! Ninguém vai morrer! Eu não vou deixar vocês morrerem! Vamos sobreviver!
— Certo! — responderam Mary e Shihoru em uníssono.
Tsuga segurava seu bastão, mas parecia não ter forças para empunhá-lo e lutar.
Quando Setora deu a ordem, — Apoie o Haruhiro! — Enba posicionou-se ao lado dele. Mary, Shihoru e Tsuga se esconderam nos arbustos à direita. O que Setora faria?
Ela estava diagonalmente atrás de Haruhiro e Enba, com os olhos fixos no wyvern no céu. Isso significava que não pretendia deixá-los arriscar a vida sozinhos, ao que parecia. Ela era respeitável.
O wyvern azul começou a descer. Naturalmente, não estava caindo. Estava se lançando em um mergulho. Mas parecia que estava despencando de cabeça em direção ao chão. Era assustador. Mary queria gritar.
Haru, não! Corra! É perigoso demais!
Naturalmente, ela não gritou. Agora que chegara a esse ponto, só podia assistir. Tinha que confiar nele.
Shihoru gritou: — Dark! — chamando seu elemental.
Mary arregalou os olhos o máximo que pôde e prendeu a respiração.
O wyvern soltou um: Pigyahhhh, batendo as asas com força e se virando.
As patas. Ambas estavam apontadas para baixo. Mesmo assim, ele não conseguiu quebrar a inércia da descida. Parecia que, em vez de pousar, ia se chocar contra o chão com as patas. Ele pretendia esmagar Haruhiro e Enba?
Haruhiro, Enba e Setora saltaram para o lado, evitando o ataque. Na primeira vez, pelo menos.
Não acabou em apenas uma investida. O wyvern pisoteava o chão com a pata direita, depois a esquerda, e saltava.
Pigyahh, pigyahh, pigyahh, ele gritava, pulando e batendo as asas freneticamente.
As vibrações eram intensas. Era como estar bem acima do epicentro de um terremoto. Será que Haruhiro, Enba e Setora estavam bem? Uma nuvem de poeira subia, dificultando a visão.
— Haru! Haru! Haru! — Mary chamou seu nome repetidamente. Ela não conseguia evitar.
O wyvern. Um wyvern azul. O que era aquela monstruosidade?
O dragão de fogo de Darunggar claramente estava em outra categoria em comparação, e nem se aproximava da hidra no Reino do Crepúsculo, mas aquele wyvern tinha uma aura intimidadora que poderia rivalizar com a de um gigante branco, especialmente um de oito metros. Era muito menos alto que um desses, mas a envergadura de suas asas, quando abertas, não era algo a ser ignorado.
O wyvern soltou um grito estridente: Piiiigyahhhhhh, enquanto batia as asas. Estava prestes a voar?
Havia uma silhueta humanoide em meio à nuvem de poeira. Quem poderia ser?
— Vá! — Shihoru mandou Dark. — Espalhe-se!
A forma humanóide, ou talvez semelhante a um boneco, de Dark explodiu com um estrondo. Mas ele não apenas explodiu. Ele se espalhou. Dark assumiu uma forma espessa, como uma névoa negra, e envolveu a cabeça do wyvern. O wyvern correu.
Pigyahh, pigyahh, grasnava, movendo as asas freneticamente enquanto ganhava altitude. A névoa de Dark o perseguia. Ele o seguiu, mas… não conseguiu acompanhar. Quando o wyvern atingiu cerca de três metros de altura, a névoa negra subitamente se dissipou e desapareceu. Será que ele o sacudiu?
Ou…
— Shihoru?! — Mary correu para amparar sua companheira. Shihoru estava prestes a desabar. Ela não estava em condições de usar magia. Mesmo assim, havia invocado Dark.
O que eu posso fazer?! Não há nada que eu possa fazer?!
— Haru! — chamou Mary.
— Sim! — a resposta foi imediata.
Ela não conseguia confirmar sua localização, mas Haruhiro estava vivo.
O que eu faço agora?!
— Ó Luz, que a proteção divina de Lumiaris esteja sobre você. Circlet!
Um anel luminoso surgiu ao redor de Mary e Shihoru. A luz de Lumiaris curaria aqueles dentro do círculo. Ela poderia mantê-lo por um tempo. Afinal, eu sou uma sacerdotisa.
— Ó Luz, que a proteção divina de Lumiaris esteja sobre você. Protection! Assist!
Dois hexagramas de cores diferentes apareceram no pulso esquerdo de Shihoru. Um deles também surgiu no próprio pulso de Mary, e outro no pulso de Tsuga, que estava por perto. Não alcançou Haruhiro, Setora ou Enba.
Ela deveria ter lançado Protection neles com antecedência. Repetia o mesmo erro que cometera quando perderam Moguzo. Era descuido, e ela se sentia uma péssima sacerdotisa, mas— ainda sou uma sacerdotisa!
— Shihoru, eu vou te proteger! Use toda a força que tiver!
— Mary… — Shihoru deu um sorriso exausto e, em seguida, acenou com firmeza. Naquele momento, houve um brilho mais intenso que a luz de Lumiaris. — Tudo bem. Estou me sentindo melhor graças a você… então vou dar tudo de mim até cair!
Embora a luz da cura pudesse tratar feridas, não podia recuperar a energia ou a força de vontade de uma pessoa. Assist aumentava todos os tipos de resistências, o que talvez desse um pequeno impulso na vitalidade, mas seria algo mínimo. Shihoru devia saber disso também. Mary podia fazer poucas coisas. Muito poucas, mas ainda era melhor que nada. Além disso, se ela estivesse ali, poderia ao menos proteger Shihoru caso o pior acontecesse.
Minha existência não é insignificante. Vou fazer tudo o que puder!
— Talvez eu tente rezar para Deus. Não sou muito fã disso, no entanto. — Tsuga levou os dedos à testa e fez o sinal do hexagrama. — Ó Luz, que a proteção divina de Lumiaris esteja sobre você. Prayer (Oração).
Ela nunca tinha visto isso antes.
Prayer.
Um único feixe de luz desceu dos céus para iluminar Tsuga. Algum tipo de fenômeno sobrenatural, trazido pelo grande poder do Deus da Luz, Lumiaris, estava acontecendo. Não estava claro o que iria ocorrer. Talvez nada acontecesse. Ou, talvez, mesmo que algo acontecesse, poderia não ser perceptível ou reconhecível por simples mortais.
Dizia-se que esse era um dos feitiços supremos da magia de luz, equivalente ao Sacrament, mas poucos sacerdotes tentavam aprendê-lo. O problema era que, além de ser incerto, seus efeitos eram imprevisíveis. Se fosse apenas inútil às vezes, seria uma coisa, mas havia a possibilidade de ser prejudicial.
Se Tsuga tivesse consultado Mary antes, ela provavelmente teria sido contra. Mas ele já havia usado. Era tarde demais. Tudo o que ela podia fazer era rezar para que nada terrível acontecesse.
Talvez as preces de Mary tenham sido atendidas. Ou talvez fosse o poder de Prayer.
A luz que iluminava Tsuga desapareceu, e… foi isso. Parecia que nada tinha acontecido.
— Tsc… É só isso? — Tsuga estalou a língua, claramente decepcionado.
— Tsuga… — Shihoru respondeu com desdém, deixando de lado o honorífico.
— Hã? Você me chamou sem honorífico de novo?
— …Você imaginou isso. Ou sua audição está incrivelmente ruim.
A nuvem de poeira começou a se dissipar, e Mary avistou Haruhiro e os outros. Ainda eram três, como deveria ser.
— Tá vindo! — gritou Haruhiro.
O wyvern.
O wyvern girou no ar. Estava tentando se posicionar para outro mergulho?
— Dark! — Shihoru invocou o elemental.
Mary envolveu Shihoru com os braços, apertando-a com força, enquanto cerrava os dentes. Que bem isso faria? Ela não queria pensar nisso agora. Por ora, ficaria ao lado dela.
Piiiiigyahhhhhhhiiiiiyahhhhhhhhh! O wyvern soltou um grito estridente enquanto girava a cabeça. Suas asas se fecharam levemente e ele começou a descer. Parecia estar mais lento, mas era apenas imaginação dela. Já estava quase em cima deles.
Shihoru soltou um suspiro engasgado. Ela hesitou? Pensou duas vezes antes de mandar o Dark? Parecia que havia parado. Dito isso, Shihoru estava à beira da exaustão, e não havia garantia de que pudesse usar mais magia. Provavelmente, era por isso que ela estava apostando no elemental atual. Estava tentando algo decisivo. Para conseguir isso, precisava esperar o momento perfeito. Mesmo com o wyvern tão perto, ela era cautelosa. Essa era a força de Shihoru.
Mary também sentiu que algo estava estranho. O quê?
A velocidade e o ângulo da descida.
Havia uma diferença sutil, mas ele não estava descendo em um ângulo tão íngreme quanto antes. O wyvern vinha em uma diagonal. Estava um pouco mais lento também. Não tinha a mesma força de antes. Mesmo assim, Haruhiro e os outros só podiam tentar evitá-lo. Não havia outra opção.
Haruhiro jogou-se para a direita, enquanto Setora e Enba se jogaram para a esquerda. O wyvern então pousou no chão com força suficiente para parecer um impacto—ou não. Nem sequer colocou as patas no chão.
Ele subiu de repente antes de tocar o solo.
O wyvern não voou muito alto. Ele fez uma curva fechada e desceu novamente.
— Whoa! — Mary quase se agarrou a Shihoru, mas conseguiu se conter.
Uma descida acentuada, uma subida acentuada, uma nova descida acentuada, seguida de outra subida acentuada. O wyvern repetia isso como um pêndulo.
Apesar de comparar com um pêndulo, o wyvern não seguia sempre o mesmo trajeto. Ele mudava de direção constantemente. O ângulo e a velocidade também variavam. A nuvem de poeira era incrível, mas não tão densa quanto quando ele alçava voo. Mary conseguia enxergar, mesmo que com dificuldade.
Alguém tropeçou enquanto tentava se esquivar do ataque do wyvern. Era Setora?
Enba imediatamente foi socorrê-la. No instante em que ele a segurava, o wyvern mudou de uma subida íngreme para um mergulho violento e os atacou. Dessa vez, suas patas estavam estendidas. Ele pretendia esmagá-los.
Com um — Nnnnnngh! — Enba lançou Setora para longe e tentou saltar para se salvar.
Foi muito perto. Ele não conseguiu.
A pata direita do wyvern roçou o braço direito de Enba. Foi o suficiente para arrancar seu braço e levá-lo junto.
— Ennnnnnnbaaaaaaaaa! — Assim que se levantou, posicionada para cair de forma segura, Setora tentou correr até Enba, mas Haruhiro a agarrou e puxou para trás.
O wyvern recomeçou seus movimentos ameaçadores e aterrorizantes. Bateu as asas e saltou.
Enba estava… desaparecido. O que havia acontecido com ele? Aquilo não era perigoso apenas para Enba; era uma ameaça para Haruhiro e Setora também.
— Dark! É tudo o que tenho! — gritou Shihoru.
Shihoru decidiu que não era mais hora de procurar uma abertura. Dark que flutuava sobre seu ombro finalmente foi lançado.
O elemental avançou em direção ao wyvern, emitindo um som que parecia eletricidade correndo por seus ouvidos e pele. Não haveria outro disparo. Shihoru tinha colocado tudo naquele ataque. Era por isso que Mary achou que Dark ficaria maior. Mas suas expectativas foram frustradas. Foi o oposto. Dark foi diminuindo aos poucos. Os sons estranhos ficaram mais fracos também.
Talvez por isso o wyvern não tentou evitá-lo. Ele pode nem ter notado. Afinal, até Mary perdeu de vista. Ela suspeitava que Dark havia atingido o peito do wyvern. O elemental se tornou pequeno demais para ser visto antes disso, então Mary o perdeu de vista.
Mas não havia dúvida de que Dark havia atingido o wyvern. Se não tivesse, o wyvern não teria aberto as asas, jogado a cabeça para trás e começado a tremer descontroladamente.
Funcionou.
Enquanto os olhos de Shihoru reviravam, e sua cabeça pendia para o lado, Mary a segurava firme e soltava um grito silencioso de alegria.
Shihoru! Isso foi incrível. Você é maravilhosa. Foi mais do que incrível. Eu nem consigo acreditar que você pode usar magia assim.
O wyvern cambaleou para frente. Será que aquilo o derrubou?
Não.
Pyohhhhhhhhhhhhhh… O wyvern gritou, começando a bater as asas. Mas não parecia que tentava voar; era mais como se estivesse usando as asas para bater no chão e tentar se equilibrar. Parecia estar lutando para se manter de pé, mas ainda não estava sem forças. Estava vindo.
O wyvern estava vindo na direção delas, mesmo tropeçando.
Onde estavam Haruhiro e Setora? Mary não tinha tempo para procurar por eles. Tsuga segurou firme seu bastão, respirou fundo e disse, em um sussurro: — Cuide dessa garota para mim.
Shihoru estava inconsciente nos braços de Mary. Mary assentiu, se agachando com Shihoru ainda nos braços.
Ela pegou o cajado de Shihoru. Se tivesse o cajado de uma maga, talvez pudesse fazer algo. Tinha que ser melhor do que estar desarmada.
O wyvern ainda estava instável, mas sem dúvida se aproximava. Seria por causa do Circlet? Se o wyvern tivesse descoberto Mary e Shihoru por causa do anel de luz e as tivesse escolhido como alvo, que erro terrível. Era tarde demais para arrependimentos agora, mas era frustrante.
Eu…
De repente, algo pesado caiu atrás dela com um baque aos seus pés. Quando olhou, era um homem alto que ela definitivamente não esperava ver ali. O que ele estava fazendo ali?
Kuzaku ergueu o rosto.
— Haha! Eu encontrei vocês. A situação tá louca, mas… estou cheio de energiaaaa!
Ele ficou de pé.
Ferimentos. Kuzaku parecia machucado. Estava coberto de hematomas. Será que estavam sendo curados pelo Circlet? Nunca se sabia quando algo podia trabalhar a seu favor.
Kuzaku gritou: — Me empresta isso! — e pegou o cajado de Shihoru das mãos de Mary. — Mesmo isso é melhor que nada! Mary-san, leve Shihoru-san e corra!
Mary balançou a cabeça. Ela só queria tirar Shihoru dali. Ia escondê-la em algum lugar e voltaria imediatamente. Talvez ainda houvesse algo que pudesse fazer com magia de luz. Devia haver. O anel de luz estava desaparecendo. Kuzaku e Tsuga avançaram para a linha de frente. O wyvern vinha em direção a eles com passos tão fortes que faziam o chão tremer.
Mesmo que Kuzaku e Tsuga dessem tudo de si, eles não poderiam parar aquele monstro. Mas talvez pudessem atrasá-lo por alguns segundos. Ganhar algum tempo. Provavelmente, essa era a intenção deles. Naturalmente, Mary ia ajudar também.
Mas ela nunca imaginou que um uivo repentino, Auuuuuuuuw, ecoaria pela área, seguido por dezenas de lobos negros atacando o wyvern de uma vez.
Se o wyvern estivesse em plena forma, talvez não fizesse diferença, mas ele ainda estava sofrendo o impacto do golpe devastador de Dark. Os lobos negros morderam suas patas e atacaram as bordas de suas asas.
O wyvern se contorcia, balançando as asas para afastar os lobos negros. No entanto, os lobos eram rápidos e persistentes. Quando chutava um para longe, outro surgia, e quando sacudia este, mais um aparecia. Eles vinham de todas as direções, atacando em turnos. Estavam acostumados a atacar em matilha para derrubar criaturas muito maiores que eles. Eram organizados. Tinham um líder absoluto, e seguiam as ordens dele.
— Miiiiiauuuuuu!
Essa voz não era de um lobo. Era de uma pessoa.
No lado direito, na direção em que Mary estava olhando, havia uma elevação gradual. Era onde ela estava. Não só ela. Havia um lobo negro enorme também. E, além disso, o goblin domador de feras.
Por que aqueles três estavam juntos?
Yume estufou o peito e levantou o punho.
— Yume, Onsan e Garon tão aqui pra… devastar a situação! Miiiiiauuuuuu!
Yume, você provavelmente quis dizer “salvar” a situação. Além disso, por que você tá miando?
Não que isso importasse. Era fofo, afinal. Algo quente crescia dentro do peito de Mary. Sua visão ficou turva. Mary segurou aquilo dentro de si. Não ia chorar. De jeito nenhum. As lágrimas logo sumiram.
O wyvern. Alguém tinha agarrado o pescoço do wyvern. Sendo um tipo de dragão, o corpo do wyvern era coberto de escamas, mas, olhando de perto, também tinha pelos. Alguém estava agarrado àqueles pelos e, além de evitar ser derrubado, estava subindo.
— Haru! — gritou Mary.
O que ele estava pensando? Quando ele chegou ali?
Pare. É perigoso! Ela quis gritar, mas sua voz não saiu.
Ela sabia. Haruhiro não ia parar. Porque ali era onde a batalha seria decidida. Tudo tinha convergido para aquele momento. Talvez nunca houvesse outra chance como aquela.
Haruhiro estava tentando resolver tudo. Para sair daquela situação, ele apostou tudo nessa tentativa. Não era um ato de desespero. Mesmo arriscando a vida, Haruhiro sempre tinha um plano sólido por trás de suas ações. Não havia como detê-lo agora. Então Mary tinha que acreditar nele e ter esperança. Assistir. E garantir que não perderia nada.
Haru vai conseguir.
Como em um pássaro, as patas dianteiras do wyvern haviam evoluído para asas. Ele não tinha braços nem mãos. Isso era o que dificultava para ele jogar Haruhiro para longe. Conhecendo Haruhiro, ele provavelmente tinha levado isso em consideração antes de atacar. Uma vez na parte de trás da cabeça do wyvern, o resto foi rápido. Haruhiro saltou em direção ao rosto da criatura e cravou seu estilete no olho direito. Foram três golpes antes de passar para o olho esquerdo. O wyvern soltou um grito cortante, de partir o céu, enquanto se debatia em agonia.
Haruhiro esperou o momento em que o wyvern baixasse a cabeça e então pulou para longe. Mesmo parecendo um louco desesperado, ele sempre escolhia viver. Naturalmente. Se ele morresse, seria um problema para a party.
O wyvern bateu as asas. Estava tentando voar? Parecia que sim. Com os olhos cegados, não estaria seguro nem mesmo no céu, mas isso ainda era melhor do que permanecer no chão, que estava cheio de inimigos querendo matá-lo. Essa devia ser a decisão do wyvern. Sim, isso era bom.
— A gente também! — Haruhiro gritou. — Corram! Enquanto podemos!
— Miau! — Yume respondeu enquanto corria encosta abaixo.
O lobo negro gigante e o goblin não se moveram.
Yume disse: — Tchau, miau! — e parecia estar acenando para eles.
Kuzaku pegou Shihoru dos braços de Mary e a carregou ele mesmo.
— Vamos, Mary-san!
— Certo! — Se fosse honesta, Mary gostaria de carregar Haruhiro. Mas Haruhiro não iria querer isso. A coisa mais importante para ele no momento era o bem-estar de seus companheiros. Para tranquilizar a mente do líder, o melhor seria se retirarem o quanto antes.
O wyvern estava levantando voo, e Haruhiro e Yume estavam bem.
Mary pegou o cajado de Shihoru de volta das mãos de Kuzaku e assumiu a liderança enquanto fugiam.
Tsuga, que fazia a retaguarda, começou a rir.
Mary não acreditava no que via. Isso realmente era possível?
Era névoa. De repente, a névoa se espalhou.
Quem poderia imaginar? Ela acreditava que não havia nenhum fenômeno sobrenatural presente. Será que estava enganada?
Prayer. Seria isso que havia trazido a névoa?
Ela ouvira dizer que os wyverns voavam das Montanhas Kuaron, no leste, em dias claros. Houve uma época em que dezenas deles atacaram a vila oculta de uma só vez. Isso significava que o wyvern azul não era o único por ali. Outros wyverns poderiam ter vindo ao Vale dos Mil buscando presas, e ainda poderiam encontrá-los.
Mas, com a névoa, isso já não era possível.
Será que tiveram sorte? Mary achava que não. A sorte teve seu papel, sem dúvida, mas havia mais do que isso. Porque todos fizeram o máximo e não desistiram, conseguiram chegar a esse resultado.
Com a névoa, a visibilidade estava piorando rapidamente. Mesmo quando olhou para o céu, Mary não conseguia mais distinguir a forma do wyvern.
— Yume!
— Haru-kun!
No momento em que ouviu os dois chamando pelos nomes um do outro atrás dela, Mary não conseguiu mais segurar as lágrimas. Continuou correndo, sem nem se preocupar em secá-las.
Mesmo quando Setora gritou: — Haru! — e Haruhiro respondeu: — Que bom que você está bem! — Mary não sentiu nada além de alívio. Ela conseguiu se alegrar, de coração, por Setora estar bem.
Se Mary continuasse assim, poderia viver sem guardar rancor. Todos eram preciosos para ela, ela os amava e, por mais embaraçoso que fosse admitir, queria dizer isso honestamente. Queria dizer a todos, com um sorriso no rosto. Algum dia, certamente seria capaz.
Era assim que se sentia.